Dicogamia

produção alternada de gâmetas masculinos e femininos em organismos
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Dicogamia (forma preferida em botânica) ou hermafroditismo sequencial (forma preferida em zoologia) é a designação dada às estratégias reprodutivas que incluem um tipo de hermafroditismo com separação temporal na produção de gâmetas masculinos e femininos num mesmo indivíduo. No contexto da sexualidade vegetal das plantas com flores (angiospermas) a dicogamia descreve a existência de uma separação temporal na maturação dos sexos dentro da mesma flor ou da mesma planta. Na sexualidade animal, a dicogamia descreve a produção, em fases diferentes da vida, de gâmetas masculinos e femininos por um mesmo espécime. Há duas formas de dicogamia: a protoginia, na qual a maturação dos órgãos sexuais femininos precede a dos masculinos, e a protandria na qual, pelo contrário, os órgão sexuais masculinos maturam antes dos femininos.[1][2] Esta estratégia reprodutiva é muito comum em plantas, peixes e gastrópodes, podendo as espécies ter gónadas que contenham em simultâneo células germinais femininas e masculinas ou mudar completamente de tipo gonadal durante o seu último estádio de vida.[3]

Amphiprion ocellaris, uma espécie protândrica.
Thalassoma lunare, uma espécie animal protogínica.
Protândria em Aeonium undulatum.

Descrição editar

A dicogamia (ou hermafroditismo sequencial) é muito comum entre as angiospermas como forma de evitar a endogamia, mas também ocorre com grande frequência entre os peixes e os gastrópodes. Embora exista no mundo animal entre outros taxa, é neles comparativamente raro.

Sexualidade vegetal editar

Historicamente, a dicogamia foi considerada como um mecanismo para reduzir a endogamia (por exemplo, Darwin, 1862).[4] Contudo, a proporção de espécies dicógamas é similar tanto entre as plantas autógamas como alógamas.[5][6]

A duração do período de receptividade estigmática joga um papel central na regulação do isolamento entre sexos nas plantas dicógamas, e tal duração é influenciada pela temperatura e a humidade.[7]

A protandria favorece a alogamia e é a condição mais frequente em espécies com dicogamia intrafloral.[8] A protoginia intrafloral está associada com a autogamia, pelo que este processo é um recurso evolutivo para assegurar a produção de frutos e sementes.[2][9]

Sexualidade animal editar

Entre os peixes e os gastrópodes são comuns os casos de hermafroditismo, ocorrendo tanto na variante protândrica como protogínica. Em muitos outros agrupamentos taxonómicos, embora menos frequentes, estas estratégias reprodutivas não são incomuns.

Hermafroditas protândricos editar

Hermafroditas protândricos é a designação dada em zoologia aos organismos que nascem com o sexo masculino e que em algum momento de sua vida sofrem uma mudança para o sexo feminino.

Entre os animais protândricos incluem-se diversas espécies de peixe-palhaço, entre as quais Amphiprion percula. Esta espécie apresenta uma organização social rigidamente estruturada, com até quatro indivíduos excluídos da procriação por cada par reprodutor, partilhando toda a colónia uma única anémona-do-mar. A dominância é baseada no tamanho, com a fêmea a ser o maior e o macho reprodutor o segundo maior. Os restantes membros do grupo são animais progressivamente menores não-procriadores, sem gónadas funcionais.[10] Se a fêmea morre, o macho ganha peso e torna-se fêmeas desse grupo. De seguida, o maior espécime não-procriador, amadurece sexualmente e torna-se o macho do grupo.[11]

Outros exemplos de animais protândricos incluem:

Hermafroditas protogínicos editar

Hermafroditas protogínicos é a designação dada em zoologia aos organismos que nascem com o sexo feminino e que em algum momento de sua vida sofrem uma mudança para o sexo masculino. À medida que o animal envelhece, com base em eventos internos ou externos, desencadeia-se um processo que leva à alteração do sexo para se tornar um animal masculino. A fecundidade masculina aumenta muito com a idade, ao contrário da feminina.

A protoginia é a forma mais comum de hermafroditismo em peixes no meio natural.[14] Cerca de 75% de todas as espécies de peixes em que ocorre hermafroditismo sequencial são protogínicas.[15]

Os organismos modelo mais comuns para este tipo de hermafroditismo sequencial são os bodiões (família Labridae), uma das maiores famílias de peixes dos recifes de coral. Os bodiões são encontrados em todo o mundo e em quase todos os habitats marinhos. Tendem a enterrar-se na areia durante a noite ou quando se sentem ameaçados.[16] Nos bodiões, os machos são mais corpulentos, sendo as fêmeas significativamente mais pequenas. Na maioria dos casos, as fêmeas e os espécimes imaturos têm uma cor uniforme, enquanto os machos apresentam uma fase terminal com brilhante coloração bicolor.[17] Os machos maiores dominam territórios e tentam acasalar durante a desova, enquanto os animais mais pequenas e de tamanho médio do sexo masculino, em fase inicial, vivem com as fêmeas e as crias do grupo.[18] Em outras palavras, tanto os machos iniciais como os na fase terminal se podem reproduzir, mas diferem no entanto, na forma como o fazem.

