Concílio de Basileia-Ferrara-Florença: diferenças entre revisões

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O '''Concílio de Florença''' (originalmente '''Concílio de Basileia''') foi um [[concílio ecumênico]] de bispos e outros membros do clero da [[Igreja Católica Romana]]. Ele começou em 1431 em [[Basileia (Suíça)|Basileia]] e foi transferido para [[Ferrara]] em 1438 por ordem do [[Papa Eugênio IV]], movimento que fez com que ele também ficasse conhecido como '''Concílio de Ferrara'''. O encontro foi novamente transferido para [[Florença]] em 1439 por conta do perigo de [[peste bubônica|peste]] em Ferrara e por que a cidade de Florença concordou, com promessa de pagamento futuro, em financiar o concílio<ref name= "Oxford 2005">{{citation | title = Oxford Dictionary of the Christian Church | publisher = Oxford University Press | year = 2005 |isbn=978-0-19-280290-3 | chapter = Florence, Council of}}.</ref>. A localização inicial em Basileia refletia o desejo entredas partes que buscavam a reforma de se encontrar fora dos [[Estados Papais|territórios em poder do Papa]], do [[Sacro Império Romano-Germânico]] ou dos [[Rei de Aragão|reis de Aragão]] e da [[rei da França|França]], cujas influências sobre o concílio procuravam evitar. [[Ambrogio Traversari]] esteve no concílio de Basileia como [[legado papal|legado]] do Papa Eugênio.
 
O concílio seu reuniu numa época em que o [[conciliarismo]] era forte e a autoridade papal, fraca. Sob pressão para promover as reformas eclesiásticas, [[Papa Martinho V]] sancionou um decreto do [[Concílio de Constança]] (9 de outubro de 1417) obrigando o papado a convocar concílios gerais periodicamente. Ao expirar o período proposto pelo decreto, o Papa cedeu e convocou um concílio em [[Pávia]]. Por conta de uma [[epidemia]], a localização foi transferida quase que imediatamente para [[Siena]] (veja [[Concílio de Siena]]) e cancelado - por motivos ainda não conhecidos perfeitamente - logo que tinha começadocomeçou a discutir o assunto da reforma (1424).
 
O próximo concílio se deu ao terminar o prazo de sete anos, em 1431. Martinho V obedientemente o convocou para esta data na cidade de [[Basileia (Suíça)|Basileia]] e selecionou o cardeal [[Juliano Cesarini]] para presidi-lo, um prelado muito respeitado. O próprio Martinho, porém, viria a morrer antes da abertura dos trabalhos.
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O concílio em Basileia abriu com apenas uns poucos bispos e [[abade]]s presentes, mas cresceu rapidamente e acabou tendo uma maioria de religiosos de ordens menores sobre os bispos. A postura inicial foi anti-papal, proclamando a superioridade do concílio sobre o Papa e prescrevendo uma [[profissão de fé do sumo pontífice]], um juramento que deveria ser feito por todos os Papas em sua eleição. Quando o concílio foi transferido de Basileia para Ferrara em 1438, alguns permaneceram em Basileia (como [[Nicolau de Cusa]]), ainda alegando serem parte do "verdadeiro concílio". Eles elegeram [[Amadeu VIII, Duque de Saboia]] como o [[Antipapa Félix V]]. Expulsos de Basileia em 1448, eles se mudaram para [[Lausanne]], onde Félix, o único reclamante ao trono papal a ter feito a profissão de fé proposta em Basileia, renunciou. No ano seguinte, o eles decretaram o fechamento do que eles ainda acreditavam ser o Concílio de Basileia<ref name = "Oxford 2005" />.
 
O concílio enquanto isso tinha negociado com sucesso a reunificação com diversas [[Igrejas Ortodoxas]], conseguindo acordos em assuntos como a [[primazia papal]], a inclusão da [[cláusula filioque]] no credo e sobre o [[purgatório]], uma novidade recente no léxico teológico latino. OsO itensitem mais importantesimportante em discussão, previsivelmente, eramera o [[poder papal]], no sentido de um poder direto e que responde à ninguém, sobre todas as Igrejas ortodoxas nacionais (sérvia, búlgara, russa, georgiana, armênia etc.) em troca de assistência militar contra os [[otomanos|turcos otomanos]]. O partido grego, sob forte pressão do [[imperador bizantino]], aceitou, por razões puramente políticas, as demandas do grupo papal. Apenas [[Marcos de Éfeso]] rejeitou a união nesteentre grupoos ortodoxos gregos. Os russos, tendo ouvido rumores desta teologia puramente política, rejeitaram furiosamente a união e expulsaram qualquerquaisquer preladoprelados que fossefossem minimamente simpáticosimpáticos à ideia. É claro que a ajuda do ocidente ao [[Império bizantino]] nunca se materializou e a [[queda de Constantinopla]] ocorreu em 1453. O concílio declarou também que o grupo que estava reunido em Basileia eram [[heresia|heréges]] e os [[excomunhão|excomungou]]. Finalmente, em 1441, a superioridade do Papa sobre os concílios foi reafirmanda na [[bula papal]] ''Etsi non dubitemus'' de 20 de abril<ref name = "Oxford 2005" />.
 
