Paixão segundo São João, BWV 245: diferenças entre revisões

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[[File:Rembrandt Harmensz. van Rijn 071.jpg|300px|right|]]
A '''Paixão segundo São João, BWV 245''' (em [[alemão]]:Johannes-Passion)<ref>[http://orton.catie.ac.cr/cgi-bin/wxis.exe/?IsisScript=COLPOS.xis&method=post&formato=2&cantidad=1&expresion=mfn=039430 GROVE, ''Dicionário de música''. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed.,1994]</ref>, é um [[oratório]] [[sacro]] de [[Johann Sebastian Bach]].<ref>[[Michael Steinberg (music critic)|Steinberg, Michael]]. ''Choral Masterworks: A Listener’s Guide'', 19. New York: Oxford University Press. 2005.</ref> A peça foi composta em [[Leipzig]], no inverno que precedeu a [[sexta-feira santa]] de [[1724]]. <ref name="Williams, Peter 2004">Williams, Peter. ''The Life of Bach'', 114. Cambridge: Cambridge University Press. 2004.</ref>
 
A obra é uma representação dramática do texto contido no [[Evangelho de João]], emoldurada por dois [[coral (protestantismo)|corais]] (abertura e final) e dramatizada de forma reflexiva em [[recitativo]]s, corais, [[arioso]]s, e [[aria]]s.<ref> Daw, Stephen. ''The Music of Johann Sebastian Bach: The Choral Works'', 107. Canada: Associated University Presses, Inc. 1981.</ref> Comparada com a ''[[Paixão segundo São Mateus]], [[BWV]] 244'', a ''Paixão segundo São João'' tem sido descrita como mais extravagante, com um [[andamento]] expressivo, asàs vezes desenfreado e menos "acabado".<ref>Steinberg, 22.</ref>
 
A Paixão é uma obra de ocasião, e por regra, foi ouvida apenas uma única vez. Obra muito elaborada artisticamente, o que o ouvinte não conseguia entender em termos estéticos, como disse [[Eric Chafe|Chafe]], era compensado por seu conhecimento de uma rede de intenções que ligavam a experiência religiosa de cada um ao seu contexto cultural e religioso maior. A principal dentre essas intenções era apresentar o caráter dinâmico da experiência religiosa num programa didático sequencial de [[doutrina dos afetos|afetos]] e formas com que o ouvinte comum pudesse se identificar, criando uma ponte entre as [[Escrituras]] e a fé, à luz, naturalmente, da tradição [[hermenêutica]] fundada por [[Lutero]]. Para conseguir esse objetivo, além do conteúdo explícito dos textos, Bach recorria a um rico repertório de elementos puramente musicais para ilustrar e enfatizar o texto, elementos que por sua vez estavam associados a uma série de convenções [[símbolo|simbólicas]] e [[alegoria|alegóricas]] então de domínio público, um procedimento típico do [[Barroco]] em geral, no caso aplicado aos propósitos do [[Protestantismo]].<ref>[http://books.google.com.br/books?id=wVXP165e-uEC&printsec=frontcover&dq=%22bach's+cantatas%22&hl=pt-BR&ei=_FsWTcyjDsX6lwfh8MTJDA&sa=X&oi=book_result&ct=result&resnum=5&ved=0CD0Q6AEwBA#v=onepage&q=%22bach's%20cantatas%22&f=false Chafe, pp. ix-xv]</ref>
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Bach seguiu os capítulos 18 e 19 do [[Evangelho de João]] da [[Bíblia de Lutero|Bíblia luterana]], e o [[tenor]] [[evangelista]] diz exatamente o texto dessa [[Bíblia]]. A compilação e poemas adicionais são de autoria desconhecida, seguindo o modelo do [[Hinário]] [[luterano]] e da ''Paixão segundo João'' de ''[[Christian Heinrich Postel]]'' (c.1712).
 
Na primeira parte, a primeira [[cena]] se dá no [[Vale do Cédron]], e a segunda no palácio do sumo sacerdote [[Caifás|Kaiphas]]. A segunda parte mostra três cenas, uma com [[Pilatus]], outra no [[Calvário|Golgatha]], e outra nas ruas de [[Jerusalém]]. O argumento dramático entre Pilatus, Jesus e os sacerdotes não é interrompido pelas reflexões feitas pelo coro, que em [[Bach]] sempre representa o povo.<ref> name="Williams, Peter. ''The Life of Bach'', 114. Cambridge: Cambridge University Press. 2004.<"/ref>
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As pesquisas apontam que [[Bach]] revisou várias vezes a obra antes de apontar uma versão final na década de 1740.<ref>Wolff, 293-4.</ref> Os números alternativos que Bach introduziu em 1725, foram posteriormente removidos e podem ser encontrados no apêndice de dezenas de trabalhos, tais como no da ''[[Neue Bach Ausgabe]]''.<ref name="Wolff, 294">Wolff, 294.</ref>
 
