A histerese é a tendência de um sistema de conservar suas propriedades na ausência de um estímulo que as gerou, ou ainda, é a capacidade de preservar uma deformação efetuada por um estímulo. Podem-se encontrar diferentes manifestações desse fenômeno. A histerese mais conhecida ocorre no magnetismo[1], mas também pode ocorrer em diversas áreas como mecânica clássica[2], tráfego[3], biologia[4], epidemiologia[5] entre outras[6][7]. A palavra "histerese" deriva do grego antigo υστέρησις, que significa 'retardo', que foi cunhada por James Alfred Ewing em 1890.

Saturação magnética editar

Quando um campo magnético   (ampere-espira por metro) é aplicado a um material ferromagnético, passa a circular neste uma densidade de fluxo magnética (ou indução magnética)   (tesla = weber por metro quadrado). A relação entre densidade de fluxo e campo magnético é dada pela expressão  [8].

Para uma geometria fixa, como o caso de uma bobina com núcleo fixo ou transformador, uma variação do campo magnético   é dada por uma variação na corrente da bobina que está sendo alimentada. Quanto maior a corrente  , maior o campo magnético  [9].

Na região magnética linear   com   constante (e da ordem de   ou mais), contudo, à medida que o campo magnético cresce, o material entra em uma região não linear (saturação magnética), onde   passa a diminuir à medida que a saturação cresce.

Inconveniente da saturação editar

Quando atingida a saturação o transformador, mesmo a vazio, passa a demandar correntes maiores para manter o fluxo magnético imposto pela tensão. A relação entre fluxo magnético e tensão induzida é dada pela Lei de Faraday[10]. Uma das formas de expressá-la é por  , onde   é o fluxo magnético,   é o tempo ,   o número de espiras e   é a tensão induzida. Para simplificar a análise (e sem prejuízo de conceitos) consideraremos a tensão induzida no primário igual a tensão aplicada pela fonte.

Imaginando uma tensão de entrada sinusoidal  , o fluxo demandado pelo núcleo do transformador será dado por  , ou seja, o fluxo é diretamente proporcional a tensão e a frequência de entrada. Trabalhando mais um pouco, pode-se chegar a expressão que o fluxo de pico de um sinal sinusoidal é dado por  , onde   é a frequência em hertz.

A densidade de fluxo que atenda ao fluxo demandado é dada pela relação  , onde   é a área da secção transversal à passagem do fluxo magnético[10]. Associada a densidade de fluxo magnético está o campo magnético   que o gera, dado por  . Perceba que com a redução da permeabilidade (na saturação), um maior campo magnético muito maior é demandado, e este, por fim, está associado à corrente elétrica   que o gera, que por consequência, pode aumentar para valores muito acima dos nominais, mesmo com o transformador a vazio.

Para evitar este inconveniente deve-se trabalhar com valores baixos de saturação, limitando a tensão aplicada, aumentando a área de ferro ou aumentando a qualidade dos materiais.

Histerese magnética editar

 
Laço de Histerese.
  1. Aumenta-se a densidade de fluxo magnética (ou indução magnética)   aplicada a um material ferromagnético até a saturação. A relação entre campo e densidade de fluxo neste intervalo é dada por  . Quando mais saturado o material menor o valor da permeabilidade  .
  2. Diminuí-se a densidade de fluxo e como consequência também o campo   diminui. Contudo, quando   chega a zero (corrente zero), ainda existe uma densidade de fluxo remanescente,   (o material fica imantado).
  3. Para que   chegue a zero, é necessário aplicar um campo negativo, chamado de força coercitiva,  .
  4. Se   continuar aumentando no sentido negativo, o material é magnetizado com polaridade oposta. Desse modo, a magnetização inicialmente será fácil, até quando se aproxima da saturação, passando a ser difícil.
  5. A redução do módulo do campo novamente a zero deixa uma densidade de fluxo remanescente,  , e, para reduzir   a zero, deve-se aplicar uma força coercitiva   no sentido positivo.
  6. Aumentando-se mais ainda o campo, o material fica novamente saturado, com a polaridade inicial.

Nesse fenômeno, observa-se o atraso entre densidade de fluxo e campo magnético (  quando  ), chamado de histerese magnética.

O ciclo traçado pela curva de magnetização é chamado de ciclo de histerese.

 
Uma família de curvas de histerese medida com uma densidade de fluxo modulada sinusoidal com frequência de 50 Hz (período de 0,02 s) e campo magnético variável de 0,3 T a 1,7 T.

