Venda de esposas na Inglaterra: diferenças entre revisões

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Embora no início da [[Idade Moderna]] existissem métodos juridicamente válidos para romper um casamento na Inglaterra, as opções disponíveis eram inacessíveis à maioria da sociedade. A maneira mais comum consistia em peticionar a um [[tribunal eclesiástico]] por uma separação de corpos ({{Langx|la|''divortium a mensa et thoro''}}; [[Denotação|lit]].: separação de mesa e cama), em razão de [[adultério]] ou crueldade extrema.{{Sfn|Brabcová|2004|p=23}} Esse método, contudo, dependia de comprovação do adultério ou tratamento cruel, e além do mais não permitia aos cônjuges casarem-se novamente.{{Sfn|Stone|1990|p=141}}
 
A partir da década de 1550 e até que a Lei de causas matrimoniais{{efn|Em inglês: ''Matrimonial Causes Act''.}} foi promulgada em 1857, o divórcio ({{Langx|la|''divortium a vinculo matrimonii''}}; [[Denotação|lit]].: dissolução do vínculo matrimonial) tornou-se possível, mas devia ser precedido da separação ''a mensa et thoro'' e exigia o procedimento complexo e extremamente custoso de aprovação de uma lei privada do [[Parlamento do Reino Unido|Parlamento]].{{Sfn|Sokol|Sokol|2003|p=144}}{{efn|Em uma sentença de 1844 contra um marido bígamo, o juiz britânico William Henry Maule descreveu o processo de divórcio em detalhes, incluindo os seus custos: "Eu lhe direi o que você deveria ter feito [...] Você deveria ter instruído seu advogado a agir contra o sedutor de sua esposa [...]. Isso lhe custaria cerca de cem libras. Quando você tivesse obtido um julgamento por (embora não necessariamente recuperado) danos substanciais contra ele, você deveria ter instruído seu procurador a pedir aos tribunais eclesiásticos uma separação ''a mensa et thoro''. Isso lhe custaria duzentas ou trezentas libras a mais. Quando você tivesse obtido uma separação ''a mensa et thoro'', você deveria se fazer representar por um advogado diante da Câmara dos Lordes, a fim de obter uma lei privada do Parlamento autorizando um divórcio ''a vinculo matrimonii'', que teria permitido a você livre e legalmente se casar com a pessoa que você escolheu, sem tal sanção. O projeto de lei poderia ser repelido em suas etapas nas duas Casas do Parlamento, e você teria que gastar cerca de mil ou mil e duzentas libras. Você provavelmente vai me dizer que nunca teve esse dinheiro nesta vida; mas, prisioneiro, isso não faz diferença. Sentado aqui como um juiz inglês, é meu dever dizer-lhe que este não é um país em que há uma lei para os ricos e outra para os pobres. Você será preso por um dia. Como você esteve sob custódia desde o início do processo, você está livre para partir". Esses custos mais tarde contribuíram para a aprovação do ''Matrimonial Causes Act'' de 1857.{{Sfn|Wright|2004|p=169}}}} Como já se colocou a respeito, embora a Inglaterra e depois o [[Reino Unido]] fossem países de maioria [[Protestantismo|protestante]], em termos práticos essa era uma "sociedade sem divórcio", à imagem dos países [[Catolicismo|católicos]]:{{Sfn|Grossman|Guthrie|5=1996|p=308}} devido aos seus custos, em cerca de três séculos apenas 200 pessoas tentaram esse tipo de procedimento, das quais apenas 6seis eram mulheres.{{Sfn|Brabcová|2004|p=24}} E embora os tribunais de divórcio estabelecidos na sequência da lei de 1857 tenham tornado seu procedimento consideravelmente mais barato, o divórcio permaneceu proibitivamente caro para a imensa maioria da sociedade.{{Sfn|Finlay|2005|p=15}}
 
Também excessivamente custosa, a anulação do casamento buscava invalidar retroativamente o enlace, mas exigia acesso a [[Tribunal eclesiástico|tribunais eclesiásticos]] e a presença de certos pressupostos que a restringia a poucos.{{Sfn|Stone|1990|p=141}}{{Sfn|Grossman|Guthrie|5=1996|p=308-309}} Uma alternativa menos cara era obter uma separação privada, um acordo negociado entre os dois cônjuges e celebrado em um ato de separação elaborado por um jurista especializado em operações de compra e venda, o ''conveyancer''. Mas também esse método era uma impossibilidade para a maioria e além do mais não permitia aos cônjuges casarem-se novamente.{{Sfn|Stone|1990|p=141}} A deserção ou fuga conjugal era muito comum, e nesse caso um dos cônjuges evadia-se, a esposa era forçada a deixar a casa da família ou o marido estabelecia uma nova casa com sua nova companheira. Contudo, os cônjuges permaneciam impossibilitados de contrair novas núpcias, e a esposa permanecia responsabilidade de seu marido, que legalmente continuava a responder por seu sustento.{{Sfn|Stone|1990|p=141}}{{Sfn|Bryce|1901|p=818}}
 
Por fim, a noção da venda da esposa era um método alternativo, mas desprovido de reconhecimento jurídico formal, de terminar um casamento.{{Sfn|Hill|1994|p=215}} Um manual jurídico de 1777, intitulado ''The Laws Respecting Women, As They Regard Their Natural Rights'', observava que, para os pobres, a venda de esposas era vista como um "método de dissolver o casamento", quando "o marido e a mulher encontram-se vivamente cansados uns dos outros e concordam em separar-se, se o homem tiver a intenção de validar a separação pretendida, tornando-a uma questão de conhecimento público".{{Sfn|Wright|2004|p=170}}
 
=== Casamento e estatuto da mulher ===