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'''Estado intermediário''', na [[escatologia cristã]], é uma referência à existência "intermediária" de uma pessoa entre a morte e a [[ressurreição universal]]. O conceito está relacionado às doutrinas do [[juízo particular]], que ocorre logo após a morte, e do [[juízo geral]] (ou [[Juízo Final]]), que ocorre depois da ressurreição.
 
Durante os [[cristianismo primitivo|os primeiros anos do cristianismo]], quando os fieis acreditavam na iminência do [[escatologia cristã|fim do mundo]], havia pouco interesse sobre o estado intermediário entre a morte e a ressurreição. Posteriormente, [[cristianismo oriental|cristãos orientais]] passaram a acreditar num conceito similar, mas não o definiram claramente de propósito para não embaçar a distinção entre os destinos definitivos possíveis, representados pelo [[céu (cristianismo)|céu]] e [[inferno]]. No [[cristianismo ocidental|ocidente]], havia muito mais curiosidade sobre o estado intermediário, com evidências sobre o tema remontando à "Paixão das Santas [[Perpétua e Felicidade]]" (203), na qual se fala da crença de que os pecados podem ser expurgados pelo sofrimento numa [[vida após a morte]] e que este [[Purgatório|expurgo]] pode ser acelerado pela intercessão dos vivos (cristãos orientais também acreditavam que [[oração pelos mortos|os mortos podem ser auxiliados pela oração]]).<ref>Oxford Dictionary of the Christian Church (Oxford University Press 2005 ISBN 978-0-19-280290-3), artigo ''Purgatory''</ref>.
 
Tanto no oriente quanto no ocidente, os que estão num estado intermediário tem sido tradicionalmente identificados como sendo beneficiários de orações (como as [[missa de réquiem|missas de réquiem]]). No oriente, acreditava-se que as orações beneficiam inclusive os [[paganismo|pagãos]]<ref name="ReferenceA">"Dead, prayer for the." Cross, F. L., ed. The Oxford dictionary of the Christian church. New York: Oxford University Press. 2005</ref> enquanto que, no ocidente, [[Santo Agostinho]] defendeu que ela era útil apenas aos que estavam em [[comunhão plena|comunhão]] com a Igreja e que o destino final de todas as almas é determinado na morte.<ref name="ReferenceA"/>. No fim, a doutrina ocidental restringiu a eficácia das orações às almas no [[purgatório]].<ref name="ReferenceA"/>. Na [[Idade Média]], a [[Igreja latina|igreja ocidental]] oferecia [[indulgência]]s aos que estavam no purgatório, um costume que evoluiu a partir da prática mais antiga das remissões canônica.<ref>"Indulgences." Cross, F. L., ed. The Oxford dictionary of the Christian church. New York: Oxford University Press. 2005</ref>.
 
A doutrina das [[denominação cristã|denominações]] [[protestantes]] negam a existência do purgatório católico e, portanto, não ensina a [[oração pelos mortos]]. Em compensação, [[Lutero]] ensinava o conceito do "[[sono da alma]]" ("mortalidade da alma"), comparando o sono de uma pessoa cansada depois de um dia de trabalho, cuja alma ''"não dorme, está acordada"'' ({{lang-la|"''non sic dormit, sed vigilat''"}}) e que pode ''"experimentar visões e os discursos dos anjos e de Deus"'', com o sono dos mortos, que nada experimentam, mas ainda ''"vivem para Deus"'' ("''coram Deo vivit''").<ref>Martin Luther, ''An Exposition of Salomon's Booke, called Ecclesiastes or the Preacher'' (translation 1573). E.M. Plass, ''What Luther Says'', Vol. 1. St. Louis: Concordia Publishing House, 1950. p. 385.</ref><ref>J Pelikan, ed., ''Luther's Works'', Vol. 4. St. Louis: Concordia Publishing House, 1964. p. 313).</ref>. [[Calvino]], por outro lado, acreditava que os mortos repousavam num estado de felicidade.<ref name="psychopannychia">John Calvin, [http://www.lgmarshall.org/Calvin/calvin_psychopannychia.html Psychopannychia], @ lgmarshall.org</ref>.
 
== Contexto judaico ==
{{AP|Escatologia judaica}}
Os primeiros [[hebreus]] não desenvolveram o conceito de [[ressurreição dos mortos]]<ref>[[Stephen L Harris|Harris, Stephen L.]], Understanding the Bible. Palo Alto: Mayfield. 1985. p. 415</ref> e, portanto, não havia espaço para uma doutrina sobre o estado intermediário. Assim como outros grupos humanos vizinhos, eles compreendiam a morte como sendo o fim. Sua noção de "vida após a morte", o ''"[[sheol]]"'' ("fosso"), era um lugar escuro do qual ninguém retorna. Na época de [[Jesus]], porém, o [[Livro de Daniel]] ({{citar bíblia|livro=Daniel|capítulo=12|verso=1-4|Daniel|1|4|}}) e uma profecia em [[Livro de Isaías|Isaías]] ({{citar bíblia|Isaías|26|19}})<ref name ="Harris">[[Stephen L Harris|Harris, Stephen L.]], Understanding the Bible. Palo Alto: Mayfield. 1985.</ref> popularizaram a ideia que os mortos no ''"sheol"'' seriam "ressuscitados para um juízo final".
 
