Venda de esposas na Inglaterra: diferenças entre revisões

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=== Casamento e estatuto da mulher ===
[[Imagem:TheOutcastRichardRedgrave.jpg|esquerda|miniaturadaimagem|upright=1.2|A pintura ''The Outcast'', de Richard Redgrave, mostra um pai expulsando sua filha [[Família monoparental|mãe-solteira]] de casa, diante de uma esposa resignada. Ela tem sido interpretada como uma crítica contemporânea à moralidade puritana e à submissão da mulher na [[era vitoriana]]{{Sfn|Dominguez|2019|p=72-73}}]]
Em função da Lei sobre casamentos pré-contratuais e relativa a questões de consanguinidade,''{{efn|Em inglês: ''An Act concerning Pre-contracts of Marriages, and touching Degrees of Consanguinity''.}}'' de 1540, que foi aplicada até a entrada em vigor da Lei de casamento de 1753,''{{efn|Em inglês: ''Marriage Act of 1753''.}}'' casamentos na Inglaterra não careciam de uma cerimônia formal perante um clérigo, desde que não fossem "não proibidos pela Lei Divina".{{Sfn|Bryce|1901|p=816}} Isso impunha que os noivos concordassem com a união e tivessem a idade legal de consentimento,{{Sfn|Bryce|1901|p=816–817}} que era de 12doze anos para meninas e 14quatorze anos para meninos,{{Sfn|Brabcová|2004|p=21}} e como consequência sua muitos casamentos não eram registrados. Contudo, esses casamentos eram reconhecidos [[de facto|de fato]] e [[de jure|de direito]] pelas autoridades e pelas comunidades em que viviam os nubentes.{{Sfn|Bryce|1901|p=816-817}}{{efn|No {{séc|XIX}}, a venda de esposas tornou-se conhecida em países vizinhos da Inglaterra, sobretudo dentre os franceses, que acreditavam se tratar de um costume amplamente difundido e portanto corriqueiro. Um dos relatos da época que compartilhavam dessa opinião afirma que "a bigamia, ou sobretudo a poligamia, é comum na Inglaterra. Não é raro encontrar lá um homem com duas ou três esposas. A dispensa de requerimentos para se proceder à celebração de um casamento, a grande facilidade com que se pode contrair uma união desse tipo, e sobretudo a facilidade com que se pode dissolve-la, tornam necessariamente frequente a bigamia nesse reino".{{Sfn|Pillet|1815|p=300-301}}}}
 
