Álvaro Coelho de Athayde

Álvaro Coelho de Athayde, 20.º barão de Teive, mais conhecido como o Barão de Teive, é um dos semi-heterónimos de Fernando Pessoa. Foi criado em 1928, quando o poeta teve a necessidade de transferir toda a sua “implacável lucidez”[1] e de se salvar a si mesmo. Nascia assim o Barão de Teive, fidalgo português, destinado a morrer, depois de dar expressão ao lado mais pessimista das múltiplas personalidades pessoanas. Os fragmentos da sua obra inacabada foram reunidos sob o título A Educação do Estóico.

Nome: Álvaro Coelho Athayde
Nascimento: Não existem informações específicas
Morte: 12/7/1920
Nacionalidade: Português
Ocupação Profissional: Escritor
Principais Trabalhos: A Educação de um Stoico; obra anterior queimada
Movimento Literário: Modernismo
Estatuto Social: Aristocrata
Assinatura:

Biografia editar

Álvaro Coelho de Athayde, vigésimo (ou décimo quarto, segundo um trecho dactilogrado) [2] Barão de Teive, morou na Quinta da Macieira, nos arredores de Lisboa. Foi o último alter ego criado por Fernando Pessoa, em 1928[2], não havendo quaisquer informações sobre a sua data de nascimento. Sabe-se que a sua perna esquerda fora amputada, não havendo qualquer explicação associada, mas podendo ser uma das justificações para a sua inépcia em relação às mulheres. Note-se o facto de que todos os heterónimos e semi-heterónimos são definidos pelo próprio Fernando Pessoa, na carta de 13 de janeiro de 1935[3], a Adolfo Casais Monteiro, como “não sendo a personalidade a minha, é, não diferente da minha, mas uma simples mutilação dela”[4], sendo este aspeto concreto no caso do Barão de Teive.

Não existem quaisquer informações detalhadas sobre o seu percurso académico, pois é meramente uma figura de expressão literária e filosófica, não respeitando as biografias convencionais de figuras históricas. Era estóico por autodidatismo, sendo o título da sua única obra fragmentária reflexo dessa mesma filosofia: A Educação do Stoico.

Na narrativa ficcional criada por Fernando Pessoa em torno do Barão, é anunciado, numa notícia de jornal , a 12 de julho de 1920[5], o suicídio do fidalgo, na mesma quinta onde vivera, depois de deixar o seu manuscrito[6] na gaveta de um hotel[7], para ser encontrado por Pessoa.

Obra editar

Os seus escritos foram reunidos na obra A Educação do Estóico, de pendor introspetivo e de carácter fragmentário.

 
Primeira página do livro A Educação do Estóico

Um dos títulos ponderados para o livro foi A Profissão do Improdutor, que refletia a necessidade de Fernando Pessoa exprimir, numa só personalidade, a sua incapacidade de terminar por completo um trabalho literário de grande envergadura, já que, nesta ocasião, vivia atormentado com a construção do Livro do Desassossego. Esta improdutividade típica do Barão de Teive não se limitou ao plano literário e expressou-se também no plano físico.

No manuscrito, logo abaixo do título, surge como segundo título ou título principal O Único Manuscrito do Barão de Teive (O Único Scripto/ Manuscripto do Barão de Teive), com uma seta a apontar para o que seria o subtítulo definitivo - “a impossibilidade de fazer arte superior”.

Esta obra é reconhecida pelo seu caráter filosófico e intimista, refletindo as complexidades da existência humana e as visões particulares do autor sobre a natureza da vida, na qual não acredita.

Os trechos atribuídos ao Barão de Teive foram recolhidos de um caderno preto [8] e ocupavam trinta e uma páginas, em duas dessas estão registados dois poemas datados de 6 de agosto de 1928. Além deste caderno, existem ainda dezoito textos avulsos de dimensões variáveis, uns manuscritos e outros dactilografados.[9]

Alguns excertos assinados pelo Barão de Teive foram publicados pela primeira vez em 1960, no prefácio à obra de Fernando Pessoa, Obra Poética, organizada e anotada por Maria Aliete Galhoz, e publicada no Rio de Janeiro, pela Editora José Aguilar, em 1960. [10]

A primeira edição independente da sua obra foi publicada em abril de 1999, havendo uma edição crítica em 2007[11].

Temas editar

Tendo em conta o carácter fragmentário dos textos do Barão de Teive, as diferentes temáticas encontram-se dispersas pelos manuscritos, não seguindo assim uma sequência lógica. No entanto, há temáticas que unem os excertos como a lucidez, o orgulho, a dicotomia vida/morte e a filosofia estóica.

