Mare Liberum (título original: Mare Liberum, sive de jure quod Batavis competit ad Indicana commercia dissertatio; em português, 'Mar livre ou uma dissertação sobre o direito dos neerlandeses de manter o comércio nas Índias') é um tratado de autoria do jurista neerlandês Hugo Grotius. Publicado, como excerto, em 1609, Mare Liberum discute o direito a governar os mares, contestando sobretudo a política de Mare clausum, defendida por Espanha e Portugal, dado que, se tais países pudessem governar e dominar os mares, os holandeses estariam impedidos de navegar às Índias Orientais. A tese de Grotius é que a liberdade dos mares era um aspecto primordial na comunicação entre os povos e nações. Portanto, nenhum país poderia monopolizar o controle do oceano, dada sua imensidão e falta de limites estabelecidos.

Folha de rosto de Mare Liberum
(1609)
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História editar

A história de Mare Liberum ('Mar livre' ou 'Liberdade dos Mares') começa em 1603, quando o almirante Jacob van Heemskerck, a serviço da Companhia Holandesa das Índias Orientais captura o navio de carga português "Santa Catarina" em alto-mar, ao largo de Singapura. Esta ação, que não terá contado com o aval da companhia ou mesmo do governo, propiciou, no entanto, à Companhia um enorme butim: mais de três milhões de florins. O feito gerou protestos internacionais, e até mesmo nos Países Baixos. Para defender-se, os representantes da Companhia procuraram um jovem e renomado jurista de Haia: Hugo Grotius (Hugo de Groot), que provavelmente também era membro da Câmara de Amsterdam da Companhia das Índias Orientais.[1]

Assim, no decurso de 1604, Grotius teria a tarefa de elaborar uma justificativa para o sequestro, formulando então uma extensa defesa, baseada nos princípios do direito natural, que foi denominada provisoriamente de "De Indis". Num dos capítulos, denominado "De Mare Liberum" ("Sobre o Mar Livre"), o jurista defendia o princípio de que o mar era um território internacional e todas as nações seriam livres de utilizá-lo para comércio - contestando a autoridade do Papa no direito internacional, que considerava um assunto a ser resolvido entre Estados soberanos. Ao advogar o Mare Liberum, a livre navegação nos mares, Grotius deu uma sustentação ideológica para que os holandeses quebrassem vários monopólios comerciais, utilizando a sua formidável potência naval para estabelecer depois o seu próprio monopólio.

Em 1609, Mare Liberum foi publicado como excerto,[2] anonimamente. [3]

O texto surge numa época de conflitos, em relação ao comércio marítimo, que envolviam Portugal e Espanha (que reivindicavam o monopólio dos mares descobertos), além da Inglaterra (que defendia a soberania sobre as águas ao redor das Ilhas Britânicas), de um lado, e, de outro lado, a República das Sete Províncias Unidas dos Países Baixos, que postulava a internacionalidade das águas oceânicas.

As reações não se fizeram esperar: a posição de Grotius é fortemente contestada. A Inglaterra, em competição cerrada com os holandeses pelo domínio do comércio mundial, opôs-se à tese de Grotius e reclamou a soberania sobre as águas que rodeavam as ilhas Britânicas. Para sustentar sua posição, os ingleses basearam-se nos argumentos do jurista John Selden, que reformulou o conceito de "Mare Clausum". Na sua obra "Mare clausum", de 1635, Selden defende que o mar era, na prática, tão passível de ser apropriado quanto o território terrestre. Segundo essa nova interpretação, o mar era equiparado a um território continental e, como tal, podia ser conquistado.

Na controvérsia gerada pelo conflito entre essas duas visões, os estados marítimos acabariam por moderar as suas exigências de domínio marítimo, baseando-se no princípio de que o território se estendia para o largo a partir de terra. Uma base sustentável foi encontrada, restringindo o domínio marítimo até à distância em que um tiro de canhão fosse capaz de defendê-lo. Essa posição seria universalmente adotada e estabelecida no limite das três milhas marítimas da costa.

Notas e referências

  1. (em neerlandês) Mare Liberum van Hugo de Groot. Koninklijke Bibliotheek.
  2. (em inglês) Harrison, James Evolution of the law of the sea: developments in law-making in the wake of the 1982 Law of the Sea Convention. School of Law, University of Edinburgh, 2007, p. 17 (nota 28).
  3. (em inglês) Feenstra, Robert. Hugo Grotius Mare Liberum 1609-2009: Original Latin Text and English Translation. Leiden, Boston: Brill, 2009, p. IX
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