Saúde pública: diferenças entre revisões

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[[Ficheiro:Rossio-CloseUp-1598.jpg|thumb|300px|Representação do século XVI do [[Real Hospital de Todos os Santos]], em Lisboa, Portugal.]]
 
Pode-se dizer que a ''saúde política'' e ''económica'' centra sua ação a partir da ótica do Estado com os interesses que ele representa nas distintas formas de organização social e política das populações, segundo o médico e político [[Rudolf Virchow]] (1821-1902), a política é “uma medicina em escala maior” .<ref>Acosta LMW. O fator político e econômico está no centro da discussão sobre o papel do setor saúde na redução das iniquidades [Internet]. Rio de Janeiro: Portal DSS Brasil; 2011 Out 21. Disponível em: http://cmdss2011.org/site/2011/10/o-papel-do-setor-saude-incluindo-programas-de-saude-publica-na-reducao-de-iniquidades-em-saude/ Acesso: Novembro de 2019</ref> Contudo alguns autores propõem que a "saúde pública" não deve ser confundida com o conceito mais amplo de saúde coletiva.
 
== Evolução do conceito ==
Uma das mais citadas definições de Saúde Pública foi apresentada pelo americano Charles-Edward Amory Winslow (1877–1957) fundador do Departamento de Saúde Pública da Universidade de Yale, em 1920:<blockquote>"''A arte e a ciência de prevenir a [[doença]], prolongar a [[vida]], promover a [[saúde]] e a eficiência física e mental mediante o esforço organizado da [[comunidade]]. Abrangendo o saneamento do meio, o controle das [[infecções]], a educação dos indivíduos nos princípios de higiene pessoal, a organização de serviços [[médico]]s e de [[enfermagem]] para o diagnóstico precoce e pronto tratamento das doenças e o desenvolvimento de uma estrutura social que assegure a cada indivíduo na sociedade um padrão de vida adequado à manutenção da saúde''". <ref>KEMPER, Steve. C-E.A. Winslow, who launched public health at Yale a century ago, still influential today. Yale News, june 2, 2015. [https://news.yale.edu/2015/06/02/public-health-giant-c-ea-winslow-who-launched-public-health-yale-century-ago-still-influe Yale University News] Aces. 09/03/2020</ref></blockquote>A persistência do uso dessa definição é reforçada pela ampla difusão da definição de saúde da [[Organização Mundial de Saúde]] - organização internacional que propôs a realização das Conferências Mundiais de Saúde com integração de todos os países na persistente busca do completo bem-estar físico, psíquico e social e não penas na ausência de doenças. <ref name="WHO constitution">[[World Health Organization]]. (2006). [http://www.who.int/governance/eb/who_constitution_en.pdf ''Constitution of the World Health Organization''] – ''Basic Documents'', Forty-fifth edition, Supplement, October 2006.</ref>
Uma das mais citadas definições de Saúde Pública foi apresentada pelo americano Charles-Edward Amory Winslow (1877–1957) fundador do Departamento de Saúde Pública da Universidade de Yale, em 1920:
 
"''A arte e a ciência de prevenir a [[doença]], prolongar a [[vida]], promover a [[saúde]] e a eficiência física e mental mediante o esforço organizado da [[comunidade]]. Abrangendo o saneamento do meio, o controle das [[infecções]], a educação dos indivíduos nos princípios de higiene pessoal, a organização de serviços [[médico]]s e de [[enfermagem]] para o diagnóstico precoce e pronto tratamento das doenças e o desenvolvimento de uma estrutura social que assegure a cada indivíduo na sociedade um padrão de vida adequado à manutenção da saúde''". <ref>KEMPER, Steve. C-E.A. Winslow, who launched public health at Yale a century ago, still influential today. Yale News, june 2, 2015. [https://news.yale.edu/2015/06/02/public-health-giant-c-ea-winslow-who-launched-public-health-yale-century-ago-still-influe Yale University News] Aces. 09/03/2020</ref>
 
A persistência do uso dessa definição é reforçada pela ampla difusão da definição de saúde da [[Organização Mundial de Saúde]] - organização internacional que propôs a realização das Conferências Mundiais de Saúde com integração de todos os países na persistente busca do completo bem-estar físico, psíquico e social e não penas na ausência de doenças. <ref name="WHO constitution">[[World Health Organization]]. (2006). [http://www.who.int/governance/eb/who_constitution_en.pdf ''Constitution of the World Health Organization''] – ''Basic Documents'', Forty-fifth edition, Supplement, October 2006.</ref>
 
