Nota: Para outros significados, veja Homa.

HOMA (em sigla originária da inglês para a expressão Homeostatic Model Assessment, equivalente em português a Modelo de Avaliação da Homeostase) é um método utilizado para quantificar a resistência à insulina e a função das células beta do pâncreas. O conceito foi estabelecido por Robert Turner e Rury Holman (1976)[1]; em 1979 foi publicado um modelo baseado nestas hipóteses. Matthews et al (1985) posteriormente publicaram um modelo expandido e mais completo que foi denominado HOMA. Em 1998, Jonathan Levy et al publicaram um modelo atualizado do HOMA, designado HOMA2.

Derivação das equações editar

Os autores do HOMA utilizaram dados oriundos de estudos fisiológicos para desenvolver equações matemáticas de correlação, capazes de descrever a regulação da glicemia como um ciclo de feedback[2]

Construção do modelo editar

O modelo HOMA foi originalmente desenvolvido como um caso especial de um modelo mais genérico denominado HOMA-CIGMA[3]

HOMA1: as equações editar

  • No modelo "HOMA1", a equação aproximada para a resistência à insulina utilizava uma amostra de sangue com o paciente em jejum (derivada com as premissas de indivíduos normais antes de 35 anos, peso normal, tendo 100% função das células β uma resistência à insulina unitária) é:
   
Glicemia em unidades molares mmol/l Glicemia em unidades mássicas mg/dl

Nessa equação, a glicemia é dada em milimoles por litro (mmol/l) e a insulinemia, em microunidades por mililitro (μU/ml); deve-se utilizar o valor da constante igual a 405 em lugar de 22,5, no caso de a glicemia ser apresentada em miligramas por decilitro (mg/dl).

  • Para a atividade de células beta do pâncreas, a equação proposta é:
   
Glicemia em unidades molares mmol/l Glicemia em unidades mássicas mg/dl

Nessa equação, a insulinemia é dada em microunidades por litro (μU/l) e a glicemia, em milimoles por litro (mmol/l); o valor da glicemia deve ser dividido por 18 quando se utiliza a unidade miligrama por decilitro (mg/dl).

Os autores testaram o HOMA extensivamente contra outras medidas de resistência à insulina (ou sua recíproca, sensibilidade à insulina) e função das células beta[4][5][6]. Este modelo apresentava uma boa correlação com as estimativas realizadas utilizando-se o método do clamp euglicêmico (r = 0.88). Entretanto, já nesta versão os autores recomendavam o uso do software (disponível gratiutamente para uso educativo) de preferência ao cálculo através das fórmulas[7].

HOMA2: o diferencial editar

No modelo "HOMA2", considera-se melhor a captação hepática e periférica de glicose e permite utilizar níveis tanto de dosagens insulina específica como do Peptídio C para os cálculos, em alternativa à dosagem da insulina total (RIA). Caso sejam possíveis a dosagem tanto do Peptídio C como da insulina, recomenda-se o uso do Peptídio C (marcador de secreção) para calcular a função secretora das células beta e da insulinemia, com o fim de obter a sensibilidade à insulina. Entretanto, na prática, a insulinemia e a glicemia têm sido utilizadas para obtenção de ambos os resultados, uma vez que a dosagem do Peptídio C incrementa o custo do procedimento.

