Hispânia Tarraconense: diferenças entre revisões
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== Geografia e organização político-administrativa da província Tarraconense ==
=== Limites e extensão ===
A província Hispânia Citerior Tarraconense, no seu momento de maior extensão, abrangia as duas terceiras partes da [[península Ibérica]], e compreendia as regiões a norte e a sul do [[rio Ebro]], dos [[Pirenéus]] a norte até [[Sagunto]] a sul, o [[Rio Douro|vale do Douro]], exceto a zona da sua margem meridional entre o [[rio Tormes]] e a sua desembocadura em [[Cale (cidade)|Cale]] ([[Vila Nova de Gaia]], Portugal), os vales do [[Rio Tejo|Tejo]] e do [[Rio Guadiana|Guadiana]] até aos limites com a Lusitânia, e o extremo oriental da [[Andaluzia]], a leste da fronteira da Bética que discorria de [[Cástulo]] ([[Linares (Jaén)|Linares]]), passando por [[
A [[Galécia]] e a [[Cartaginensis]] foram cindidas posteriormente da Tarraconense, ambas no {{séc|III}}, e a [[Baleares|''Balearica'']] da ''Cartaginensis'', em finais do {{séc|IV}}, sendo transformadas em províncias independentes.
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Por decisão de [[Augusto]] em {{AC|27|x}} a Tarraconense passou a ser uma [[Província romana|província]] imperial, assim como a [[Lusitânia]], enquanto a [[Bética]] foi senatorial;<ref>Estrabão III, 4, 20: Neste tempo as províncias eram distribuídas entre o povo e o [[Senado romano|senado]], por um lado, e o ''[[princeps]]'', por outro. A Bética foi atribuída ao povo, enviando a ela um [[pretor]] assistido por um ''[[questor]]'' e um legado. O seu limite oriental passava pelas cercanias de Cástulo. O resto pertencia ao [[imperador romano|imperador]], que enviava na sua representação dois legados: um deles pretório e o outro consular. O pretório, assistido, pela sua vez, por um legado, era encarregue de administrar justiça aos [[Lusitanos]], ou seja, à população compreendida entre as fronteiras da Bética e o curso do Douro até a sua desembocadura, porque toda esta parte recebeu o mesmo nome e compreende também [[Augusta Emerita]]. Tudo o que agora fica fora da Lusitânia, é a maior parte da Ibéria, fica sob a autoridade do legado consular, que dispõe de forças consideráveis: umas três legiões e três legados.</ref><ref>Pom. Mela, ''Chor.'' II, 79: ''Tribus autem est distincta nominibus, parsque eius Tarraconensis, pars Baetica, pars Lusitania vocatur. Tarraconensis altero capite Gallias altero Baeticam Lusitaniamque contingens mari latera obicit Nostro qua meridiem, qua septentrionem spectat oceano. Illas fluvius Anas separat, et ideo Baetica maria utraque prospicit, ad occidentem Atlanticum, ad meridiem Nostrum. Lusitania oceano tantummodo obiecta est, sed latere ad septentriones, fronte ad occasum. Vrbium de mediterraneis in Tarraconensi clarissimae fuerunt Palantia et Numantia, nunc est Caesaraugusta; in Lusitania Emerita, in Baetica Hastigi, Hispal, Corduba.''</ref> a Tarraconense tinha categoria consular, enquanto as outras duas províncias eram de categoria pretória.
À frente da
As grandes dimensões da província determinaram que, em algum momento entre [[Tibério]] e [[Cláudio]], o governador recebesse como auxiliares na administração de justiça sete legados, chamados ''legati iuridici'', à frente de ''conventus iuridicus''. Estes ''legati'' eram nomeados diretamente pelo imperador. Os sete [[Conventus|conventos jurídicos]] da província eram:
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* O Tarraconense, com capital na Colônia [[Tarraco]] (Tarragona).