Nesse período, para uma mulher era socialmente e materialmente difícil encontrar maneiras de garantir seu próprio sustento independentemente de um casamento, e a integridade sexual e o reconhecimento como uma pessoa casada forneciam-lhe respeitabilidade e prestígio social.{{Sfn|Brabcová|2004|p=21}} Uma vez casadas, as mulheres eram subordinadas aos seus esposos, incluindo os seus direitos e obrigações, que eram incorporados aos de seus maridos de acordo com o instituto legal da cobertura ({{Lang-en|''coverture''}}). Nas palavras do eminente juiz inglês [[William Blackstone]], em um texto de 1753, "o próprio ser, ou existência legal da mulher, é suspenso durante o casamento, ou pelo menos é consolidado e incorporado ao do marido: sob cujas asas, proteção e cobertura, ela realiza todas as suas ações". Como consequência de terem suas [[Personalidade jurídica|personalidades jurídicas]] absorvidas pelas dos seus maridos,{{Sfn|Bryce|1901|p=818}}{{efn|Como coloca o jurista Bryce, a assimilação da personalidade jurídica da esposa pela do seu marido não era absoluta, pois existiam algumas exceções, por exemplo quanto à [[imputabilidade penal]] da esposa. Segundo esse autor, talvez a melhor maneira de descrever o tratamento jurídico da esposa nessa época seja "um acordo entre as três noções de absorção, de uma espécie de tutela e de uma espécie de parceria de propriedade em que a voz do marido normalmente prevalece".{{Sfn|Bryce|1901|p=819}}}} mulheres casadas não podiam possuir propriedades por direito próprio, e popularmente eram consideradas propriedade de seus maridos.{{Sfn|Caine|Sluga|2002|p=12-13}} Essa concepção era fruto de uma sociedade patriarcal,{{Sfn|Brabcová|2004|p=22}} que como norma colocava a mulher em uma "posição inferior ou (formalmente) desprovida de poder".{{Sfn|Thompson|1991|p=458}} Como comentou o próprio Blackstone, em um comentário posterior a respeito do estatuto jurídico da mulher casada, "até mesmo as limitações que a esposa encontra são, na maior parte, destinadas à sua proteção e benefício. Tão grande favorito é o sexo feminino, das leis da Inglaterra".{{Sfn|Bryce|1901|p=820}}
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Por vezes a venda era combinada com antecedência com um comprador, sobretudo quando a esposa tinha um amante ou um outro parceiro de fato.{{Sfn|Thompson|1991|p=428}} Na percepção do marido a venda o liberava de seus deveres conjugais, incluindo sua responsabilidade financeira sobre a sua esposa,{{Sfn|Hill|1994|p=217–218}} e para o comprador que era o amante ou o companheiro de fato da esposa a transação o livrava da ameaça de uma ação legal por relações sexuais ilegais, que permitiria ao marido requerer compensações financeiras.{{Sfn|Pateman|1988|p=122}} Por exemplo, esse é o caso de uma venda ocorrida em setembro de 1815, na qual "apenas três xelins e quatro pênis eram oferecidos pelo lote, pois ninguém queria competir com o licitante pelo belo objeto, cujos méritos só podiam ser apreciados por aqueles que os conheciam. Esse comprador poderia se gabar de um conhecimento longo e íntimo".{{Sfn|Ashton|1899|p=216–217}}
 
No entanto, a venda também podia ser espontânea, e nesse caso a esposa se encontrava sujeitava a propostas de estranhos.{{Sfn|Hill|1994|p=216–217}} O jornal ''The Times'', em outubro de 1839, menciona em um artigo "uma mulher [...] respeitosamente vestida" que fora posta à venda no mercado de Rotherham. Começado o leilão, os lances foram aumentando e chegaram a 4quatro xelins e 10dez pênis. Policiais chegaram de surpresa ao lugar em que acontecia o leilão, e a esposa, temendo ser presa, fugiu e se refugiou em um prédio das vizinhanças. Em sua ausência, o leiloeiro a vendeu àquele que apresentara o maior lance. Quando a esposa se assegurou de que a polícia viera ao leilão para "impedir uma perturbação da paz", e não para interferir com a venda, ela "entregou-se ao seu novo mestre, e eles seguiram juntos de trem para Sheffield".{{Sfn|Padgett|2016}}
 
Essas vendas espontâneas evidentemente apresentavam maiores riscos para os envolvidos, sobretudo a esposa vendida. Contudo, aparentemente mesmo nessas circunstâncias a esposa era capaz de vetar lances e até mesmo a venda, se as condições não lhe agradassem.{{Sfn|Thompson|1991|p=433}} Em um incidente ocorrido em um mercado de Bristol, em 1823, uma mulher foi posta à venda e, não tendo recebido muitas ofertas, ela foi vendida por um valor mínimo para um jovem que se encontrava presente e aparentemente sentia pena da sua situação. Contudo, o jovem acabou por se arrepender de sua decisão, e decidiu revendê-la. A mulher se opôs ao novo comprador, alegando que ela só iria com ele se obrigada por um magistrado.{{Sfn|Drummond|2019}}
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| citado = true
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O preço acertado nas vendas de esposas variava de quantias escassas a quantias bastante altas, e bens e dinheiro eram envolvidos nas transações. O máximo registrado foi a quantia de 100cem libras mais 25 libras por cada um dos dois filhos negociados junto com a mãe, em uma venda de 1865, e, no outro oposto, existem registros de uma venda (tecnicamente, [[escambo]]) em [[Selby]], em 1862, por um copo de cerveja.{{Sfn|Thompson|1991|p=415}} A menor quantia de dinheiro trocado, de que se tem notícia, foi de três ''farthings'',''{{efn|O ''farthing'' foi uma [[moeda]] inglesa, e a [[Moeda (peça)|moeda]] de mais baixo valor durante a maior parte do período entre 1707 e 1960. Seu valor era 1/4 de um pêni ou 1/960 de uma libra.{{Sfn|Reuben|2019}}}}'' mas o preço usual parece ter sido entre dois xelins, seis pênis e cinco xelins.{{Sfn|Thompson|1991|p=415}}
 
