Fumarola negra
Fumarola negra é um tipo de fonte hidrotermal cuja pluma de material particulado em suspensão - ejetada a partir de sua chaminé - tem aparência escura. O fluido emanado de uma fumarola negra é rico em sulfetos e tipicamente apresenta temperatura muito alta (acima de 200 °C). Quando ele entra em contato com a água fria do oceano profundo há precipitação de diversos minerais, formando depósitos sedimentares ricos em sulfetos metálicos no entorno da fumarola.
![](http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/6/6f/Blacksmoker_in_Atlantic_Ocean.jpg/220px-Blacksmoker_in_Atlantic_Ocean.jpg)
Apesar de ocorrerem predominantemente no oceano, fumarolas negras também podem ser encontradas no fundo de lagos e lagoas quentes. Elas são encontradas principalmente nas bordas das placas tectônicas, onde a espessura da crosta tende a ser mais fina e o gradiente geotérmico é mais acentuado. Isso favorece o aquecimento do fluido percolante e promove reações químicas que formam o fluido hidrotermal da fumarola negra.
Uma das mais belas fumarolas negras já descobertas chama-se Castelo de Loki, localizada na Dorsal Mesoatlântica entre a Groenlândia e a Noruega.[1] Ela foi descoberta por cientistas da Universidade de Bergen (Noruega) em 2008.
Diferença entre fumarolas negra e branca
editarAs fumarolas encontradas no assoalho oceânico podem ser classificadas em negras e brancas conforme a cor da pluma do fluido ejetado a partir de sua chaminé. Além da cor da pluma, o fluido dessas fumarolas também apresenta propriedades distintas. As fumarolas negras ejetam fluido com temperaturas muito elevadas (200-380 °C), enquanto as fumarolas brancas emanam fluido com temperaturas mais brandas (5-60 °C).[2] O material particulado em suspensão na pluma tende a precipitar em contato com a água do mar, formando a chaminé da fumarola e depósitos/incrustações no seu entorno. Na área sob influência das fumarolas negras existem depósitos ricos em sulfetos metálicos, já em torno das fumarolas brancas há deposição de óxidos de bário, cálcio e silício.[2] Outra diferença entre esses dois tipos de fumarola é a sua localização predominante no oceano global. Enquanto as fumarolas negras geralmente são encontradas sobre a dorsal das cordilheiras meso-oceânicas, as fumarolas brancas ocorrem mais frequentemente nas zonas de fratura dessas mesmas cordilheiras.[3]
Distribuição global
editarA primeira fonte hidrotermal no oceano foi descoberta em 1977 na Falha de Galápagos, que separa as placas tectônicas de Nazca e Cocos.[4] Desde então, mais de 500 campos hidrotermais já foram descobertos no oceano global.[5] A distribuição das fontes hidrotermais está diretamente relacionada à atividade sísmica nas bordas das placas tectônicas. Elas ocorrem em maior abundância nas cordilheiras meso-oceânicas do Oceano Pacífico.[5]
Estrutura de um campo hidrotermal
editarA estrutura interna de um campo hidrotermal é formada por um sistema de fissuras que coleta água do mar infiltrada no leito marinho e ejeta fluido hidrotermal através da fumarolas desse campo. O fluido é lançado na coluna de água oceânica com propriedades diferentes da água do mar. Todo o sistema é alimentado pela infiltração da própria água do mar em regiões profundas da crosta oceânica, onde essa água absorve calor do gradiente geotérmico local (que é acentuado pela proximidade de câmaras magmáticas). O fluido aquecido e sob alta pressão retorna para a superfície, sendo ejetado através das fumarolas negras e/ou brancas. A estrutura externa do campo é formada por chaminés que liberam não só calor, mas também sulfetos metálicos, gás sulfídrico, óxidos de bário, óxidos de cálcio, sílica e metais dissolvidos na coluna de água oceânica.[3]
Formação do fluido hidrotermal
editarA água intersticial que vai formar o fluido da fumarola negra geralmente penetra vários quilômetros no basalto da crosta oceânica, percorrendo um longo caminho através de rachaduras e fissuras. Estima-se que essa estrutura interna do campo hidrotermal atinja profundidades em torno de 1,5 a 3,5 quilômetros. Isso permite que o fluido interaja quimicamente com o basalto da crosta por um período de até três anos antes de ser ejetado através do topo da chaminé de uma fumarola negra. Inicialmente, esse contato da água intersticial com o basalto promove o consumo do oxigênio dissolvido e libera gases como dióxido de carbono, hidrogênio, metano e sulfeto de hidrogênio. Além dessa alteração na composição dos gases dissolvidos, o fluido hidrotermal em formação também perde magnésio e sulfato devido às reações químicas com o basalto. Em contrapartida, ele torna-se enriquecido em ferro, cobre e zinco. Após todas essas modificações, o fluido retorna para a superfície, convergindo para o topo da fumarola negra sem oxigênio dissolvido, com o pH mais ácido e rico em metais. Quando esse novo fluido - chamado de solução hidrotermal - entra em contato com a água do mar ao ser ejetado através da chaminé da fumarola negra, ele sofre um choque físico-químico que irá depositar sulfetos metálicos no entorno da sua estrutura externa.
