Caio Escribônio Curião: diferenças entre revisões

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'''Caio Escribônio Cúrio''' ou '''Caio Escribônio Curião''' ({{langx|la|''Gaius Scribonius Curio''}}; {{dni|lang=br|||90 a.C.|si}} — {{morte|lang=br|||-49}}) foi um [[Oratória|orador]] e [[Política|político]] [[República Romana|romano]], filho do [[Cônsul romano|cônsul]] [[Caio Escribônio Curião (cônsul em 76 a.C.)|Caio Escribônio Curião]]. Foi amigo de [[Pompeu]], [[Júlio César]], [[Marco Antônio]] e [[Cícero]]. Apesar dos defeitos da sua juventude (prodigalidade, escândalos), Cícero procurou ajudar, e escreveu-lhe várias cartas. Curião primeiro opôs-se a César mas, posteriormente, mudou-se para o bando deste,<ref name="Nota 47">
José Joaquín Caerols, nota 47 em [[Aulo Hírcio]], [[De Bello Gallico|Comentários à guerra das Gálias]], livro VIII, cap. 52.4, pág. 334, Alianza Editorial, Col. Clásicos de Grecia y Roma, BT 8254, 3.ª reimpres., Madrid, 2008, ISBN 978-84-206-4092-1</ref><ref>No [[Epítome de Tito Lívio|Epítome]], CIX de [[Tito Lívio|Lívio]] diz-se que "Contém um relato das ações de Caio Curião, o tribuno da plebe, primeiro contra César, mais tarde no seu favor." [http://www.perseus.tufts.edu/hopper/text;jsessionid=2ABD0601A22FD637D396DC4A096DD4EC?doc=Perseus%3Atext%3A1999.02.0150%3Abook%3D109 {{en}}][[Língua inglesa|inglês]]<span>)</span>.</ref> no que combateu e faleceu durante a [[Segunda Guerra Civil da República de Roma|guerra civil]].
 
== Vida ==
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O fato de fazer parte da juventude escandalosa de Roma não impedia que Cícero continuara manifestando a sua amizade para Curião. Nem o fato de ser amigo de Públio Clódio, que progressivamente se ia revelando como inimigo de Cícero. Em [[59 a.C.]], sendo [[cônsul romano|cônsul]] [[Júlio César]] autorizou Clódio a entrar nas filas dos [[plebeus]]. Com isso Clódio podia apresentar-se ao [[tribuno da plebe|tribunado]]. Cícero, assustado, fugiu de Roma. Foi precisamente Curião quem lhe confirmou, um dia que Cícero se acercou à [[Via Ápia]], que, em efeito, Públio apresentar-se-ia a tribuno da plebe.<ref name=autogenerated2 /> Nesta época, Cícero, e com ele todos os conservadores ''[[optimates]]'', tinham razões para ver em Curião um novo defensor das suas ideias, com um grande futuro e nele depositaram as suas esperanças.<ref>[[Francisco Pina Polo]]: ''Marco Túlio Cícero'', Ariel, 2005, ISBN 84-344-6771-2, pág. 238.</ref> Em efeito, Curião dedicou-se esse ano a desafiar constantemente a César, o que lhe reportou a admiração dos senadores conservadores. Quando acudia ao Circo, o público o aplaudia pela sua valentia.<ref name=autogenerated2 /> Nestas circunstâncias, que Curião conservara a amizade de Clódio podia fazer conceber esperanças a Cícero de Clódio acabar unindo-se ao partido dos ''[[optimates]]'',<ref>Holland, pág. 258.</ref> que era a tendência política que tradicionalmente seguiram a maioria dos [[Gens Claudia|Cláudios]]. Porém, tais esperanças não se realizaram e o tribuno da plebe Clódio dedicou-se a perseguir Cícero, que teve de abandonar Roma.
 
