Pietro Stangherlin: diferenças entre revisões

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==Vida==
[[File:Retrato de pietro stangherlin.jpg|thumb|O artista à direita, com um amigo, vestidos à moda gaúcha, c. 1880.]]
[[File:Stangherlin-museu-de-caxias.jpg|thumb|''Nossa Senhora da Neve com o Menino Jesus'', 1885, uma de suas primeiras obras documentadas. Museu Municipal de Caxias do Sul. A policromia é original, realizada pelo próprio Stangherlin.]]
[[File:Retrato de pietro stangherlin.jpg|thumb|OTarquinio artistaZambelli àe direita,Pietro com um amigo,Stangherlin vestidos à moda gaúcha, compartilhando uma cerveja, c. 1880.]]
 
Era filho de Battista e Maria Stangherlin (ou Stangherlini).<ref name="Expressão"/> Desde pequeno sofreu com um tumor benigno em um joelho, que tolheu severamente seus movimentos, a ponto de impedi-lo de caminhar durante toda sua juventude, segundo informou sua filha, postumamente. Por causa desta dificuldade, teria frequentado a escola somente até os nove anos, dedicando-se depois a tarefas manuais em casa, aprendendo a confeccionar redes de pesca, consertar relógios e criar peças em tricô, crochê, renda e bordado, auxiliando em seu sustento. Chegando à adolescência, entalhou um par de muletas para si próprio, ganhando mais mobilidade, podendo ter um pouco de vida social e podendo aprender o ofício da [[marcenaria]].<ref name="Lazzari"/><ref name="Expressão">Freitas, Marcos do Amaral de. "Das Muletas às Cabeças de Santos". In ''Expressão - Jornal do Curso de Jornalismo da UCS'', out/2000; Suplemento Espacial, p. 5</ref>
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Na década de 1870, chegando à Itália a propaganda do governo brasileiro [[Imigração italiana no Rio Grande do Sul|incentivando a imigração]], despertou nele a ideia de radicar-se em outras terras. Sua família era pobre e a Itália da época, tumultuada por guerras e fome, não oferecia perspectivas de crescimento, e seu médico também havia aconselhado a mudança, esperando que em um país de clima mais ameno seus problemas de saúde encontrassem algum lenitivo.<ref name="Lazzari"/>
 
Viajou em 1876, chegando no Rio de Janeiro em 25 de agosto e transferindo-se imediatamente para Caxias do Sul. Logo começou a oferecer seus serviços de marcenaria e fazia consertos gerais, mas encaminhava-se cada vez mais para a área das artes, encarregando-se de trabalhos de decoração, pintura e desenho, incluindo retratos.<ref name="Lazzari"/> Sua falta de preparo artístico formal não impediu que se dedicasse com entusiasmo a esta nova seara. Segundo [[Athos Damasceno]], se bem que seus primeiros esforços, datados da década de 1880, tenham produzido fracos resultados, como seria de esperar, em breve dominou o ofício. Não tardou em aventurar-se também pela escultura, modalidade de arte da qual foi o pioneiro na cidade, que veio finalmente a dominar sua produção, e onde deixou suas obras mais expressivas, todas no campo da [[arte sacra]].<ref name="Damasceno">Damasceno, Athos. ''Artes Plásticas no Rio Grande do Sul''. Porto Alegre: Editora Globo, 1971, pp: 152-155; 194-195; 414; 432; 442.</ref>
 