O dinheiro parece ter sido uma consideração secundária em boa parte das ocorrências,{{Sfn|Mansell|Meteyard|Thomson|2004|p=88}} e de fato a troca de dinheiro durante a venda servia sobretudo para legitimar a transação.{{Sfn|Thompson|1991|p=423-424}} Contudo, esse nem sempre era o caso, e existem registros de vendas onde a questão do lucro do marido revelou-se importante. Em uma venda peculiar ocorrida em maio de 1837, o marido, um ferreiro, "primeiro vendeu [sua esposa] por um xelim, depois comprou-a de volta e a revendeu a um homem casado, por meia coroa".{{efn|A meia coroa era uma moeda inglesa e posteriormente britânica, introduzida em sua versão de [[prata]] em 1551, com valor de 2 xelins e 6 pênis.{{Sfn|Clayton|2016}}}}{{Sfn|Padgett|2016}}
 
Bens e objetos variados eram adicionados aos preços combinados, incluindo relógios, tabaco e roupas.{{Sfn|Thompson|1991|p=416}} Mas os relatos mais frequentes, a respeito da inclusão de bens como forma de pagamento, tratam de bebidas alcoólicas e animais. Por exemplo, em 1832 uma esposa em Carlisle foi vendida por 20vinte xelins e um cão [[Terra-nova (cão)|Terra-nova]];{{Sfn|Walton|2014}} e no caso de julho de 1815 a esposa foi vendida pelo alto valor de 50cinquenta guinéus e um cavalo de raça.{{Sfn|Drummond|2019}} Em [[Sussex]], os [[Pousada|''inns'']] e ''pubs'' eram locais regulares de venda de esposas, e com frequência o álcool fazia parte do pagamento.{{Sfn|Vaessen|2006|p=9}} Por exemplo, quando um homem vendeu sua esposa em Yapton, em 1898, o lhe comprador pagou sete xelins, seis pênis e um [[Quarto (volume)|quarto imperial]] de cerveja. Uma venda de um século antes, em [[Brighton]], envolveu "oito potes de cerveja" e sete xelins; e em Ninfield em 1790, um homem que trocou sua esposa por meio litro de [[gim]], mais tarde mudou de ideia e comprou-a de volta.{{Sfn|Collins|2007|p=65}}
 
Inversamente, mais mais raramente, outros bens podiam ser adicionados à venda da esposa, e nesse caso a transação aproximava-se ainda mais de uma venda ordinária de bens e afastava-se de um simples método para terminar um casamento. Essa modalidade de venda é exemplificada por um incidente reportado no ''Chelmsford Chronicle'' em 18 de julho de 1777, em que um jardineiro de [[Witham]] "vendeu sua esposa e seu filho, um galo e onze porcos, por seis guinéus, para um pedreiro da mesma localidade".{{Sfn|Thompson|1991|p=416}}
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Era comum que os envolvidos na venda acreditassem profundamente agir em acordo com a lei, e por vezes eles pagavam um advogado para redigir os recibos de venda, que eram guardados com zelo, da mesma maneira que casais preservam suas certidões de casamento.{{Sfn|Thompson|1991|p=416; 424}} Contudo, os efeitos práticos das vendas podiam deixar de existir, quando o caso levava a contestações na justiça. Por exemplo, uma esposa que fora vendida em 1835, depois que seu verdadeiro marido morreu alegou ter direito às propriedades que ele deixara. Os parentes do morto insistiram que a venda tinha sido válida e que ele morrera sem esposa, mas o juiz decidiu em favor desta, o que chocou os parentes do morto.{{Sfn|Walton|2014}}
 
