Cícero: diferenças entre revisões

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[[Ficheiro:Svedomsky-Fulvia.jpg|thumb|upright=1.4|[[Fúlvia]], a esposa de [[Marco Antônio]], com a cabeçaCHEIA DE COCO de Cícero, o grande inimigo de seu marido.<br><small>Séc. XIX, por [[Pavel Svedomsky]] (1849-1904).</small>]]
{{ver desambiguação}}
{{Dividir em colunas|2}}
{{Info/Nobre
|nome = Marco Túlio Cícero
|titulo =[[Cônsul da República Romana]]
|imagem =Gipsmodelle Wiener Historismus Hofburg-Keller 2015 Cicero Karl Sterrer.jpg
|imgw =300px
|legenda =Escultura de Cícero por Karl Sterrer Parlamento Austríaco
|sucessão =
|reinado =63 a.C.
|tipo-reinado =Consulado
|data de nascimento ={{dni|3|1|106 a.C.|si}}
|local de nascimento =[[Arpino]]
|data da morte ={{morte|7|12|-43|3|1|-106}}
|local da morte =Fórmia
}}
'''Marco Túlio Cícero''' (106&ndash;43 a.C.; {{langx|la|''Marcus Tullius Cicero''}}, {{langx|grc|Κικέρων||Kikerōn}}) foi um político da [[gente (Roma Antiga)|gente]] [[Túlios|Túlia]] da [[República Romana]] eleito [[cônsul romano|cônsul]] em 63 a.C. com [[Caio Antônio Híbrida]]. Era filho de [[Marco Túlio Cícero, o Velho|Cícero, o Velho]], com Élvia e pai de [[Cícero, o Jovem]], cônsul em 30 a.C., e de [[Túlia Cícera|Túlia]]. Cícero nasceu numa rica família municipal de Roma de [[ordem equestre]] e foi um dos maiores [[oratória|oradores]] e [[literatura romana|escritores em prosa]] da Roma Antiga<ref>[[Elizabeth Rawson|Rawson, E.]]: ''Cicero, a portrait'' (1975) p.303</ref><ref>Haskell, H.J.: ''This was Cicero'' (1964)p.300–301</ref>.
 
Sua influência na [[latim|língua latina]] foi tão imensa que acredita-se que toda a história subsequente da prosa, não apenas no Latim, como nas línguas europeias, no século XIX seja ou uma reação contra seu estilo ou uma tentativa de retornar a ele<ref name="Inc1995">{{cite book|author=Merriam-Webster, Inc|title=Merriam-Webster's Encyclopedia Of Literature|url=https://books.google.com/books?id=eKNK1YwHcQ4C&pg=PA244|accessdate=|date=janeiro de 1995|publisher=Merriam-Webster|isbn=978-0-87779-042-6|page=244|chapter=Ciceronian period}}</ref>. Segundo [[Michael Grant (autor)|Michael Grant]], ''"a influência de Cícero sobre a história da literatura e das ideias europeias em muito excede a de qualquer outro escritor em [[prosa]] de qualquer língua"''<ref>Cicero, ''Selected Works'', 1971, pp.24</ref>. Cícero introduziu os romanos às principais escolas da [[filosofia grega]] e criou um [[vocabulário]] filosófico latino (inclusive com [[neologismo]]s como ''"evidentia"''<ref>''Q. Acad.'' 2.17–18</ref>,''"[[humanitas]]"'', ''"qualitas"'', ''"quantitas"'' e ''"essentia"'')<ref>Conte, G.B.: "Latin Literature: a history" (1987) p.199</ref>, destacando-se como [[tradutor]] e filósofo.
 
A redescoberta das cartas de Cícero por [[Petrarca]] é geralmente considerada como um dos eventos iniciais do [[Renascimento]], no século XIV, nos [[Res publica|assuntos públicos]], [[humanismo renascentista|humanismo]] e na cultura romana clássica<ref name="Wootton1996">{{cite book |last=Wootton |first=David |title=Modern Political Thought: Readings from Machiavelli to Nietzsche|url=https://books.google.com/books?id=78eaIfCg2mcC|accessdate=|date=1 de janeiro de 1996|publisher=Hackett Publishing|isbn=978-0-87220-341-9|page=1}}</ref>. Segundo o historiador polonês [[Tadeusz Stefan Zieliński|Tadeusz Zieliński]], ''"o Renascimento era, acima de tudo, um reavivamento de Cícero e, apenas depois dele e através dele, do resto da [[antiguidade clássica]]"''<ref>{{cite book |last=Zieliński |first=Tadeusz |title=Cicero Im Wandel Der Jahrhunderte |publisher=Nabu Press}}</ref>. O pico da autoridade e prestígio de Cícero se deu durante o [[Iluminismo]] no século XVIII<ref>{{cite book|first=Neal|last=Wood |title=Cicero's Social and Political Thought |publisher=University of California Press|year=1991|isbn=978-0-520-07427-9}}</ref> e seu impacto sobre os principais pensadores iluministas, como [[John Locke]], [[David Hume]] e [[Montesquieu]], foi substancial<ref>{{cite web|first=Walter|last=Nicgorski |title=Cicero and the Natural Law |publisher=Natural Law, Natural Rights, and American Constitutionalism|url=http://www.nlnrac.org/classical/cicero}}</ref>. Suas obras estão entre as mais influentes da cultura europeia e ainda hoje constituem um dos mais importantes ''[[corpus literário|corpus]]'' de material primário para obras e revisões sobre a [[história da Roma Antiga]], especialmente sobre os últimos dias da [[República Romana]]<ref>{{cite book |first=Miriam |last=Griffin|first2=John |last2=Boardman |first3=Jasper |last3=Griffin |first4=Oswyn |last4=Murray |title=The Oxford Illustrated History of the Roman World|url=https://books.google.com/books?id=w95Nb-BJWRcC&pg=PA76|accessdate=|date=15 de janeiro de 2001|publisher=Oxford University Press|isbn=978-0-19-285436-0|pages=76-}}</ref>.
 
Embora tenha sido um dotado orador e um advogado de sucesso, Cícero acreditava que sua carreira política era sua conquista mais importante. Foi durante seu consulado que a [[Segunda Conspiração de Catilina]] tentou derrubar o governo romano através de um ataque estrangeiro por forças estrangeira e Cícero suprimiu a revolta executando cinco dos conspiradores sem o [[devido processo legal]]. Durante a caótica segunda metade do século I a.C., marcada pelas [[guerras civis romanas|sucessivas guerras civis]] e pela [[ditador romano|ditadura]] de [[Júlio César]], Cícero liderou a campanha pelo retorno do governo republicano. Logo depois da morte de César, Cícero se destacou como inimigo de [[Marco Antônio]] nas lutas pelo poder que se seguiram, atacando-o numa [[Filípicas (Cícero)|série de discursos]]. Acabou [[proscrição|proscrito]] como [[inimigo do estado]] pelo [[Segundo Triunvirato]] e consequentemente executado por soldados por sua ordem em 43 a.C., depois de ser interceptado numa tentativa de fugir da [[península Itálica]]. Suas mãos e sua cabeça foram, como vingança final de Antônio, exibidas no [[Fórum Romano]].
 