Em [[56 a.C.]] começaram a aparecer signos de debilidade no [[Primeiro triunvirato|triunvirato]], com a luta entre [[Crasso]] e [[Pompeu]] pelo comando no Oriente na luta contra os [[partos]]. Isto fez com que os velhos inimigos do triunvirato, entre os que estava Curião, se preparassem para dar a batalha.<ref>Holland, pág. 277.</ref> Em [[54 a.C.]] Curião desempenhou a [[pretura]] e, ao ano seguinte seguinte foi [[Promagistrado|proquestor]] na [[Província romana da Ásia|província da Ásia]].<ref name="Nota 47" /> O desempenhou da sua questura foi digno de elogio. Estando ainda na Ásia, faleceu o seu pai, e começou a planear os [[jogos funerários]] que daria em honra da sua memória quando voltara para Roma.
 
O seu amigo Públio Clódio apresentou-se como candidato ao [[pretor]]ado. Os ''[[optimates]]'' defendiam a candidatura de [[Tito Ânio Papiano Milão|Milão]] ao [[consulado]]. Cícero recorreu entre outros a Curião, a quem pediu usar a sua influência para impulsionar esta candidatura. Porém, não consta que Curião tivesse apoiado Milão ativamente.<ref>Francisco Pina Polo: ''Marco Túlio Cícero'', Ariel, 2005, ISBN 84-344-6771-2, pág. 238.</ref> Ao final, nem um nem outro puderam atingir as magistraturas que pediam. O primeiro resultou morto na [[via Ápia]], e o segundo, acusado desse [[assassinato]], exilou-se em [[Massália]].
 
À sua volta a [[Roma]], Curião celebrou os jogos funerários em honra do seu pai. Para isso, vendo que não podia avantajar a espetaculosidade de outros jogos precedentes, ideou um engenho que se recordou em gerações posteriores.<ref>[[Plínio, o Velho]]: [[História Natural]], [http://www.perseus.tufts.edu/cgi-bin/ptext?doc=Perseus%3Atext%3A1999.02.0137&query=head%3D%232515 Livro XXXVI. A história natural das pedras, 117-18 {{en}}.][[Língua inglesa|inglês]]<span>)</span><span>.</span> assinala que Curião lamentava não poder celebrar jogos que superassem a riqueza e magnificência dos de [[Escauro]], e o que ideou foi um novo engenho próprio.</ref> Fez construir dois [[Teatro romano|teatros]], um junto ao outro, de [[madeira]] e unidas as arquibancadas por um pivô. Antes do meio-dia, foi exibido um espetáculo de jogos em cada um de eles; os teatros estavam volvidos o um contra o outro de maneira a que o ruído de um não interferira no que estava ocorrendo no outro. Num momento posterior do mesmo dia, de repente, os dois teatros giraram e, unindo-se as esquinas, ficaram cara a cara; também se tiraram os quadro exteriores e assim se formou um [[anfiteatro]], no que decorreram lutas de [[gladiador]]es.<ref>Plínio o Velho, 36.117-18; Holland, pág. 314.</ref> Além disso, Curião especializou-se em apresentar [[pantera]]s, pois o público apreciava a apresentação de animais exóticos nos jogos. Tais alardes obedeciam a algo muito habitual na [[República Romana]]; esperava-se que tudo candidato a uma magistratura desse impressionantes jogos aos demais cidadãos, embora fosse incorrendo em grandes dívidas, das quais era esperado ressarcirem-se posteriormente com a renda que conseguissem na sua carreira política. Desta maneira impressionava-se o eleitorado em favor de um dos candidatos. Curião visava apresentar-se ao [[tribuno|tribunado]], e com uns jogos que todos recordariam, ao mesmo tempo que celebrava a memória do seu pai, ajudava-se na sua carreira política.<ref>Holland, pág. 315.</ref>
 
