O guaiamu, guaiamum, goiamu ou goiamum (nome científico: Cardisoma guanhumi)[1] é um espécie de caranguejo terrestre da família dos gecarcinídeos (Gecarcinidae). É encontrado em estuários tropicais e subtrópicos e outras áreas marítimas de terra ao longo da costa atlântica da América do Sul desde o sul do Brasil,[2] através do Caribe e golfo do México, às Baamas e norte para Ponce Inlet,[3] Princess Place Preserve em Palm Coast e Bermudas.[4] A espécie varia em cor de azul escuro a marrom ou cinza pálido, e pode crescer até 15 centímetros (6 polegadas) na largura da carapaça e pesar mais de 500 gramas (18 onças).[3][5]

Como ler uma infocaixa de taxonomiaGuaiamu
Espécie na praia do Monte Woodford, em Dominica
Espécie na praia do Monte Woodford, em Dominica
Espécime em Forte Sherman, Colón, Panamá
Espécime em Forte Sherman, Colón, Panamá
Classificação científica
Reino: Animalia
Filo: Arthropoda
Subfilo: Crustacea
Classe: Malacostraca
Ordem: Decapoda
Infraordem: Brachyura
Superfamília: Grapsoidea
Família: Gecarcinidae
Género: Cardisoma
Espécie: C. guanhumi
Nome binomial
Cardisoma guanhumi
(Latreille, 1828)

Etimologia editar

Guaiamu, guaiamum, goiamu e goiamum derivam do termo tupi waia'mu ou guaiá-m-u, que significa «caranguejo escuro azulado». O crustáceo é também chamado fumbamba e caranguejo-mulato-da-terra.[1][6][7][8]

Descrição editar

 
Tem coloração azulada do exoesqueleto

O exoesqueleto de guaiamu pode atingir uma largura de até 15 centímetros (6 polegadas).[5] Tal como acontece com muitas espécies de caranguejo, os machos possuem garras dimórficas: a garra maior pode crescer até cerca de 30 centímetros (6 polegadas) de comprimento, tornando-se maior do que a própria carapaça. Os olhos possuem talos e sua cor varia de um azul profundo a um cinza pálido. Os juvenis geralmente têm uma carapaça marrom com pernas de cor laranja. As fêmeas geralmente aparecem cinza claro ou branco. As cores adultas geralmente estão presentes entre 80 gramas (2,8 onças) e 180 gramas (6,3 onças). Os indivíduos da espécie podem pesar mais de 500 gramas (18 onças).[3][9] No Brasil, tem sua toca, feita no terreno, geralmente arenoso, entre o manguezal e a restinga (área de transição).[10][11]

Distribuição editar

O guaiamu é encontrado em todo o estuário e outras regiões costeiras do Caribe, e ao longo da costa atlântica da América Central e do América do Sul (até o sul do Brasil).[2] Nos Estados Unidos pode ser encontrado em áreas costeiras do golfo do México e Flórida ao norte de Vero Beach até Ponce Inlet,[3] Princess Place Preserve em Palm Coast[3] e Bermudas.[4] Temperaturas da água relativamente frias no inverno, inferiores a 20 °C (68 °F), afetam a sobrevivência das larvas e restringem a possibilidade da espécie de se espalhar mais para o norte.[3]

Características editar

Dieta editar

O guaiamu é onívoro, coletando e comendo folhas e frutas perto de sua toca, enquanto também come insetos e carniça. Como muitos caranguejos, esta espécie é canibal, consumindo espécimes menores.[10] Se movem na sombra durante o dia e evitam se mover sob luz solar direta prolongada para se alimentar à noite.[3] De acordo com um pescador que os captura há 50 anos, uma vez capturados, os menores levam duas semanas para filtrar (limpar) antes de serem consumíveis e os maiores levam um mês.[12]

Sentidos editar

O guaiamu encontra seu alimento usando detectores de luz e som. Experimentos mostram que os caranguejos podem ser retirados de suas tocas para investigar o som de frutas caindo, uma vez que iniciam uma busca por comida. O comportamento predatório é liberado nesses caranguejos pela detecção de pequenos objetos em movimento. Caranguejos do gênero Cardisoma são capazes de detectar pequenas vibrações no solo na faixa de 10-1 500 Hz e 70 dB. A acuidade visual aumenta com o tamanho do corpo devido a um aumento no número e no diâmetro dos omatídeos.[3]

