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Cladogramas que representam as mesmas relações filogenéticas entre os táxons A, B e C

Um cladograma é um diagrama que mostra as relações filogenéticas ou genealógicas entre espécies ou grupos supra-específicos, indicando um história em comum. O objetivo principal é identificar grupos monofiléticos, caracterizados por caracteres derivados e compartilhados (sinapomorfias). Apesar de terem sido tradicionalmente obtidas principalmente por caracteres morfológicos, sequências de DNA e RNA e filogenética computacional são agora normalmente usados para gerar cladogramas. Suas ramificações representam as relações de ancestralidade, sendo um ramo, o ancestral do táxon que o segue. Os nós representam os eventos de divergência entre os táxons (cladogênese). A raiz representa o ancestral comum de todos incluídos no cladograma e os nós terminais representam os táxons terminais, ou unidades taxonômicas operacionais (UTO's), e sua distribuição na árvore constitui suas relações de semelhança e parentesco, o que caracteriza também a finalidade desse diagrama. Uma característica importante, é que cladogramas mostram somente a relação entre grupos-irmãos, o tamanho dos ramos não corresponde ao tempo de divergência (como nos dendogramas) ou quantidade de transformações (como nos filogramas).

Basicamente, cladogramas contêm hipóteses sobre a filogenia de um determinado grupo. Essas hipóteses podem ser verdadeiras ou falsas, dependendo da interpretação dos dados considerados para o estudo. Correspondem ainda a um conjunto de informações sobre monofilia, ou seja, caso a monofilia de um subgrupo seja refutada, isso não necessariamente invalida as demais. As informações apresentadas em um cladograma podem sofrer transformações à medida que o conhecimento sobre os táxons e sua diversidade aumentam, com a adição de dados de espécies ou caracteres ou mudança na polarização, por exemplo, podendo ou não mudar a topologia da árvore. Por fim, um bom cladograma é uma ferramenta muito útil nas áreas biológicas como um todo, devido à sua capacidade de “retrovisão” dos eventos que ocorreram na evolução de um grupo.

Grupo de estudo e caracteres editar

O primeiro passo para produção de um cladograma é a escolha de um grupo de estudo (grupo interno) e os táxons terminais. Estes podem ser espécies de um gênero ou táxons superiores, como uma família, por exemplo, onde os táxons terminais seriam gêneros. Além do grupo interno, é preciso escolher um grupo externo, que pode ser qualquer organismo que não pertença ao seu grupo interno. O grupo externo será usado no enraizamento do cladograma, resultando na polarização dos caracteres, ou seja, na definição da direção da transformação de um estado primitivo para um derivado. O grupo externo ideal é o grupo-irmão do grupo interno, que se caracteriza por ser o grupo externo filogeneticamente mais próximo do grupo de estudo, e o que fornece mais informações sobre o sentido da evolução dos caracteres. A relevância de se incluir grupos-externos a sua análise, é corroborar sua hipótese de monofilia ao grupo de interesse.

Todo cladograma é baseado em uma matriz de caracteres para cada táxon terminal, sobre a qual as hipóteses filogenéticas se apoiam. Os caracteres devem ser homólogos e cada caráter tem pelo menos dois estados, que eventualmente serão definidos como primitivo (plesiomórfico) ou derivado (apomórfico). Os caracteres utilizados podem são geralmente morfológicos ou moleculares, mas também podem ser de outros tipos (comportamentais, embriológicos, bioquímicos, fisiológicos,, etc.). As matrizes são os depósitos das informações reunidas até agora. Exibem em cada ponto a condição de um caráter em um determinado táxon. Elas correspondem à base de dados sobre a qual os cladogramas serão construídos. Erros na matriz de caracteres corresponde a erros de topologia na árvore, ou seja, cladogramas falsos[1]. Tecnicamente, a maneira de orientar as matrizes em colunas e em linhas pode variar, mas normalmente são feitas colocando os táxons nas linhas, e os caracteres nas colunas. Em relação à ordenação de caracteres e táxons na matriz, se já houver alguma inferência sobre a filogenia do grupo, esta pode ser utilizada para organizar os dados na matriz, no qual a sequência dos táxons podem seguir a hierarquia da classificação tradicional. À medida que o estudo prossegue, novas sinapomorfias encontradas podem unir grupos monofiléticos, sendo necessária uma nova matriz. Um método de organizar os táxons por ordem alfabética, por exemplo, pode dificultar a visualização de caracteres compartilhados e de homoplasias.

Homologias e homoplasias editar

No geral, estruturas homólogas são aquelas que indicam ancestralidade comum, ou seja, à luz da evolução, se duas espécies apresentam homologia em suas estruturas, quer dizer que seu ancestral comum também apresentava tal estrutura. Esta pode sofrer variações morfológicas e funcionais ao longo do tempo. Essa concepção passou a ser utilizada com o advento da biologia evolutiva, sendo que no período pré-Darwiniano, homologias caracterizavam um “plano da natureza”, num sentido sobrenatural[2]. Atualmente, compõem a principal ferramenta utilizada pela Sistemática Filogenética. De contrapartida, homoplasias são caracteres compartilhados entre duas ou mais espécies que não estavam presentes no ancestral comum entre elas, e que essa novidade teria surgido independentemente nas duas ou mais linhagens. Um exemplo muito comum são as asas de aves e de morcegos, que possuem a mesma função, mas tem origens diferentes. Em morcegos, a membrana alar estende-se entre os dedos de seus membros anteriores (homólogos ao braço humano), e em aves a membrana alar liga-se ao tórax pela parte distal da asa[1]. Além disso, asas de pássaros são cobertas por penas, enquanto de morcegos é coberta por pele[2]. Essas semelhanças são meramente superficiais, e surgiram mais de uma vez, provavelmente por que esses dois organismos sofreram pressões evolutivas muito parecidas na aerodinâmica de suas asas (forma, tamanho, movimento). Na cladística, a relevância dessa diferença se destaca no momento de inferência filogenética, no qual homoplasias não revelam relações de parentesco, enquanto homologias sim[2]. Homoplasias causam muitas distorções na filogenia, pois podem ser confundidas, durante a análise, como sinapormofias, unindo duas linhagens, sendo que, na realidade, foram dois eventos independentes; o que caracteriza uma dificuldade imposta pela natureza evolutiva à sistemática.