== Vida pessoal ==
 
=== Primeiros anos ===
[[ficheiro:Vincenzo foppa, giovane che legge cicerone, dal banco mediceo di milano 03.JPG|thumb|esquerda|upright=1.3|"Jovem Cícero Lendo".<br>[[Afresco]] de 1464. Por [[Vincenzo Foppa]], atualmente na ''[[Wallace Collection]]'', em [[Londres]].]]
Cícero nasceu em 106 a.C., em [[Arpino]], uma cidade montanhosa a 100 quilômetros para o sudeste de Roma. Seu pai era um rico membro da [[ordem equestre]] e possuía boas relações em Roma. Porém, sendo semi-inválido, não pôde entrar na [[cursus honorum|vida pública]], mas estudou extensivamente para compensar. Embora pouco se sabia sobre Élvia, a mãe de Cícero, era comum que as esposas de importantes [[cidadão romano|cidadãos romanos]] fossem responsáveis pela administração da casa. O irmão de Cícero, [[Quinto Túlio Cícero|Quinto]], escreveu em uma carta que ela era uma dona de casa muito parcimoniosa<ref>Rawson, E.: ''Cicero, a portrait'' (1975) p.5–6; [[Cícero]], ''Ad Familiares'' [http://www.perseus.tufts.edu/cgi-bin/ptext?lookup=Cic.+Fam.+16.26.2 16.26.2] (de Quinto a Cícero)</ref>.
 
O cognome de Cícero, seu sobrenome pessoal, vem da palavra [[latim|latina]] para [[grão-de-bico]], ''"cicer"''. [[Plutarco]] explica que o nome foi originalmente dado a um dos ancestrais de Cícero que tinha uma fenda na ponta de seu nariz parecido com um grão-de-bico. Porém, é mais provável que os ancestrais de Cícero tenham prosperado pelo cultivo e venda de grãos-de-bico<ref>Trollope, Anthony. ''[http://www.gutenberg.org/files/8945/8945-h/8945-h.htm The Life of Cicero]'' Volume 1. p. 42</ref>. Os romanos geralmente escolhiam cognomes pessoais muito práticos: os famosos nomes dos [[Fábios]], [[Lêntulos]] e [[Pisões]] também eram originários dos nomes latinos para feijões, lentilhas e ervilhas. Plutarco escreve que Cícero foi orientado a mudar seu nome quando entrou na política, mas recusou, afirmando que ele iria torná-lo mais glorioso do que [[Marco Emílio Escauro|Escauro]] ("de tornozelo inchado") e [[Cátulo]] ("filhote")<ref>[[Plutarco]], ''[[Vidas Paralelas (Plutarco)|Vidas Paralelas]]'', ''Cícero'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Plutarch/Lives/Cicero*.html#1.3 1.3–5]</ref>.
 
Neste período da história romana, ser considerado "culto" significava ser capaz de falar tanto o latim quanto [[grego antigo|grego]]. Cícero foi, portanto, educado nos ensinamentos dos antigos [[filosofia grega|filósofos]], [[poesia na Grécia Antiga|poetas]] e [[história da Grécia Antiga|historiadores gregos]]. Cícero obteve muito de sua compreensão sobre a teoria e prática da [[retórica]] do poeta grego [[Aulo Licínio Árquias|Árquias]]<ref>[[Anthony Everitt|Everitt, A.]]:"Cicero: The Life and Times of Rome's Greatest Politician" (2001) p.34</ref> e utilizou este conhecimento para traduzir muitos dos conceitos da filosofia grega para o latim, tornando-as disponíveis para uma audiência muito maior. Foi precisamente esta educação ampla que abriu-lhe as portas da tradicional elite romana<ref>Everitt, A.:"Cicero: The Life and Times of Rome's Greatest Politician" (2001) p.35</ref>.
 
Segundo [[Plutarco]], Cícero era um estudante extremamente talentoso, cuja erudição atraía a atenção de todos em Roma<ref>[[Plutarco]], ''[[Vidas Paralelas (Plutarco)|Vidas Paralelas]]'', ''Cícero'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Plutarch/Lives/Cicero*.html#2.2 2.2]</ref>, o que permitiu que ele estudasse o [[direito romano]] sob [[Quinto Múcio Cévola Áugure]], um dos maiores juristas da época<ref>[[Plutarco]], ''[[Vidas Paralelas (Plutarco)|Vidas Paralelas]]'', ''Cícero'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Plutarch/Lives/Cicero*.html#3.2 3.2]</ref>. Os colegas de estudo de Cícero foram [[Caio Mário, o Jovem]], [[Sérvio Sulpício Rufo]] (que também se tornou um advogado famoso e um dos poucos que o próprio Cícero considerava superior a si mesmo em assuntos legais) e [[Tito Pompônio Ático|Tito Pompônio]]. Estes dois últimos e Cícero tornaram-se amigos pela vida toda e Tito Pompônio &mdash que depois receberia o cognome "Ático", cuja irmã casou-se com Quinto, o irmão de Cícero &mdash; tornar-se-ia, nas palavras do próprio Cícero, ''"como um segundo irmão"'' com quem manteve uma correspondência até o final da vida<ref>Everitt, A.:"Cicero: The Life and Times of Rome's Greatest Politician" (2001) p. 35</ref>.
 
Cícero desejava perseguir uma carreira na política seguindo os passos do ''[[cursus honorum]]''. Em 90-88 a.C., Cícero serviu tanto [[Pompeu Estrabão]] quanto [[Sula]] em suas campanhas na [[Guerra Social (91-88 a.C.)|Guerra Social]], embora ele não tivesse nenhum pendor pela vida militar por ser um intelectual em primeiro lugar. Cícero começou sua carreira como advogado por volta de 83-81 a.C.. Seu primeiro grande caso, do qual um registro literário ainda existe, foi sua defesa, em 80 a.C., de [[Sexto Róscio]] numa acusação de [[patricídio]]<ref>Rawson, E.: "Cicero, a portrait" (1975) p.22</ref>. Aceitar este caso foi um movimento corajoso para Cícero, pois o patricídio era considerado um crime hediondo e as pessoas a quem Cícero estava acusando de homicídio, o mais famoso deles [[Lúcio Cornélio Crisógono]], eram favoritos de Sula. Nesta época, teria sido muito fácil para Sula mandar assassinar o desconhecido Cícero, cuja defesa foi um desafio indireto ao [[ditador romano|ditador]]. Por conta de sua poderosa defesa, Róscio foi inocentado<ref>Everitt, A.:"Cicero: The Life and Times of Rome's Greatest Politician" (2001) p. 61</ref>.
[[Ficheiro:Ciceron Vaux.jpg|thumb|direita|uprtight=1|Cícero.<br><small>Busto em mármore do séc. XVII. Preservado no ''Château de Vaux-le-Vicomte'', [[França]].</small>]]
O caso de Cícero foi dividido em três partes. A primeira parte detalhou exatamente a acusação feita por Erício. Cícero explicou como um rústico filho de um fazendeiro, que vive das benesses de suas próprias terras, não teria nada a ganhar cometendo patricídio, pois ele certamente herdaria as terras depois da morte de seu pai. A segunda parte fez referência à empáfia e à ganância de dois dos acusadores, Magno e Capito. Cícero contou ao [[júri]] que eles seriam os prováveis assassinos por serem ambos gananciosos, tanto por conspirarem juntos contra um concidadão, e Magno, por sua empáfia e por não ter vergonha de aparecer na corte para realizar falsas acusações. A terceira parte explicou que Crisógono tinha imenso poder política e a acusação só teve sucesso por causa deste poder. Mesmo que Crisógono não tenha sido quem Cícero afirmou que ele era, Cícero, por meio de sua poderosa [[retórica]], Cícero, com sucesso, fez com que ele parecesse ser um [[liberto (Roma Antiga)|liberto]] estrangeiro malicioso o suficiente para aproveitar-se do resultado da guerra civil para prosperar. Cícero concluiu que isto revelava que tipo de pessoa ele era e que algo como um assassinato não era impossível para Crisógono<ref>{{cite book|last=Vasaly|first=Ann|title=Representation: Images of the World in a Ciceronian Territory|publisher=University of California Press|location=Berkeley|isbn=0520077555|pages=158–168|url=}}</ref>.
 
