Polaridade nas relações internacionais: diferenças entre revisões

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A maior parte dos teóricos da área de relações internacionais considera que a conformação do Sistema Internacional é completamente dependente da distribuição de poder e da influência de Estados em uma região ou a nivel internacional.
 
==Pólos de Poder, potência e polaridade ==
EsteUma das dificuldades para se definir um pólo de poder diz respeito à definição e análise do tipo de [[poder]]. Não existe consenso sobre quais modalidades de poder são as mais importantes para definir uma grande potência ou uma potência regional, embora exista um relativo consenso de que o poder militar, o poder econômico e o poder político, são determinantes para qualquer classificação. etipo de controvérsia envolve claramente definições distintas do que vem a ser poder, como mensurar o poder de um país, quais os elementos de [[poder]] (real e imediato ou potencial) mais relevantes e em que hierarquia de importância este devem ser considerados. Simplesmente não há concenso a respeito desta hierarquização em nenhuma grande corrente teórica das [[relações internacionais]], de estudos da [[geopolítica]] ou de [[estudos estratégicos]].
[[Ficheiro:Cold_War_Map_1980.png|right|thumb|400px|Bipolaridade: entre o fim da [[Segunda Guerra Mundial]] e o fim da [[Guerra Fria]] o [[Sistema Internacional]] era dividido em dois grandes pólos de poder.]]
Grande parte dos problemas relacionados à classificação da polaridade do sistema internacional está relacionado aos diferentes critérios utilizados para se clasificar uma potência. Alguns autores diferenciam aspectos como a capacidade de atuação ou a capacidade de [[projeção de poder]] de uma potência (potência global, continental, [[potência regional]], local) da dimensão ou "tamanho" do poder ([[superpotência]], [[grande potência]], [[potência média]] e pequenas potências). O grande problema que aparece neste caso é que, dependendo dos critérios utilizados para se mensurar poder, o número de pólos de poder muda. O tipo de poder a ser considerado também muda o resultado da classificação, pois é diferente considerar o [[poder]] real ou de uso imediato (geralmente político-militar), do [[poder]] potencial, que geralmente inclui economia, finanças, capacidade industrial, demografia e tamanho da população, tamanho do território, recursos naturais, capacidade de engenharia e de desenvolvimento tecnológico, além de aspectos diplomáticos, como o padrão de alianças e inimizades regionais.
 
Pólos de poder regionais são qualitativamente distintos dos pólos de poder globais, não apenas pelas diferenças econômicas e de capacidades militares ou de [[projeção de força]]s, mas também porque as características da competição inter-estatal no nível global, ou do conjunto do Sistema Internacional, são bastante distintas das exigências da competição nos continentes e regiões. A [[Polaridade no Sistema Internacional]] depende basicamente do número de pólos com capacidade de atuação, projeção de forças e competição em todo o globo, sendo que na atualidade, outros critérios também são relevantes, como a capacidade nuclear de ataque e contra-ataque.
===Poder===
Considerando critérios de poder real, por exemplo, autores americanos como Lieber & Press (1996), chegaram a defender que a supremacia nuclear americana era suficiente para garantir a [[supremacia]] militar global e, portanto, a [[unipolaridade]] do [[sistema internacional]]. Isto foi contestado diretamente por Cepik, Avila e Martins (2007 e 2009), que defendem que os Estados Unidos não possuem supremacia nuclear incontestável (seria apenas superioridade nuclear), e que mesmo que os Estados Unidos obtivessem a supremacia nuclear, isso não seria suficiente para impor e manter a [[unipolaridade]] absoluta no sistema mundial.
 