Ciclo de vida editar

 
Alimentam-se de frutos e folhas
 
Atinge a maturidade sexual aos quatro anos

Atingem a maturidade sexual aos quatro anos e o ciclo reprodutivo está intimamente ligado aos padrões climáticos sazonais e à fase lunar. Chuvas fortes na primavera iniciam as migrações. Quando isso ocorre, o guaiamu começa a ganhar peso, à medida que mais alimentos são consumidos e coletados nas primeiras semanas do período migratório.[3] A migração das fêmeas para o mar ocorre no período de desova e dura uma ou duas noites, num percurso de até 5 quilômetros. A fêmea, à época de desova, assume a coloração da carapaça em tons na cor creme ou amarelada. A fertilização é interna e poligênica. A fêmea armazena e mantém, depois da cópula, espermatozoides ativos em duas espermatecas que se comunicam com as duas gônadas, o que lhe permite fecundar os ovócitos sem realizar novas cópulas. As fêmeas podem desovar até cinco vezes por ano e, como a fecundidade depende do seu tamanho, podem produzir entre 20 mil e um milhão e duzentos mil ovos.[11] Após aproximadamente duas semanas, os ovos eclodem e devem ser liberados em água salgada para que as larvas sobrevivam. Várias desovas por ano podem ocorrer com a época de desova variando de acordo com a localização dentro do intervalo. Na Flórida, a época de desova dura de junho a dezembro e atinge seu pico em outubro e novembro. Nas Baamas a temporada se estende de julho a setembro, enquanto na Venezuela a desova dura de julho a novembro. Os ovos eclodem em larvas de natação livre com 5 estágios zoeais e um estágio pós-larval ou megalopa. O tempo de desenvolvimento típico desde a eclosão até o primeiro estágio dos caranguejos é de 42 dias em condições de laboratório; no entanto, esse tempo pode ser muito menor em espécimes selvagens.[3]

Guaiamu é uma espécie de crescimento lento em comparação com a maioria dos outros caranguejos. Requer mais de 60 mudas – cerca de três vezes mais do que outras espécies de caranguejo – para atingir seu tamanho máximo. O caranguejo geralmente selará a saída de sua toca usando lama, seis a dez dias antes da muda, para se proteger dos predadores. (Após a muda, os caranguejos são mais vulneráveis ​​ao ataque, pois sua casca ainda não endureceu.)[3] Suportam grandes variações de salinidade, entre 0 e 35‰. Contudo a reprodução é muito lenta, só acontecendo a partir dos quatro anos de vida e nunca em cativeiro.[11]

 
Espécime perto de sua toca
 
Espécime no acervo de invertebrados marinhos do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), no Rio de Janeiro

Conservação editar

O guaiamu é um recurso economicamente importante em várias localidades de sua área de distribuição no Atlântico Ocidental – Bermudas, Flórida, golfo do México, Antilhas, Venezuela e Brasil (do Ceará a Santa Catarina). São de grande importância na culinária do litoral nordeste do Brasil, conforme os dados de produção pesqueira publicados no Boletim Estatístico da Pesca Marítima e Estuarina do Nordeste do Brasil (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), (2000, 2001, 2002, 2003, 2004, 2005). O crustáceo faz parte da culinária pernambucana e baiana, está entre os pratos mais pedidos para consumo e, por ser um prato tradicional, remete aos costumes e identificação da sociedade.[13] Em 2005, foi classificado como vulnerável na Lista de Espécies da Fauna Ameaçadas do Espírito Santo;[14] em 2011, como vulnerável na Lista das Espécies da Fauna Ameaçada de Extinção em Santa Catarina;[15] em 2014 e 2018, respectivamente, como criticamente em perigo no Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção e na Lista Vermelha do Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio);[16] e em 2017, como vulnerável na Lista Oficial das Espécies da Fauna Ameaçadas de Extinção do Estado da Bahia;[17][18] e em 2018, como em perigo na Lista das Espécies da Fauna Ameaçadas de Extinção no Estado do Rio de Janeiro.[19]

Duas portarias, 445/2014 e 395/2016, do Ministério do Meio Ambiente, proíbem a captura, transporte, armazenamento, guarda, manejo, beneficiamento e comercialização do crustáceo (entre um total de 475 espécies de peixes e animais aquáticos consideradas em risco de extinção) a partir de abril de 2017, em todo o território brasileiro.[20][21] No entanto, em maio de 2017 o MMA adiou para 30 de abril de 2018 a proibição referente a quinze espécies da lista, incluindo o guaiamu.[22] Desde 30 de maio de 2018, a portaria 161, do Ibama, de 20 de abril de 2017, proíbe a captura de 25 espécies dos mares e dos rios, entre elas o guaiamu. Segundo a portaria, os estoques mantidos até 30 de junho de 2018 podem ser comercializados, sendo necessário informar o Ibama até o dia 5 de junho de 2018. Em qualquer outro caso, a comercialização é proibida, e quem for flagrado comercializando o crustáceo está sujeito ao pagamento de multa de R$ 5 mil por unidade.[23]