Em 79 a.C., Cícero partiu para a [[Grécia (província romana)|Grécia]], [[Ásia (província romana)|Ásia]] e [[Rodes]], provavelmente para evitar possível vingança de Sula<ref>Haskell, H.J.: "This was Cicero" (1940) p.83</ref>. Traçando um caminho intermediário entre os estilos [[aticismo|ático]] e [[estilo asiático|asiático]], que competiam entre, Cícero finalmente seria considerado segundo apenas a [[Demóstenes]] entre os oradores históricos<ref>Gesine Manuwald, Cicero: Philippics 3–9, vol. 2, Berlin: Walter de Gruyter, 2007, pp. 129f</ref>.
 
O interesse de Cícero em filosofia apareceu fortemente em sua carreira final e levou-o a criar um relato bastante completo da filosofia grega para uma audiência romana<ref>[[Cícero]], ''De Officiis'' 1.1</ref>, incluindo a criação de um vocabulário filosófico em [[latim]]<ref>Everitt, A.:"Cicero: The Life and Times of Rome's Greatest Politician" (2001) pgs. 253–255</ref>. Em 87 a.C., [[Filon de Larissa]], o diretor da [[Academia de Platão|Academia]] fundada por [[Platão]] em [[Atenas]] cerca de 300 anos antes, chegou em Roma. Cícero, ''"inspirado por um zelo extraordinário zelo pela filosofia"''<ref>Rawson:"Cicero, a portrait" (1975) p.18</ref>, sentou-se de forma entusiástica aos seus pés e aprendeu o que pôde da [[platonismo|filosofia platônica]]. Depois, afirmaria, sobre os "[[Diálogos (Platão)|Diálogos]]", de Platão, que se [[Zeus]] fosse falar, esta seria a sua linguagem<ref>{{cite web|title=Elpenor|url=http://www.ellopos.net/elpenor/greek-texts/ancient-greece/plato-homepage.asp}}</ref>.
 
===Família ===
Cícero casou-se com [[Terência]], provavelmente aos 27 anos de idade, em 79 a.C.. Segundo as tradições morais da classe superior romana da época, este foi um casamento de conveniência, mas perdurou, de forma harmoniosa, por cerca de30 anos. A família dela era rica, provavelmente a casa nobre [[plebe romana|plebeia]] dos [[Terêncios|Terêncios Varrões]], o que se encaixava bem com as ambições políticas de Cícero, tanto em termos econômicos quanto sociais. Ela tinha uma meia irmã chamada Fábia, que ainda criança, tornou-se uma [[virgem vestal]], uma honra muito grande. Terência era uma mulher de vontade forte e, segundo Plutarco, ''"ela demonstrou mais interesse na carreira política do marido do que ela permitiu que ele interferisse nos assuntos domésticos"''<ref>Rawson, E.: "Cicero, a portrait" (1975) p.25</ref>.
 
Na década de 50 a.C., as cartas de Cícero a Terência tornaram-se mais curtas e mais frias. Ele reclamava aos amigos que ela o teria traído, mas não especificou em que sentido. Provavelmente, o casamento simplesmente não pôde resistir à tensão das revoltas políticas em Roma, o envolvimento de Cícero nelas e várias outras disputas entre os dois. O [[divórcio]] parece ter ocorrido em 51 a.C. ou pouco antes<ref>Susan Treggiari, ''Terentia, Tullia and Publilia: the women of Cicero's family'', London: Routledge, 2007, pp. 76f.</ref>. Em 46 ou 45 a.C.<ref>Susan Treggiari, ''Terentia, Tullia and Publilia: the women of Cicero's family'', London: Routledge, 2007, pp. 133</ref>. Cícero casou-se então com uma jovem, Publília, que havia sido sua pupila. Acredita-se que Cícero precisava do dinheiro dela, especialmente por ter que devolver o [[dote]] de Terência<ref name="Rawson_1975_225">Rawson, E.: ''Cicero'' p.225</ref>. Este casamento não durou muito.
 
Embora o casamento com Terência tenha sido de conveniência, acredita-se amplamente que Cícero gostava especialmente da filha deles, [[Túlia Cícera]]<ref>Haskell H.J.: ''This was Cicero'', p.95</ref>. Quando ela ficou doente, em fevereiro de 45 a.C., e morreu depois de ter aparentemente se recuperado do parto de seu filho em janeiro, Cícero ficou arrasado. ''"Perdi a única coisa que me prendia à vida"'', ele escreveu a Ático<ref name="Haskell_1964_249">Haskell, H.J.:"This was Cicero" (1964) p.249</ref>. Ático pediu-lhe que Cícero fosse visitá-lo durante as primeiras semanas de seu luto para que recebesse conforto no pior momento de sua dor. Na gigantesca biblioteca de Ático, Cícero leu tudo que os filósofos gregos haviam escrito sobre a superação do luto, ''"mas minha tristeza supera qualquer consolo"''<ref>[[Cícero]], ''Cartas a Ático'', 12.14.</ref><ref>Rawson, E.: ''Cicero'' p. 225</ref>. César, [[Marco Júnio Bruto|Bruto]] e [[Sérvio Sulpício Rufo|Rufo]] enviaram-lhe cartas de condolências<ref>Rawson, E.:''Cicero'' p.226</ref>.
 
Cícero esperava que seu filho se tornasse um filósofo como ele, mas [[Cícero, o Jovem]], preferia a carreira militar. Ele juntou-se ao exército de [[Pompeu]] em 49 a.C. e, depois da derrota dos republicanos na [[Batalha de Farsalos]], em 48 a.C., César o perdoou. Cícero o enviou a Atenas para estudar como discípulo do filósofo [[escola peripatética|peripatético]] [[Crátipo de Pérgamo]] em 48 a.C., mas ele próprio se aproveitou do fato de estar distante dos ''"olhos vigilantes de seu pai"'' para ''"comer, beber e ser feliz"''<ref>{{Cite book|last=Haskell|first=H.J|title=This was Cicero|year=1964|pages=103–104}}</ref>. Depois do assassinato de Cícero, seu filho se juntou ao exército dos ''[[liberatores]]'', mas foi, mais uma vez, perdoado, desta vez por [[Otaviano]] (o futuro imperador Augusto). O [[:wikt:remorso|remorso]] de Otaviano por não ter se oposto à colocação de Cícero na lista de [[proscrição|proscritos]] durante o [[Segundo Triunvirato]] levou-o a ajudar consideravelmente a carreira do filho dele. Cícero, o Jovem, tornou-se [[áugure romano|áugure]] e foi nomeado cônsul em 30 a.C. junto com o próprio Otaviano. Na função, o destino quis que ele fosse o responsável por revogar todas as honras dedicadas a [[Marco Antônio]], o principal artífice da proscrição de seu pai. Posteriormente, ele atuou como [[procônsul]] da [[Síria (província romana)|Síria]] e da [[Ásia (província romana)|Ásia]]<ref>Paavo Castren & L. Pietilä-Castren: ''Antiikin käsikirja/Encyclopedia of the Ancient World''</ref>.
 