Da mesma forma, embora pudesse ser socialmente aceito, esse substitutivo do divórcio nem sempre era permanente. Em 1826, um certo John Turton vendeu sua esposa Mary para William Kaye por cinco xelins. Porém, depois da morte de Kaye, ela voltou para o marido e o casal permaneceu junto pelos próximos 30trinta anos.{{Sfn|Pobjoy|1970|p=132}} Contrariamente, ele podia levar a consequências permanente mas também trágicas, como em um caso ocorrido em março de 1766, em que um carpinteiro de [[Southwark]] vendeu sua esposa "após uma briga em uma cervejaria". Uma vez sóbrio, o homem pediu à esposa que voltasse e, depois que ela se recusou, ele suicidou-se.{{Sfn|Hill|1994|p=216}}
== Distribuição do costume ==
As vendas se tornaram mais comuns em meados do {{séc|XX}}, inclusive como resultado de muitos maridos estarem no exterior, nas forças armadas, na marinha mercante ou sendo transportados para as [[Império Britânico|colônias]].{{Sfn|Wright|2004|p=171-172}} Na época, boa parte da população acreditava erroneamente que a ausência de um dos cônjuges por sete anos constituía automaticamente um divórcio, de modo que, quando o marido retornava depois desse tempo e descobria que a sua esposa tinha uma nova família, o dilema era resolvido com a venda de sua esposa no mercado local, normalmente diretamente ao seu novo companheiro.{{Sfn|Thompson|1991|p=443-444}}[[Ficheiro:French depiction of englishman wife selling.jpg|alt=Refer to caption|miniaturadaimagem|Uma representação francesa da personagem [[John Bull (personagem)|John Bull]] rumando para um mercado de Londres a fim de vender a sua esposa (c. 1848)|esquerda]]Samuel Pyeatt Menefee menciona 387 vendas documentadas, a última das quais ocorreu no início do {{séc|XX}}.{{Sfn|Stone|1990|p=145}} O historiador [[E. P. Thompson]] considerou muitos dos episódios contabilizados por Menefee "vagos e duvidosos", e que algumas contagens duplas haviam ocorrido. Contudo, ele concordou que cerca de 300trezentos relatos eram autênticos, o que, quando combinado com sua própria pesquisa, resultou em cerca de 400quatrocentos casos confirmados.{{Sfn|Thompson|1991|p=408}} Desses, aproximadamente 300trezentos ocorreram no período 1780 e 1850, um número pouco significativo em comparação com os episódios de abandono conjugal, que na [[era vitoriana]] contavam dezenas de milhares.{{Sfn|Stone|1990|p=147–148}} Como muitas vendas eram realizadas em privado, é muito provável que a maior parte delas jamais tenha sido noticiada. Com efeito, os poucos casos conhecidos geralmente foram notados porque os envolvidos se envolveram em algum procedimento judicial ou administrativo.{{Sfn|Thompson|1991|p=426}}
 