Lucidez editar

 
Capa do livro A Educação do Estóico do Barão de Teive

Devido ao raciocínio que possuía, faltou-lhe um lado mais afetivo, acabando por defender a loucura: assim, o Barão está a priori condenado a morrer pela sua excessiva racionalidade. No livro A Educação do Estoico, o seu autor escreve que a "conduta racional da vida é impossível"[12] e, por isso, perante tanta lucidez, só lhe resta o suicídio: “Atingi, creio, a plenitude do emprego da razão. E é por isso que me vou matar”[13].

Orgulho editar

Além da lucidez e de uma racionalidade absurda, o orgulho do Barão contribuiu para o seu suicídio. No seu testamento para a posteridade, afirma que o seu orgulho “nunca sofreu que eu me permitisse menos do que a minha inteligência poderia fazer. Nunca pude conceder a mim mesmo a autorização para o meio-termo, para qualquer coisa menos na obra que a minha personalidade inteira e o meu desejo todo."[14] - porém, apesar da sua inteligência e do desejo de criar uma arte superior que o libertasse, foi incapaz de concretizar qualquer plano/obra. Esta incapacidade de se realizar literariamente condu-lo à decisão do suicídio, não antes de queimar todos os seus escritos para escrever algo que explicasse as suas motivações para pôr fim à própria vida. Mas esta nova obra revelou-se incoerente e desconexa, acentuando a angústia sentida pelo Barão.

Estoicismo editar

Para o Barão de Teive, o estoicismo define-se como uma assunção do sofrimento de forma passiva e silenciosa. Deste modo, recusa a anestesia geral no momento da amputação da perna e critica os “grandes poetas pessimistas”[15] do século XIX, como Antero de Quental, por escreverem poesia usando os seus sofrimentos e problemas pessoais, ao invés de os conterem.

Fernando Pessoa, em Ficções do Interlúdio, define o estoicismo do fidalgo e a sua personalidade como alguém que “pensa claro, escreve claro, e domina as suas emoções" [16] - realça-se então o autodomínio característico da corrente estoicista.

Estilo editar

  • Prosa
  • Diário em fragmentos
  • Estilo confessional e de introspecção
  • Narração na primeira pessoa
  • Obra Inacabada
  • Reflexões sobre a vida
  • Estoicismo

Bibliografia e Referências editar

  1. Teive, Barão de (1999). A Educação do Estóico. Rua S. Nicolau, Lisboa: Assírio & Alvim. p. 85. ISBN 978-972-37-0520-1 
  2. a b Martins, Fernando Cabral (2008). Dicionário de Fernando Pessoa e do Modernismo Português. [S.l.]: Editorial Caminho. ISBN 9789722119856 
  3. «Carta a Adolfo Casais Monteiro · Casa Fernando Pessoa». www.casafernandopessoa.pt. Consultado em 18 de dezembro de 2023 
  4. «Casa Fernando Pessoa». www.casafernandopessoa.pt. Consultado em 19 de dezembro de 2023 
  5. Teive, Barão de (1999). A Educação do Estóico. Rua S. Nicolau, Lisboa: Assírio & Alvim. p. 19 
  6. «MultiPessoa: Labirinto». multipessoa.net. Consultado em 19 de dezembro de 2023 
  7. Teive, Barão de (1999). A Educação do Estóico. Rua S. Nicolau, Lisboa: Assírio & Alvim. p. 16. ISBN 978-972-37-0520-1 
  8. Teive, Barão de (1999). A Educação do Estóico. Rua S. Nicolau, Lisboa: Assírio & Alvim. ISBN 978-972-37-0520-1 
  9. Teive, Barão de; Zenith, Richard (1999). A Educação do Estóico. Rua S. Nicolau, Lisboa: Assírio & Alvim. p. "Post-mortem". ISBN 978-972-37-0520-1 
  10. Pessoa, Fernando; Galhoz, Maria Aliete Dores; Simões, João Gaspar (1960). Obra Poética. Rio de Janeiro: Editora José Aguilar 
  11. Pizarro, Jerónimo (2007). Fernando Pessoa: Entre Génio e Loucura. [S.l.]: INCM – Imprensa Nacional Casa da Moeda. ISBN 9789722715775 
  12. Teive, Barão de (1999). A Educação do Estóico. Rua S. Nicolau, Lisboa: Assírio & Alvim. ISBN 978-972-37-0520-1 
  13. Teive, Barão de (1999). A Educação do Estóico. Rua S. Nicolau, Lisboa: Assírio & Alvim. p. 57. ISBN 978-972-37-0520-1 
  14. Teive, Barão de (1999). A Educação do Estóico. [S.l.]: Assirio & Alvim. pp. 50–51 
  15. Teive, Barão de (1999). A Educação do Estóico. Rua S. Nicolau, Lisboa: Assírio & Alvim. pp. 52–53. ISBN 978-972-37-0520-1 
  16. Pessoa, Fernando (2018). Ficções do Interlúdio. [S.l.]: Assírio & Alvim. ISBN 978-972-37-2065-5 

Outros heterónimos editar

Outras Leituras editar

Ligações externas editar