Usuário(a):Thereza de Almeida/Testes

Desde os tempos de colônia já existiam formas de regular as práticas de curar no Brasil, como a Fisicatura-mor, órgão governamental responsável por esta fiscalização. Na prática, porém, isto se mostrou insuficiente e a Fisicatura-mor não conseguiu reprimir todas as terapêuticas populares. Seus representantes estavam em maior número, se comparados aos médicos, e seus métodos eram requeridos e aceitos pela população. A figura do médico não era naturalizada e este profissional teve que desenvolver estratégias para inserir-se na sociedade e conquistar sua clientela. O enfermo escolhia o tratamento que mais se aproximava das suas crenças e da sua condição financeira.

Além disso, a responsabilidade sobre a manutenção da salubridade pública acompanhava as mudanças políticas do país e, por isso, o fornecimento da assistência à saúde para a população nem sempre foi ligada ao poder central, como vivemos atualmente. Ela alternava com a municipalidade, quando esta função era delegada para as Câmara Municipais. E isto perdura também durante o Império. A ciência é um produto social e, portanto, adequa-se ao seu contexto e responde às principais demandas da sociedade na qual é desenvolvida.

Deve-se levar em conta que, à época, as causas das doenças não eram vistas da mesma forma do que hoje. A chamada Teoria dos Miasmas, mais aceita na época entre os médicos e autoridade políticas, defendia que as enfermidades eram causadas pelas más condições de limpeza do ambiente. Por isso, as medidas de saúde pública mais comuns eram voltadas para uma intervenção preventiva no ambiente, já que os tratamentos conhecidos nem sempre se mostravam totalmente eficazes. Olhando para a História da Saúde Pública no Brasil Colonial e Imperial, vemos muito mais perguntas do que respostas e a coexistência de teorias e medidas de enfrentamento às moléstias e recorrentes epidemias.

Tal como aponta Tânia Pimenta, "o fim da Fisicatura-mor marcou um novo período na relação entre governo, médicos acadêmicos e terapeutas populares"[1], no qual a medicina pretendia alcançar o monopólio das artes de curar, classificando as demais práticas como ilegais e desqualificadas. O processo da institucionalização da medicina no Brasil, na década de 1820, contou ainda com "a criação da Sociedade de Medicina do Rio de Janeiro, da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro e de vários periódicos especializados"[2], contribuindo para um fortalecimento do discurso de que esta ciência e seus representantes seriam capazes de combater os principais males do país, que causavam o atraso do país.

A saúde entrou definitivamente nas discussões de políticas públicas após a primeira grande epidemia de Febre Amarela do verão de 1849-1850 na cidade do Rio de Janeiro, acompanhando o contexto de consolidação do poder do Segundo Império brasileiro. Até então, "as grandes epidemias que assolaram o mundo europeu e parte das Américas eram consideradas pelos médicos brasileiros ainda pouco frequentes, senão inexistentes no país"[3] e não tinham mobilizado as autoridade públicas, como fez o episódio da Febre Amarela. Assim, através do Decreto nº 598, de 14 de setembro de 1850, é criada a Junta Central de Higiene Pública (1850), que deveria propor medidas para garantir a salubridade das cidades e exercer a fiscalização de estabelecimentos e locais que poderiam ser considerados grandes focos de doenças, como os portos. Inicialmente voltada para o combate da Febre Amarela, sua atuação foi sendo expandida para qualquer questão ligada à saúde pública no Império Brasileiro.

Já na República, o órgão que passa a unificar o sistema de higiene é a Diretoria Geral de Saúde Pública, criada através do Decreto nº 2.449, de 1º de fevereiro de 1897 e pautada pela "ideia de centralização e uniformização das ações de saúde, subordinadas ao governo federal, sem ferir a autonomia estadual"[4] do sistema federalista aprovado pela Constituição de 1891. Em dezembro de 1903, o médico sanitarista Oswaldo Cruz assumiu a diretoria do órgão, assumindo o compromisso de acabar com as três principais enfermidades que assolavam o Rio de Janeiro, então capital federal: febre amarela, varíola e peste bubônica.

  1. Pimenta, Tânia (2004). «Transformações no exercício das artes de curar no Rio de Janeiro durante a primeira metade do Oitocentos». História, Ciências, Saúde Manguinhos: p. 69. Consultado em 1 de agosto de 2023 
  2. Pimenta, Tânia (2004). «Transformações no exercício das artes de curar no Rio de Janeiro durante a primeira metade do Oitocentos». História, Ciências, Saúde Manguinhos: p. 68. Consultado em 1 de agosto de 2023 
  3. Kodama et. al., Kaori (2012). «Mortalidade escrava durante a epidemia de cólera no Rio de Janeiro (1855-1856): uma análise preliminar». História Saúde Ciência - Manguinhos. Consultado em 1 de agosto de 2023 
  4. Cabral, Dilma (2018). «Diretoria-Geral de Saúde Pública». Mapa - Arquivo Nacional. Consultado em 1 de agosto de 2023