A ''Paixão segundo São João'' não foi a primeira Paixão de Bach. Enquanto ele trabalhava como [[organista]] em 1708 e Konzertmeister em 1714 em [[Weimar]], Bach escreveu, possivelmente, uma paixão agora perdida.<ref name="Steinberg, 19">Steinberg, 19.</ref> Às vezes, ao ouvir porções da ''Paixão segundo São João'', percebemos uma sensação de [[música antiga]] e alguns estudiosos acreditam que essas porções são as partes sobreviventes da [[Paixão de Weimar]].<ref name="Steinberg, 19"/> Ao contrário da [[Paixão segundo São Mateus]], em que Bach fez poucas e insignificantes alterações, a ''Paixão segundo São João'' foi objeto de várias revisões importantes.<ref>Wolff, 297.</ref> A versão original de [[1724]] é a mais familiar para nós hoje.<ref name="Melamed, 72">Melamed, 72.</ref> Em 1725, Bach substituiu o [[refrão]] de abertura e encerramento e acrescentou três árias ([[BWV]] 245-c), enquanto cortou ''Ach, mein Sinn'' da versão original.<ref name="Wolff, 294"/> O coro de abertura foi substituído por ''O Mensch, bewein dein Sunde'', que depois foi transposto e reutilizado no final de uma das partes da ''Paixão segundo São Mateus.''<ref name="Wolff, 294"/> O coral de encerramento foi substituído por uma parte de ''Du Lamm Christe Gottes'', tirada da cantata'' [[Wahrer Du und Gott Davids Sohn, BWV 23 ]]''.<ref> name="Melamed, 72.<"/ref>
 
Em 1730, Bach revisa mais uma vez a Paixão, restaurando o [[coro]] de abertura original e o [[coral]] final, também removeu três árias.<ref>Melamed, 75.</ref> Ele também extirpou as duas interpolações do [[Evangelho de Mateus]], que apareceu no trabalho, provavelmente devido a acusações por parte das autoridades [[eclesiástica]]s.<ref name="Wolff, 294"/> A primeira delas, ele simplesmente removeu, para substituir a segunda ele compôs uma nova sinfonia.<ref>Steinberg, 25</ref> Ele também inseriu uma ária para substituir o ainda desaparecido ''Ach, mein Sinn''.<ref>Steinberg, 21</ref> Nem a ária, nem a sinfonia foram preservadas. <ref>Bach, 237.</ref> Em geral, Bach optou por manter o texto bíblico, inserindo textos do [[hinário]] [[luterano]] apenas para facilitar o retorno a substância do serviço [[litúrgico]].<ref>Herz, 58</ref>
 
Podemos inferir que Bach tinha em mente uma [[orquestra]] composta de não mais de 15 a 17 músicos.<ref>Bach, vi.</ref> Em 1749, ele voltou ao original de 1724, fazendo apenas pequenas mudanças para a orquestração, nomeadamente substituindo a [[viola d'amore]], então quase obsoleta, pelo [[violino]]. <ref>Wolff, 294</ref><ref>Hochreither, Karl. ''Performance Practice of the Instrumental-Vocal Works of Johann Sebastian Bach'', 11. Maryland, The Scarecrow Press. 2002.</ref>
 
No verão de 1815, as Paixões de Bach começaram a ser estudadas novamente<ref>Herz, 94.</ref>, [[Fred Wolle]], com seu Coral União em 1888 na cidade de [[Bethlehem]], foi o primeiro a realizar a ''Paixão segundo São João'' nas [[América]]s. Isso provocou um revival da [[coral (protestantismo)|música coral]] de Bach no [[Novo Mundo]].<ref>Herz, 199.</ref>
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O texto e a música da Paixão tem sido criticada como [[anti-semita]].<ref name="Steinberg, 23">Steinberg, 23.</ref> Esta acusação está intimamente ligada ao tom do [[Evangelho de João]] em relação ao [[judaísmo]].<ref name="Steinberg, 26">Steinberg, 26.</ref>
 
Tendo chegado aos [[Estados Unidos]] em 1937 como um judeu refugiado da [[Alemanha nazista]], [[Lukas Foss]] alterou o texto de "Juden" para "Leute" (povo) quando dirigiu apresentações do trabalho. Esta tem sido a tendência de inúmeras denominações cristãs desde o século 20XX, bem como, por exemplo, a [[Igreja Episcopal]], quando lê o evangelho durante a [[Quaresma]], no [[serviço]] da [[sexta-feira santa]].<ref name="Steinberg, 23"/> O luterano [[Michael Marissen]] examina a controvérsia em detalhe. Ele conclui que as Paixões de Bach contêm menos declarações depreciativas em relação aos judeus do que muitas outras versões contemporâneas da Paixão. Ele também observa que Bach usou palavras para comentar as árias e hinos que tendem a transferir a culpa pela morte de [[Jesus]] "dos [[judeu]]s" para a congregação dos cristãos.<ref name="Steinberg, 26"/>
 
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