Características do modelo editar

As curvas do HOMA são classificadas como modelos paradigmáticos - opondo-se ao modelo mínimo[8], e ao de outros testes como o clamp euglicêmico, clamp hiperglicêmico, Continuous Infusion of Glucose with Model Assessment (CIGMA --- Infusão contínua de glicose com avaliação de modelo) e Insulin Sensitivity Index (ISI --- Índice de Sensibilidade à insulina) --- os quais se baseiam na medida dinâmica das respostas insulínica e/ou glicêmica após estímulo[9]. Estes últimos utilizam dados individuais e dinâmicos, através de equações ajustáveis a curvas, e determinando uma solução matemática ótima (vale dizer, é necessária computação individualizada para cada conjunto de dados). São teoricamente mais sensíveis, contudo são também mais invasivos e trabalhosos. Já o modelo paradigmático utilizado pelo estudo do HOMA é baseado na computação de uma estrutura fisiológica, ajustada às normas da população; medem basicamente a sensibilidade hepática à insulina, estimam a sensibilidade periférica em função da mesma e inferem as medidas dos níveis de resistência à insulina e atividade ds células beta a partir do ajuste dos dados individuais ao modelo produzido pela análise populacional[9]. Isto quer dizer que dados individuais podem ser utilizados para produzir estimativas de função das células beta e da sensibilidade à insulina em condições estáticas, sem o uso de computação adicional.
Dessa maneira, o modelo HOMA é derivado da avaliação matemática da interação entre a função de células beta e resistência à insulina em um modelo idealizado (inserido nas fórmulas ou no software), o qual é utilizado para se computar as concentrações estáticas de insulina e glicose. Os dados de saída são calibrados de maneira a fornecer a função de células beta normal de 100% e uma resistência à insulina normal de 1. Uma vez calculada esta inter-relação, torna-se possível estimar a função de células beta e resistência periférica a partir de qualquer par de valores de glicose e insulina plasmática, sem que seja necessário realimentar os dados. Este estudo é de realização mais simples e barata, principalmente quando se trata de estudos coletivos.

Calculadora de HOMA editar

Desde 2004, a Universidade de Oxford disponibiliza ao público, para uso não comercial, um programa (software) capaz de calcular o HOMA, designado HOMA Calculator[1]. Essa "calculadora" é de instalação simples e tem como entradas os resultados de:

  • Glicose plasmática: 3,5 a 25,0 mmol/l ou 54 a 450 mg/dl;
  • Insulilna plasmática: 20 a 400 pmol/l;
  • Insulina específica plasmática: 20 a 300 pmol/l;
  • C-peptídio plasmático: 0,2 a 3,5;

A calculadora informatizada oferece os resultados de:

  • %B - estimativa da função de células Beta do pâncreas;
  • %S = IR - estimativa da sensibilidade (resistência) à Insulina.

Tais estimativas são calculadas como percentagem de uma população normal de referência e uma IR normal de 1. Estes valores correlacionam bem com as estimativas derivadas de modelos estimulatórios como o de resistência hiperinsulinêmico, resistência hiperglicêmico, teste de tolerância intravenosa à insulina, e teste oral de tolerância à glicose[1].

Os autores recomendam que apenas valores realísticos (de acordo com o expresso acima) ordinariamente observados em situações clínicas sejam utilizados. Fora destes limites, os resultados devem ser tratados com cautela, uma vez que não refletem uma condição clínica estável.

Bases fisiológicas editar

Foram considerados dados como a produção basal de glicose, o nível glicêmico, a meia-vida de decaimento da insulina. A relação entre glicemia e insulinemia no estado basal reflete o balanço entre o débito hepático de glicose e a secreção insulínica, o qual é mantido por um mecanismo de realimentação (feedback) entre o fígado e as células beta. As predições utilizadas neste modelo derivam de dados experimentais realizados em humanos e animais.

Dados oriundos de determinações experimentais realizadas em 30 pacientes com Diabetes Tipo 2 tratado com dieta mostram uma correlação quase perfeita entre os dados de %B e %S oriundos do HOMA2 computados a partir da média de três amostras basais, coletadas a intervalos de cinco minutos, e da realização de uma amostra basal única (r= 0,99, p<0.0001)[7]. Entretanto, o uso de uma amostra única resultou em uma variação intra-individual (CV) de 10,3% para a %S e 37,5% para a %B --- comparado com 5,8% e 4,4% quando se utilizam três amostras. Assim, a coleta de três amostras, intervaladas de 5 minutos, é preferível à coleta de apenas uma amostra. Isto se explica porque a secreção de insulina se dá em um padrão pulsátil e não contínuo.

Validação e uso editar

O HOMA foi comparado com diversos métodos validados utilizados para se mensurar a resistência à insulina e a função de células beta --- incluindo o clamp euglicêmico e o clamp hiperglicêmico (considerados golden standards) e o modelo mínimo. Tem sido utilizado para avaliar mudanças longitudinais na função das células beta do pâncreas e na resistência à insulina em pacientes com Diabetes, de maneira a se examinar a história natural do Diabetes e avaliar efeitos da terapêutica[10], bem como em estudos epidemiológicos. Em estudos na população normal, tem sido utilizado para efetuar comparações com a função de células beta e sensibilidade à insulina em pacientes normais e naqueles com tolerância anormal à glicose, bem como na coleta de dados relativos a pacientes que posteriormente desenvolvem intolerância à glicose[8]. Ao utilizar o modelo para estudos individuais, recomenda-se o uso de amostras de insulinemia em triplicata. Nestes casos, pode ser utilizado para detectar mudanças longitudinais na função de células beta e na resistência à insulina, bem como para determinar se existe um predomínio da redução da sensibilidade à insulina ou da insuficiência de células beta[8].

