Trancista
Trancista ou trançadeira afro é uma palavra usada para nomear a ocupação de mulheres, em sua maioria negras, que têm como ocupação a atividade de estilizar cabelos crespos, cacheados, lisos e anelados com os penteados artesanais afro.[1][2][3]
No Brasil, a atividade de trancista afro é extremamente vinculada às políticas de afirmação da identidade negra, da negritude e do orgulho negro. O uso de tranças e outros penteados afro artesanais ocorre para pessoas negras por diversos motivos desde pela transição capilar, bem como para reafirmar a identidade negra e valorizar as raízes culturais africanas.[4]
O espaço destinado para a execução do trabalho das trancistas afro pode ser os salões de beleza étnico ou afro, suas residências ou a casa de seus clientes. Geralmente, na preparação e confecção dos trançados, elas costumam gastar cerca de 4 a 12 horas.
No Brasil a ocupação de trancista ou trançadeira afro não é regulamentada pelos órgãos oficiais. [5]Esta atividade laborativa pode ser considerada ofício por ser transmitida de geração em geração e ser aprendida em contextos familiares e em espaços de sociabilidades negras e não apenas em cursos formativos para trancistas [1].
A falta de reconhecimento pelos órgãos governamentais[6] não impede que um expressivo contingente de mulheres e homens negros exerçam esta atividade laborativa e se articulem politicamente na luta por seus direitos. De tal modo, que na atualidade, a partir de suas articulações políticas as trancistas conseguiram garantir nos calendários municipais e estaduais o dia da trancistas. As cidades de Uberlândia (MG), Rio de Janeiro (RJ), Carapicuíba (SP)[1], Belém (PA)[2], Mogi das Cruzes (SP)[3] , Nova Friburgo (RJ)[7], Valparaíso de Goiás (GO)[4], Diadema (SP), Salvador (BA) e São Paulo (SP) e os estados do Rio de Janeiro e de Minas Gerais têm em seus calendários oficiais o dia da trancista.[8][9][10]
A arte de trançar cabelos pode ser vista em vários países com população afrodiaspórica: Venezuela, Colômbia, Argentina, Cuba, Estados Unidos e Uruguai.[11] Na realidade, todos os países que receberam africanos e africanas escravizados no período colonial, bem como países que recebem na atualidade africanos e africanas imigrantes. Ou seja, a cultura de entrelaçar cabelos com penteados artesanais afro está disseminada em várias partes do globo.
Ainda vale mencionar que mulheres negras, tais como: Idalice Moreira Basto[12] (Afro Dai, RJ) na cidade do Rio de Janeiro (RJ), Negra Jhô em Salvador (BA), Penha Nascimento em São Paulo (SP); Betina Borges em Belo Horizonte (MG), Claudia Talita (RJ), Roseane Líbano (RJ), Gabriela Azevedo (RJ), Michelle Reis (BA) atuaram na disseminação da cultura das tranças e promoveram eventos (festivais, concursos de beleza e desfiles) de valorização da arte das tranças e indumentária afro e africana [1]. Os blocos afro como Ilê Aiyê em Salvador (BA) e Agbara Dudu (RJ) também sã o promotores desta estética negra. Além disso, os salões de beleza afro/ étnico são os Quilombos Urbanos[13] que podemos encontrar essas trabalhadoras ofertando o serviço de trançar cabelos.
Cabe mencionar que no universo acadêmico algumas pesquisadoras e pesquisadores se dedicaram a investigar o universo ocupacional das trancistas, trançadeiras e os estilos dos penteados afro nas diversas áreas do conhecimento desde Educação, Antropologia Social, Matemática, História, Jornalismo, Geografia, Administração, Ciências Sociais e Patrimônio Cultural. Podemos citar os seguintes nomes que escreveram monografias, trabalhos de conclusão de cursos e artigos: Anne Karine Cherrin de Souza, Natália Felício dos Santos[14], Gabriela Isaias de Sousa[15], Thais Santos Costa[16], Ezequias Adolfo Domingas Cassela e Eliane Costa dos Santos[17], Gloria Ford Gilmer Joice Caroline de Jesus Marques[18], Ciranilda Cardoso Silva[19], Elane Brito Pereira[20] e Luane Bento dos Santos[21]
Na pós-graduação temos as dissertações de mestrado de: Elisa Hipólito do Espirito Santo[22], Luane Bento dos Santos[23], Ana Paula Medeiros Teixeira dos Santos[24], Mariane Valério de Paula[25], Eufrásia Nahako Songa[26], Jorlânia Carolina Cândido Souza[27].
As teses de doutorado sobre a temática das trancistas e trançadeiras são das seguintes pesquisadoras: Luane Bento dos Santos e Raissa Lennom[28]. Vale dizer que no universo acadêmicos, as pesquisas sobre o trabalho das trancistas e a beleza das tranças estão concentradas no campo da Antropologia Social, Etnomatemática e Relações Raciais.
Além dos trabalhos acadêmicos, na atualidade, também há produções audiovisuais (curta-metragem, documentários e filmes) dedicados a estética dos penteados trançados, são eles: Memórias Trançadas[29], O que cabe em um trançado[30], Abebé[31], Enraizadas[32], Espelho, Espelho Meu!, Trança nagô: a arte e história, Ancestralidade das Tranças no Rio de Janeiro. Comemoração do Dia da Pessoa Trancista, Caminhos Trançados de São Paulo.
