Viriato Clemente da Cruz: diferenças entre revisões

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{{Info/Biografia
|nome = Viriato da Cruz
|nome_completo = Viriato Francisco Clemente da Cruz
|data_nascimento = {{dni|25|3|1928|si|lang=br}}
|local_nascimento = [[Porto Amboim]], [[Cuanza Sul]]</br> [[Angola portuguesa]]
|data_morte = {{nowrap|{{morte|13|6|1973|25|3|1928}}}}
|local_morte = [[Pequim]], </br> {{CHN}}
|ocupação = [[Político]] e [[poeta]]
|magnum_opus = ''Colectânea de poemas: 1947-1950''
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== Atividade política ==
Viriato da Cruz cresceu numa família em situação económica difícil, uma vez que o seu pai o tinha abandonado. Apesar destas dificuldades, fez estudos liceais no [[Liceu Salvador Correia]]. Nos anos 1950 esteve em contacto com a movimentação anticolonial clandestina em Luanda, incluindo o Partido Comunista Angolano (PCA), fundado naquela altura. Abandonou [[Angola]] por volta de [[1957]] para se dirigir a [[Paris]] onde se encontrou com [[Mário Pinto de Andrade]], desenvolvendo atividades políticas e culturais.<ref> Cf. MARCUM, John. ''The Angolan Revolution'', vol. I, ''The Anatomy of an Explosion (1950-1962)'', Cambridge/Mass. & Londres: MIT Press, 1969.</ref>.
 
A primeira digressão pela China Continental foi em novembro de 1958, e durou 3 semanas. Tanto [[Viriato da Cruz]] e [[Mário Pinto de Andrade]] foram a Pequim, Xangai e Guangzhou (Cantão).<ref name="ROCHA">Cf. ROCHA, Edmundo; SOARES, Francisco; FERNANDES, Moisés (orgs.). ''Viriato da Cruz: O homem e o mito'', Lisboa: Prefácio; Luanda: Chá de Caxinde, 2008.</ref>.
 
Tal como Mário Pinto de Andrade, Matias Miguéis, Lúcio Lara, Hugo Azancot de Menezes e Eduardo Macedo dos Santos, Viriato participou em 1960 na Guiné-Conakry na fundação do [[MPLA|Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA)]], tornando-se o seu secretário-geral.<ref>{{citar livro|título=MPLA. Um Nascimento Polémico. As Falsificações da História [prefácio de Joaquim Pinto de Andrade]|ultimo=Pacheco|primeiro=Carlos|editora=Vega|ano=1.ª edição (fevereiro) 1997|local=Lisboa|páginas=|acessodata=}}</ref>. Nesta qualidade fez parte de uma delegação da recém-formada [[FRAIN]] (Frente Revolucionária Africana pela Independência Nacional dos Povos sob Domínio Português) que, ainda em agosto de 1960, fez uma viagem à [[China]] para obter apoios.<ref> A delegação era composta por dois dirigentes do [[MPLA]] (Viriato da Cruz, secretário-geral, e Eduardo Macedo dos Santos, adjunto do departamento de Defesa e Segurança) e quatro elementos do [[PAI]] (Partido Africano da Independência) da Guiné-Bissau ([[Amílcar Cabral]], Elysée Turpin, Luciano N'Dau e Douara Bangala)</ref>. Este foi um passo fundamental para Viriato da Cruz. Ele trouxe dinheiro que ajudou o MPLA no âmbito político-militar e financeiro.
 
Em Maio de 1962 Viriato da Cruz abandonou espontaneamente o cargo de secretário-geral do MPLA a pretexto de tornar o Comité Director mais representativo (ou epidermicamente mais escuro). Com a chegada de Agostinho Neto a Léopoldville em Julho daquele ano depois da sua fuga de Portugal, irromperam divergências insanáveis entre Viriato e Neto que se arrastaram até à I Conferência Nacional do Movimento em Dezembro. No rescaldo deste evento que consagrou Neto como novo presidente do MPLA, Viriato apontou Neto de ser o símbolo da viragem política do MPLA à direita. Injustamente acusado de se ter apropriado de recursos monetários do Movimento, foi formalmente expulso a 7 de Julho de 1963. Antes disso, porém, os sequazes de Neto, comandados por Manuel dos Santos Lima, arrancaram-no brutalmente da pensão em que se alojava em Léopoldville e espancaram-no acolitados por soldados congoleses agenciados por Neto. A extensão das agressões físicas foi de uma tal magnitude que Viriato sangrava por todos os lados, espojado no chão. Neto, Lúcio Lara, Iko Carreira e outros dirigentes sequer se coibiram de exibir no rosto um ar trocista, mesmo tendo diante dos olhos um espectáculo tão sórdido que feria profundamente a dignidade e o conceito público de um ex-companheiro da estirpe de Viriato. Mesmo esfacelado e a rastejar no solo, o antigo secretário-geral e criador do MPLA<ref>{{citar livro|título=Percursos da Luta de Libertação Nacional. Viagem ao Interior do MPLA. Memórias Pessoais [organização, fixação e revisão do texto, preâmbulo, notas e comentários de Carlos Pacheco]|ultimo=MENEZES|primeiro=Hugo Azancot de|editora=Vega|ano=1.ª edição, 2017|local=Lisboa|páginas=103-106|acessodata=05-11-2017}}</ref> continuou a ser sovado e insultado pelos seus verdugos. Os abusos prosseguiram na penitenciária de Lufungula onde o aprisionaram e humilharam juntamente com outros seus companheiros. Saiu do cárcere entre a vida e a morte.<ref>{{citar livro|título=Agostinho Neto, o Perfil de um Ditador. A História do MPLA em Carne Viva|ultimo=PACHECO|primeiro=Carlos|editora=Vega|ano=1.ª edição, 2016|local=Lisboa|páginas=vol. I, pp. 191-200|acessodata=05-11-2017}}</ref>.
 