[[Ficheiro:Fulvia Antonia.jpg|thumb|250px|Moeda na que aparece representada [[Fúlvia]], esposa primeiro de [[Públio Clódio Pulcro|P. Clódio]], depois de Curião e finalmente de [[Marco Antônio]]. Eumeneia (como Fúlvia). Por volta de 41-40 a.C. Æ 18mm (7.82 g, 12h). Zmertorix, o filho de Filonides, magistrado. Busto de Fúlvia (como Nike) / Ateneia em pé, sustendo um escudo e uma lança; [Z]MERTOR[IGOS/FILWNIDOU] em duas linhas. RPC I 3139; SNG Copenhague.]]
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Mas além dessa razão podia haver outras. Célio alude à irresponsabilidade do seu amigo. Porém, Curião devia pensar [[Pragmatismo|pragmaticamente]] na sua própria carreira política. Naquele momento, a geração mais nova acreditava que César era uma aposta mais segura. Assim, poderia fazer por César o que o próprio César fizera por Pompeu, e aguardar uma recompensa similar.<ref>Holland, pág. 320.</ref> O próprio Célio escreveu a [[Cícero]] que, bem como na época de [[paz]], era importante apoiar a facção que leva razão, "na época de guerra se tem de apoiar a mais forte".<ref>Cícero, ''Aos amigos'', 8.14, citado por Holland, pág. 322.</ref> Apoiar César podia significar para estes jovens uma ascensão mais rápida ao poder.
 
Curião tinha a suficiente habilidade para que a mudança não fosse totalmente descarada, de maneira a que a aparência que deu era que estava tanto contra de Pompeu como contra de César, mas no seu coração, diz [[Veleio Patérculo]] "era um cesariano".<ref>Veleio Patérculo: ''História Romana'', livro II, cap. 48.4.</ref> A princípio continuou atacando César, e pouco a pouco foi assumindo uma aparência de [[neutralidade]]; e para marcar a ruptura entre ele e o partido pompeiano, propôs algumas leis que sabia que não poderiam ser levadas a cabo, como por exemplo vastos planos para reparar e construir [[estrada]]s. Ao recusarem os seus planos deram-lhe a desculpa perfeita para abandonar os seus amigos. Em março de [[50 a.C.]], Curião impôs o seu veto quando foi debatida de novo a possível destituição de César.<ref>Pina Pelo, pág. 299.</ref> Assim, antes da [[Segunda Guerra Civil da República de Roma|Guerra Civil]], Curião apareceu como um dos últimos políticos que pediu a Pompeu e a César que fizessem as pazes.<ref>Uma página que debate o movimento de Curião para impedir a guerra civil: [http://www.unrv.com/fall-republic/crossing-the-rubicon.php unrv.com {{en}}][[Língua inglesa|inglês]]<span>)</span></ref> No [[Senado romano|Senado]], alguns acreditavam que Pompeu não devia ser privado do seu poder até o fazer César. E outros, entre eles Curião, diziam o contrário, que precisamente precisavam César contra o poder de Pompeu, pondo em evidência uma e outra vez que Pompeu não estava disposto a renunciar ao comando, nem a uma única das suas legiões, e que tinham de temê-lo o mesmo que a César, e que tinha pretensões de [[tirania|tirano]]. Ou isso, ou que ambos dissolvessem os seus exércitos. Como o Senado não concordou, interpôs o veto e a questão ficou indecisa.
 