Em cada uma das sedes conventuais, foi organizado o [[culto imperial]], dedicado aos ''genii imperatoris'' e aos imperadores divinizados, com um sacerdócio próprio masculino -''flamines augusti''- e feminino -''flaminicai augusti''-, eleitos dentre as elites das comunidades privilegiadas - colônias municípios - da província. Anualmente, eram designados dentre eles a um ''flamen'' e uma ''flaminica'' -não era estranho que fossem casal- para se ocuparem do culto imperial na província, desempenhando as suas funções no ''[[Foro (direito)|foro]]'' provincial da capital da província, a
A administração financeira da Tarraconense, pela sua vez, dependia de um [[procurador imperial]] -''procurator Caesaris''-, nomeado diretamente pelo imperador dentre os membros do ''[[ordem equestre]]'', cujo ''officium'' também tinha a sua sede na capital da província. Contudo, a partir de finais do {{séc|I}} ou começos do {{séc|II}}, a zona de mineração aurífera do noroeste da província começou a ser administrada por um procurador específico -''procurator metallorum''-, cargo desempenhado normalmente um [[liberto]] imperial, que tinha a sede do seu ''officum'' em Astúrica Augusta, capital do ''conventus Asturicensis''. Os ''procuratores'' dependiam diretamente do imperador e não do governador provincial, embora ambos os cargos devessem colaborar para a correta administração da província.
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Assim, em {{DC|74|x}}, [[Vespasiano]], mediante o [[Édito de Latinidade de Vespasiano|Édito de Latinidade]], outorgou a cidadania latina menor -''ius latii minor''- a todas os comunidades da Hispânia, o que permitia obterem a [[cidadania romana]] todas aquelas pessoas que desempenhassem magistraturas municipais -[[Duunvirato]] ou edilidade- na sua comunidade, uma vez que fora transformada em município por ordem imperial, enquanto o restante dos habitantes adquiriam a cidadania latina, que lhes permitia gozar legalmente do direito de fazer negócios de acordo com a lei romana -''ius comercii''- e de se casar à romana -''ius connubii''-, em ''iustae nuptiae''.
A concessão deste direito foi aproveitada por bastantes comunidades estipendiárias da Tarraconense para se tornarem em municípios, como é o caso de [[Nova Augusta]] ([[Lara de los Infantes]], [[província de Burgos|Burgos]]), [[
As principais cidades, de fundação romana ''ex novo'' ou com origem grega -as menos- ou pré-romano, da província Tarraconense foram:
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* [[Barcino]] ([[Barcelona]]), Colônia de César e Augusto
* [[Ilerda]] ([[Lérida]]), Município de Augusto
*
* [[Júlia Líbica]] ([[Llívia]], Gerona), Município de César
*
* [[Bétulo]] ([[Badalona]], Barcelona), Município de Augusto
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* [[Empórias]] (Ampúrias, [[Província de Gerona|Gerona]]), Colônia de César
* [[Gerunda]] ([[Gerona]]),
* [[Bétulo]] ([[Badalona]], Barcelona), Colônia de Augusto
*
*
* [[Iaca]] ([[Jaca (Huesca)|Jaca]], [[Província de Huesca|
* [[Labitosa]] ([[La Puebla de Castro]], Huesca), Município Flávio
[[Imagem:Teatro Romano Cesaraugusta-vista desde arriba-3.jpg|200px|thumb|[[Teatro de César Augusta]], capital de um ''conventus iuridicus', edificado sob [[Augusto]] e [[Tibério]] para dotar a cidade mais importante do [[vale do Ebro]]'.]]
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* [[Turíaso]] ([[Tarazona]], Saragoça), Município de Augusto
* [[Celsa]] ([[Velilla de Ebro]], Saragoça), Colônia triunviral
*
* [[Arcóbriga]] ([[Monreal de Ariza]], Saragoça)
*
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* [[Cartago Nova]] ([[Cartagena (Espanha)|Cartagena]]), Colônia de César
* Valência ([[Valência (Espanha)|Valência]]), Colônia de Augusto
* [[Sagunto]] ([[Sagunto]], [[Província de Valência|Valência]]), Município cesariano
[[Imagem:Faro Torre Hércules La Coruña Galicia España.jpg|thumb|200px|[[Torre de Hércules]], farol romano construído no {{séc|II}} no Município Flávio Brigâncio na [[Corunha]].]]
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* [[Ilici]] ([[Elche]], [[Província de Alicante|Alicante]]), Colônia de Augusto
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*
* [[Lucento]] ([[Alicante]]), Município de Augusto
* [[Begastro]] ([[Cehegín]], [[Província de Múrcia|Múrcia]]), Município Flávio?
