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{{Ver desambig|a canção finlandesa|La dolce vita (canção)}}
{{Info/Filme
| título-or = La dolce vita
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| cor-pb = p&b
}}
'''''A Doce Vida'''''<ref>{{Citar web |url=https://www.adorocinema.com/filmes/filme-4459/ |titulo=A Doce Vida |acessodata=2021-07-27 |website=[[AdoroCinema]] |local=Brasil |lingua=pt-BR}}</ref><ref>{{Citar web |url=http://www.cinecartaz.publico.pt/Filme/19427_a-doce-vida |titulo=A Doce Vida |acessodata=2021-07-27 |website=Cinecartaz |publicado=[[Público (jornal)|Público]] |local=Portugal |lingua=pt}}</ref><ref name=estadão /> (no original em {{Ling|it}}: '''''La dolce vita'''''; {{AFI2|ˈla ˈdol.tʃe ˈviː.ta}}) é um [[filme]] [[França|franco]]-[[Itália|italiano]] de [[1960 no cinema|1960]], de gênero [[drama]] dirigido pelo cineastapor [[Federico Fellini]], sendo normalmente citado como a passagem para sua maturidade artística, o marco da transição de seus estilos, de uma representação poética do mundo real, tipicamente [[neorrealismoNeorrealismo italiano|neorrealismoneorrealista]], para oa [[simbolismo]]criação subjetiva de um mundo espetacular baseado em sonhos, imaginação e memória.<ref name=":3">{{citar livro|título=The Films of Federico Fellini|ultimo=Bondanella|primeiro=Peter|editora=Cambridge University Press|ano=2002|local=Cambridge|página=92}}</ref> É um dos filmes mais importantes da [[década de 1960]] e do [[século XX]]. Uma das características capitais da obra é a imagem em [[Filme monocromático|preto-e-branco]], e as sequências noturnas realçando um laço com o cinema ''[[Film noir|noir]]'' e com o [[expressionismo alemão]], apresentando um cenário festivo, e em algumas vezes com altos contrastes de luz e sombra.<ref>{{citar web |url= http://www.aratuonline.com.br/amandaaouad/tag/festival/ |título= E o Cinema Noir? |acessodata= 24 de agosto de 2015 |autor= |data= |obra= Aratu Online |publicado= |língua= português |citação= |arquivourl= https://web.archive.org/web/20150904180426/http://www.aratuonline.com.br/amandaaouad/tag/festival/ |arquivodata= 2015-09-04 |urlmorta= yes }}</ref>
 
É considerado uma das obras-primas de Federico Fellini, juntamente com ''[[8½]]'' e ''[[Amarcord]]''. O filme é uma crítica aberta à sociedade romana do pós-guerra, retratando uma instituição decadente e [[hedonismo|hedonista]], marcada pela [[Superfície|superficialidade]] e [[comunicação|incomunicabilidade]], temas desenvolvidos ao longo do filme.<ref name=estadão>{{citar web |url= http://cultura.estadao.com.br/noticias/cinema,a-doce-vida--classico-de-fellini--estreia-em-copia-restaurada,1747275 |título= De volta em cópia restaurada, 'A Doce Vida' mostra a imagem chocante da decadência |acessodata= 24 de agosto de 2015 |autor= Luiz Zanin Oricchio |data= 20 de agosto de 2015 |obra= Estadão |publicado= |língua= português |citação= }}</ref>
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== Sinopse ==
[[Ficheiro:Dolce vita1.gif|thumb|esquerda|Famosa cena em que [[Marcello Mastroianni]] e [[Anita Ekberg]] se banham na [[Fontana di Trevi]] em reprodução.]]Marcello Rubini é um [[escritor]] frustrado que trabalha como [[colunista social]].<ref>{{Citar web |url=https://www.filmsite.org/dolcevita.html |titulo=La Dolce Vita (1960) |acessodata=2021-07-08 |website=www.filmsite.org}}</ref> À procura de fofocas, passa muito de suas noites na [[Via Veneto]], centro das casas noturnas e da farra pós-balada na [[Roma]] dos anos 1950, ponto de encontro de políticos, astros de cinema, gângsteres, artistas, prostitutas e aristocratas decadentes, todos vivendo em uma boemia que se convencionou chamar de "a doce vida".<ref name=":1">{{citar livro|título=O Livro do Cinema|editora=Globo Livros|ano=2016|local=São Paulo|páginas=162-164}}</ref> Seu trabalho o coloca em contato com algumas personalidades da capital italiana, principalmente mulheres, como a herdeira Maddalena e a atriz [[Hollywood|hollywoodiana]] Sylvia Rank, com quem se envolve, apesar de ter Emma, sua noiva ciumenta e melodramática, o esperando em casa. Imerso nesse modo de vida hedonístico, Marcello, infeliz, pondera se uma vida como a de seu amigo Steiner, escritor e pai de família, não seria melhor.<ref>{{Citar web |url=https://www.imdb.com/title/tt0053779/ |titulo=The Sweet Life (1960) |acessodata=2021-07-08 |website=IMDb |lingua=en-US}}</ref> Ao longo de sete noites, ele busca alguma felicidade. Quase a encontra, mas sempre a vê escapar ao amanhecer.<ref name=":1" />
O filme passa-se em [[Roma]] e conta a história de Marcello Rubini, um [[Jornalismo|jornalista]] especializado em histórias sensacionalistas sobre estrelas de cinema, visões religiosas e a aristocracia decadente, que passa a cobrir a visita da atriz [[hollywood]]iana Sylvia Rank, por quem fica fascinado.
[[Ficheiro:Dolce vita1.gif|thumb|esquerda|Famosa cena em que [[Marcello Mastroianni]] e [[Anita Ekberg]] se banham na [[Fontana di Trevi]] em reprodução.]]
 