Nos dias 24 e 30 de abril de 1963, Viriato da Cruz participou na [[Conferência de Jornalistas Afro-Asiáticos]], patrocinada pelos regimes de [[Ahmed Sukarno]] e [[Mao Zedong]], que levou à fundação da respectiva associação, que excluía propositamente a União Soviética, recorrendo ao argumento que eram "brancos". Por outras palavras, ajudou a instituir mais um organismo rival criado pela China Continental, contra a União Soviética. Viriato integrou a mesa da presidência da reunião, em representação de Angola.<ref name="ROCHA" />.
 
== Na China ==
Valendo-se dos contactos anteriores, Viriato da Cruz viaja em 1966 para [[Pequim]] onde mais tarde fixaria residência. A sua chegada deu-se, assim, no início da [[Revolução Cultural Chinesa]], e foi recebido pelos dirigentes chineses, dentro do espírito daquele período chineses.
 
Os dirigentes chineses recebem-no de braços abertos, pois tinha demonstrado uma enorme capacidade na criação do primeiro Partido Comunista de Angola (PCA) e, posteriormente, do [[MPLA]], primeiro em Conacri e, depois, no Congo Belga (neste foi detido e sofreu torturas, por defender ideias contrárias às estabelecidas). Uma das suas primeiras ações foi o de ajudar a dividir a Organização de Escritores Afro-Asiáticos (OEAA), no decorrer da sua Assembleia Geral Extraordinária, que decorreu em Pequim entre os dias 27 de junho e 9 de julho de 1966, em duas agremiações distintas: a pró-soviética, baseada no Cairo, e a pró-chinesa, com sede em Pequim e em Colombo, no Sri Lanka. Os chineses entendiam que Viriato da Cruz poderia facilitar a penetração ideológica do [[socialismo]] [[maoísmo|maoísta]] no [[continente africano]] - o que não sabiam era que estavam profundamente enganados; daí nasceu um grave mal-entendido com consequências trágicas para Viriato e para a sua família.
 
Pouco tempo depois instaram-no a proferir um discurso nas comemorações do dia nacional da República Popular da China, 1 de outubro de 1966. Em nome do povo angolano, Viriato da Cruz exaltou o pensamento do dirigente máximo chinês, as atividades dos Guardas Vermelhos e a "Grande Revolução Cultural do Proletariado" em curso. Para as derrotar era necessário constituir uma "frente única internacional" contra o imperialismo americano e o imperialismo russo, que congregasse os povos da Ásia, da África e da América Latina.
 
Elabora um relatório onde afirma que os países [[Africanos]], mesmo os mais desenvolvidos, não estão preparados para uma revolução socialista. Demonstra então grande firmeza ao recusar-se a mudar o relatório. Esse aspectos do seu carácter já lhe tinha valido graves dissabores na sua curta vida política quando da crise de 1962-63, no seio do [[MPLA]]. O relatório pessimista elaborado por Viriato ia contra a doutrina maoísta da iminência da revolução mundial.
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== Os últimos anos de vida na China ==
Com o claro propósito de precipitar a expulsão do seu marido e família da China, a mulher de Viriato, Maria Eugénia, derrubou o busto do presidente Mao Zedong. O efeito foi precisamente ao contrário, as autoridades chinesas desterraram-nos para um campo de trabalho na região sul da cidade de Pequim.
 