Reações químicas
editarA água intersticial que penetra através das fissuras que compõem a estrutura interna do campo hidrotermal não contém a mesma composição química do fluido que é expelido pela chaminé da fumarola negra. Uma série de reações químicas ocorre entre a água intersticial e o basalto oceânico durante a formação do fluido hidrotermal. Por exemplo, os íons cálcio (Ca2+) e sulfato (SO42-) dissolvidos na água do mar precipitam para formar o mineral anidrita conforme a reação abaixo:[6]
O magnésio (Mg2+) dissolvido na água intersticial também precipita na forma de hidróxido de magnésio (Mg(OH)2), liberando íons hidrogênio (H+) no fluido e reduzindo seu pH conforme descrito abaixo:
Por sua vez, o hidróxido de magnésio reage com o basalto resultando na formação de argilo-minerais laminares. Porém, o produto dessa reação pode variar dependendo da temperatura da solução hidrotermal. Em temperaturas inferiores a 200 °C há formação de esmectitas, enquanto cloritas são formadas em temperaturas superiores a 200 °C.[2]
Duração da atividade do hidrotermal
editarA fase ativa de um campo hidrotermal corresponde ao período no qual suas fumarolas emanam solução hidrotermal através das chaminés. Ela tem relação direta com a velocidade de espalhamento das placas tectônicas onde esse campo está localizado. Logo, uma fumarola deixa de ejetar fluido quando afasta-se da região de borda das placas tectônicas. Este fenômeno representa a "morte" da fonte hidrotermal.
A fase ativa é mais curta em fumarolas localizadas sobre cordilheiras de espalhamento rápido, como a Cordilheira Pacifico Leste que desloca-se a uma velocidade que pode chegar a 15 centímetros por ano.[7] Nessas cordilheiras, a fase ativa de um campo hidrotermal geralmente varia de 6 a 14 milhões de anos.[3] Já nas cordilheiras de espalhamento lento, a fase ativa é um pouco mais duradoura, oscilando de 11 a 19 milhões de anos. Um exemplo desse tipo de cordilheira é a Cordilheira Meso-Atlântica cuja velocidade de espalhamento está em torno de 2 a 5 centímetros por ano.[7] Por fim, fumarolas localizadas na zona de fratura de uma cordilheira apresentam uma fase ativa bastante extensa, variando de 50 a 70 milhões de anos.[3]
Importância econômica e ecológica
editarOs depósitos minerais no entorno das fumarolas negras são ricos em metais, como cobre, zinco e terras raras.[2][8][9][10] Estas últimas apresentam elevado valor comercial porque são utilizadas em diversas aplicações na indústria tecnológica, como a fabricação de computadores, celulares, carros elétricos e satélites.[11][12] Considerando que as principais reservas mundiais de terras raras estão localizadas na Ásia,[12] sua exploração no fundo do oceano pode ser uma alternativa para reduzir a dependência econômica do mercado asiático. Entretanto, ainda é preciso equacionar a viabilidade econômica dessa exploração, pois a extração mineral no fundo do oceano ainda é muito onerosa em comparação com aquela realizada nos continentes. Além disso, há poucos profissionais especializados nesse tipo de exploração.