Através dos olhos deste personagem, Fellini mostra uma Roma moderna, sofisticada, mas decadente, com os sinais da influência [[Povo dos Estados Unidos|norte-americana]]. O repórter é um homem sem compromisso, que se relaciona com várias mulheres: a amante ciumenta, a mulher sofisticada em busca de aventura, e a atriz de Hollywood, com a qual passeia por Roma, culminando no ponto alto do filme, a famosa sequência da [[Fontana di Trevi]].
 
Outra sequência famosa do filme é a da abertura, na qual o jornalista, num [[helicóptero]] que transporta uma estátua de [[Jesus]] até o [[Vaticano]], encontra uma mulher tomando sol numa cobertura e pergunta pelo seu número de telefone. O barulho dos motores impede que ambos possam se entender. A temática da falta de comunicação se repete ao longo de todo o filme.
 
Dentre os momentos mais importantes do filme, está aquele na qual duas meninas atraem uma multidão, ao fingirem ver uma aparição da [[Maria (mãe de Jesus)|Virgem Maria]] nos subúrbios de Roma; e quando o personagem Steiner, um intelectual e colega de Marcello, que vive com a sua família numa aparente harmonia, comete o [[assassínio|assassinato]] dos seus próprios filhos (um casal de crianças) e se [[Suicídio|suicida]] em seguida. Após a morte de Steiner, Marcello embarca numa vida de orgias e, numa destas ocasiões, pela manhã, caminha pela [[praia]] em busca de um monstro marítimo morto, o final simbólico do filme.
 
== Elenco ==
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* Alain Dijon — Frankie Stout
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== Produção ==
[[Ficheiro:Aiche_nana_1958_rugantino_spogliarello.jpg|miniaturadaimagem|240x240px|Fotografia de Tazio Secchiaroli do [[Striptease|strip-tease]] de Aichè Nanà, inspiração para um dos episódios finais do filme.]]
 