== Carreira pública ==
=== Primeiros anos ===
[[Ficheiro:Cicero - Musei Capitolini.JPG|thumb|esquerda|upright=.9|Busto de Cícero nos [[Museus Capitolinos]], em [[Roma]].]]
Seu primeiro cargo na [[magistratura romana]] foi o de um dos vinte [[questor]]es anuais, um posto de "treinamento" considerado pré-requisito para o avanço para uma posição mais séria na administração pública numa diversidade de áreas, mas com uma tradicional ênfase na administração e na contabilização rigorosa das verbas públicas sob o acompanhamento de um magistrado mais sênior ou governador provincial. Cícero serviu na [[Sicília (província romana)|Sicília]], em 75 a.C., e demonstrou honestidade e integridade na lida com os seus habitantes. Como resultado, os agradecidos sicilianos pediram que Cícero processasse [[Caio Verres]], um governador da Sicília, que havia saqueado duramente a província. O processo resultante foi um grande sucesso<ref>{{cite book|title=The Oxford illustrated history of the Roman world|url=https://books.google.com/books?id=w95Nb-BJWRcC&lpg=PP1&dq=The%20Oxford%20illustrated%20history%20of%20the%20Roman%20world&pg=PA84#v=onepage&q=extortionate&f=false|accessdate=|pages=84–}}</ref> para Cícero. Caio Verres contratou o proeminente advogado de uma família nobre, [[Quinto Hortênsio Hórtalo]]. Depois de um longo período na Sicília coletando testemunhos e evidências e persuadindo testemunhas a se apresentarem, Cícero retornou a Roma e venceu o caso numa série de dramáticas batalhas na corte. Seu estilo único de [[oratória]] o destacou perante o extravagante Hortênsio. Depois da conclusão deste caso, Cícero passou a ser considerado o maior orador de Roma. O ponto de vista de que Cícero pode ter aceitado este caso por razões pessoais é possível. Hortênsio já era, nesta época, conhecido como o melhor advogado de Roma e derrotá-lo garantiria o sucesso e o prestígio que Cícero precisava para avançar sua carreira. A habilidade oratória de Cícero aparece de forma clara no assassinato da reputação de Verres e em várias outras técnicas de persuasão utilizadas sobre o júri. Um exemplo pode ser encontrado no discurso ''"[[In Verrem]]"'', no qual ele diz ''"...com os senhores neste banco, senhores, com [[Mânio Acílio Glabrião (cônsul em 67 a.C.)|Mânio Acílio Glabrião]] como vosso presidente, não compreendo o que Verres espera conseguir"''<ref>Trad. para o inglês, Grant, Michael. Cicero: Selected Works. London: Penguin Books. 1960.</ref>. A oratória era considerada a grande arte na [[Roma Antiga]] e uma importante ferramenta para a disseminação do conhecimento e a promoção pessoal nas eleições, em parte por não existirem jornais ou mídia de massa regulares. Cícero não era nem [[patrício romano|patrício]] e nem [[plebe romana|plebeu]] e sua ascensão política, apesar de sua origem relativamente humilde, tem sido tradicionalmente atribuído ao seu brilhantismo como orador<ref>[http://www.bartleby.com/268/2/11.html III. The First Oration Against Catiline by Cicero. Rome (218 B.C.-84 A.D.). Vol. II. Bryan, William Jennings, ed. 1906. The World's Famous Orations<!-- Bot generated title -->]</ref>.
 
Cícero cresceu numa época de revoltas civis e guerra. A vitória de [[Sula]] na primeira de uma série de [[guerras civis romanas|guerras civis]] levaram a uma nova moldura constitucional que minou a ''"[[Libertas (direito romano)|Libertas]]"'' ("liberdade"), o valor fundamental da República Romana. Ainda assim, as reformas de Sula reforçaram a posição da [[ordem equestre]], contribuindo para o aumento do poder desta classe. Cícero era tanto um equestre italiano quanto um [[homem novo]], mas, mais importante, era um [[Constituição da República Romana|constitucionalista romano]]. Sua classe social e sua lealdade à República asseguraram que ele iria ''"conseguir o apoio e a confiança do povo e também das classes médias italianas"''. A facção dos ''[[optimates]]'' nunca aceitaram plenamente Cícero, o que minou seus esforços para reformar a República tentando manter a constituição. Apesar disto, Cícero conseguiu avançar no ''cursus honorum'', assumindo cada uma das magistraturas na ou perto da idade mínima possível: questor em 75 a.C. (31 anos), [[edil]] em 69 a.C. (37 anos) e [[pretor]] em 66 a.C. (40 anos), servindo como presidente da corte de "reclamações". Finalmente, Cícero foi eleito cônsul em 63 a.C., aos 43 anos de idade.
 
=== Cônsul ===
{{AP|Segunda Conspiração de Catilina}}
[[Ficheiro:Maccari-Cicero.jpg|thumb|direita|upright=1.4|"Cícero denuncia [[Catilina]]". Quando foi cônsul, Cícero foi responsável por desmantelar a [[Segunda Conspiração de Catilina]], executando sumariamente seus líderes, uma decisão que resultaria em seu exílio anos depois.<br><small>1889. [[Afresco]] de [[Cesare Maccari]] no [[Palazzo Madama (Roma)|Palazzo Madama]], em [[Roma]].</small>]]
Cícero foi eleito cônsul para o ano de 63 a.C. com [[Caio Antônio Híbrida]], que teve um papel secundário. Durante seu mandato, Cícero desmantelou uma conspiração cujo objetivo era assassiná-lo e derrubar a República Romana com a ajuda de forças armadas estrangeiras, liderada por [[Lúcio Sérgio Catilina]]. Cícero obteve um ''[[senatus consultum ultimum]]'' e expulsou Catilina da cidade depois de quatro veementes discursos, conhecidos como [[Catilinárias]], que, até hoje, são considerados como exemplos máximos de seu estilo retórico. As Catilinárias listaram as chicanas de Catilina e de seus seguidores e denunciaram seus senadores simpatizantes como devedores maliciosos e teimosos que dependiam de Catilina como uma esperança final desesperada. Cícero exigiu que todos deixassem a cidade. No final de seu primeiro discurso, Catilina rapidamente deixou o Senado (que, na época, se reunia no [[Templo de Júpiter Estator (século VIII a.C.)|Templo de Júpiter Estator]]. Em seus discursos seguintes, Cícero não endereçou diretamente Catilina. Cícero então proferiu o segundo e o terceiro discursos perante o [[SPQR|povo e o Senado]] e o último, novamente, perante o Senado. Com as "Catilinárias", Cícero queria preparar o Senado para o pior caso possível e apresentou, adicionalmente, mais evidências contra Catilina<ref>Cicero, Marcus Tullius, Selected Works, Penguin Books Ltd, Great Britain, 1971</ref>.
 
Catilina fugiu e deixou para trás seus seguidores, cujo objetivo era provocar a revolta em Roma, enquanto ele tentava atacar a cidade com um exército de ''"falidos morais e fanáticos honestos"''. Catilina tentou envolver os [[alóbroges]], uma tribo da [[Gália Transalpina]], no complô, mas Cícero, trabalhando com os [[gauleses]], conseguiu interceptar cartas que incriminavam os cinco conspiradores e os obrigaram a confessar seus crimes perante o Senado<ref>[[Cícero]], ''In Catilinam'' [http://www.perseus.tufts.edu/cgi-bin//ptext?lookup=Cic.+Catil.+3.4 3.2]; [[Salústio]], ''Bellum Catilinae'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Sallust/Bellum_Catilinae*.html#40 40–45]; [[Plutarco]], ''[[Vidas Paralelas (Plutarco)|Vidas Paralelas]]'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Plutarch/Lives/Cicero*.html#18.4 18.4].</ref>.
 