== Polaridade ==
Este tipo de controvérsia envolve claramente definições distintas do que vem a ser poder, como mensurar o poder de um país, quais os elementos de [[poder]] (real e imediato ou potencial) mais relevantes e em que hierarquia de importância este devem ser considerados. Simplesmente não há concenso a respeito desta hierarquização em nenhuma grande corrente teórica das [[relações internacionais]], de estudos da [[geopolítica]] ou de [[estudos estratégicos]].
As principais formas de polaridade existentes nas relações internacionais são:
===Capacidades===
[[Ficheiro:Minuteman_III_MIRV_path.svg|right|thumb|300px|Modelo de míssil Balístico interncontinel com capacidade de lançar [[ogivas nucleares]] estão entre as capacidades fundamentais para distinguir as grandes potências mundiais das potências regionais]]
 
====Unipolaridade ou Sistema Unipolar====
Uma das definições interessantes é a de [[John J. Mearsheimer]], que considera que o primeiro critério para definir as grandes potências ou [[superpotências]], é verificar se estas possuem capacidade nuclear de segundo ataque (ver [[Destruição Mútua Assegurada|MAD]]), ou seja, a capacidade de sobreviver a um [[ataque nuclear]] e retaliar o país agressor com um outro [[ataque nuclear]]. Somente [[Estados Unidos]], [[Rússia]] e [[China]] teriam esta capacidade, portanto seriam as únicas três "grandes potências mundiais". Hierarquicamente abaixo deste critério principal, um segundo conjunto de critérios levantados por Mearsheimer envolveria o tamanho do [[Exército]], como principal capacidade dissuasória de um país após a capacidade nuclear. Uma terceira categoria, mais complexa e difícil de ser mensurada envolve a capacidade política e econômica de sustentar a "[[estratégia]] de [[grande potência]]". As capacidades necessárias para que um país mantenha uma "estratégia de grande potência", portanto, são principalmente a capacidade de uma potência de conseguir manter seu arsenal nuclear em pronto uso (incluindo os meios de lançamento como bombardeios estratégicos, Míssil balístico intercontinental|mísseis balísticos intercontinentais]] e submarinos nucleares lançadores de mísseis) e também de manter e sustentar por longo período de tempo, um grande [[Exército]]. Estas capacidades precisariam ser mantidas mesmo diante das pressões da competição internacional. Pode-se considerar, por exemplo, que na segunda metade da [[Guerra Fria]], a [[URSS]] não coseguiu manter sua estratágia de grande potência e sucumbiu frente às pressões estratégicas impostas pelo seu maior competidor, os [[Estados Unidos]] e seus aliados.
Característica de uma correlação de forças existente em um Conjunto de Estados em determinada região, continente ou no [[Sistema Internacional]], em que existe uma única potência polarizando aquele sistema. Mais comum em complexos regionais, é muito clara em casos como a [[América do Norte]], em que só existe um único pólo de poder, os [[Estados Unidos]]. Seria o caso, ainda, da África Ocidental, onde a [[Nigéria]] é o único pólo de poder regional.
 
====Bipolaridade ou Sistema Bipolar====
Mesmo uma categorização simultaneamente clara e complexa como esta é questionável, pois novas categorias de [[armas estratégicas]], ou armas de uso estratégico (como canhões a laser e armas de energia direta, aeronaves aeroespaciais hipersônicas), tenderiam a substituir com vantagens as atuais [[armas nucleares]] e a tríade de lançadores nucleares, formada pelos bombardeios estratégicos, [[Míssil balístico intercontinental|mísseis balísticos intercontinentais]] e [[submarino|submarinos]] nucleares lançadores de [[Míssil balístico intercontinental|mísseis]] (AVILA, CEPIK & MARTINS, 2009).
[[Ficheiro:Cold_War_Map_1980.png|right|thumb|330px|Bipolaridade: entre o fim da [[Segunda Guerra Mundial]] e o fim da [[Guerra Fria]] o [[Sistema Internacional]] era dividido em dois grandes pólos de poder.]]Sistema de Estados em que há claramente apenas dois grandes pólos de poder. O Caso mais conhecido é o do período da [[Guerra Fria]], em que Estados Unidos e [[União Soviética]] polarizaram todo o [[Sistema Internacional]], embora sempre tenham existido outras potências regionais com influência regional. Seria, ainda, o casos da [[América do Sul]] durante a primeira metade do século XX, quando [[Brasil]] e [[Argentina]] eram os principais pólos de poder regional, com capacidade para polarizar todo o continente. Também pode ser caracterizado como um sistema bipolar aquele que predominava na África Austral durante o fim dos anos 1970 e os [[anos 1980]], quando [[África do Sul]] e [[Angola]] lideravam grupos opostos em confronto direto.
 
