Nudez heroica: diferenças entre revisões

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A [[nudez]] masculina foi um costume socialmente aceito dentro de certos contextos atléticos e militares da [[Grécia Antiga]], e se tornou um traço distintivo da cultura helênica. Em outros contextos, a nudez não era tolerada e era motivo de vergonha. Aparentemente, como se deduz de uma passagem de [[Tucídides]], a nudez foi praticada primeiro pelos [[espartanos]] em seus exercícios militares, e daí teria sido introduzida nos [[Jogos Olímpicos antigos|Jogos Olímpicos]], mas outras fontes afirmam que o costume se originou quando um atleta corredor venceu a prova na V Olimpíada (720 a.C.) ao perder ou tirar no meio do trajeto o [[perizoma]] (espécie de tanga de uso generalizado) que o atrapalhava.<ref name="Spivey"/> No entanto, esta origem da nudez pública grega tem sido disputada e parece pertencer à lenda. Larissa Bonfante pensa que a nudez devia servir a um propósito mágico e protetor, já que eram comuns naquela época [[amuleto]]s contra as forças do mal na forma de [[falo]]s eretos, e é de assinalar que os Jogos atléticos eram comemorados como festividades religiosas e os próprios atletas eram de certa forma santificados pela participação. Qualquer que tenha sido a forma de sua introdução, a nudez rapidamente foi adotada pela sociedade grega e pelas artes dentro de uma moldura formal e conceitual idealizante, gerando prolífica e influente [[iconografia]] atestada desde o século VIII a.C. em pinturas de vasos e nos numerosos ''[[kouroi]]'' arcaicos<ref>Bonfante, Larissa. ''Etruscan Dress''. The Johns Hopkins University Press, 2003, pp. 20; 102 </ref> e, no século V a.C., quando aparecem os primeiros [[Gymnasion|ginásios]] atléticos, ela já estava largamente difundida. A palavra ginásio, aliás, deriva do grego ''gymnos'', nu.<ref name="Spivey">Spivey, Nigel. ''Greek Sculpture''. Cambridge University Press, 2013, pp. 133-148 </ref>
 
A educação na Grécia Antiga seguia um sistema pedagógico de amplo escopo, conhecido como ''[[paideia]]'', que se destinava a preparar cidadãos felizes e úteis à sociedade. Dentro deste sistema era dada grande atenção à formação do caráter, havendo forte ênfase em aspectos éticos e cívicos, ao mesmo tempo em que se pensava que a beleza das formas corpóreas refletia a beleza, a força, a pureza e a bondade da alma, síntese expressa no conceito de ''[[kalokagathia]]'', e por isso o cuidado com o corpo era igualmente importante. Esta filosofia tinha uma forte inclinação [[idealista]], e entendia a arte como um auxiliar educativo privilegiado, atribuindo-lhe a função de criar imagens simbólicas que servissem como exemplo de virtudes e condutas a serem imitadas. Por consequência, a representação do nu logo foi associada à representação de personagens célebres e dignificados, ou por qualquer motivo merecedores de apreço social, como deuses, militares e atletas vencedores das Olimpíadas, eternizando publicamente suas qualidades em estátuas e pinturas que os mostravam de corpos belos, vigorosos, saudáveis e jovens, mesmo que, quando humanos, na realidade não fossem assim. Embora esta nudez tenha provavelmente se inserido na [[homossexualidade na Grécia Antiga|cultura grega da homossexualidade masculina]], suanão representaçãoé artísticaclaro nãose parecesua terrepresentação guardadoartística guardava associações sexuais óbvias até data bem tardiaimportantes.<ref name="Spivey"/><ref name="Osborne"/><ref>Hurwitt, Jeffrey. "The Human Figure in Early Greek Sculpture and Vase Painting". In Shapiro, Henry. ''The Cambridge companion to archaic Greece''. Cambridge University Press, 2007, pp. 274-275.</ref>
 
A nudez heroica não se limitou aos homens, mas a inclusão de mulheres na galeria de nus clássicos foi posterior e muito menos usual, aparecendo somente no século IV a.C., inaugurada pela célebre ''[[Afrodite de Cnido]]'' de [[Praxíteles]],<ref name="Havelock">Havelock, Christine Mitchell. ''The Aphrodite of Knidos and Her Successors: A Historical Review of the Female Nude in Greek Art''. University of Michigan Press, 2007, p. 142 </ref> e não se repetiu em práticas físicas, continuando a mulher grega real a permanecer invariavelmente vestida, salvo em [[Esparta]], onde a exposição de seu corpo durante exercícios era aceitável. Para as mulheres a associação com o heroísmo não era natural, e o nu feminino tendia a significar vulnerabilidade, imoralidade, fraqueza, derrota ou vitimização, pois somente escravas e prostitutas eram vistas em público sem roupas.<ref>Cohen, Ada. ''Art in the Era of Alexander the Great: Paradigms of Manhood and Their Cultural Traditions''. Cambridge University Press, 2010, p. 236.</ref><ref name="Blanshard"/> Exceção notável é a tipologia de [[Afrodite]], mostrada desde Praxíteles sempre nua para indicar a pureza, vigor e beleza de seu amor.<ref name="Havelock"/><ref name="Sorabella"/>