Na espécie Semicossyphus pulcher, um bodião da costa da Califórnia, quando uma fêmea se masculiniza e se transforma num macho funcional, os ovários degeneram e criptos espermatogénicos aparecem nas gónadas. A estrutura geral das gónadas mantém-se semelhante a um ovário, mesmo após a completa mudança de sexo, e o esperma é transportado por uma série de ductos situados na periferia da gónada e do oviducto. Neste caso, a mudança de sexo é estritamente dependente da idade, com o animal a manter-se como fêmea durante quatro anos antes de mudarem de sexo.[17]

A espécie Thalassoma bifasciatum inicia a sua fase reprodutiva como machos ou fêmeas, mas as fêmeas podem mudar de sexo e funcionar como machos. As fêmeas e machos jovens iniciam a fase reprodutiva com uma coloração distinta, conhecida como "fase inicial" antes de evoluirem para uma coloração conhecida por "fase terminal", distinta da anterior por mudanças na intensidade das cores, listras e barras. Os machos da "fase inicial" têm testículos maiores do que os dos machos da "fase terminal", apesar destes terem maior corpulência. Esta diferença está ligada à maior produtividade daqueles machos, os quais, apesar de mais pequenos, produzem maior quantidade de esperma. Esta estratégia permite competir com a do macho maior, que é mais poderoso na guarda do seu próprio harém.

Outros exemplos de protoginia incluem:

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Notas

  1. Warner, R.R (1975). «The Adaptive Significance of Sequential Hermaphroditism in Animals.». The American Naturalist. 109: 61–82 
  2. a b González, A.M (10 de janeiro de 2013). «Alogamia». Morfología de Plantas Vasculares (em espanhol). Argentina: Universidad Nacional del Nordeste 
  3. Carruth, L. L (2000). «Freshwater cichlid Crenicara punctulata is a protogynous sequential hermaphrodite». Copeia. 2000: 71–82 
  4. Charlesworth, D., Charlesworth, B. (1987). «Inbreeding Depression and its Evolutionary Consequences». Annual Review of Ecology and Systematics. 18: 237–68. JSTOR 2097132. doi:10.1146/annurev.es.18.110187.001321 
  5. Bertin, R.I. (1993). «Incidence of monoecy and dichogamy in relation to self-fertilization in angiosperms». Amer. J. Bot. 80 (5): 557–60. JSTOR 2445372. doi:10.2307/2445372 
  6. Bertin R.I., Newman C.M. (1993). «Dichogamy in angiosperms». Bot. Rev. 59: 112–52. doi:10.1007/BF02856676 
  7. Lora, J; Herrero, M., & Hormaza, J. I. (27 de abril de 2011). «Stigmatic receptivity in a dichogamous early-divergent angiosperm species, Annona cherimola (Annonaceae): Influence of temperature and humidity.». American Journal of Botany. 98: 265–274. doi:10.3732/ajb.1000185 
  8. Jersáková, J; SD Johnson (2007). «Protandry promotes male pollination success in a moth-pollinated orchid.». Functional Ecology. 21: 496–504 
  9. Bertin R.I. & Newman C.R. 1993. Dichogamy in Angiosperms. Bot.Rev. 59: 112-120.
  10. Buston, P. M (2004). «Territory inheritance in clownfish». Proceedings of the Royal Society B. 271: s252-s254. PMC 1810038 . PMID 15252999. doi:10.1098/rsbl.2003.0156 
  11. Buston, P (2004). «Does the Presence of Non-Breeders Enhance the Fitness of Breeders ? An Experimental Analysis in the Clown Anemonefish Amphiprion percula». Behavioral Ecology and Sociobiology. 57: 23–31. doi:10.1007/s00265-004-0833-2 
  12. a b Policansky, D (1982). «Sex change in plants and animals». Annual Review of Ecology and Systematics. 13: 471–495 
  13. Lederhouse, Robert C.; M.D. Finke, J.M Scriber (1982). "The Contributions of Larval Growth and Pupal Duration to Protandry in the Black Swallowtail Butterfly, Papiliopolyxenes". Oecologia (Berlin) 53: 296–300.
  14. Avise, JC; JE Mank (2009). «Evolutionary Perspectives on Hermaphroditism in Fishes». Sexual Development. 3: 152–163 
  15. Pandian, TJ (2012). Genetic Sex Differentiation in Fish. Boca Raton, FL: Science Publishers 
  16. «Animal Planet :: Fish Guide -- Wrasse». PetEducation.com. Consultado em 28 de março de 2011. Arquivado do original em 2 de março de 2011 
  17. a b Warner, R.R (1975). «The reproductive biology of the Protogynous hermaphrodite Pimelometopon Pulchrum (Pisces: Labridae).». Fishery Bulletin. 73: 261–283 
  18. Adreani, M S; L G Allen (2008). «Mating system and reproductive biology of a temperate wrasse, Halichoeres semicinctus». Copeia: 467–475 
  19. «Familie Serranidae - Sea basses: groupers and fairy basslets». Fishbase. 26 de agosto de 2010. Consultado em 21 de janeiro de 2012 
  20. «Anthiinae - the Fancy Basses». Reefkeeping Magazine. 2008. Consultado em 21 de janeiro de 2012 
  21. R. Thompson & J.L. Munro (1983). «The Biology, Ecology and Bionomics of the Hinds and Groupers, Serranidae». In: J. L. Munro. Caribbean Coral Reef Fishery Resources. [S.l.]: The WorldFish Center. p. 62. ISBN 978-971-10-2201-3 
  22. J.R. Gold (1979). «Cytogenetics». In: W.S. Hoar, D.J. Randall, & J.R. Brett. Bioenergetics and Growth. Col: Fish Physiology. VIII. [S.l.]: Academic Press. p. 358. ISBN 978-0-12-350408-1 
  23. Dimitri A. Pavlov, Natal'ya G. Emel'yanova, & Georgij G. Novikov (2009). «Reproductive Dynamics». In: Tore Jakobsen. Michael J. Fogarty, Bernard A. Megrey & Erlend Moksness. Fish Reproductive Biology: Implications for Assessment and Management. [S.l.]: John Wiley and Sons. p. 60. ISBN 978-1-4051-2126-2