Ao longo da História pode-se observar outros casos de bipolaridade, como a que existiu na região do [[Mar Mediterrâneo]], entre os séculos III e II a.C., quando [[Roma]] e [[Cartago]] eram os dois principais pólos de poder da região.
==Polaridade e estabilidade do Sistema Internacional==
 
A bipolaridade seria típica de regiões em que existem conflitos capazes de polarizar o sistema de estados.
====Tripolaridade ou Sistema Tripolar====
[[Ficheiro:Superpower map 1945.png|thumb|right|330px|Mapa do mundo em [[1945]]. De acordo com [[William T.R. Fox]], os [[Estados Unidos]] (azul), a [[União Soviética]] (vermelho) e o [[Império Britânico]] (verde-azulado) eram as superpotências da época.]]
Caso relativamente raro de equilíbrio de poder entre três potências ou pólos principais de poder. Alguns consideram que a Europa no período do imediato pós-II Guerra Mundial estava configurada como um Sistema Tripolar, em que [[Estados Unidos]], [[Inglaterra]] e [[União Soviética]] eram os três grandes pólos de poder presentes no continente, embora esta situação tenha durado pouco, pois já em 1947 e 1948 a Europa ficaria claramente dividida em dois grandes pólos de poder.
 
Quando consideradas regiões segmentadas é possível encontrar correlações de força mais tipicamente tripolares, como na porção leste da Ásia ou Ásia Oriental, em que [[China]], [[Rússia]] e [[Japão]] são os três principais pólos de poder regional. A Europa Centro-Ocidental, ou seja, desconsiderando a [[Rússia]], também poderia ser classificado como um sistema tripolar, em que [Inglaterra]], [[França]] e [[Alemanha]] são os três grandes pólos de poder na região. Quando se considera o conjunto do [[Sistema Internacional]] na atualidade, pode-se considerar a existência de três grandes potências globais, com capacidades militares de atuação global e capacidade nuclear significativa, os Estados Unidos, a Rússia e a China (Ver artigo: [[Polaridade no Sistema Internacional]])
É comum a confusão de conceitos como [[unipolaridade]], [[supremacia]] ou [[hegemonia]], embora sejam três conceitos distintos. A maior parte dos pensadores das relações internacionais que seguem a chamada escola realista geralmente utilizam o termo hegemonia como sinônomo de supremacia militar. Uma pequena parte dos autores realistas, a grande maioria dos teóricos construtivistas, liberal-institucionalistas e marxistas, consideram [[supremacia]] como sendo diferente de [[hegemonia]] (ANDERSON, 2002; ARRIGHI, 1996; KEOHANE, 1984). Para este grupo de autores, geralmente, hegemonia vai além da força e inclui, em algum grau, liderança, ou seja, a capacidade de influência político-diplomática, e (ou) econômica e (ou) ideológica e cultural. Já a supremacia estaria associada diretamente à existência de uma superioridade militar incontestável. Neste sentido os Estados Unidos, no mundo de hoje, teriam hegemonia global, mas supremacia militar apenas na América do Norte.
 
====Multipolaridade ou Sistema Multipolar====
[[Kenneth Waltz]], criador da corrente teórica do [[realismo estrutural]], considera que a [[bipolaridade]] é o sistema mais estável e a multipolaridade o mais instável, ou propenso à um guerra central, como as Guerras Mundiais. Para este autor, a bipolaridade seria caracterizada pela divisão do mundo ou de um continente em duas grandes áreas de influência de duas potências com superioridade militar (supremacia) regional, como na época da Guerra Fria.
O equilíbrio de poder multipolar é o mais comum ao longo da história e em Sistemas Inter-Estatais regionais. A [[Europa]] entre os séculos XVI e XVII ou durante a maior parte dos séculos XVIII e XIX, foi caracterizada por um sistema multipolar. A Europa deixou de ser multipolar por períodos relativamente curtos, quando haviam guerras continentais que levavam à configuração de duas grandes alianças militares polarizadas por pólos antagônicos, como nas Guerras Napoleônicas, ou na I e II Guerras Mundiais, situação que poderia ser classificada como de bipolaridade temporária, embora nem sempre fique claro se isto alterou realmente a polaridade do sistema regional.
 