O Senado então decidiu sobre a punição dos conspiradores. Como era o principal corpo de apoio das várias assembleias legislativas e não um corpo jurídico, havia limites para o seu poder; porém, o ''senatus consultum ultimum'' ainda estava vigendo e, temia-se, que a simples [[prisão domiciliar]] ou o [[exílio]] &mdash; as opções padrão &mdash; não seriam suficientes. A princípio, [[Décimo Júnio Silano|Décimo Silano]] pediu a ''"penalidade extrema"''; muitos foram convencidos por Júlio César, que descartou o precedente que seria criado e defendeu a pena de [[prisão perpétua]] em variadas cidades italianas. [[Catão, o Jovem]], então se insurgiu a favor da [[pena de morte]] e todos no Senado finalmente concordaram com ele. Cícero levou os conspiradores até o [[Tuliano]], a notória prisão romana, onde foram todos estrangulados. O próprio Cìcero acompanhou o antigo cônsul [[Públio Cornélio Lêntulo Sura]], um dos conspiradores, até lá. Cícero recebeu o honorífico de ''"[[Pater Patriae]]''" pelos seus esforços para suprimir a conspiração, mas viveu o resto da vida com medo de um processo ou do exílio por ter condenado [[cidadãos romanos]] sem consentimento prévio de um tribunal responsável.
 
Depois que os conspiradores foram executados, Cícero estava orgulhoso de suas realizações. Alguns inimigos políticos argumentaram que o ato, pela voz de Cícero, ganhou popularidade, exagerando seu próprio sucesso. Ele cometeria o mesmo erro novamente anos depois, quando voltou a Roma depois de seu exílio. Neste período, Cícero alegou a a República seria restaurada com ele<ref>{{cite web|last=Clayton|first=Edward|title=Cicero (106—43 BCE)|url=http://www.iep.utm.edu/cicero/#H2|publisher=Internet Encyclopedia of Philosophy|accessdate=}}</ref>.
 
=== Exílio e retorno ===
Em 60 a.C., [[Júlio César]], convidou Cícero para ser o quarto membro de sua parceria com [[Pompeu]] e [[Crasso]], uma aliança que seria finalmente chamada de [[Primeiro Triunvirato]]. Cícero recusou o convite pois suspeitava que o objetivo dos três era minar as instituições republicanas<ref>Rawson, E.: ''Cicero'', 1984 106</ref>.
[[Ficheiro:Franciabigio - The Triumph of Cicero - WGA08193.jpg|thumb|direita|upright=1.4|"Retorno de Cícero do Exílio". Processado por [[Públio Clódio Pulcro]], Cícero foi forçado a se exilar. Quando retornou, logo depois do assassinato de Clódio, foi aclamado pela plebe, que o idolatrava.<br><small>{{ca.}} 1520. [[Afresco]] de [[Franciabigio]] na ''[[Villa Medicea di Poggio a Caiano]]''.</small>]]
Dois anos mais tarde, o [[tribuno da plebe]] [[Públio Clódio Pulcro]] introduziu leis (''"[[Leges Clodiae]]"'') ameaçando com o exílio qualquer um que tenha executado um cidadão romano sem o devido processo legal. Cícero, tendo executado os membros da [[Segunda Conspiração de Catilina]] quatro anos antes sem julgamento, e tendo discutido publicamente com Clódio, era claramente o alvo da lei. Cícero argumentou que o ''[[senatus consultum ultimum]]'' o isentava de qualquer culpa ou punição e Cícero tentou angariar o apoio dos senadores e cônsules, especialmente de Pompeu. Quando percebeu que não conseguiria, ele próprio seguiu para o exílio. Chegando em [[Tessalônica]] em 23 de maior de 58 a.C.<ref>Haskell, H.J.: ''This was Cicero'', 1964 200</ref><ref>Haskell, H.J.: ''This was Cicero'', 1964 p.201</ref><ref>[[Plutarco]], ''[[Vidas Paralelas (Plutarco)|Vidas Paralelas]]'', ''Cícero'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Plutarch/Lives/Cicero*.html#32 32].</ref>. Este exílio fez com que Cícero caísse numa profunda [[depressão nervosa|depressão]], como se percebe em sua correspondência com [[Tito Pompônio Ático|Ático]]: ''"Seus pedidos evitaram que eu cometesse o [[suicídio]]. Mas o que restou pelo qual viver? Não me culpe por reclamar. Minhas aflições superam quaisquer outras que já ouvi antes"''<ref>Haskell, H.J.: "This was Cicero" (1964) p.201</ref>. Depois da intervenção dos recém-eleitos [[tribuno da plebe|tribunos]] [[Tito Ânio Milão]], o Senado votou a favor de reconvocar Cícero do exílio. Clódio lançou o único voto contra o decreto. Cícero retornou para a Itália em 5 de agosto de 57 a.C., desembarcando em [[Brundísio]], onde foi recepcionado por uma multidão entusiasmada e, para seu imenso agrado, por sua querida filha, [[Túlia Cícera|Túlia]]<ref>Haskell. H.J.: ''This was Cicero'', p.204</ref>.
 
Cícero tentou re-entrar na política, mas seu ataque a uma lei de César fracassou. A [[Conferência de Lucca]], em 56 a.C., forçou Cícero a [[:wikt:abjurar|abjurar]] sua posição e a apoiar o Triunvirato. Depois disto, Cícero, acovardado, concentrou-se em suas obras literárias. É incerto se ele chegou a se envolver diretamente na política nos anos seguintes<ref>Grant, M: "Cicero: Selected Works", p67</ref>. Relutantemente, aceitou o [[governador romano|governo]] [[procônsul|proconsular]] da [[Cilícia (província romana)|Cilícia]] em 51 a.C., principalmente pela falta de outros candidatos elegíveis por conta de um novo requisito legislativo imposto por Pompeu em 52 a.C., que especificava um intervalo de cinco anos entre um consulado ou pretorado e um [[província romana|comando provincial]]<ref>Everitt, A. "Cicero: The Life and Times of Rome's Greatest Politician" (2001), pgs. 186–188</ref>. Cícero então serviu como procônsul da Cilícia entre maio de 51 até novembro de 50 a.C.. Acompanhado por seu irmão, [[Quinto Túlio Cícero|Quinto]], atuando como seu [[legado]], Cícero foi poupado de ações militares por conta de conflitos internos entre os [[partas]], mas, ainda assim, foi aclamado ''[[imperator]]'' por suas tropas por tomar uma fortaleza nas montanhas e derrotar os últimos cilícios independentes.
 
=== Guerra civil de Júlio César ===
{{AP|Guerra Civil de César}}
O conflito entre [[Pompeu]] e Júlio César se intensificou em 50 a.C.. Cícero favoreceu Pompeu, pois via-o como um defensor do [[Senado Romano]] e da tradição republicana, mas, na época, já evitava confrontar publicamente César. Quando ele invadiu a Itália, em 49 a.C., Cícero, assim como muitos outros senadores romanos, deixou a capital. Cécsar, tentando conseguir alguma legitimidade pelo endosso de um senador sênior, tentou agraciar Cícero, mas, ainda assim, ele conseguiu chegar em [[Dirráquio]], na [[Ilíria (região)|Ilíria]], onde estava o grupo de Pompeu<ref>Everitt, Anthony: ''Cicero'' pp. 215.</ref>. Cícero viajou com as forças [[pompeianos|pompeianas]] até [[Farsalos]], em 48 a.C.<ref>[[Plutarco]], ''[[Vidas Paralelas (Plutarco)|Vidas Paralelas]]'', ''Cícero'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Plutarch/Lives/Cicero*.html#38 38.1]</ref>, mesmo tendo rapidamente perdido a fé na competência e na justiça da causa dos pompeianos. Finalmente, Cícero conseguiu irritar seu colega [[Catão, o Jovem]], que afirmou-lhe que ele teria sido mais útil à causa dos ''[[optimates]]'' se tivesse ficado em Roma. Depois da vitória de César na [[Batalha de Farsalos]], Cícero voltou para Roma muito cautelosamente. César perdoou-o e Cícero tentou ajustar-se à situação e manter seu trabalho político, esperando que César revivesse a República e suas instituições.
 