A sessão do Senado que definitivamente radicalizou as posturas que levaram à guerra civil foi celebrada a [[1 de dezembro]] de [[50 a.C.]] De novo o [[cônsul romano|cônsul]] [[Caio Cláudio Marcelo (cônsul 50 a.C.)|Cláudio Marcelo]] propôs as questões que levavam meses debatendo. Mas habilmente dividiu a questão e tomou os votos separadamente, assim: "Devem enviar-se os sucessores a César?" e de novo, "Deve Pompeu ser privado do comando?" A maioria votou em favor da primeira e contra da segunda.<ref name="Nota 48">José Joaquín Caerols, nota 48 em Aulo Hírcio, [[De Bello Gallico|''Comentários à guerra das Gálias'']], livro VIII, cap. 52.5, pág. 334, Alianza Editorial, Col. Clásicos de Grecia y Roma, BT 8254, 3.ª reimpres., Madrid, 2008, ISBN 978-84-206-4092-1</ref><ref>Apiano, ''As guerras civis'', Livro II, cap. 30</ref> Mas então interveio Curião concebendo como terceira questão a sua anterior proposta: que ambos [[procônsul]]es depusessem o seu poder.<ref>[[Aulo Hírcio]], [[De Bello Gallico|''Comentários à guerra das Gálias'']], livro VIII, cap. 52.4, pág. 334, trad. José Joaquín Caerols, Alianza Editorial, Col. Clásicos de Grecia y Roma, BT 8254, 3.ª reimpres., Madrid, 2008, ISBN 978-84-206-4092-1.</ref> O argumento que oferecia Curião era que César e Pompeu receavam o um do outro, e que não haveria paz duradoura até os dois serem privados do comando e das legiões. Era uma postura plausível e com total aparência de neutralidade, pronunciada por quem parecia tão valente quanto para não temer a inimizade de Pompeu nem de César. O Senado votou, e a maioria concordou com a proposta de Curião, que anulava as duas anteriores,<ref name="Nota 48" /> com 22 senadores contra e 370 a favor.<ref>Apiano, ''As guerras civis'', Livro II, cap. 30.</ref> Com isso ficava demonstrado que os radicais anticesarianos eram uma minoria no Senado. A maioria, o mesmo que o povo em geral, o que desejava era evitar a guerra civil.<ref>Pina Pelo, pág. 299-300.</ref>
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Mas do mesmo jeito era considerado que tinha notáveis talentos, particularmente como [[orador]]. [[Cícero]] apreciou essa qualidade, e nunca perdeu a esperança de voltar o talento de Curião em favor das suas ideias. As primeiras sete cartas do Segundo livro de Cícero ''Epistolae ad Familiares'' dirige-se a ele.
[[Quintiliano]], o [[Retórica|retórico]] do [[século I]] d.C., punha como exemplo de certo estilo [[humor]]ístico, em que uma réplica engenhosa segue de maneira natural e inevitável a outra broma anterior, uma entre Cícero e Curião, quem sempre começava os seus discursos pidindo perdão pela sua juventude, ao que Cícero respondeu que "Encontrarás o teu exórdio mais fácil cada dia".<ref>[[Quintiliano]], [http://penelope.uchicago.edu/Thayer/E/Roman/Texts/Quintilian/Institutio_Oratoria/home.html ''Institutio Oratoria'', vi. 3. § 76 {{en}}][[Língua inglesa|inglês]]<span>)</span></ref> [[Suetônio]] contava que [[Pompeu]] retomou a prática de declamar até mesmo durante a [[Segunda Guerra Civil da República de Roma|guerra civil]], para estar melhor preparado para argumentar contra Curião, "um jovem de grande talento, a quem era encomendada a defesa de César".<ref>[[Suetônio]], [http://www.gutenberg.org/files/6398/6398.txt ''Vidas de eminentes gramáticos e retóricos''{{en}}][[Língua inglesa|inglês]]<span>)</span>.</ref> Também [[Tácito]] o menciona no seu ''[[Dialogus de oratoribus|Diálogo sobre os oradores]]'', quando gaba que os antigos também cultivavam a [[oratória]], dizendo que {{Quote1|De eles pode ser entendido bem não somente em valor e armas, mas em engenho e eloquência; que os Lêntulos, os Metelos, os Lúculos, os Curiões e demais próceres colocaram muito trabalho e cuidado nestes estudos, e que nenhum naqueles tempos chegou a grande valimento sem a eloquência. ''Diálogo dos oradores'', 37.}}
 
== {{Bibliografia}} ==