No período no pós-[[Guerra Fria]] a Europa volta a ser um Sistema claramente Multipolar, tendo na Europa Ocidental três grandes pólos de poder: [[Inglaterra]], [[França]] e [[Alemanha]], além da [[Rússia]], na Europa Oriental. Atualmente predominam sistemas multipolares no continente [[África|africano]], na [[Ásia]] e no [[Oriente Médio]].
[[John J. Mearsheimer]], por sua vez, considera que é muito difícil uma supremacia global, mas que os Estados Unidos ficariam satisfeitos em continuar sendo a única potência mundial com hegemonia (no sentido de supremacia) regional, na América do Norte. Assim, a estratégia americana para impedir o surgimento de hegemonias regionais e continuar sendo a única potência com hegemonia-supremacia regional estaria correta, pois garantiria a liderança global. Assim, a unipolaridade seria o sistema menos propenso a guerras centrais.
 
====Apolaridade ou Sistema Apolar====
Ao mesmo tempo, autores brasileiros consideram que a multipolaridade equilibrada é o padrão de distribuição de poder mais estável e, portanto, menos propenso às guerras centrais. O problema, portanto, estaria no desequilíbrio entre as capacidades das potências, como principal causador de conflitos centrais, e, não necessariamente, no número de pólos de poder.
Apolaridade ou a-polaridade, seria o caso em que não é possível identificar um pólo de poder relevante ou principal. Casos deste tipo de polaridade foram comuns em regiões não organizadas na forma de Estados, ao longo da História da Humanidade, ou, em períodos mais recentes, em regiões pequenas onde não haviam pólos de poder local. Regiões que poderiam ser caracterizadas como apolares, na atualidade, restringem-se à regiões como a África Central, na faixa que vai da [[República Centro-Africana]] e [[República Democrática do Congo]] (ex-Zaire) até o [[Uganda]], [[Quênia]], [[Tanzânia]], incluindo [[Ruanda]] e [[Burundi]]. Neste caso, isto ocorre porque o principal pólo de poder regional, o antigo Zaire, implodiu em uma longa [[Guerra Civil]], com intervenção de inúmeros outros atores regionais, que acabou por desmantelar as capacidades político-institucionais e de projeção de forças militares do país.
 
Uma situação de apolaridade completa, na atualidade, só existe na [[Antártida]].
 
 
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* ANDERSON, Perry (2002). ''Force and Consent'', '''New Left Review''', n. 17, p. 5-30
* ARRIGHI, Giovanni (1996). '''''O Longo Século XX: dinheiro, poder e as origens de nosso tempo'''''. Ed. Contraponto: Rio de Janeiro, RJ; Ed. UNESP: São Paulo, SP; Brasil.
* CEPIK, Marco A. C.; AVILA, Fabrício S.; MARTINS, José Miguel Q. (2007). ''O escudo anti-míssil americano e a resposta russa''. '''Radar do Sistema Internacional'''. Brasil. [http://rsi.cgee.org.br/documentos/4241/1.PDF]
* CEPIK, Marco A. C.; AVILA, Fabrício S.; MARTINS, José Miguel Q.(2009). ''Armas estratégicas e poder no sistema internacional: o advento das armas de energia direta e seu impacto potencial sobre a guerra e a distribuição multipolar de capacidades''. '''Revista Contexto Internacional''', vol.31, n.1, p. 49-83. Rio de Janeiro, Brasil. [http://www.scielo.br/pdf/cint/v31n1/02.pdf]
* KEOHANE, Robert (1984). '''''After Hegemony: Cooperation and Discord in the World Political Economy'''''. Princeton University Press, Princeton, Oxford.
* LIEBER, Keir A. & PRESS, Daryl G. (2006) ''A ascensão da supremacia nuclear dos Estados Unidos''. '''Revista Política Externa''', v. 15, nº 1, jun/jul/ago de 2006, p. 47-56.
* MEARSHEIMER, John (2007). '''''A Tragédia da Política das Grandes Potências'''''. Tradução: Tiago Araújo. Ed. Gradiva: Lisboa, Portugal.
* WALTZ, K. (1979). '''''Theory of International Politics'''''. Reading: Addison-Wesley .
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