Numa carta a [[Marco Terêncio Varrão|Varrão]] por volta de 20 de abril de 46 a.C., Cícero revelou sua estratégia sob a ditadura de César. Cícero, porém, foi completamente surpreendido quando os ''[[liberatores]]'' assassinaram César nos [[idos de março]] de 44 a.C.. Ele não fazia parte da conspiração, mas os conspiradores estavam seguros de seu apoio ou simpatia. [[Marco Júnio Bruto]] chamou seu nome, pedindo-lhe que restaurasse a República quando retirasse a adaga ensanguentada depois do assassinato<ref>[[Cícero]], ''[[Filípicas (Cícero)|Filípicas II]]''</ref>. Uma carta escrita por Cícero em fevereiro de 43 a.C. a [[Trebônio]], um dos conspiradores, começava assim: ''"Como eu desejava que tivesses me convidado para aquele gloriosíssimo banquete nos idos de março!"''<ref>[[Cícero]], ''Ad Familiares'' [http://www.thelatinlibrary.com/cicero/fam10.shtml#28 10.28]</ref>. Cícero tornou-se um líder popular no período de instabilidade que se seguiu ao assassinato. Ele não tinha respeito algum por [[Marco Antônio]], que estava conspirando para se vingar dos assassinos de César. Em troca de [[anistia]] para eles, Antônio conseguiu que o Senado concordasse em não declarar César um tirano, o que permitiu que os [[cesarianos]] tivessem suporte legal e mantivessem as reformas e políticas de César intactas<ref>Cecil W. Wooten, "Cicero's Philippics and Their Demosthenic Model" University of North Carolina Press</ref>.
 
=== Oposição a Marco Antônio e morte ===
[[Ficheiro:Assassinat de Cicéron.jpg|thumb|esquerda|upright=.8|"Assassinato de Cícero". Cícero foi morto por ordem de Marco Antônio apesar da objeção de [[Otaviano]]. Seu executor foi o [[centurião]] Herênio.<br><small>Séc. XV. [[Iluminura]] em ''"Les cas des nobles hommes et femmes"'', [[manuscrito]] preservado em [[Ruão]], [[França]].</small>]]
Cícero e Antônio tornaram-se os dois principais políticos em Roma &mdash; Cícero na posição de voz do Senado; Antônio como cônsul, líder dos cesarianos e executor não oficial do testamento público de César. As relações entre os dois, jamais amigáveis, pioraram depois que Cícero ter acusado Antônio de estar tomando certas liberdades indevidas na interpretação dos desejos e intenções de César. [[Otaviano]] era o [[Adoção na Roma Antiga|filho adotivo]] de César e seu herdeiro; depois que ele retornou para a Itália, Cícero tentou jogá-lo contra Antônio. Ele elogiava Otaviano, declarando que ele cometeria os mesmos erros de seu pai. Ele atacou Antônio numa série de discursos conhecidos como "[[Filípicas (Cícero)|Filípicas]]" ({{lang-la|''"Philippicae"''}}), uma referência às denúncias de [[Demóstenes]], considerado o maior orador da [[antiguidade]], contra [[Filipe II da Macedônia]]. Na época, a popularidade de Cícero não tinha rivais entre o povo romano<ref>[[Apiano]], ''Guerras Civis'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Appian/Civil_Wars/4*.html#19 4.19]</ref>.
 
Cícero apoiou [[Décimo Júnio Bruto Albino]] como governador da [[Gália Cisalpina]] e urgiu o Senado para que nomeasse Antônio como [[inimigo público]]. Porém, o discurso de [[Lúcio Calpúrnio Pisão Cesonino (cônsul em 58 a.C.)|Lúcio Pisão]], sogro de César, atrasou a decisão. Antônio só foi declarado inimigo do estado mais tarde, quando se recusou a [[Campanha de Mutina|abandonar o cerco]] de [[Mutina]], a capital de Décimo Bruto. O plano de Cícero fracassou quando Antônio e Otaviano se reconciliaram e se uniram a [[Lépido]] para formar o [[Segundo Triunvirato]] depois de duas batalhas seguidas, em [[Batalha do Fórum dos Galos|Fórum dos Galos]] e Mutina. O triunvirato decidiu então começar a [[proscrição|proscrever]] seus inimigos e potenciais rivais imediatamente depois de conseguirem transformar em lei a aliança, uma ditadura de fato que dava aos [[triúnviro]]s poderes consulares (''[[imperium]]''). Cícero e todos os seus contatos e aliados estavam entre os que foram proscritos e, conta-se, Otaviano teria discutido por dois dias contra a decisão de Antônio de incluí-lo na lista<ref>[[Plutarco]], [[Vidas Paralelas (Plutarco)|Vidas Paralelas]], ''Cícero'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Plutarch/Lives/Cicero*.html#46.3 46.3–5]</ref>.
 
Cícero foi um dos proscritos perseguidos de forma mais violenta e obstinada. Ele era muito popular e muitos não quiseram delatá-lo. Ele foi finalmente capturado em 7 de dezembro de 43 a.C. deixando sua ''[[villa]]'' em ''[[Formiae]]'' numa [[liteira]] a caminho do litoral, onde embarcaria para um navio destinado à [[Macedônia (província romana)|Macedônia]]<ref name="Haskell_1964_293">Haskell, H.J.: ''This was Cicero'' (1964) p.293</ref>. Quando seus assassinos &mdash; Herênio (um [[centurião]]) e Popílio (um [[tribuno da plebe|tribuno]]) &mdash; chegaram, os próprios escravos de Cícero afirmaram desconhecer seu paradeiro, mas Cícero foi traído por Filólogo, um [[liberto (Roma Antiga)|liberto]] de seu irmão, [[Quinto Túlio Cícero|Quinto Cícero]]<ref name="Haskell_1964_293" />
 
Consta que suas últimas palavras foram: ''"Não há nada adequado sobre o que está fazendo, soldado, mas tente me mater adequadamente"''. Ele se ajoelhou perante seus captores, inclinando sua cabeça para fora da liteira em um gesto [[gladiador|gladiatorial]] destinado a facilitar a execução. Ao expor seu pescoço e garganta aos soldados, estava indicando que não resistiria. Segundo Plutarco, Herênio primeiro o matou e depois cortou sua cabeça. Por ordem de Antônio, suas mãos, que haviam escrito as "Filípicas" contra ele, foram cortadas também; elas e a cabeça foram pregadas na [[Rostra]] no [[Fórum Romano]] seguindo a tradição inaugurada por [[Caio Mário|Mário]] e [[Sula]], que também exibiam as cabeças de seus inimigos no Fórum. Contudo, Cícero foi a única vítima das proscrições do Segundo Triunvirato a sofrer esta humilhação. Segundo [[Dião Cássio]], em uma história geralmente atribuída incorretamente a Plutarco)<ref>[[Dião Cássio]], ''História Romana'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Cassius_Dio/47*.html#8.4 47.8.4]</ref>. A esposa de Antônio, [[Fúlvia]], pegou a cabeça de Cícero, arrancou sua língua e a espetou repetidas vezes com um grampo de cabelo, uma vingança final contra o poder da oratória do inimigo de seu marido<ref>Everitt, A.: ''Cicero, A turbulent life'' (2001)</ref>.
[[Ficheiro:Svedomsky-Fulvia.jpg|thumb|direita|upright=1.4|[[Fúlvia]], a esposa de [[Marco Antônio]], com a cabeça decapitada de Cícero, o grande inimigo de seu marido.<br><small>Séc. XIX, por [[Pavel Svedomsky]] (1849-1904).</small>]]
O filho de Cícero, [[Cícero, o Jovem]], durante seu consulado, em 30 a.C., vingou de certa forma a morte de seu pai ao anunciar ao Senado a derrota naval de Marco Antônio na [[Batalha de Ácio]] no ano anterior pelas mãos de Otaviano e de seu habilidoso comandante e amigo, [[Marco Vipsânio Agripa|Agripa]].
 