Precauções e usos indevidos editar

  • O uso do HOMA em estudos que visam realizar comparações inter-culturais, requer cuidados especiais. Nessas circunstâncias, é necessário primeiro determinar a %S de base em cada grupo comparativo, de maneira a se determinar se a diferença em sensibilidade à insulina representa apenas uma diferença na linha de base[8].
  • Em pacientes sob uso de insulina, sua utilização para determinação da sensibilidade à insulina deve ser realizada apenas em situações clínicas em que a glicose e a concentração de insulina se encontram em uma condição estável. Nestes pacientes, o estudo necessita de validação adicional, em função das particularidades da administração da insulina exógena, e os resultados devem ser interpretados com cautela. Para determinação de atividade de células beta, o método não foi validado[8].
  • Em pacientes sob uso de estimulantes de secreção insulínica, deve ser interpretado com cautela: o aumento da função de células beta observado no primeiro ano de uso, por exemplo, reflete apenas o mecanismo secretagogo do medicamento, observando-se que há um declínio subsequente, o que demonstra que o tratamento em si não resulta melhora da insuficiência de células beta[8]..
  • Seu uso para determinação apenas na avaliação isolada de função de células beta (sem considerar os valores concomitantes de sensibilidade à insulina) pode levar a erros de avaliação, sendo considerado inapropriado[8].
  • Para a classificação individual dos resultados de pacientes, observa-se uma dificuldade no estabelecimento de um ponto de corte dos valores, que sofre a influência de dois fatores básicos: as diferenças populacionais e as dificuldades de padronização das condições de realização das medidas de insulina e glicose[9].
  • Outra dificuldade é representada pelo grau de especificidade analítica do ensaio para a medida da insulilnemia, sendo recomendados os ensaios mais específicos[9].

Notas e referências

Notas

Referências

  1. a b c Diabetes Trial Unit - The Oxford Centre for Diabetes, endocrinology & Metabolism. HOMA Calculator. Acessado em 12/05/2008
  2. TURNER et al. (1979)
  3. TURNER et al. (1993) Measurement of insulin resistance and beta-cell function: the HOMA and CIGMA approach. Current topics in diabetes research (eds) F. Belfiore, R. Bergman and G. Molinatti Front Diabetes. Basel, Karger 12: 66-75
  4. WALLACE. Studies
  5. HERMANS et al. (1999b) Comparison of insulin sensitivity tests across a range of glucose tolerance from normal to diabetes Diabetologia 42: 678–87
  6. HERMANS et al. (1999) Comparison of tests of β-cell function across a range of glucose tolerance from normal to diabetes. Diabetes 48: 1770-86
  7. a b LEVY, J.C., MATTHEWS, D.R., HERMANS, M.P. Correct Homeostasis Model Assessment (HOMA) Evaluation Uses the Computer Program (Letter). Diabetes Care, v. 21, n.12, p. 2191 - 2192, 1998, December 1998
  8. a b c d e f g WALLACE, T.M, LEVY, J.C, MATTHEWS, D.R. Use and Abuse of HOMA Modeling. Diabetes Care, v.27, n.6, p. 1486 - 1495, June 2004>
  9. a b c d OLIVEIRA, E. P., SOUZA, M. L. A. S., LIMA< M. D. A. Índice HOMA (Homeostasis model assessment) na prática clínica: uma revisão. J Bras, Patol. Med. Lab, v. 41, n.4, p. 237-43, Agosto 2005.
  10. UKPDS Group: U.K. Prospective Diabetes Study 16. Overview of 6 years’ therapy of type II diabetes: a progressive disease. Diabetes , v. 44, n. 11, p.1249-1258, November 1995.

Ver também editar

Ligações externas editar