== Concílio de Basileia ==
=== Composição do concílio ===
[[Ficheiro:Pisanello, copia da Ritratto di Martino V (Galleria Colonna).jpg| thumb| 300px| esquerda| [[Papa Martinho V]] convocou o Concílio de Basileia<br><small>Cópia de obra de [[Pisanello]] (séc. XV), na [[Galeria Collona]].</small>]]
A característica democrática da assembleia em Basileia foi o resultado tanto de sua composição quanto de sua organização. Doutores em teologia, mestremestres e representantes de [[capítulo (religião)|capítulos reliosos]], monges e clérigos de ordens inferiores constantemente superavam em número os prelados no concílio. Além disso, a influência do clero superior tinha menos peso pois, ao invés de se separarem em "nações", como no [[Concílio de Constança]], eles se dividiram de acordo com os seus gostos e aptidões em quatro comitês ou ''deputationes''. UmaUm era responsável por questões de fé (''fidei''), outraoutro sobre as negociações de paz (''pacis''), aum terceiraterceiro sobre a reforma da igreja (''reformatorii'') e ao quartaquarto com que eles chamaram de "preocupações comuns" (''pro communibus''). Cada decisão tomada por três destes comitês &nbsp;— e em cada um, o clero inferior era majoritário &nbsp;— recebia a ratificação formal da congregação geral e, se necessário, levava à promulgação dos decretos na sessão plenária. Por esta razão, os críticos papais chamaram este concílio de "uma assembleia de copistas" ou mesmo de "um conjunto de cavalariços e ajudantes de cozinha".
 
=== Tentativas de dissolvê-lo ===
Da Itália, França e Alemanha, os religiosos chegaram tardeatrasados à Basileia. Cesarini devotouvinha devotando todas as suas energias à guerra contra os [[hussitas]], até que a [[batalha de Domažlice]] (chamada de "desastre de Taus") forçou-o a evacuar a [[Boêmia]] apressadamente. O [[Papa Eugênio IV]], o sucessor de Martinho, perdeu as esperanças de que o concílio pudesse ser útil dado o progresso da heresia, os problemas relatados na Alemanha, a guerra que tinha recentemente iniciado entre o [[Duque da Áustria]] e o [[Duque da Borgonha]] e, finalmente, o pequeno número de religiosos que tinham respondido à convocação de Martinho V. Esta opinião, somada ao desejo de presidir sobre o concílio em pessoa, induziram-no a reconvocar os padres da Alemanha, cancelando o concílio. Ele apontou [[Bolonha]] como novo local do concílio, paraa ser realizado dali dezoito meses, com a intenção de fazer as sessões do concílio coincidirem com algumas conferências com a [[Igreja Ortodoxa]] que já estavam marcadas para ocorrer alina cidade e já com o objetivo de fomentar a união ecumênica.
 
[[Ficheiro:Věnceslav Černý - Poselstvo české v Basileji r. 1433.jpg| thumb| direita| 300px| Embaixada da [[Boêmia]] no Concílio de Basileia.]]
 
EstaA ordemsuspensão do concílio provocou uma forte reação entre os padres quereunidosestavam alireunidos e provocou uma enorme insatisfação no legado papal responsável, o cardeal Cesarini. Eles argumentaram que os hussitas iriam pensar que a Igreja estava com medo de enfrentá-los e que os leigos iriam acusar o clero de estarem adiando a reforma, ambas as acusações com efeitos desastrosos. O Papa explicou suas razões e cedeu em alguns pontos, mas o padres ali reunidos não mudaram de opinião. Consideráveis poderes tinhatinham sido decretados para os concílios da Igreja pelo [[Concílio de Constança]] que, entreenvolvido osnos problemas do [[Cisma do Ocidente]], tinha proclamado a superioridade, em alguns casos, dos concílios sobre o Papa eem alguns casos. Com base nisto, os padres em Basileia insistiram em seu direito de permanecerem reunidos. Elese realizaram sessões, interferiram com o governo do [[Condado Venaissino]] (o condado papal à volta de [[Avinhão]]), fizeram tratados com os hussitas e, como representantes da Igreja universal, propuseram leis regulando até mesmo o próprio [[Papa|Sumo-pontífice]].
 