Linha 99:
* [[Vareia]] ([[Logronho]], [[La Rioja (Espanha)|La Rioja]]), Município de Augusto
* [[Tricio Magalo]] ([[Trício]], [[La Rioja (Espanha)|La Rioja]]), Município Flávio
*
* [[Cascanto]] ([[Cascante]], Navarra), Município de Augusto
* [[Calagurris]] ([[Calahorra]], [[La Rioja (Espanha)|La Rioja]]), Município sob César
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* [[Flávio Brigâncio]] ([[Corunha]]), Município Flávio
* [[Iria Flávia]] ([[Padrón]], [[Província da Corunha|A Corunha]]), Município Flávio
*
[[Imagem:Ponte Romana1.jpg|200px|thumb|[[Ponte de Trajano]] em ''[[Aquae Flaviae]]'' na que a inscrição chamada ''[[padrão dos povos]]'' indica que a sua construção foi sufragada por 10 comunidades da zona e construído com ajuda da [[Legio VII Gemina]].]]
* [[Luco Augusto]] (Lugo), Município de Augusto?
Linha 122:
* [[Cale (cidade)|Cale]] e [[Portus Cale]] ([[Vila Nova de Gaia]] e [[Porto]], Portugal), Município?
* [[Clúnia]] (Coruña del Conde, [[Província de Burgos|Burgos]]) Município de Tibério e colônia sob Vespasiano
*
* [[Numância]] ([[Garray]], [[Sória]]), Município Flávio?
* [[Tiermes]] ([[Montejo de Tiermes]], Sória), Município sob Tibério
Linha 128:
* [[Augustóbriga]] ([[Muro de Ágreda]], Sória), Município Flávio?
* [[Palância]] ([[Palência]]), Município Flávio?
* {{ilc|Píncia||Pintia}} ([[Padilla de Duero]], [[
[[Imagem:AcueductoSegovia edit1.jpg|thumb|200px|[[Aqueduto]] de Segóvia, edificado sob [[Domiciano]] e remoçado sob [[Trajano]], dentro do processo de municipalização flávio em toda Hispânia, proporcionou a este município um elemento singular ao mesmo tempo em que útil.]]
* [[Intercácia]] ([[Montealegre de Campos]],
* [[Albócela]] ([[Villalazán]], [[Província de Zamora|Zamora]]) Município Augusto?
* [[Septimanca]] ([[Simancas]],
* [[Rauda (Hispânia)|Rauda]] ([[Roa (Burgos)|Roa]], Burgos), Município Flávio?
* [[Deobrígula]] ([[Tardajos]], [[Província de Burgos|Burgos]]), Município Flávio?
Linha 148:
* [[Lância (cidade)|Lância]] ([[Villasabariego]], Leão) Município Flávio
* [[Bedúnia]] ([[San Martín de Torres]], [[Província de Leão|Leão]])
* [[
*
* [[Toleto]] ([[Toledo]]), Município de Augusto
* [[Cesaróbriga]] ([[Talavera de la Reina]], [[Província de Toledo|Toledo]]), Município sob César
Linha 157:
* [[Compluto]] ([[Alcalá de Henares]], [[província de Madrid]]), Município de Augusto
* [[Titúlcia]] ([[Titúlcia]], Madrid), Município Flávio.
[[Imagem:Roman aqueduct Tarragona.jpg|200px|thumb|Aqueduto romano das Ferreras ou [[Pont del Diable (Tarragona)|Pont del Diable]], que fornecia de água a
* [[Libisosa]] ([[Lezuza]], [[Província de Albacete|Albacete]]), Colônia de Augusto
* [[Salária (cidade)|Salária]] ([[Úbeda]], [[Jaén (província da Espanha)|Jaén]] ), Colônia de Augusto
* [[Sisapo]] ([[Almodóvar del Campo]], [[Província de Cidade Real|Cidade Real]]), Município de Augusto
* [[Cástulo]] ([[Linares (Jaén)|Linares]], [[Jaén (província da Espanha)|Jaén]]), Município de César
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=== Distribuição das guarnições militares romanas na província ===
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A criação destas novas províncias foi realizada para poder afrontar a incorporação ao território romano das últimas zonas independentes da península, habitadas por [[Galaicos]], [[Cântabros]] e [[Astures]], de modo que Augusto reservou-se para o seu controle direto as zonas limítrofes às destes povos, embora, no caso da Tarraconense enganasse o [[Senado romano|senado]] ao incluir numa província militarizada e com sérias ameaças bélicas uma série de comarcas pacificadas desde havia mais de 50 anos, e intensamente urbanizadas e romanizadas, formadas pelo vale do [[Ebro]], as costas do Levante, e as zonas da Andaluzia não pertencentes ao vale do ''[[Betis]]''.