== História ==
Uma exceção às visões tradicionais judaicas do ''"[[sheol]]"'', o [[Evangelho de Lucas]], especificamente na [[Parábola do Rico e Lázaro]], descreve o [[Hades]] em linha com a tradição [[literatura intertestamental|intertestamental]] judaica de um ''"sheol"'' dividido entre os justos felizes e os maus em miséria.<ref>George W. E. Nickelsburg ''Resurrection, immortality, and eternal life in intertestamental Judaism and Early Christianity'' Harvard Theological Studies</ref>. Posteriormente, [[Hipólito de Roma]], partiu desta parábola e descreveu atividades no "[[Seio de Abraão]]" em "Contra Platão".<ref>Hipólito de Roma, "Contra Platão", "Sobre a Causa do Universo", §1.</ref>.
 
A partir de [[Santo Agostinho]], cristãos passaram a acreditar que as almas dos que morrem ou descansam em paz, caso dos cristãos, ou são afligidos depois da morte, caso dos condenados, até a ressurreição.<ref name="Hoekema">{{citecitar booklivro|lastúltimo =Hoekema|firstprimeiro =Anthony A|titletítulo=The Bible and the Future|yearano=1994|locationlocal=Grand Rapids|publisherpublicado=Wm. B. Eerdmans|pagepágina=92}}</ref>. O [[Venerável Beda]] e [[São Bonifácio]] relatam visões de uma [[vida após a morte]] como uma divisão em quatro partes, incluindo lugares agradáveis e terríveis no céu e no inferno criados para abrigar as almas até o Juízo Final.
 
Depois de Agostinho, a [[Igreja Católica]] passou a ensinar que todos os que morrem na graça de Deus e amigos d'Ele, mas que ainda não estão perfeitamente puros, passam por um processo de "purificação" para alcançar a santidade necessária para adentrar a alegria do céu. Este processo ficou conhecido como [[purgatório]].<ref>[http://www.vatican.va/archive/catechism/p123a12.htm#III Catechism of the Catholic Church, 1030-1031]</ref>. Num raciocínio similar, teólogos católicos batizaram de "[[Limbo das crianças|limbo]]" o lugar para onde são enviadas as almas das crianças falecidas antes do [[batismo]], e de "[[limbo dos profetas]]", o lugar para onde vão as almas dos justos que viveram antes da [[Encarnação|vinda de Jesus]].
 
No século XVI, [[Reforma Protestante|reformadores]] como Lutero e Calvino desafiaram a doutrina do [[purgatório]]. Ambos continuavam a acreditar num estado intermediário, mas Calvino defendia uma existência mais consciente para as almas dos mortos do que Lutero. Para ele, os crentes no estado intermediário gozavam de uma benção incompleta na esperança da ressurreição e a [[teologia reformada]] baseia-se majoritariamente nesta crença.<ref name="Hoekema" />.
 
== Doutrina ==
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=== Mortalismo cristão ===
{{AP|Sono da alma}}
O termo histórico mais neutro para esta crença atualmente é geralmente "mortalismo" ou "mortalismo cristão"<ref>Norman T. Burns Christian mortalism from Tyndale to Milton 1967, 1972</ref><ref>Albert C. Labriola Milton Studies, Volume 45 2005 p17.</ref><ref>Ann Thomson Bodies of Thought: Science, Religion, and the Soul in the Early Enlightenment 2008 p43</ref><ref>Douglas Kries Piety and humanity: essays on religion and early modern political philosophy 1997 p101</ref> The terms ''Soul sleep''.<ref>Millard J. Erickson Christian theology 1998 p1182 </ref>.
 
Um grupo minoritário de cristãos, incluindo [[William Tyndale]], [[Martinho Lutero]],<ref name="Luther">"Christian Song Latin and German, for Use at Funerals", 1542, in Works of Luther (1932), vol. 6, pp. 287, 288</ref>, alguns [[anglicanos]] como [[E. W. Bullinger]] e denominações específicas como os [[Adventistas do Sétimo Dia]]<ref>[[28 fundamentos|28 crenças fundamentais dos adventistas do sétimo dia]], [http://www.adventist.org/beliefs/fundamental/index.html adventist.org], number 26 "Death and Resurrection".</ref> e [[cristadelfianos]], negam qualquer existência consciente da alma após a morte, acreditando que o estado intermediário dos mortos seja apenas um "sono" inconsciente. [[Testemunhas de Jeová]] também acreditam nisto, excluindo apenas os [[144.000]].<ref>''From Paradise Lost to Paradise Regained'' Watchtower Society 1st Ed. 1958</ref>. Segundo estas crenças, a alma não tem consciência de nada após a morte e não saberá sequer quanto tempo se passou até a ressurreição. Para elas, seria como se o tempo passasse imediatamente da morte para a ressurreição.
 
== Ver também ==