Eugênio IV resolveu resistir às alegações de supremacia do concílio, mas ele não ousou repudiar diretamente a doutrina conciliar, considerada por muitos como sendo a real fundação da autoridade dos papas antes do [[cisma]]. Ele logo percebeu a impossibilidade de tratar com os padres de Basileia como um rebeldes ordinários e tentou uma solução intermediária. Porém, conforme o tempo passava, os padres lá reunidos se tornaram mais e mais firmes, criando entre as partes uma barreira insuperável.
 
Abandonado por uma parte de seus [[cardeal|cardeais]], condenado pela maioria dos poderes laicos, sem poder militar sobre seus domínios por causa dos ''[[condottieri]]'', que abertamente invocavam a autoridade do concílio, o Papa fez concessões atrás de concessões e terminou, em 15 de dezembro de 1433, com uma lamentável rendição de todos os itens em discussão numa [[bula papal]], ditada pelos padres na Basileia, que efetivamente cancelava sua bula de dissolução anterior - tida agora como nula e inválida - e reconhecendo que o sínodoa reunião em Basileia era legítimolegítima. Porém, Eugênio IV não ratificou todos os decretos vindos dedo Basileiaconcílio e nem cedeuconcedeu uma subsmissão definitiva à supremacia do concílio. Ele se recusou a discursarrealizar qualquer pronunciamento sobre o assunto e seu silêncio forçado escondia um desejo secreto de salvaguardar o princípio da soberania do Papa.
 
Os padres, desconfiados, só permitiriam que os legados do Papa presidissem sobre os trabalhos sob a condição de que eles reconhecessem a superioridade do concílio. Os legados de fato se submeteram a esta humilhante (para eles) formalidade, mas em seus próprios nomes, como se descobriria depois, reservando assim a decisão final à [[Santa Sé]]. Além disso, as dificuldades de todos os tipos que Eugênio tinha que lidar, como a insurreição em Roma, que forçou-o a escapar através do [[Tibre]] deitado no fundo de um barco, o deixaram sem condições de resistir às maquinações do concílio.
 
[[Ficheiro:Josef Mathauser - Bitva u Domažlic.jpg| thumb| 300px| direita| [[Batalha de Domažlice]], vitória dos [[hussitas]] e tema do Concílio de Basileia.<br><small>Por Josef Mathauser.</small>]]
 
=== Questões de reforma ===
Encorajados pelo seus sucessos, os padres reunidos então atacaramenfrentaram o assunto da reforma, sendo o item principal a redução ainda maior do poder papal e dos recursos à disposição do Papa. Eles tomaram decisões sobre medidas disciplinares que regulavam as [[conclave|eleições]], sobre a celebração dos serviços religiosos, sobre a realização periódica de [[sínodo]]s [[diocese|diocesanos]] e provinciais, todos assuntos que eram tópicos comuns nos concílios católicos. Eles também emitiram decretos sobre alguns dos direitos assumidos pelos quais os papas tinham estendido o seu poder e melhorado suas finanças às custas das igrejas locais. Assim, o concílio aboliu os "[[anado]]s" ("Primeiros frutos"), limitou muito o abuso das "reservas" de concessão de benefícios pelo Papa e completamente aboliu o direito alegado pelo Papa de ''gratiae expectativae''. Outros decretos conciliares limitaram fortemente a jurisdição da corte de Roma e trataram até mesmo das regras dos [[conclave]]s e da constiuição do [[Colégio Sagrado]]. Os padres continuaram a se devotar também à subjugação dos [[hussitas]] e também intervieram, rivalizando com o Papa, nas negociações entre a França e Inglaterra que levaram ao [[Tratado de Arras]], concluído por [[Carlos VII da França]] com o [[Duque da Borgonha]]. Também, a [[circuncisão]] foi considerada como sendo um [[pecado mortal]]. Finalmente, eles investigaram e julgaram diversos casos privados &nbsp;— processos legais entre prelados, membros de ordens religiosas e recipientes de benefícios - cometendo assim um dos mais sérios abusos aos olhos da corte de Roma.
 
== Concílio de Ferrara - Florença ==
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A luta pela união do ocidente e oriente em Ferrara e em Florença, ainda que promissora, nunca deu resultados. Enquanto progressos pela união no oriente continuaram a ser feitos nas próximas décadas, todas as esperanças de uma reconciliação foram estraçalhadas com a queda de Constantinopla em 1453.
 
Já a disputa de dezessete anos para defender o [[conciliarismo]] realizada, em Basileia e em Lausanne, terminou também em derrota. O Papado, tão abalado em suas fundações durante o [[Cisma do Oriente]], atravessou estas tribulações com uma [[vitória de Pirro]]. A era de grandes concílios do século XV terminou e a constituição da Igreja Católica Romana continuou monárquica.
 
Por fim, diversas das questões e tensões levantadas sobre as reformas iriam provocar, no século seguinte, a [[Reforma Protestante]].