A venda de esposas parece ter sido difundida por toda a Inglaterra, mas relativamente rara no vizinho [[País de Gales]], onde apenas alguns casos foram constatados, e na [[Escócia]], onde se sabe de apenas um episódio.{{Sfn|Thompson|1991|p=409}} Embora frequentemente se afirmasse ser uma prática comum em toda a zona rural inglesa,{{efn|O reverendo e folclorista Sabine Baring-Gould dedicou um capítulo inteiro à venda de esposas em seu livro sobre o folclore do [[Devon|Devonshire]], retratando-a como um costume sobretudo rural. Quando criança, ele testemunhou um episódio em que um poeta, que morava em sua região, voltava do mercado com uma esposa recém-comprada. Confrontado pelo vigário e por outras autoridades locais, o poeta alegou que a venda havia sido realizada corretamente e portanto era legal e moralmente aceitável.{{Sfn|Baring-Gould|1908|p=58 e ss.}}}} o costume era particularmente difundido na região mais industrializada do norte da Inglaterra,{{Sfn|Padgett|2016}} mas em pequenas localidades, onde as relações sociais eram mais coesas e as normas sociais mais firmemente vigiadas.{{Sfn|Thompson|1991|p=444-446}} Como já se colocou, trata-se de um costume que surgiu em comunidades caracterizada pelo apego à tradição e pela veladura moral dos seus membros,{{Sfn|Thompson|1991|p=444}} e como sintoma das grandes transformações econômicas e sociais produzidas pela [[Revolução Industrial]].{{Sfn|Leeson|Boettke|Lemke|5=2014|p=372}}
 
O condado inglês com o maior número de casos entre 1760 e 1880 foi [[Yorkshire]], com 44 registros, consideravelmente mais do que os 19dezenove relatados em [[Middlesex]] e [[Londres]] durante o mesmo período.{{Sfn|Thompson|1991|p=409}} Apesar disso, parece ter existido uma crença difundida de que essa prática era particularmente popular em Londres,{{Sfn|Smith|1999|p=189}} e que é ilustrada por uma representação francesa da época que mostra a personagem [[John Bull (personagem)|John Bull]] no mercado de Smithfield gritando "''à'' ''quinze livres ma femme !''" [quinze libras pela minha mulher], enquanto sua esposa aguarda em um cercado.{{Sfn|Thompson|1991|p=409}}[[Ficheiro:Anne Wells, aka Duchess of Chandos (died 1759) by Joseph Highmore, in the Walker Art Gallery.jpg|miniaturadaimagem|Anne Wells foi comprada de seu marido pelo viúvo Henry Brydges, 2º Duque de Chandos (1746)|alt=]]
 
Até meados do {{séc|XX}} acreditava-se que a venda de esposas restringia-se aos níveis mais baixos da pirâmide social,{{Sfn|Thompson|1991|p=414-415}} especialmente àqueles que viviam em áreas rurais remotas.{{Sfn|Thompson|1991|p=411}} Contudo, uma análise das ocupações de maridos e compradores revela que o costume era mais forte em comunidades proto-industriais e não estava necessariamente ligado a classes sociais específicas. De 158 casos em que a ocupação dos maridos pôde ser estabelecida, 19dezenove trabalhavam com o comércio de gado ou transportes, 14quatorze trabalhavam na construção civil, cinco eram ferreiros, quatro eram limpadores de chaminés e dois eram descritos como "cavalheiros". Esses números sugerem que a venda de esposas não era um costume associado a ocupações urbanas ou rurais, mas sim a uma "cultura plebéia" que se chocava com novos padrões sociais.{{Sfn|Thompson|1991|p=415-416}} A prática foi registrada até mesmo dentre membros da nobreza, sendo o caso de maior destaque o de Henry Brydges, 2º Duque de Chandos, que por volta de 1740 teria comprado sua segunda esposa de um cavalariço.{{Sfn|Thompson|1991|p=414}}
 