A província Tarraconense serviu bem como base para a anexação dos Cântabros ao império durante as guerras [[Guerras Cantábricas]] entre {{AC|27-19|x}}, residindo o próprio Augusto em {{AC|27-26|x}} em ''[[Segisama]]'' ([[Sasamón]], [[Burgos]]),<ref>Floro, II, 33:Ipse venit Segisamam, castra posuit.</ref><ref>ORÓSIO, VII, 21: ''igitur Caesar apud Segisamam castra posuit, tribus agminibus totam paene amplexus Cantabriam''</ref> e em
O nome da província foi-lhe dado pelo da sua capital, a Colônia Júlia Cidade Triunfal [[Tarraco]]. Os seus limites foram corregidos em {{AC|12|x}}, ao serem incorporadas as zonas dos Galaicos e Astures procedentes da província Lusitânia, e a zona mineira em torno de [[Cástulo]], procedente da província senatorial Bética.
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No capítulo da produção [[cerâmica]], vale a pena resenhar também os alfares de cerâmica comum de [[Melgar de Tera]] (Zamora), que começaram a funcionar no {{séc|I}} em relação a o abastecimento das tropas imperiais acantonadas em Petavônio, e com a venda de olaria à população civil do ambiente. As suas produções atingiram ''Legio'' e estiveram em funcionamento até o {{séc|IV}}. Também destacaram-se as instalações de produção de ''Terra Sigilata Hispana'' e cerâmica pintada de tradição celtibérica de ''[[Uxama argaela]]'' ([[Burgo de Osma]]-[[Osma]], [[Sória]]), cuja distribuição abarcou todo o Vale do Douro e a parte Oriental do vale do Ebro.
A agricultura de tipo mediterrâneo - olival, vinhedo e cereal - foi especialmente florescente em todas as comunidades da zona levantina, destacando-se a articulação de uma importante zona de regadio na parte média do vale do Ebro, entre
Na zona das duas submesetas, pela sua vez, o cultivo predominante foi o cerealístico, com a pecuária transumante, que afundava as suas raízes na época pré-romana. A exploração agrícola melhorou notavelmente a respeito da época anterior graças à abundância de ferro e de ferramentas feitas com este material, os novos apetrechos usados, frente aos muito mais primitivos pré-romanos.
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Na zona de Cartago Nova foi praticado o cultivo do [[esparto]],{{dn}} utilizado para a fabricação de cordames para diversos usos, entre outros, o dos barcos, pelo qual a cidade foi conhecida também como ''Cartago Espartária, já no {{séc|VI}}.
Também foi importante a indústria de salgados localizada arqueologicamente no atual Parque do Castro em [[Vigo]], a antiga
[[Imagem:Hispania roads.svg|thumb|esquerda|250px|Principais calçadas da [[Hispânia]].]]
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As três vias mais importantes da Tarraconense foram:
* A via que unia Astúrica Augusta com
* A [[Via Astúrica-Burdígala||via Ab Asturica Burdigalam}} que unia Astúrica Augusta com [[Burdígala]] ([[Bordéus]], [[França]]) por [[Oiasso]] ([[Irún]], [[Guipúscoa]]).
* A importante [[Via Augusta]], que começava nos [[Pirenéus]], em Juncária ([[La Jonquera]], Gerunda), ligando com a [[Via Domícia]] da [[Gália Narbonense]] e descendia por toda a costa levantina em direção à [[Bética]].
Também destacavam um ramo da estrada de Astúrica a
Pela sua vez, o importante comércio marítimo no ''Mare Nostrum'' - o Mediterrâneo - com direção à [[Gália Narbonense]], [[Itália (província romana)|Itália]] e o oriente do império, utilizou, primariamente, os seguintes portos:
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* Cartago Nova, através do qual se remetia para a Itália a prata e o chumbo de Serra Morena.
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