Referências

  1. a b Ferreira, Aurélio B. H. (1986). Novo Dicionário da Língua Portuguesa 1 ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira. p. 871 
  2. a b Debelius, Helmut (2001). Crustacea - Guide of the World 2.ª ed. Francoforte: IKAN Unterwasserarchiv 
  3. a b c d e f g h i j k K. Hill (25 de julho de 2001). «Cardisoma guanhumi». Estação Marítima Smithsonian em Forte Pierce 
  4. a b «Giant Land Crab». The Department of Environment and Natural Resources (em inglês). Consultado em 9 de outubro de 2018 
  5. a b Hostetler, M. E.; Mazzotti, F. J.; Taylor, A. L. (dezembro de 2016). «Blue Land Crab (Cardisoma guanhumi)». Universidade da Flórida, IFAS 
  6. Redação (2007). «Guaiamu». Dicionário Caldas Aulete. Consultado em 23 de agosto de 2016 
  7. Gregório, José (1980). Contribuição indígena ao Brasil. Niterói: União Brasileira de Educação e Ensino. 1316 páginas 
  8. Araujo, Ruy Magalhães de. «Os tupinismos como forma de sátira em Gregório de Mattos e Guerra». Círculo Fluminense de Estudos Filológicos e Linguísticos. Consultado em 22 de abril de 2022. Cópia arquivada em 22 de abril de 2022 
  9. Inglez Souza; Julio Seabra, eds. (1995). Enciclopédia agrícola brasileira: C-D. São Paulo: EdUSP. p. 608. ISBN 9788531404603 
  10. a b Shinozaki-Mendes, Renata Akemi; Santander-Neto, Jones; Hazin, Fábio H. V.; Silva, José Roberto F. (2008). «Alometria do guaiamum, Cardisoma guanhumi Latreille, 1828 (Decapoda, Gecarnidae) no Estuário do Rio Jaguaribe, Ceará, Brasil». Revista Brasileira de Engenharia de Pesca. 3: 24-27. Consultado em 22 de abril de 2022 
  11. a b c Botelho, Emanuel Roberto de Oliveira; Santos, Maria do Carmo Ferrão; Almeida, Lucia; Silva, Carmen Giselle Martins da (2009). «Caracterização Biológica do Guaiamum, Cardisoma guanhumi, Latreille, 1825 (Decapoda: Gecarcinidae) do Estuário do Rio Caravelas (Caravelas - Bahia)» (PDF). Boletim Técnico-Científico CEPENE. 17 (1): 65-75. Consultado em 22 de abril de 2022 
  12. «Archived copy». Consultado em 6 de julho de 2019. Arquivado do original em 6 de julho de 2019 
  13. Silva, Rejane da; Oshiro, Lídia Miyako Yoshii (dezembro de 2002). «Aspectos da reprodução do caranguejo guaiamum, Cardisoma guanhumi Latreille (Crustácea, Decapoda, Gecarcinidae) da Baía de Sepetiba, Rio de Janeiro, Brasil». Revista Brasileira de Zoologia. Consultado em 22 de abril de 2022 
  14. «Lista de Espécies da Fauna Ameaçadas do Espírito Santo». Instituto de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (IEMA), Governo do Estado do Espírito Santo. Consultado em 7 de julho de 2022. Cópia arquivada em 24 de junho de 2022 
  15. Lista das Espécies da Fauna Ameaçada de Extinção em Santa Catarina - Relatório Técnico Final. Florianópolis: Governo do Estado de Santa Catarina, Secretaria de Estado do Desenvolvimento Econômico Sustentável, Fundação do Meio Ambiente (FATMA). 2010 
  16. «Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção» (PDF). Brasília: Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Ministério do Meio Ambiente. 2018. Consultado em 3 de maio de 2022. Cópia arquivada (PDF) em 3 de maio de 2018 
  17. «Lista Oficial das Espécies da Fauna Ameaçadas de Extinção do Estado da Bahia.» (PDF). Secretaria do Meio Ambiente. Agosto de 2017. Consultado em 1 de maio de 2022. Cópia arquivada (PDF) em 2 de abril de 2022 
  18. «Cardisoma guanhumi Latreille, 1825». Sistema de Informação sobre a Biodiversidade Brasileira (SiBBr). Consultado em 22 de abril de 2022. Cópia arquivada em 9 de julho de 2022 
  19. «Texto publicado no Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro contendo a listagem das 257 espécies» (PDF). Rio de Janeiro: Governo do Estado do Rio de Janeiro. 2018. Consultado em 2 de maio de 2022. Cópia arquivada (PDF) em 2 de maio de 2022 
  20. «Portaria MMA nº 445, de 17 de dezembro de 2014» (PDF) 
  21. «Meio Ambiente proíbe venda do Guaiamum em todo Brasil». JC Online. 17 de março de 2017. Consultado em 22 de abril de 2022. Cópia arquivada em 22 de abril de 2022 
  22. «Ministério adia proibição da captura e venda de guaiamum para 2018». G1. 26 de abril de 2017. Consultado em 22 de abril de 2022. Cópia arquivada em 22 de abril de 2022 
  23. Filho, Sarney (30 de maio de 2018). «Portaria nº 161» (PDF). Ministério do Meio Ambiente. Consultado em 17 de maio de 2018 

Ligações externas editar

Outros projetos Wikimedia também contêm material sobre Guaiamum:
  Categoria no Commons
  Diretório no Wikispecies