Assim como os franceses viriam a condenar e satirizar amplamente as vendas de esposas, crendo-as triviais na Inglaterra,{{Sfn|Baring-Gould|1908|p=58-59}} também os norte-americanos criticavam o costume. Contudo, a sua situação era mais ambígua, pois existem relatos de práticas equivalentes sendo aplicadas às suas mulheres.{{Sfn|Drummond|2019}} Juntamente com outros costumes ingleses, aparentemente os colonos que chegaram à [[América do Norte Britânica|América do Norte]] durante o final do {{séc|XVII}} e início do {{séc|XVIII}} levaram consigo a prática da venda de esposas e a crença em sua legitimidade como forma de acabar com casamentos.{{Sfn|Drummond|2019}} Em 1645, os ''Records of the Particular Court'' de [[Hartford|Hartford, Connecticut]], relataram o caso de Baggett Egleston, que foi multado em 20vinte xelins por "entregar sua esposa para um jovem".{{Sfn|Ross III|295}} O ''Boston Evening-Post'' noticiou em 15 de março de 1736 uma discussão entre dois homens "e uma certa mulher, cada um alegando que ela era sua esposa, mas [...] um deles tinha disposto do seu direito sobre ela em benefício do outro, por quinze xelins". O comprador, aparentemente, não dispunha de recursos para pagar integralmente o preço combinado, e tentou devolver a esposa ao seu marido. O comprador acabou recebendo a quantia que faltava de dois generosos espectadores, e pagou ao marido, que prontamente recebeu o dinheiro e "saudou rapidamente a mulher, desejando-lhe bem", e, ao comprador, "muito alegria da sua compra".{{Sfn|Woodbury|1951|p=224–225}} Da mesma forma, uma notícia de 1781 registra que de William Collings, da [[Carolina do Sul]], vendeu sua esposa por "dois [[Dólar dos Estados Unidos|dólares]] e meia dúzia de tigelas de cerâmica".{{Sfn|Godbeer|2002|p=131}}
 
== Aceitação do costume ==
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==== Gradual desaparecimento ====
[[Imagem:Wife-seling-UK.png|miniaturadaimagem|Vendas documentadas de esposas, entre 1800 e 1859{{Sfn|Thompson|1991|p=411}}|alt=]]Thompson descobriu 121 relatos de vendas de esposas entre 1800 e 1840, em comparação com apenas 55 registros entre 1840 e 1880,{{Sfn|Thompson|1991|p=409}} e afirma que depois da década de 1850 a venda de esposas sobreviveu principalmente em setores da sociedade nos quais ainda resistia uma cultura pré-moderna.{{Sfn|Thompson|1991|p=455}} As vendas deixaram os mercados em busca da publicidade mais restrita oferecida pelos ''pubs'' e ''inns'', e gradualmente o uso do cabresto desapareceu.{{Sfn|Thompson|1991|p=455; 457}} No último caso conhecido em que o uso de um cabresto foi mencionado, ocorrido em um vilarejo próximo a Sheffield em 1889, um membro do [[Exército de Salvação]] havia vendida sua esposa a um amigo pelo valor de 1um xelim, e após a venda a havia levado por um cabresto até a casa de seu comprador, afim de realizar a entrega.{{Sfn|Thompson|1991|p=455}}
 
O costume de venda de esposas persistiu até as primeiras décadas do {{séc|XX}}, quando ainda ocorria ocasionalmente. A cidade de [[Leeds]] parece ter permanecido um reduto da prática de venda de esposas, pois abrigou alguns dos últimos casos conhecidos. Em um deles, relatado em 1913,{{Sfn|Padgett|2016}} uma mulher que testemunhou em um tribunal alegou que seu marido a havia vendido, a um de seus colegas, por 1uma libra. A maneira de sua venda não é registrada.{{Sfn|Thompson|1991|p=408–409}} No último episódio de que se tem conhecimento, reportado em 1926, um juiz ouviu o depoimento de um homem chamado Horace Clayton, de 40quarenta anos de idade, acusado de ter abandonado sua esposa e filhos em meados de 1919. Segundo Clayton, ele havia se mudado para Hull e passara a alugar um quarto na casa de uma família, e em 1925 seu [[senhorio]] lhe propusera vender a própria esposa pela soma de 10dez libras. Como parte do arranjo, esse homem enviava mensalmente 12doze xelins à sua ex-companheira, para o sustento do filho que tinham em comum. Como Clayton não fizera o mesmo por seus próprios filhos e pela esposa que deixara em Leeds, o juiz o condenou a 3três meses de prisão com [[trabalho forçado]].{{Sfn|The Times|1926|p=8, col. E}}
 
== Representações nas artes ==