=== Uma sucessão de conceitos & práticas ===
Segundo o brasileiro Jairnilsom PaimPaimː<ref>Paim, Jairnilsom Silva. ''Desafios para Saúde Coletiva no Século XXI''. Ba, UDUFBA, 2005.</ref> <blockquote>"''A Saúde Coletiva, latino-americana foi composta a partir da crítica à Medicina Preventiva, à Medicina Comunitária, à Medicina da Família, desenvolveu-se a partir da Medicina Social do [[Século XIX]] e pela saúde pública institucionalizada nos serviços de saúde e academia. Envolve um conjunto de práticas técnicas, ideológicas, políticas e econômicas desenvolvidas no âmbito acadêmico, nas organizações de saúde e em instituições de pesquisa vinculadas a diferentes correntes de pensamento resultantes de projetos de reforma em saúde.''"</blockquote>Ainda de acordo com ele, ao longo da história da medicina cosmopolita, o campo social da saúde tem sido atravessado por um conjunto de movimentos ideológicos como a Polícia Médica; Higiene; Saúde Pública; Medicina Social; Medicina Preventiva; Saúde Comunitária; Saúde Coletiva; Medicina Familiar entre outros. Tais movimentos constituem-se como lutas teórico-paradigmáticas, políticas e ideológicas com repercussões enquanto campo do saber e de práticas.<ref>Paim, Jairnilsom Silva. ''Política e Reforma Sanitária''. Ba, ISC, 2002.</ref>
 
Ainda de acordo com ele, ao longo da história da medicina cosmopolita, o campo social da saúde tem sido atravessado por um conjunto de movimentos ideológicos como a Polícia Médica; Higiene; Saúde Pública; Medicina Social; Medicina Preventiva; Saúde Comunitária; Saúde Coletiva; Medicina Familiar entre outros. Tais movimentos constituem-se como lutas teórico-paradigmáticas, políticas e ideológicas com repercussões enquanto campo do saber e de práticas.<ref>Paim, Jairnilsom Silva. ''Política e Reforma Sanitária''. Ba, ISC, 2002.</ref>
 
=== Medicina Social ===
<blockquote>"''Identificam-se três etapas para consolidação da medicina social, inclusive como disciplina do curso de formação médica: a Polícia Médica, especialmente desenvolvida na Alemanha no início do [[século XVIII]] a fim de prover o [[Estado]] sobre os índices de saúde da população alemã, a Medicina das Cidades ou Medicina Urbana, que tem como objetivo controlar os fatores nocivos à saúde da população urbana que estavam associados às grandes epidemias, evidenciada na [[França]], e, por fim, a Medicina da Força de Trabalho, consolidada no [[saneamento|sanitarismo]] inglês, que objetiva manter a sua força trabalhadora plenamente apta.''"<ref>Foucault, Michel. ''O nascimento da medicina Social in: Microfísica do Poder''. Organização e tradução de Roberto Machado. RJ, Graal, 1979.</ref></blockquote>Observe-se porém que as preocupações com o isolamento de doentes e assistência aos pobres confunde-se com os princípios da caridade e assistencialismo pregado pelos [[cristão]]s e [[muçulmano]]s, a exemplo: das discussões sobre a remuneração dos serviços médicos associada à realização de curas de [[Cosme e Damião]] os santos "anárgiros", ou seja, “aqueles que não são comprados por dinheiro"<ref>Núcleo de Apoio Ministerial. A Verdadeira História de Cosme e Damião.
[http://www.montesiao.pro.br/estudos/festaspagas/cosmedamiao.html Monte Sião] Acesso, novembro de 2015</ref> <ref>MÉIER, Gabriel. Cosmas and Damian, Saints. The Catholic Encyclopedia, 1914 (San Diego, Catholic Answers, 2007) [http://oce.catholic.com/index.php?title=Cosmas_and_Damian%2C_Saints HTML] {{Wayback|url=http://oce.catholic.com/index.php?title=Cosmas_and_Damian%2C_Saints |date=20151208060747 }} Aces. Nov. 2015</ref> <ref> KALIMNIOU, Dean. Medicine in the Byzantine Empire – part one/two Ethnic Publications Ltd [https://neoskosmos.com/en/11798/medicine-in-the-byzantine-empire-part-one/ Neos Kosmos Digital Edition 10 May 2012] ABN 13005 255 087 Aces. 09/03/2020</ref> (no que hoje é a [[Síria]], por volta do ano 300); a assistência médica prestada aos escravos e soldados romanos ([[valetudinário]]); ou ao nascimento das [[Santa Casa de Misericórdia|Santas Casas de Misericórdia]] em Portugal (1000) e hospitais religiosos.<ref>RIBEIRO, Herval Pina. O hospital: história e crise. SP: Corez, 1993 ISBN 85-249-0509-3</ref><ref>IVAMOTO, Henrique S.(Ed.). A Santa Casa da Misericórdia de Santos: sinopse histórica. Acta Medica Misericordiæ 1(1): 7-10, 1998 [http://www.actamedica.org.br/datafiles/documentos/A_Santa_Casa_da_Misericordia_de_Santos_-_sinopse_historica.pdf PDF] Aces. nov. 2015</ref> <ref>PETERS, S. The hospitalized legionnaire at the Rhine front at the outset of the Roman Principate. Wurzbg Medizinhist Mitt. 2010;29:158-93. [https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21563373 PUBMED] Aces. 09/03/2012</ref>
 
