Machado de Assis: diferenças entre revisões

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Em crônica de 19 de maio de 1888, na coluna "Bons dias!", seis dias depois, portanto, da Abolição, Machado se utiliza do discurso em primeira pessoa com ironia ácida para se passar por um senhor que "alforria" seu escravo, antes da própria lei e de qualquer um da elite; o escravizado, sem ter para onde ir, porque não fora feita uma distribuição de terras tal como setores populares do movimento abolicionista lutavam, acaba por continuar com o senhor, recebendo os mesmos mal tratos de sempre, só que agora com um mísero [[Trabalho assalariado|ordenado]], ou seja, o crítico Machado identifica contradições e dominações nestas transições todas: escravagismo para capitalismo, monarquia para república etc.<ref>Assis, Machado de. Obra Completa, Vol III. 3ª edição. José Aguilar, Rio de Janeiro. 1973. págs. 489 – 491.</ref>
[[Imagem:Machado-450.jpg|thumb|esquerda|Fotografia de Machado de Assis em cerca de 1896. Suas críticas sociais e visões políticas, ainda que reservadas, diante de uma época de grandes transformações nacionais e mundiais, podem ser investigadas basicamente em suas crônicas e na ficção.]]
Segundo conta o poeta [[Olavo Bilac]] numa de suas crônicas, relembrada por [[Alfredo Pujol]],<ref>Pujol, 2007, págs. 239-240.</ref> o grande romancista português e virulento antimonarquista<ref>Berrini, 1988, p. 155.</ref> [[Eça de Queiroz]], que, no inverno de [[1890]] abria sua casa em [[Paris]] para pequena reunião de brasileiros, não deixava uma noite passar sem pronunciar e discutir o nome de Machado de Assis; numa dessas tertúlias, nutrindo por ele enorme admiração, quis saber se Machado foi contra ou a favor a [[Proclamação da República no Brasil|Proclamação da República]] e seus efeitos, ao que Bilac e os demais presentes, embaraçados, não souberam o que responder, já que Machado mantinha-se reservadoː "Nem [[Domício da Gama]], nem os dois Prados, [[Paulo Prado|Paulo]] e [[Eduardo Prado|Eduardo]], nem eu [Bilac], podíamos por exemplo dizer ao grande escritor de ''[[Os Maias]]'' o que o autor das ''[[Memórias Póstumas de BrázBrás Cubas]]'' pensava da proclamação da República, da questão financeira, do problema da unidade ou pluralidade das emissões bancárias, da agitação revolucionária do Rio Grande do Sul, e das tendências nativistas da nova política brasileira. E a esta interrogação: 'Que pensa sobre isso o Machado?' — só podíamos replicar: 'O Machado não pensa nada sobre isso: o Machado escreve romances e contos!' Literariamente, a admiração de Eça pelo nosso amado mestre era intensa."<ref>Apud Matos, 2018.</ref><ref>Apud Gallo, 1989, p. 27.</ref>
 
De fato, apesar de determinadas crônicas já expostas, no âmbito da opinião política mais consistente considera-se a ficção de Machado, imediatamente voltada para seu tempo e realidade. Assim, de acordo com [[Josué Montello]], numa conclusão tardia, "Em vez de ser omisso, exprimia-se frequentemente por intermédio dos seres que ia criando no recurso de sua ficção. Um dia far-se-á a coleta das opiniões desses personagens, sobretudo considerando que eles refletiriam as contradições do Império e que levariam à proclamação da República, objeto também do registro de Machado de Assis".<ref>Montello, 1998, p. 125.</ref> Pelas crônicas machadianas, sabe-se que, se a "monarquia constitucional" era, na realidade, uma "absoluta [[oligarquia]]",<ref name="OligarquiaMonarquia" /> alguns aspectos da República trouxeram muitos desagrados a ele, porque o jornalismo começou a dar mais atenção às companhias [[capitalista]]s, aos bancos e à [[Bolsa de valores]] do que à arena parlamentar.<ref name="BosiSete">BOSI, 2004, p. 7.</ref> Neste breve período, o [[capitalismo]] brasileiro, mediado pelo Estado, "ensaiava temerariamente os primeiros passos no regime nascente", conforme escreve [[Raimundo Faoro]].<ref>FAORO, 1974, págs. 495- 505.</ref> Machado detestava o "vale-tudo do dinheiro pelo dinheiro", registra [[Alfredo Bosi]].<ref name="BosiSete" /> Em trecho de crônica de 09 de outubro de 1892, escreveu: "Prisões, que tenho eu com elas? Processos, que tenho eu com eles? Não dirijo companhia alguma, nem anônima, nem pseudônima; não fundei bancos, nem me disponho a fundá-los; e, de todas as coisas deste mundo e do outro, a que menos entendo, é o [[Sistema cambial|câmbio]]. (...) Finanças, finanças, são tudo finanças."<ref>Apud Bosi, 2004, p. 8.</ref>