Paranoia ou Mistificação?
Paranoia ou Mistificação? é como ficou conhecido um artigo, escrito por Monteiro Lobato, intitulado "A Propósito da Exposição Malfatti", publicado no jornal O Estado de S. Paulo em 20 de dezembro de 1917, provocando uma polêmica que terminou por afastar Monteiro Lobato dos modernistas brasileiros de 1922.[1]
Paranoia ou Mistificação? | |
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Data | 1917 |
País | Brasil |
Tipo de documento | artigo |
Autor(es) | Monteiro Lobato |
No artigo, Monteiro Lobato traz duras críticas à estética modernista, tendo como plano de fundo a exposição feita pela pintora Anita Malfatti, e apresenta assim um posicionamento antimodernista e em prol das artes de cunho classicista. Por tais posicionamentos e colocações, o texto hoje é considerado um exemplo da crítica conservadora.
O artigo 'Paranoia ou Mistificação?' também é um perfeito exemplo do que foi o movimento Pré-Modernismo, em que pensamentos conservadores e clássicos conviviam e divergiam com pensamentos modernistas. Ressaltando ainda que ele desempenhou papel importante ao instigar a criação da Semana de Arte Moderna.
Contexto
editarRecém-chegada da Europa e dos Estados Unidos, onde foi estudar pintura, Anita Malfatti resolveu, com o apoio dos amigos, organizar a sua exposição de pintura moderna nos meses de dezembro de 1917 e janeiro de 1918. Ela e um grupo de vanguardistas de São Paulo acreditavam que havia chegado a hora de a arte no Brasil "abandonar os modelos tradicionais" e buscar "novos rumos". Naturalmente, no meio artístico paulistano, tal exposição provocou comentários contra e a favor. No entanto, um artigo do jornal “O Estado de São Paulo”, de autoria de Monteiro Lobato (que também era crítico de arte), chamou a atenção.[2]
Vale ressaltar que Anita, como já mencionado, recém-chegada da Europa influenciada por movimentos europeus, trazia a pintura social do que vivenciava. Em suas obras existia toda uma tentativa de desconstrução do que se pensava por arte até o momento, com ideias estéticas originais em relação aos últimos movimentos literários, Parnasianismo e Simbolismo, que na atual conjuntura já estavam em declínio.
Para uma melhor compreensão desse período em que opiniões distintas permeavam o mundo cultural, faz-se necessário entender o contexto histórico, social e cultural em que se passava. Em pleno início do século XX, com I Guerra Mundial (1914-1918), Revolução Russa (1917), surgimento de diferentes movimentos (Expressionismo, Surrealismo, Dadaísmo, Futurismo, Cubismo, Fauvismo), esses tendo que conviver ainda com movimentos de cunho classicista. Assim, ainda se tentava entender o período pelo qual se passava. Por isso, divergiam pensamentos de propensão conservadora e moderna, como os de Anita Malfatti e os de Monteiro Lobato.
Conteúdo
editarO artigo nos revela que, para Lobato, há duas espécies de artistas. Uma seria composta pelos que veem normalmente as coisas e em consequência disso fazem "arte pura", guardando os eternos ritmos da vida, e adotados para a concretização das emoções estéticas, os processos clássicos dos grandes mestres. Ele então cita alguns exemplos, como Praxíteles e Rembrandt. A outra espécie de artista – ainda segundo Lobato – é "formada pelos que vêem anormalmente a natureza, e interpretam-na à luz de teorias efêmeras, sob a sugestão estrábica de escolas rebeldes, surgidas cá e lá como furúnculos da cultura excessiva. São produtos de cansaço e do sadismo de todos os períodos de decadência: são frutos de fins de estação, bichados ao nascedouro. Estrelas cadentes, brilham um instante, as mais das vezes com a luz de escândalo, e somem-se logo nas trevas do esquecimento".[3] Para Lobato, nessa segunda espécie de artista é onde se encaixaria Anita Malfatti e, mais posteriormente, os "modernistas de 22" no geral, afirmando que a "única diferença das telas de Anita daquelas feitas nos manicômios, como terapia, é que a dos loucos é arte sincera". Assim, o escritor trazia que as obras de cunho modernistas eram artes vindas de cérebros transtornados pelas mais estranhas psicoses, o que repercutiu no mundo cultural brasileiro.
Entretanto, este artigo também diz: "... Essa artista tem um talento vigoroso, fora do comum. Poucas vezes através de uma obra torcida para má direção, se notam tantas e tão preciosas qualidades latentes. (...) Entretanto, seduzida pelas teorias do que ela chama de 'arte moderna' (...) põe todo o seu talento a serviço da nova espécie de caricatura...".[4] Argumentando que os movimentos "(...)futurismo, cubismo, impressionismo e tutti quanti não passam de outros tantos ramos da arte caricatural." (...) e que "a fisionomia de quem sai de uma dessas exposições é das mais sugestivas. Nenhuma impressão de prazer, ou de beleza, denunciam as caras; em todas, porém, se lê o desapontamento de quem está incerto, duvidoso de si próprio e dos outros, incapaz de raciocinar, e muito desconfiado de que o mistificam habilmente.
Impacto
editarAnita Malfatti recebeu mal a crítica de Paranoia ou Mistificação?, quase entrou em depressão e parou de pintar. Um ano depois, decidida a ser mais convencional, foi tomar aulas de "natureza-morta" com Pedro Alexandrino Borges e se tornou amiga da pintora Tarsila do Amaral.[5] Além disso – ou por causa disso –, o artigo é considerado o estopim da Semana de Arte Moderna de 1922.[6]
A publicação desse artigo causou grandes divergências entre apoiadores das artes clássicas e defensores do modernismo. Artistas modernistas, como Mário de Andrade e Oswaldo de Andrade, se movimentaram em defesa e difusão do seu movimento no cenário cultural brasileiro. Assim, surgiu a ideia da realização da Semana de Arte Moderna.
Referências
- ↑ «"Paranóia ou Mistificação?"». Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo (MAC/USP). Consultado em 29 de novembro de 2017
- ↑ LIMA, Djahy. «"A Crítica Demolidora de Monteiro Lobato."». Consultado em 29 de novembro de 2017
- ↑ «"Paranóia ou Mistificação?"». Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo (MAC/USP). Consultado em 29 de novembro de 2017
- ↑ Zöler, Zöler (2018). «2.1.7.1 caso Malfatti». Lobato Letrador. 2º passo 1 ed. [S.l.]: Tagore Editora. p. 131. 304 páginas. ISBN 9788553250349
- ↑ [1]
- ↑ LEITE, Edmundo. «"A propósito da exposição Malfatti, por Monteiro Lobato."». Consultado em 27 de novembro de 2017
Ligações externas
editar- O Wikisource possui fontes primárias relacionadas com A propósito da exposição Malfatti