Observe-se porém que as preocupações com o isolamento de doentes e assistência aos pobres confunde-se com os princípios da caridade e assistencialismo pregado pelos [[cristão]]s e [[muçulmano]]s, a exemplo: das discussões sobre a remuneração dos serviços médicos associada à realização de curas de [[Cosme e Damião]] os santos "anárgiros", ou seja, “aqueles que não são comprados por dinheiro" <ref>Núcleo de Apoio Ministerial. A Verdadeira História de Cosme e Damião.
[http://www.montesiao.pro.br/estudos/festaspagas/cosmedamiao.html Monte Sião] Acesso, novembro de 2015</ref> <ref>MÉIER, Gabriel. Cosmas and Damian, Saints. The Catholic Encyclopedia, 1914 (San Diego, Catholic Answers, 2007) [http://oce.catholic.com/index.php?title=Cosmas_and_Damian%2C_Saints HTML] {{Wayback|url=http://oce.catholic.com/index.php?title=Cosmas_and_Damian%2C_Saints |date=20151208060747 }} Aces. Nov. 2015</ref> <ref> KALIMNIOU, Dean. Medicine in the Byzantine Empire – part one/two Ethnic Publications Ltd [https://neoskosmos.com/en/11798/medicine-in-the-byzantine-empire-part-one/ Neos Kosmos Digital Edition 10 May 2012] ABN 13005 255 087 Aces. 09/03/2020</ref> (no que hoje é a [[Síria]], por volta do ano 300); a assistência médica prestada aos escravos e soldados romanos ([[valetudinário]]); ou ao nascimento das [[Santa Casa de Misericórdia|Santas Casas de Misericórdia]] em Portugal (1000) e hospitais religiosos.<ref>RIBEIRO, Herval Pina. O hospital: história e crise. SP: Corez, 1993 ISBN 85-249-0509-3</ref><ref>IVAMOTO, Henrique S.(Ed.). A Santa Casa da Misericórdia de Santos: sinopse histórica. Acta Medica Misericordiæ 1(1): 7-10, 1998 [http://www.actamedica.org.br/datafiles/documentos/A_Santa_Casa_da_Misericordia_de_Santos_-_sinopse_historica.pdf PDF] Aces. nov. 2015</ref> <ref>PETERS, S. The hospitalized legionnaire at the Rhine front at the outset of the Roman Principate. Wurzbg Medizinhist Mitt. 2010;29:158-93. [https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21563373 PUBMED] Aces. 09/03/2012</ref>
 
=== Saúde Coletiva ===
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No início, "não havia nada" considerando-se o que poderia ter sido feito. A saúde no Brasil praticamente inexistiu nos tempos de [[Brasil Colônia|colônia]]. O modelo exploratório nem pensava nessas coisas. O [[pajé]], com suas [[erva]]s e [[canto]]s, a medicina dos [[jesuítas]] e os [[boticário]]s, que viajavam pelo Brasil Colônia, eram as únicas formas de assistência à saúde. Para se ter uma ideia, em 1789, havia no Rio de Janeiro apenas quatro médicos.
 