Além de toda a questão técnica e financeira, também existe uma questão ecológica que envolve a exploração econômica das fumarolas negras. Ecossistemas frágeis e com diversas espécies endêmicas acabam se desenvolvendo no entorno de campos hidrotermais ativos. O sulfeto de hidrogênio e o calor no oceano profundo próximo às fumarolas servem de matéria prima para bactérias e árqueas quimiossintetizantes que transformam enxofre e hidrogênio em matéria orgânica. Assim, esses microrganismos servem como produtores primários para organismos bentônicos que crescem no entorno das fumarolas.
Ver também
editarReferências
editar- ↑ «Scientists Break Record By Finding Northernmost Hydrothermal Vent Field». ScienceDaily (em inglês). Consultado em 19 de abril de 2022
- ↑ a b c d Schulz, Horst D.; Zabel, Matthias, eds. (2006). Marine Geochemistry (em inglês). Berlin/Heidelberg: Springer-Verlag
- ↑ a b c d Chester, R (2000). Marine Geochemistry. [S.l.]: Blackwell Science
- ↑ Corliss, John B.; Dymond, Jack; Gordon, Louis I.; Edmond, John M.; von Herzen, Richard P.; Ballard, Robert D.; Green, Kenneth; Williams, David; Bainbridge, Arnold (16 de março de 1979). «Submarine Thermal Springs on the Galápagos Rift». Science (em inglês) (4385): 1073–1083. ISSN 0036-8075. doi:10.1126/science.203.4385.1073. Consultado em 18 de abril de 2022
- ↑ a b Beaulieu, Stace E.; Baker, Edward T.; German, Christopher R.; Maffei, Andrew (novembro de 2013). «An authoritative global database for active submarine hydrothermal vent fields: GLOBAL VENTS DATABASE». Geochemistry, Geophysics, Geosystems (em inglês) (11): 4892–4905. doi:10.1002/2013GC004998. Consultado em 18 de abril de 2022
- ↑ «ANIDRITA (Anhydrite)». Museu Heinz Ebert. Consultado em 18 de abril de 2022
- ↑ a b Vithana, M.V.P.; Xu, Min; Zhao, Xu; Zhang, Maochuan; Luo, Yiming (junho de 2019). «Geological and geophysical signatures of the East Pacific Rise 8°–10°N». Solid Earth Sciences (em inglês) (2): 66–83. doi:10.1016/j.sesci.2019.04.001. Consultado em 19 de abril de 2022
- ↑ Klinkhammer, G.; Elderfield, H.; Hudson, A. (setembro de 1983). «Rare earth elements in seawater near hydrothermal vents». Nature (em inglês) (5931): 185–188. ISSN 0028-0836. doi:10.1038/305185a0. Consultado em 19 de abril de 2022
- ↑ German, C. R.; Klinkhammer, G. P.; Edmond, J. M.; Mura, A.; Elderfield, H. (junho de 1990). «Hydrothermal scavenging of rare-earth elements in the ocean». Nature (em inglês) (6275): 516–518. ISSN 0028-0836. doi:10.1038/345516a0. Consultado em 19 de abril de 2022
- ↑ Klinkhammer, G.; German, C.R.; Elderfield, H.; Greaves, M.J.; Mitra, A. (fevereiro de 1994). «Rare earth elements in hydrothermal fluids and plume particulates by inductively coupled plasma mass spectrometry». Marine Chemistry (em inglês) (3): 179–186. doi:10.1016/0304-4203(94)90001-9. Consultado em 19 de abril de 2022
- ↑ «Valiosas e versáteis: pesquisas com terras raras mostram caminho para criar cadeia produtiva no Brasil». Jornal da USP. 19 de novembro de 2021. Consultado em 19 de abril de 2022
- ↑ a b Liy, Macarena Vidal (16 de junho de 2019). «Terras raras, o ouro do século XXI, são a arma da China na guerra tecnológica». El País Brasil. Consultado em 19 de abril de 2022