A ausência de outros artistas na região lhe foi favorável.<ref name="Adami"/> Em pouco tempo reuniu uma clientela, juntou economias e pôde construir uma casa-atelier na rua Sinimbu, mandando trazer da Itália parentes que ainda estavam lá, sua mãe e seus irmãos Giovanni, Luisa e Assunta.<ref name="Expressão"/> Sua saúde também apresentava melhora, e já podia andar somente com uma bengala. Contudo, em 1883<ref name="Lazzari"/> ou 1885<ref>[https://www.caxias.rs.gov.br/cultura/texto.php?codigo=370 "Memorial Atelier Zambelli"]. Secretaria de Cultura de Caxias do Sul.</ref> Contudo, em 1883 chegou a Caxias [[Tarquinio Zambelli]], outro santeiro habilidoso, que veio a se tornar o seu grande competidor no mercado. Pouco depois casou com a viúva Leticia Rancon (ou Rancam), que lhe deu muitos filhos, dos quais só sobreviveram à infância duas meninas, Adelina e Corina.<ref name="Lazzari"/><ref name="Expressão"/> Em 1885 criou aquela que viria a ser sua obra mais conhecida, o grupo de [[Nossa Senhora de Caravaggio]] com a vidente [[Joaneta Varoli|Joaneta]], instalado primeiro no [[Antigo Santuário de Nossa Senhora de Caravaggio|antigo santuário de Farroupilha]], e hoje entronizado no altar-mor da construção mais recente, erguida ao lado.<ref name="Lazzari"/>
 
Em 27 de setembro de 1887 naturalizou-se brasileiro. Seu título de eleitor de 1890 o apresenta como "escultor", indicando que já era um profissional reconhecido.<ref name="Lazzari"/> Atuou não só na cidade de Caxias do Sul, mas em outras nos arredores, e suas obras eram bastante requisitadas, povoando igrejas e capelas da região.<ref name="Adami"/><ref name="Damasceno"/> Em 1901 apresentou na ''Exposição Estadual'' em [[Porto Alegre]] uma escultura alegórica sobre a imigração, peça que recebeu medalha de bronze. Tornou-se uma figura popular em sua cidade, participando de muitas associações e clubes, e na decoração dos carros alegóricos usados nos desfiles da tradicional [[Festa da Uva]].<ref name="Damasceno"/>
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Em seus anos finais colaborou com [[Francisco Meneguzzo]], afamado na região por seus elaborados altares em madeira entalhada, deixando várias estátuas de grandes dimensões na Catedral de Caxias.<ref name="Lazzari">Lazzari, Nátali Cristina. [http://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/70410 ''Escultura Religiosa na Colônia Caxias: um estudo sobre a obra de Pietro Stangherlin e Tarquinio Zambelli'']. TCC de Artes Visuais, orientadora: Paula Viviane Ramos. UCS, 2013.</ref> Em 1912, estando a consertar uma fechadura, caiu sobre sua perna prejudicada, que quebrou-se e [[gangrena|gangrenou]], condição que o levou à morte.<ref name="Expressão"/>
 
SuaApesar filhada Adelinaconcorrência comercial que casoumanteve com Tarquinio Zambelli, se aproximaram pela amizade e respeito profissional, e seus filhos Adelina Stangherlin e [[Michelangelo Zambelli]], filhoacabariam de seuse antigounindo rivalpelo Tarquiniomatrimônio, fundando em 1914 uma importante oficina de santeiros que continuou a tradição artística de ambas as famílias e permaneceu ativa até o ano de 2004.<ref name="Lazzari"/><ref name="Damasceno"/><ref>[http://www.esteditora.com.br/correio/4917/right.htm "Monumento abriga Museu de Artes Sacras com mil peças"]. ''Correio Riograndense on line'', 22/12/2004, edição nº 4.917</ref>
 
==Obra==
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Lazzari apontou como características de seu estilo uma obediência sistemática aos cânones iconográficos consagrados pela Igreja Católica, de cunho em geral erudito, ainda que em certos casos haja desvios, que são explicados mais provavelmente pela sua ignorância de certas convenções e não por qualquer desejo de inovar. Suas estátuas, especialmente as femininas, mostram em regra rostos arredondados e cheios, de feições que lembram as camponesas italianas, com corpos sólidos, robustos e um pouco atarracados, de pescoços largos e mãos de dedos curtos, dando considerável atenção aos detalhes na face, mas permanece sempre visível uma certa rusticidade na execução e uma certa rigidez nos gestos, típicas da produção popular amadora.<ref name="Lazzari"/>
 