=== Concepção ===
A ideia inicial para A Doce Vida surgiu da retomada por Fellini e seus roteiristas de um antigo projeto que pretendia dar continuidade à estória de [[I vitelloni|Os Boas Vidas]]. O projeto denominado "Moraldo na Cidade", que retrataria o choque do jovem de interior em Roma, foi transformado para abandonar sua atmosfera provinciana e refletir as diversas transformações que ocorriam na sociedade italiana do período.<ref>{{citar livro|título=The Cinema of Federico Fellini|ultimo=Bondanella|primeiro=Peter|editora=Princeton University Press|ano=1992|local=Princeton|página=92}}</ref> A partir de então, o roteiro foi baseado nos tabloides sensacionalistas que à época registravam a vida da aristocracia e das celebridades estadunidenses e europeias que circulavam em torno da famigerada Via Veneto, centro da boemia romana a partir do final da década de 50.<ref name=":32">{{citar livro|título=The Films of Federico Fellini|ultimo=Bondanella|primeiro=Peter|editora=Cambridge University Press|ano=2002|local=Cambridge|página=92}}</ref> Para tal Fellini, passou vários meses com jornalistas de fofoca como Pierluigi Praturlon e Tazio Secchiaroli, explorando o mundo noturno da Via Veneto. Vários episódios também foram diretamente baseados em manchetes da época: a fotografia de Pierluigi Praturlon de 1957 em que Anita Ekberg caminha dentro da Fontana di Trevi, por exemplo, inspirou a famosa sequência em que Marcello adentra a fonte junto de Sylvia. Outro caso foi quando Secchiaroli foi, em uma noite de 1958, agredido duas vezes seguidas, uma delas por [[Anthony Franciosa]], que estava acompanhado de [[Ava Gardner]], o que serviu de inspiração para a cena em que Marcello é atacado pelo namorado de Sylvia. No mesmo ano ainda, a dançarina turca Aichè Nanà fez um strip-tease no restaurante Il Rugantino, evento referenciado pelo strip-tease de Nadia na famosa cena da "orgia".<ref>{{citar livro|título=The Cinema of Federico Fellini|ultimo=Bondanella|primeiro=Peter|editora=Princeton University Press|ano=1992|local=Princeton|página=146}}</ref> Além disso, um episódio muito conhecido iria influenciar a atmosfera geral do filme: o suposto assassinato de Wilma Montesi, que levaria a uma escandalosa cobertura jornalística, o que relacionou o caso ao mundo "hedonista" da Itália pós-guerra. A cena final em que o cadáver de uma criatura marítima é encontrada na praia é possivelmente uma referência às condições em que o corpo de Wilma foi encontrado.<ref>{{citar livro|título=O Livro do Cinema|editora=Globo Livros|ano=2017|local=São Paulo|página=162}}</ref>
[[Ficheiro:Via_Veneto_—_La_dolce_vita_—_Cinecittà.jpg|miniaturadaimagem|360x360px|A Via Veneto de Roma reconstruída nos estúdios da [[Cinecittà]], para a realização de La Dolce Vita, em 1959.]]
 
=== Filmagem ===
O filme contou com um orçamento de 600 milhões de liras, relativamente alto para a época. Além das grandes proporções do filme, que contava com quase 3 horas e inúmeras cenas repletas de figurantes, o grande orçamento se deveu também à decisão de Fellini de construir a maior parte dos cenários no lugar de buscar locações, para o que ele sacrificou parte de seus ganhos posteriores.<ref name=":2">{{citar livro|título=The Films of Federico Fellini|ultimo=Bondanella|primeiro=Peter|editora=Cambridge University Press|ano=2002|local=Cambridge|página=65}}</ref> Foram criados mais de 80 cenários pelo diretor de arte Piero Gherardi a partir de esboços do próprio Fellini. Entre eles, uma recriação completa da Via Veneto em estúdio, alargada, modificada e aplainada.<ref>{{citar livro|título=The Cinema of Federico Fellini|ultimo=Bondanella|primeiro=Peter|editora=Princeton University Press|ano=1992|local=Princeton|páginas=148-150}}</ref>
 
Contrariando o uso corrente de lentes de 50mm para tracking shots e panorâmicas em filmes [[CinemaScope|cinemascope]], Fellini sugeriu ao diretor de fotografia Otello Martelli o uso de lentes [[Teleobjetiva|teleobjetivas]], o que, segundo Martelli, além de uma solução técnica, contribuiu para um visual particular em que as figuras se destacam de um fundo levemente distorcido.<ref>{{citar livro|título=The Cinema of Federico Fellini|ultimo=Bondanella|primeiro=Peter|editora=Princeton University Press|ano=1995|local=Princeton|página=151}}</ref>
 