Além das enfermarias de cuidados dos jesuítas as únicas instituições que podemos destacar no vazio assistencial desse período é a criação das [[Santa Casa de Misericórdia|Santas Casas de Misericórdia]]. É controversa a data de criação da primeira Santa Casa no Brasil, para alguns autores teria sido a do porto de [[Santos]] fundada por [[Brás Cubas]] (1507-1592) em 1543 para outros teria sido a da Bahia ou de Olinda. <ref>Santos Filho. Pequena história da medicina brasileira. SP, Parma, 1980</ref>
 
Entre as descrições das patologias e medicamentos utilizados no [[Brasil Colônia]] destaca-se as contribuições do médico naturalista [[Guilherme Piso]] (1611-1678), que participou, como médico, de uma expedição nos anos 1637 - 1644 para o Brasil, com patrocínio do conde [[Maurício de Nassau]] (1604-1679) que administrou a conquista holandesa do nordeste do país entre 1637 e 1644. <ref>Pereira, Ruy dos Santos. Piso e a medicina indígena. PE, Instituto Arqueológico Histórico Pernambucano - UFPE, 1980</ref>. Observe-se a continuidade da catalogação de espécies de uso medicinal, já iniciada pelos jesuítas e outros viajantes, comparando o uso das espécies nativas às já conhecidas na farmacopeia europeia.
 
Com a chegada da família real portuguesa, em 1808, as necessidades da corte forçaram a criação das duas primeiras escolas de [[medicina]] do país: o [[Colégio Médico-Cirúrgico]] no [[Real Hospital Militar]] da Cidade de Salvador e a [[Escola de Medicina e Cirurgia|Escola de Cirurgia do Rio de Janeiro]]. E foram essas as únicas medidas governamentais até a [[República]]. <ref>Dicionário Histórico-Biográfico das Ciências da Saúde no Brasil (1832-1930). ESCOLA DE CIRURGIA DA BAHIA. Casa de Oswaldo Cruz / Fiocruz – (http://www.dichistoriasaude.coc.fiocruz.br)</ref>
 
Foi no primeiro governo de [[Rodrigues Alves]] (1902-1906) que houve a primeira medida sanitarista no país. O Rio de Janeiro não tinha nenhum saneamento básico e, assim, várias doenças graves como [[varíola]], [[malária]], [[febre amarela]] e até a [[peste bubônica]] espalhavam-se facilmente. O presidente então nomeou o médico [[Oswaldo Cruz]] para dar um jeito no problema. Numa ação policialesca, o sanitarista convocou 1. 500 pessoas para ações que invadiam as casas, queimavam roupas e colchões. Sem nenhum tipo de ação educativa, a população foi ficando cada vez mais indignada. E o auge do conflito foi a instituição de uma vacinação anti-varíola. A população saiu às ruas e iniciou a [[Revolta da Vacina]]. Oswaldo Cruz acabou afastado. <ref>Oswaldo Cruz. J. Bras. Patol. Med. Lab., Rio de Janeiro , v. 38, n. 2, p. 75, 2002 . Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1676-24442002000200001&lng=en&nrm=iso>. access on 15 Mar. 2020. https://doi.org/10.1590/S1676-24442002000200001.</ref> <ref>PORTO, Mayla Yara. Uma revolta popular contra a vacinação. Cienc. Cult., São Paulo , v. 55, n. 1, p. 53-54, Jan. 2003 . Available from <http://cienciaecultura.bvs.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0009-67252003000100032&lng=en&nrm=iso>. access on 15 Mar. 2020.</ref> <ref> Rio de Janeiro (Cidade). Secretaria Especial de Comunicação Social. 1904 - Revolta da Vacina. A maior batalha do Rio / Prefeitura
da Cidade do Rio de Janeiro.– A Secretaria, 2006. [http://www.rio.rj.gov.br/dlstatic/10112/4204434/4101424/memoria16.pdf PDF] aces. 15 Mar. 2020</ref>