Otaviano (o futuro [[imperador romano|imperador]] Augusto) aparece depois nas fontes elogiando Cícero como patriota e um acadêmico de grande importância para seus amigos e familiares<ref>[[Plutarco]], [[Vidas Paralelas (Plutarco)|Vidas Paralelas]], ''Cícero'' [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Plutarch/Lives/Cicero*.html#49.5 49.5]</ref>. Porém, foi a sua própria concordância que permitiu que ele fosse morto.
 
A carreira de Cícero como estadista foi marcada por inconsistências e uma tendência de trocar de posição em resposta às mudanças no clima político vigente. Sua indecisão pode ser atribuída À sua personalidade sensível e impressionável; ele tendia a reagir de forma exagerada aos desafios políticos e privados. ''"Quem dera ele fosse capaz de suportar a prosperidade com mais auto-controle e a adversidade com mais firmeza!"'' escreveu [[Caio Asínio Polião (cônsul em 40 a.C.)|Caio Asínio Polião]], um estadista e historiador romano de sua época<ref>Haskell, H.J.:"This was Cicero" (1964) p.296</ref><ref>Castren and Pietilä-Castren: "Antiikin käsikirja" /"Handbook of antiquity" (2000) p.237</ref>.
 
== Legado ==
[[Ficheiro:Cicero Academica 1810 title page.jpg|thumb|esquerda|upright=.8|[[Frontispício]] de uma edição de 1810 de ''"Academica"'' ("Sobre o Ceticismo Acadêmico"), de Cícero.]]
Tradicionalmente, Cícero é considerado o mestre da prosa latina. [[Quintiliano]] declarou que Cícero ''"não era o nome de um homem, mas da própria [[:wikt:eloquência|eloquência]]"''<ref>[[Quintiliano]], ''[[Institutio Oratoria]]'' 10.1.1 12</ref>. Atribui-se a ele a transformação do [[latim]], de uma língua modesta [[utilidade (economia)|utilitária]] em um meio literário versátil capaz de expressar pensamentos complicados e abstrados com clareza<ref>''Merriam-Webster's Encyclopedia of Literature'', "Ciceronian period" (1995) [https://books.google.com/books?id=eKNK1YwHcQ4C&pg=PA244 p. 244]</ref>. [[Júlio César]] elogiou as conquistas de Cícero dizendo que ''"é mais importante ter expandido muito as fronteiras do espírito ('ingenium') romano do que as fronteiras do Império Romano"''<ref>[[Plínio, o Velho|Plínio]], ''[[História Natural (Plínio)|História Natural]]'' 7.117</ref>. Segundo [[John William Mackail]], ''"a glória única e imortal de Cícero é que ele criou a língua do mundo civilizado e utilizou esta língua para criar um estilo que, por dezenove séculos, não foi substituído e, em alguns aspectos, sequer foi alterado"''<ref>[[Cícero]], ''Sete Orações'', 1912</ref>.
 
Cícero foi também um escritor energético com um interesse em uma ampla variedade de temas, sempre em linha com as tradições filosóficas e [[retórica]]s [[helenismo|helenísticas]] na qual ele fora treinado. A qualidade e o fácil acesso aos textos de Cícero ajudaram na distribuição ampla de sua obra e a inclusão dela nos currículos escolares, como revela um divertido ''[[graffiti]]'' em [[Pompeia]], que admoesta: ''"Gostarás de Cícero ou serás castigado"''<ref>Hasan Niyazi, ''From Pompeii to Cyberspace – Transcending barriers with Twitter'' [http://www.3pipe.net/2011/05/from-pompeii-to-cyberspace-transcending.html]</ref>. Cícero era muito admirado também pelos [[Padres da Igreja]], como [[Santo Agostinho]], que creditou à [[obra perdida]] "[[Hortênsio (Cícero)|Hortênsio]]" a sua conversão final ao [[cristianismo]]<ref>[[Santo Agostinho]], ''[[Confissões (Agostinho)|Confissões]]'', 3:4</ref> e [[Jerônimo|São Jerônimo]], que teve uma fervorosa visão na qual ele era acusado de ser ''"seguidor de Cícero e não de Cristo"'' perante um juízo<ref>[[Jerônimo]], ''Carta a Eustóquio'' XXII:30</ref>.
 
Esta influência aumentou ainda mais depois da [[Alta Idade Média]] na Europa, pois mais de suas obras sobreviveram do que de qualquer outro autor latino. Filósofos medievais foram influenciados pelas obras de Cícero sobre [[direito natural]]. A redescoberta das cartas de Cícero por [[Petrarca]] impulsionou novas buscas por obras em [[grego antigo]] e latim espalhadas pelos [[mosteiro]]s europeus e a subsequente redescoberta da [[Antiguidade Clássica]] levou ao [[Renascimento]]. Logo depois, Cícero tornou-se um sinônimo do [[latim clássico]] de tal maneira que diversos estudiosos [[humanismo|humanistas]] passaram a afirmar que nenhuma palavra ou frase latina poderia ser utilizada se não pudesse ser encontrada nas obras dele, uma posição criticada por [[Erasmo de Roterdã]]<ref>[[Erasmo de Roterdã]], ''[[Ciceronianus]]''</ref>. Sua volumosa correspondência, a maior parte da qual direcionada para seu amigo [[Tito Pompônio Ático|Ático]], foi especialmente influente, introduzindo a arte da escrita refinada de epístolas na cultura europeia. [[Cornélio Nepos]], o biógrafo do século I a.C. de Ático, lembrou que as cartas de Cícero continham tamanha riqueza de detalhes ''"sobre as inclinações de homens importantes, os fracassos de generais e as revoluções no governo"'' que o leitor delas sentia pouca necessidade de uma história do período<ref>[[Cornélio Nepos]], ''Atticus'' [http://www.tertullian.org/fathers/nepos.htm#Atticus 16], trad. para o inglês de John Selby Watson.</ref>.
 
Entre os admiradores de Cícero estavam Erasmo, [[Martinho Lutero]] e [[John Locke]]<ref>Richards 2010, p.121</ref>. Depois da invenção da [[prensa móvel]] por [[Gutenberg]], ''"[[De Officiis]]"'' foi o segundo livro impresso na Europa depois da [[Bíblia de Gutenberg]]. Estudiosos destacaram a influência de Cícero no renascimento da tolerância religiosa no século XVII<ref>{{cite web |last=Gibson |first=William |url=http://www.h-net.org/reviews/showrev.php?id=12681|title=John Marshall. John Locke, Toleration and Early Enlightenment Culture: Religious Toleration and Arguments for Religious Toleration in Early Modern and Early Enlightenment Europe|year=2006|accessdate=8 July 2012|publisher=H-Albion}}</ref>.
 