Plesiomorfias e apomorfias editar

Em uma série de transformação (Hennig), que seria a sequência de modificações que uma estrutura sofreu até sua condição mais derivada, a condição mais antiga, primitiva, é denominada plesiomorfia, enquanto a mais recente, derivada, é chamada de apomorfia. Em sistemas naturais, essas condições são compartilhadas pelos indivíduos de uma ou mais espécies, nesse caso passam a ser chamados de simplesiomorfias e sinapomorfias, respectivamente. Assim, um dado estado de caráter é simplesiomórfico (ectotermia em répteis, anfíbios, outros vertebrados e invertebrados) para um grupo, ou sinapomórfico (presença de pêlos em mamíferos, celoma em celomados) para um grupo. Outro conceito é o de autapomorfia, uma apomorfia exclusiva de um ramo terminal de um cladograma, que não é compartilhada por nenhum outro.

A identificação do que é plesiomórfico e o que é apomórfico, ou seja a polaridade do caráter, pode ser feita de duas formas: depois (a posteriori) ou antes (a priori) da análise, sendo o primeiro mais comum:

  1. A posteriori: Utiliza-se um grupo-externo relacionado ao grupo de estudo para determinar qual caráter é ancestral, pois espera-se que o grupo-externo apresente tal característica. Por exemplo, Amniota é o grupo formado por répteis, aves e mamíferos; todos esses animais possuem uma membrana do ovo, chamado âmnio, durante o seu desenvolvimento. Sabe-se que amniotas são um grupo monofilético, ou seja, eles todos compartilham um mesmo ancestral comum. Pegando um conjunto de seis espécies amnióticas como um rato, um canguru, um pássaro do paraíso, um pisco, um crocodilo e uma tartaruga, onde duas são vivíparas (rato e canguru) e o restante é ovípara, como saber qual caráter é apomórfico? Com isso é selecionado um grupo-externo não amniota próximo filogeneticamente, como salamandras, sapos ou um peixe. Nesses grupos oviparidade predomina, consequentemente essa característica é considerada basal (plesiomórfica) em relação á viviparidade (apomórfica). Ou seja, cangurus e ratos seriam táxons mais derivados dentro do grupo de estudo [2]. Entretanto esse método tem ressalvas, pois um determinado grupo externo pode sugerir que um caráter é basal, mas ou outro grupo externo pode apontar um outro caráter como basal. Assim é necessária uma análise com o máximo de grupos ou espécies próximas relacionadas que corroborem a mesma polaridade. Outro ponto é o fato de ser necessário um conhecimento prévio da monofilia do grupo-interno e de seus possíveis grupos-irmãos comparáveis[2]. Caso o estudo seja feito com grupos na qual sua monofilia não esteja bem embasada, acarretará em uma complicação na análise, com confusão nos dados que só seria solucionado tomando o estudo do ponto inicial. Com isso, é recomendado que antes de se iniciar o estudo, sejam feitas as relações de parentesco em um nível mais abrangente, mesmo que de uma forma superficial, delimitando um grupo que seja monofilético, para depois iniciar a análise com os elementos que fazem parte desse grupo.[1]
  2. A priori: Nesse caso podem ser usados fósseis, sendo que caracteres deixados antes no registro fósseis serão plesiomórficos em detrimento de fósseis mais recentes, que apresentariam caráter derivado. Isso funciona muito bem para a evolução de mamíferos a partir de répteis-tipo-mamíferos, devido ao vasto registro fóssil encontrado. Entretanto, se uma condição apomórfica se preservar antes do que sua condição basal, em registros fosseis restritos, a interpretação paleontológica será o contrário da realidade. O desenvolvimento embriológico também pode ser utilizado como método de polarização de caracteres, mas somente quando quando a ontogenia recapitula a filogenia, sendo os primeiros estágios do desenvolvimento primitivos e os últimos derivados.

Construção de cladogramas editar

Quando considerados poucos táxons, essa etapa pode ser feita manualmente, mas geralmente a análise inclui muitos táxons e caracteres, sendo necessário uso de um programa computacional. O número de cladogramas examinados em uma análise é proporcional ao número de táxons incluídos, e cresce exponencialmente. Assim, para um matriz com 3 táxons, existem 3 caldogramas possíveis, com 5 táxons, 15 caldogramas; com 10 táxons chega a 34.459.425 de cladogramas. Nesse caso, programas de computador são utilizam algoritmos específicos para inferir o caldograma de acordo com o critério de otimização escollhido. Um dos mais usados é a máxima parcimônia, que refere-se ao princípio que a filogenia com menor número de passos evolutivos é a melhor estimativa das relações filogenéticas. Outros critérios de otimização são a máxima verossimilhançae a distância. No geral, esses critérios comparam as árvores geradas umas em relação às outras, e por fim encontra uma que é a melhor alternativa.[2]

Referências

  1. a b c AMORIM, D. S. Elementos Básicos de Sistemática Filogenética. 2a. Edição. 2. ed. Ribeirão Preto: Holos, Editora, 1997. v. 1. 294 p.
  2. a b c d e f Ridley, M. 2003. Evolução. Artmed Ed., Porto Alegre.