Samba: diferenças entre revisões

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O samba batucado e sincopado do Estácio representou um rompimento estético com o samba amaxixado da Cidade Nova.{{sfn|Paiva|2009|p=36}} Por sua vez, a primeira geração do samba não aceitava as inovações criadas pelo sambistas do morro, visto como uma deturpação do gênero{{sfn|Paranhos|2003|p=84}} ou mesmo designado como “[[Marcha (música)|marcha]]”.{{nota de rodapé|Em entrevista registrada pelo jornalista Sérgio Cabral no fim da década de 1960, Donga e Ismael Silva divergiram sobre o seria samba. '''Donga''': ''Samba é isso há muito tempo. “O chefe da policia/ pelo telefone mandou me avisar/ Que na Carioca/ Tem uma roleta para se jogar”.'' '''Ismael''': ''Isto é maxixe.'' '''Donga''': ''Então, o que é samba?'' '''Ismael''': ''“Se você jurar/ Que me tem amor / Eu posso me regenerar/Mas se é/ para fingir mulher/ A orgia assim não vou deixar”.'' '''Donga''': ''Isso não é samba, é marcha.''{{sfn|Cabral|1996a|p=37}}}} Para músicos como Donga e Sinhô, samba era sinônimo de maxixe – espécie de último estágio abrasileirado da [[Polca|polca europeia]].{{sfn|Silva|Filho|1998|p=82}} Já para os sambistas dos morros cariocas, samba era o último estágio abrasileirado do batuque angolano que propunham ensinar à sociedade brasileira mediante as escolas de samba.{{sfn|Silva|Filho|1998|p=82}} Esse conflito de gerações, no entanto, não perdurou por muito tempo, e o samba do Estácio firmou-se como o ritmo por excelência do samba urbano carioca no decorrer da [[década de 1930]].{{sfn|Sandroni|2001|p=80}}{{sfn|Paiva|2009|p=60}}
 
Entre 1931 e 1940 o samba foi o gênero de canção popular mais gravado no Brasil, com quase 1/3 do repertório total – 2.176 sambas em um universo de 6.706 composições.{{sfn|Mello|Severiano|1997|p=67}} Sambas e marchas compuseram juntos os percentuais pouco mais da metade do repertório gravado nesse período.{{sfn|Mello|Severiano|1997|p=67}} Graças a nova tecnologia de gravação elétrica, foi possível captar os instrumentos percussivos presentes nas escolas de samba.{{sfn|Paiva|2009|p=85}} O samba “Na Pavuna” (de [[Almirante (compositor)|Almirante]]), interpretado pelo [[Bando de Tangarás]], foi o primeiro gravado em estúdio com a percussão que caracterizaria o gênero a partir dali: [[tamborim]], [[Surdo (instrumento musical)|surdo]], [[pandeiro]], [[ganzá]], [[cuíca]], entre outros.{{sfn|Lopes|Simas|2015|p=150}} Embora contado com a presença desses instrumentos percussivos, as gravações de samba em estúdio eram marcadas pela predominância de arranjos musicais de tom orquestrado com [[Metais|instrumentos de metais]] e [[Instrumento de cordas|corda]].{{sfn|Paiva|2009|p=86}} Esse padrão orquestral foi imprimido sobretudo por arranjadores europeus, entre os quais [[Simon Bountman]], Romeu Ghipsmanm, Isaac Kolman e Arnold Gluckman, maestros cuja formação [[Música erudita|erudita]] acabou por conferir uma sonoridade sinfônica europeia no ritmo contramétrico e de batuques do samba estaciano.{{sfn|Franceschi|2002|p=292}}
 
Outra razão do sucesso do samba estaciano no mercado fonográfico foi a introdução da “segunda parte”, que estimulou o estabelecimento entre parcerias entre os compositores.{{sfn|Paiva|2009|p=87}} Por exemplo, um compositor criava o refrão de um samba e outro compositor concebia a segunda parte, como ocorreu na parceira entre Ismael Silva e [[Noel Rosa]] em “Para Me Livrar do Mal”, resultado da primeira parte do sambista estaciano e da segunda parte do sambista da Vila Isabel.{{sfn|Máximo|Didier|1990|p=209}} Com a crescente demanda por novos sambas pelos intérpretes, também se tornou comum a prática de compra e venda de composições.{{sfn|Lopes|2019|p=114}}{{sfn|Lopes|Simas|2015|p=100}} Essa transação normalmente se dava por duas maneiras distintas: o autor negociava a venda apenas da gravação do samba – isto é, o sambista mantinha-se como autor da composição, mas não receberia nenhuma parte dos ganhos obtidos com as vendas dos discos, que ficavam divididos entre o comprador e a gravadora – {{nota de rodapé|Se o sambista integrasse algum órgão regulamentador de direitos autorais, ele também estaria apto a receber por esse meio.}} ou da composição inteira – ou seja, o sambista perdia integralmente os direitos sobre o seu samba, inclusive de autoria.{{sfn|Benzecry|2008|pp=70-71}} Em alguns casos, o sambista vendia a parceria ao comprador e também recebia uma parte dos lucros com as vendagens dos discos.{{sfn|Benzecry|2008|pp=70-71}} Vender um samba significava ao sambista uma chance de ver sua produção divulgada – especialemnte quando ele ainda não gozava do mesmo prestígio adquirido pelos sambistas da primeira geração – e também um modo de suprir suas próprias dificuldades financeiras.{{nota de rodapé|Em depoimento a [[Muniz Sodré]], Ismael Silva relata suas parcerias com Francisco Alves: ''Um dia doente, num hospital, fui procurado por Alcebíades Barcelos (Bide). Perguntou-me se queria vender o samba ao Chico Viola [Francisco Alves]. Cem mil réis era o que ele oferecia. Aceitei depressa e o samba, que ficou sendo propriedade dele, apareceu com meu nome. Depois vendi “Amor de Malandro”, por quinhentos réis, mas desta vez eu não figurei na gravação como autor. Fiquei zangado, é claro. O mesmo acontecia com outros sambistas: vendiam músicas que surgiam como se fosse dos compradores.''{{sfn|Sodré|1998|p=95}}}}{{sfn|Benzecry|2008|pp=70-71}} Para o comprador, era a possibilidade de renovar seu repertório, gravar mais discos e faturar sobre as vendagens, e consolidar ainda mais sua carreira artística.{{sfn|Fenerick|2002|p=168}} Artistas com bom trânsito com as gravadoras, os populares intérpretes [[Francisco Alves]] e [[Mário Reis]] foram adeptos dessa prática,{{sfn|Marcondes|1977|p=649}}{{sfn|Marcondes|1977|p=639}}{{sfn|Vagalume|1978|p=29}} tendo adquirindo sambas de compositores como [[Cartola (compositor)|Cartola]]{{sfn|Máximo|Didier|1990|p=210}}{{sfn|Cabral|1996a|p=272}}{{sfn|Cometti|2004}} e Ismael Silva.{{sfn|Máximo|Didier|1990|p=210}}{{sfn|Giron|2001|pp=98-100}}{{sfn|Cabral|1996a|pp=244-245}}