Os últimos anos de vida de Viriato foram marcados por falta de alimentos, colidindo na fome que acabou por fragilizá-lo. Veio a falecer no ''Hospital Anti-Imperialista'', antigamente o ''Hospital Universitário de Pequim'', no dia 13 de junho de [[1973]]. No entanto, a derradeira humilhação foi a maneira abjecta como foi levado para o cemitério dos estrangeiros: entaipado entre quatro tábuas, transportado num camião militar. Segundo António Caeiro, um jornalista português que passou vários anos na capital chinesa como correspondente da agência de notícias ''Lusa'', "[a]lém de mim [Ângela Guimarães] e da família, só estava presente um casal colombiano".<ref>António Caeiro, ''Peregrinação Vermelha - O Longo Caminho até Pequim'', Lisboa, Publicações Dom Quixote, 2016, p. 102.</ref> Entretanto, faz-se útil recordar, dada a sua indiscutível relevância histórica, o último registo de Viriato no seu diário, fixado com o seu punho e letra (a lápis e em caracteres miudinhos). Nele o arquitecto do MPLA não só questiona a "doença" que rapidamente o empurrou para a morte (pois pressentia que estavam a assassiná-lo), mas sobretudo lança estas palavras de advertência para a posteridade: ''Declaro, sem apelo, que os meus parentes deverão recusar, privada e publicamente, as condolências que, porventura, o MPLA ou alguns dos seus membros, tais como Agostinho Neto, Lúcio Barreto de Lara, Eduardo'' [Macedo] ''dos Santos, Mário Pinto de Andrade, Manuel Videira e Gentil Viana, venham a enviar aos ditos parentes meus ou venham a publicar. Não está no meu poder perdoar os actos de felonia, de perseguição e de falta de camaradagem que aqueles senhores e alguns dos seus sequazes praticaram, não só contra mim, mas também contra um certo número de angolanos. Parece-me ser altamente importante que tais actos sejam, em todos os tempos, condenados em Angola como criminosos e desonrosos''.<ref>{{citar livro|título=Agostinho Neto, O Perfil de um Ditador, op. cit.|ultimo=PACHECO|primeiro=|editora=|ano=|local=|páginas=vol. II, p. 1040|acessodata=05-11-2017}}</ref>
 
== Transladação de Pequim para Luanda ==
Finalmente, no dia 26 de dezembro de 1990 veio os restos mortais de Viriato da Cruz que estava no cemitério para estrangeiros em Pequim para Luanda. No dia seguinte, dia 27, os restos mortais de Viriato da Cruz foram a enterrar na sepultura onde está o corpo de sua mãe, Clementina Clemente da Cruz, às 10h00. Estiveram perto de 200 pessoas amigas e dois representantes do Bureau Político do MPLA-Partido do Trabalho, França Ván-Dúnem, Ministro do Plano, e Roberto Carneiro. Segundo a viúva de Viriato da Cruz, Maria Eugénia, disse à ANGOP: "[a]s despesas da transladação dos restos mortais de Viriato da Cruz foram custeadas pelo governo chinês".
 
== Principais obras ==
*''Poemas''. Lobito, 1974. Coleção Cadernos Capricórnio, 25.
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==Bibliografia==
*[http://www.lusofoniapoetica.com/index.php/content/category/6/23/320/ Viriato da Cruz] no site Lusofonia Poética.
*'''CAEIRO, António.''' ''Peregrinação Vermelha - O Longo Caminho até Pequim'', Lisboa, Publicações Dom Quixote, 2016.
*'''LABAN, Michel''' (org.). ''Viriato da Cruz: Cartas de Pequim''. Luanda: Chá de Caxinde, 2003.
*'''MARCUM, John'''. ''The Angolan Revolution'', vol. I, ''The Anatomy of an Explosion (1950-1962)'', Cambridge/Mass. & Londres: MIT Press, 1969.
*'''PACHECO, Carlos'''. ''Agostinho Neto, o Perfil de um Ditador. A História do MPLA em Carne Viva'', 2 vols., Lisboa, Vega Editora, 1.ª edição, 2016 (ISBN 978-972-699-988-1)
*'''ROCHA, Edmundo'''; '''SOARES, Francisco'''; '''FERNANDES, Moisés''' (Orgs.). ''Viriato da Cruz: O homem e o mito'', Lisboa: Prefácio; Luanda: Chá de Caxinde, 2008.
*'''SANTOS, Edna Maria dos'''. ''[http://publicacoes.unigranrio.br/index.php/magistro/article/view/1059/621 Viriato da Cruz e Agostinho Neto: História, Poesia, Música e Revolução]''
*'''SERRANO, Carlos'''. ''[http://www.revistas.usp.br/africa/article/download/102613/100886 Viriato da Cruz: Um Intelectual Angolano do Século XX. A Memória que se faz Necessária]''