É possívelprovável que tenha aprendido algo, informalmente, com o concorrente Zambelli, que era diplomado pela Escola de Belas Artes de Milão e tinha uma produção mais requintada. Seu estilo revela uma evolução nítida ao longo dos anos no sentido de um maior refinamento, embora seja difícil definir até onde isso deriva de influência ou se deve somente à prática continuada no ofício.<ref name="Lazzari"/><ref name="Damasceno"/> O historiador [[João Spadari Adami]] disse que ele nunca fez estudos preparatórios, partindo direto para o trabalho definitivo, e comparou, guardando as proporções, sua importância regional à de [[Aleijadinho]] na região de [[Minas Gerais]], salientando o mérito adicional do artista caxiense de não ter tido mestres qualificados como teve o outro.<ref name="Adami">Adami, João Spadari. "Um Idêntico 'Aleijadinho de Vila Rica' na Colônia Caxias". ''Pioneiro'', 23/11/1968.</ref> Na apreciação de [[Athos Damasceno]], sua falta de treinamento formal foi o que lhe favoreceu a imaginação e a espontaneidade, não lhe roubando o vigor de que outros mais cultos muitas vezes carecem.<ref name="Damasceno"/>Em Suasuas obrapalavras, embora já reconhecida por esses críticos pioneiros, por pesquisadores mais recentes ligados à [[Universidade de Caxias do Sul]] e por instâncias oficiais como o [[Museu Municipal de Caxias do Sul]], ainda aguarda mais estudos e divulgação.<ref name="Lazzari"/>
 
::"Sem dúvida, as primeiras tentativas no ofício haveriam de ressentir-se da falta de conhecimentos, ainda que rudimentares, da matéria, e fácil será imaginar-se o que teria produzido no início de suas experiências. Mas as disposições inatas e o esforço constante acabariam proporcionando-lhe os meios de que precisava para desenvolver cada vez mais suas aptidões e transformar-se num entalhador seguro, operoso e de obra digna de menção.... Stangherlin, ao longo de sua demorada atuação no ''métier'', conseguiu aperfeiçoar constantemente sua arte e várias obras que produziu então atestam não só engenho como boa técnica — é de se calcular com que dificuldade! — na observação incansável e na utilização diuturna de seus implementos de trabalho. E se não lhe foi possível ultrapassar nem projetar sombra sobe o abalizado concorrente, andou-lhe sempre na vizinhança e sem dar parte de fraco".<ref name="Damasceno"/>
Diversas de suas esculturas foram repintadas em tempos posteriores, o que prejudica seu estudo estético e histórico e altera as intenções originais do criador, visto que o próprio Stangherlin se encarregava da policromia, empregando uma paleta de cores vivas e contrastantes, com grande sutileza na [[encarnação e estofamento|encarnação]] das faces, características de autenticidade valiosas, mas perdidas nas "restaurações" inadequadas que tantas sofreram nas mãos de amadores das comunidades. As imagens conservadas no Museu Municipal, por outro lado, permanecem com suas cores primitivas, possibilitando a íntegra apreciação do vigoroso efeito plástico conseguido pelo artista, e dando uma medida mais exata do seu talento.<ref name="Lazzari"/><ref name="Damasceno"/>
 
Sua obra, embora já reconhecida por esses críticos pioneiros, por pesquisadores mais recentes ligados à [[Universidade de Caxias do Sul]] e por instâncias oficiais como o [[Museu Municipal de Caxias do Sul]], ainda aguarda mais estudos e divulgação.<ref name="Lazzari"/> Diversas de suas esculturas foram repintadas em tempos posteriores, o que prejudica seu estudo estético e histórico e altera as intenções originais do criador, visto que o próprio Stangherlin se encarregava da policromia, empregando uma paleta de cores vivas e contrastantes, com grande sutileza na [[encarnação e estofamento|encarnação]] das faces, características de autenticidade valiosas, mas perdidas nas "restaurações" inadequadas que tantas sofreram nas mãos de amadores das comunidades. As imagens conservadas no Museu Municipal, por outro lado, permanecem com suas cores primitivas, possibilitando a íntegra apreciação do vigoroso efeito plástico conseguido pelo artista, e dando uma medida mais exata do seu talento.<ref name="Lazzari"/><ref name="Damasceno"/>
 
===Lista de obras===