Apesar da grandiosidade da produção, o ambiente no set era caótico, com alterações sendo feitas diariamente por Fellini e pelos demais roteiristas, exigindo modificações em cima da hora nos cenários, objetos de cena e figurinos.<ref>{{citar livro|título=The Cinema of Federico Fellini|ultimo=Bondanella|primeiro=Peter|editora=Princeton University Press|ano=1992|local=Princeton|páginas=152-153}}</ref>
 
== Recepção ==
Igualmente polêmico e consagrado, o filme contou com um grande público, que o levou a acumular 2,2 bilhões de liras (quase 4 vezes o seu orçamento) nos seus primeiros anos de exibição.<ref name=":22">{{citar livro|título=The Films of Federico Fellini|ultimo=Bondanella|primeiro=Peter|editora=Cambridge University Press|ano=2002|local=Cambridge|página=65}}</ref> O sucesso foi o suficiente para que o personagem interpretado por Walter Santesso, Paparazzo, levasse à assimilação do termo ''[[Paparazzo|paparazzi]]'' para designar fotógrafos insistentes que perseguem os famosos. <ref>{{citar livro|título=Tudo Sobre Cinema|ultimo=Kemp|primeiro=Philip|editora=Editora Sextante|ano=2011|local=Rio de Janeiro|página=304}}</ref>
 
A divisão gerada pelo filme se deu principalmente no âmbito ideológico, levando vários grupos conservadores ligados ao catolicismo a condená-lo. Apesar do [[papa João XXIII]] ter aprovado o roteiro, após suas primeiras exibições, o [[Vaticano]], a [[Ação Católica]] italiana e o [[Alfredo Ottaviani|cardeal Ottaviani]] moveram diversas petições ao parlamento italiano exigindo sua censura. Apesar da pressão a proibição foi negada pelo secretário de Estado dos Espetáculos.<ref>{{citar livro|título=Fellini Visionário|ultimo=Calil|primeiro=Carlos Augusto|editora=Companhia das Letras|ano=1994|local=São Paulo|página=85}}</ref> O jornal de tendência neofacista ''Il Secolo d'Italia'' também repudiou o filme, publicando que se recusaria a escrever qualquer crítica devido ao caráter "ignóbil" e "bolchevista" do filme.<ref>{{citar livro|título=Fellini Visionário|ultimo=Calil|primeiro=Carlos Augusto (org.)|editora=Companhia das Letras|ano=1994|local=São Paulo|página=89}}</ref>
 
Por outro lado, houve forte aceitação do filme pela crítica de esquerda, que o viu como um retrato crítico da burguesia decadente e corrupta. A aceitação por essa seção da crítica foi algo quase inédito para Fellini, que era muito criticado até esse momento pelo caráter "católico" e "individualista" de seus filmes.<ref>{{citar livro|título=The Films of Federico Fellini|ultimo=Bondanella|primeiro=Peter|editora=Cambridge University Press|ano=2002|local=Cambridge|página=67}}</ref> Contrariando a crítica conservadora, o cineasta marxista e católico Pier Paolo Pasolini - também co-roteirista de A Doce Vida - iria categorizá-lo como o mais absoluto produto do catolicismo pelo fato de encarar seus personagens não como um juiz, mas como um cúmplice. Segundo Pasolini, as imagens cheias de vida superariam qualquer senso de corrupção ou futilidade.<ref>{{citar livro|título=The Films os Federico Fellini|ultimo=Bondanella|primeiro=Peter|editora=Cambridge University Press|ano=2002|local=Cambridge|páginas=70-71}}</ref>
 
Apesar da polêmica, Fellini, em uma entrevista publicada em Schermi em março de 1960, apresentaria uma visão positiva da reação engajada ao seu filme:<blockquote>Senti uma participação bem atenta, que foi além do esforço de interpretar, de entender, além dos valores estéticos do filme. Desta vez houve em torno do meu trabalho uma atenção humana realmente extraordinária.<ref>{{citar livro|título=Fellini Visionário|ultimo=Calil|primeiro=Carlos Augusto|editora=Companhia das Letras|ano=1995|local=São Paulo|páginas=89-90}}</ref></blockquote>
 
== Principais prêmios e indicações ==