Ver também editar
Referências editar
- ↑ a b c BENTO DOS SANTOS, LUANE. «TRANCISTA NÃO É CABELEIREIRA!: IDENTIDADE DE TRABALHO, RAÇA E GÊNERO EM SALÕES DE BELEZA AFRO NO RIO DE JANEIRO». Consultado em 25 de março de 2024
- ↑ «Dia da Trancista: Tranças exaltam autoestima e beleza na comunidade - Voz das Comunidades». 6 de junho de 2023. Consultado em 25 de março de 2024
- ↑ «A história inspiradora de uma Trancista profissional - Sebrae». sebrae.com.br. Consultado em 25 de março de 2024
- ↑ «As trancistas, a cultura ancestral e a beleza negra». Gama Revista. Consultado em 25 de março de 2024
- ↑ Paz, Dindara (29 de novembro de 2023). «Em Salvador, trancistas buscam regulamentação da profissão». AlmaPreta. Consultado em 25 de março de 2024
- ↑ JORNALISMO, ALMA PRETA (29 de novembro de 2023). «Em Salvador, trancistas buscam regulamentação da profissão». ALMA PRETA JORNALISMO. Consultado em 22 de abril de 2024
- ↑ «Lei Municipal nº 4.951, de 24 de maio de 2023». Câmara Municipal de Nova Friburgo. 25 de maio de 2023. Consultado em 21 de abril de 2024
- ↑ «Dia da Profissão de Trancista é comemorado em Uberlândia/MG». Diretoria de Estudos e Pesquisas Afrorraciais. 18 de janeiro de 2023. Consultado em 25 de março de 2024
- ↑ «Dia da Pessoa Trancista é comemorado neste domingo com exposições, mostra de filmes e roda de samba». Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro - prefeitura.rio. 4 de junho de 2022. Consultado em 25 de março de 2024
- ↑ Diadema, Prefeitura de. «Julho das Pretas é celebrado no Clara Nunes»
- ↑ Santos, Luane Bento (29 de julho de 2022). «"Trancista não é cabeleireira!": identidade de trabalho, raça e gênero em salões de beleza afro no Rio de Janeiro». Biblioteca Virtual da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Consultado em 21 de abril de 2024
- ↑ «A grande dama da beleza negra: Quem foi Idalice Bastos, a estrela deixada pelo». Site Mundo Negro. 6 de junho de 2022. Consultado em 22 de abril de 2024
- ↑ Gomes, Nilma Lima (2019). Sem perder a raiz: corpo e cabelo como símbolos da identidade negra. [S.l.]: Autêntica Editora
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- ↑ SOUSA, Gabriela Isaias de (1 de Janeiro de 2018). «A ressignificação das tranças africanas "nesse canto do mundo": uma reportagem digital». Pantheon Repositório Institucional da UFRJ. Consultado em 21 de abril de 2024
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- ↑ «A [M]matemática nas Tranças das Mulheres Angolanas ou as Tranças das Mulheres Angolanas na [M]matemática? Um Olhar à Etnomodelagem». Journal of Mathematics and Culture. 7 (17): 18. Consultado em 21 de abril de 2024
- ↑ MARQUES, Joice Caroline de Jesus. «DO AFRO À ÁLGEBRA:UM ESTUDO DA TRANÇA NAGÔ». Acervo - Boletim do Centro de Documentação GHEMAT. Consultado em 21 de abril de 2024
- ↑ SILVA, Ciranilda (2 de abril de 2020). «Mulheres trançadeiras; o universo feminino dos penteados afro-brasileiros». Revista Desenvolvimento Social. 1 (9)
- ↑ PEREIRA, Elane (16 de agosto de 2021). «Simbologia do cabelo: estudo sobre as mulheres trançadeiras de Marabá». Revista Ensino em Perspectiva. 2 (4): 2. Consultado em 21 de abril de 2024
- ↑ SANTOS, Luane (9 de janeiro de 2024). «PROCESSOS FORMATIVOS ANTIRRACISTAS NA PROFISSIONALIZAÇÃO DE TRANCISTAS AFRO NA CIDADE DO RIO DE JANEIRO». UERJ, UFRRJ e UNIRIO. Revista Interinstitucional Artes de Educar. 1 (10): 19. Consultado em 21 de abril de 2024
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- ↑ PAULA, Mariane Valério de. «Fazer e pensar tranças: técnicas e gestos de uma arte dos cabelos». Biblioteca Virtual da UFSC. Consultado em 21 de abril de 2024
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- ↑ SANTOS, Luane Bento dos (4 de setembro de 2022). «Memórias Trançadas: um filme sobre tranças e pessoas trançadas». Site Medium. Consultado em 21 de abril de 2024
- ↑ «[FILME] O QUE CABE EM UM TRANÇADO». REVISTA CONTINENTE. 29 de março de 2022. Consultado em 21 de abril de 2024
- ↑ «Abebé' curta amazonense dialoga sobre a valorização da estética negra». Portal a Crítica. Consultado em 21 de abril de 2024
- ↑ Claire, Marie (25 de junho de 2020). «"Enraizadas": filme sobre origem das tranças no Brasil será exibido em festival». Revista Marie Claire. Consultado em 21 de abril de 2024