B = Campo magnético [T] ou [Wb/m²]
H = Intensidade de campo magnético [A/m] ou [A.e/m]
BR = Remanescência
HC = Coercividade

Exemplo de histerese com metais editar

Quando o ferro não está magnetizado, seus domínios magnéticos estão dispostos de maneira desordenada e aleatória. Porém, ao aplicar uma força magnetizante, os domínios se alinham com o campo aplicado. Se invertemos o sentido do campo, os domínios também inverterão sua orientação. Num transformador, o campo magnético muda de sentido muitas vezes por segundo, de acordo com o sinal alternado aplicado. E o mesmo ocorre com os domínios do material do núcleo. Ao inverter sua orientação, os domínios precisam superar o atrito e a inércia. Ao fazer isso, dissipam uma certa quantidade de potência na forma de calor, que é chamada de perda por histerese.

Em determinados materiais, a perda por histerese é muito grande. O ferro doce é um exemplo. Já no aço, esse tipo de perda é menor. Por isso, alguns transformadores de grande potência utilizam um tipo de liga especial de ferro-silício, que apresenta uma perda por histerese reduzida. Esse tipo de problema também aumenta junto com a frequência do sinal. Um transformador que apresenta baixa perda nas frequências menores, pode ter uma grande perda por histerese ao ser usado com sinais de frequências mais altas.

A histerese produz-se devido ao gasto de energia para inverter os dipolos durante uma mudança de campo magnético.

Eletrônica editar

 
Curva de histerese de um Disparador Schmitt

Histerese pode ser utilizada para filtrar sinais de forma que a saída reaja de maneira retardada à história desse sinal. Por exemplo, um termostato controlando um aquecedor pode acioná-lo quando a temperatura cai abaixo da temperatura de 'A' graus Celsius, mas só desligará quando a temperatura ultrapassar 'B' graus Celsius.

Um Disparador Schmitt é um circuito eletrônico simples que também exibe essa propriedade. Geralmente, uma quantidade de histerese é intencionalmente adicionada ao circuito eletrônico (ou algoritmo digital) para prevenir chaveamentos (troca de estados) rápidos.

Referências

  1. Bertotti, Giorgio (21 de maio de 1998). Hysteresis in Magnetism: For Physicists, Materials Scientists, and Engineers (em inglês). [S.l.]: Academic Press. ISBN 9780080534374 
  2. Almeida, M.P.; Costa, U.M.S. (março de 2000). «Exemplo de Histerese com um Sistema de Massa-Mola» (PDF). Revista Brasileira de Ensino de Física. 22 (1): 49-53. Consultado em 26 de junho de 2018 
  3. Hu, Mao-Bin; Wen-Xu (2 de março de 2007). «Phase transition and hysteresis in scale-free network traffic». Physical Review E (em inglês). 75 (3). 036102 páginas. doi:10.1103/PhysRevE.75.036102 
  4. Noori, Hamid Reza. Hysteresis Phenomena in Biology - Springer. [S.l.: s.n.] doi:10.1007/978-3-642-38218-5 
  5. Chen, Li; Fakhteh (30 de março de 2016). «Phase transitions and hysteresis of cooperative contagion processes». arXiv:1603.09082 [cond-mat, physics:physics, q-bio] 
  6. Chakrabarti, Bikas K.; Muktish (1 de abril de 1999). «Dynamic transitions and hysteresis». Reviews of Modern Physics. 71 (3): 847–859. doi:10.1103/RevModPhys.71.847 
  7. Piquette, Jean C.; Elizabeth A. (1 de junho de 2002). «Generalization of a model of hysteresis for dynamical systems». The Journal of the Acoustical Society of America. 111 (6): 2671–2674. ISSN 0001-4966. PMID 12083200 
  8. Sadiku, Matthew N. O. (2004). Elementos de eletromagnetismo 3 ed. Porto Alegre: Bookman. ISBN 9788536302751. OCLC 124029850 
  9. Assumpção., Bastos, João Pedro (2008). Eletromagnetismo para engenharia : estática e quase-estática. Florianópolis: Ed. UFSC. ISBN 9788532804181. OCLC 817147229 
  10. a b Bastos, João Pedro Assumpção (2008). Eletromagnetismo para engenharia: estática e quase-estática. Florianópolis: Ed. UFSC. ISBN 9788532804181