Enquanto Cícero, o humanista, influenciou profundamente a cultura do Renascimento, Cícero, o republicano, inspirou os [[pais fundadores dos Estados Unidos]] e os revolucionários da [[Revolução Francesa]]<ref>De Burgh, W.G., "The legacy of the ancient world"</ref>. [[John Adams]] disse sobre ele: ''"[Como] Todas as idades do mundo não produziram um estadista e filósofo ao mesmo tempo maior do que Cícero, sua autoridade deve ter peso maior"''<ref>''American republicanism: Roman Ideology in the United States'' [[Mortimer Sellers|Mortimer N. S. Sellers]], NYU Press, 1994</ref>. [[Thomas Jefferson]] cita Cícero como uma das poucas figuras que contribuíram para uma tradição do ''"direito público"'' que serviu de fonte para seu rascunho da [[Declaração de Independência dos Estados Unidos|Declaração de Independência]] e deu forma à compreensão norte-americana da base no "senso do comum" para o direito de revolução<ref>[[Thomas Jefferson]], ''"Letter to Henry Lee"'', 8 May 1825, in The Political Thought of American Statesmen, eds. Morton Frisch and Richard Stevens (Itasca, Ill.: F. E. Peacock Publishers, 1973), 12.</ref>. [[Camille Desmoulins]] afirmou que os republicanos franceses, em 1789, eram ''"principalmente jovens que, estimulados pela leitura de Cícero na escola, tornaram-se apaixonados entusiastas da liberdade"''<ref>{{cite book |last= Aulard |first= François-Alphonse |title= Histoire politique de la Révolution française: Origines et Développement de la Démocratie et de la République (1789–1804) |publisher= Librairie Armand Colin |year= 1901|page=5}}</ref>.
 
[[Jim Powell (historiador)|Jim Powell]] começa seu livro sobre a história da liberdade assim: ''"Marco Túlio Cícero expressou os princípios que tornaram-se a fundação da liberdade no mundo moderno"''<ref>{{cite book|title=The Triumph of Liberty: A 2,000 Year History Told Through the Lives of Freedom's Greatest Champions|last=Powell|first=Jim|date=July 4, 2000|publisher=Free Press|isbn=978-0684859675|pages=2–10}}</ref>.
{{multiple image
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| width = 220
| header = Obras de Cícero
| footer = A obra de Cícero era tão popular que o segundo livro impresso na Europa por [[Gutenberg]], depois de sua [[Bíblia de Gutenberg|Bíblia]], foi ''"De Officiis"''.
| image1 = Cicero, De officiis, Vaticanus Palatinus lat. 1534.jpg
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| caption1 = Página ricamente [[iluminura|iluminada]] de ''"[[De Officiis]]"'' ("Sobre os Deveres"), de 1534.
| image2 = Cicero, De amicitia, Vaticanus Palatinus lat. 1523.jpg
| alt2 =
| caption2 = Outro exemplo ricamente iluminado, desta vez de ''"[[De Amicitia]]"'' ("Sobre a Amizade"), de 1523
| image3 = M. Tullii Ciceronis De oratore liber.jpg
| alt3 =
| caption3 = Página de ''"[[De Oratore]]"'', do século XV.
}}
Da mesma forma, nenhuma outra figura da antiguidade inspirou tanta crítica, por vezes venenosa, quanto Cícero, especialmente entre os críticos mais modernos<ref>Bailey, D.R.S. "Cicero's letters to Atticus" (1978) p.16</ref>. Seu compromisso com os valores da República acomodavam um ódio aos pobres e uma persistente oposição aos advogados e aos mecanismos de representação popular<ref>[[Cícero]], ''Cartas a Ático'' I & II</ref>. [[Friedrich Engels]] referia-se a ele como o ''"canalha mais desprezível da história"'' por defender uma "democracia" republicana enquanto, ao mesmo tempo, denunciava reformas agrárias e sociais<ref>Nota em Michael Parenti, ''The Assassination of Julius Caesar: A People's History of Ancient Rome'', 2003:86. ISBN 1-56584-797-0</ref>. Cícero também enfrentou críticas por exagerar as qualidades democráticas da [[República Romana]] e por defender uma [[oligarquia]] contra as reformas populares de César. [[Michael Parenti]] admite as habilidades de Cícero como orador, mas considera-o uma personalidade vaidosa, pomposa e [[:wikt:hipócrita|hipócrita]] que, quando lhe era vantajoso, podia mostrar apoio público para causas populares que detestava em privado. Parenti relata o processo de Cícero na [[Segunda Conspiração de Catilina]] como legalmente falho, para dizer o mínimo, e possivelmente ilegal<ref>Michael Parenti, ''[[The Assassination of Julius Caesar: A People's History of Ancient Rome]]'', 2003, pp. 107–111, 93. ISBN 1-56584-797-0</ref>.
 
Cícero também teve influência sobre a [[astronomia]]. [[Copérnico]], buscando por fontes antigas para o [[translação|movimento da Terra]], afirmou que ''"primeiro... encontrou em Cícero que [[Hicetas]] havia proposto que a Terra se movia"''<ref>{{cite book |last=Spielvogel |first=Jackson |page=492 |title=Western Civilization since 1300 |isbn= 978-1-111-34219-7 |year=2011 |publisher=Cengage Learning}}</ref>.
 
== Obras ==
{{AP|Obras de Marco Túlio Cícero}}
Cícero foi declarado um [[pagão justo]] pela [[cristianismo primitivo|Igreja antiga]]<ref>Everitt, A., ''Cicero: The Life and Times of Rome's Greatest Politician'' (2003) , p. 259</ref> e, por isso, suas obras foram consideradas dignas de serem preservadas. Os [[bogomilos]] consideravam-no como um dos poucos santos pagãos<ref>De Burgh, W.G.</ref>. Escritores cristãos romanos e medievais citaram sem ressalvas ''"[[De Re Publica]]"'' e ''"[[De Legibus]]"'' e muitas de suas obras foram recriadas a partir destas citações fragmentárias. Cícero articulou também uma primeira conceituação de direitos, primitiva e abstrata, baseada nas leis e nos costumes antigos. Das obras de Cícero, seis sobre [[retórica]] sobreviveram, além de partes de outras oito em filosofia. De seus discursos, 88 foram citados, mas sobreviveram apenas 58.
 
=== Discursos ===
{{Dividir em colunas|2}}
* (81 a.C.) ''[[Pro Quinctio]]'' ("Em Defesa de Quíncio")
* (80 a.C.) ''[[Pro Roscio Amerino]]'' ("Em Defesa de [[Sexto Róscio|Róscio]] de [[Améria]]")
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* (45 a.C.) ''[[Pro Deiotaro]]'' ("Em Defesa do rei [[Deiotaro]]")
* (44–43 a.C.) ''[[Philippicae]]'' ("Filípicas", contra [[Marco Antônio]])<ref>{{cite web|url=http://www.perseus.tufts.edu/cgi-bin/ptext?doc=Perseus%3Atext%3A1999.02.0021 |title=M. Tullius Cicero, Orations: The fourteen orations against Marcus Antonius (Philippics) (ed. C. D. Yonge) |publisher=Perseus.tufts.edu | language=inglês}}</ref>
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=== Tratados ===
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* (55 a.C.) ''[[De Oratore]] ad Quintum fratrem libri tres'' ("Sobre o Orador, três livros para seu irmão Quinto")
* (51 a.C.) ''[[De Re Publica]]'' ("Sobre a República")