La famille de saltimbanques

pintura de Pablo Picasso

La famille de saltimbanques, (A família de saltimbancos em português), é um quadro do pintor espanhol Pablo Picasso, datado de 1905, que marca a transição entre sua fase azul e a fase rosa, sendo considerado uma das maiores obras-primas.[1] O óleo sobre tela tem 212,8 X 229,6 cm e encontra-se exposto em Washington, na National Gallery of Art.[2] Pertence à fase rosa, anterior ao cubismo, em que Picasso volta a se aproximar dos princípios clássicos de beleza. Suas telas adquirem um tom mais natural e delicado, com predominância da cor rosa e vermelho.[3] Nesta fase, ocorrida entre a segunda metade do ano 1904 e durante 1905, o artista desenhava, gravava e pintava várias figuras e pequenos grupos de saltimbancos, arlequins e bobos da corte. [4]

La famille de saltimbanques
La famille de saltimbanques
Autor Pablo Picasso
Data 1905
Técnica Óleo sobre tela
Localização Galeria Nacional de Arte

O quadro, cuja paisagem é caracterizada por um ambiente triste, retrata uma família de saltimbancos, provavelmente inspirado no Circo Médrano que ficava localizado próximo a casa de Picasso[1], no bairro boêmio de Monmartre (em Paris). Os saltimbancos eram considerados a classe mais inferior dentre os acrobatas, comumente se apresentavam improvisadamente de cidade em cidade.[5] Chama atenção a imagem dos saltimbancos - comumente associados à diversão, crianças e alegria - destoando do deserto duro, estático e desolado ao fundo.[2] Assim como na literatura, as artes plásticas da época passou a explorar o tema do circo, vindo a ganhar importância notável na França, ao final do século XVIIII.[1] Outros pintores que manifestam essa atração pelo tema circense são os impressionistas e pós-impressionistas Edgar Degas, Pierre-Auguste Renoir, Georges Seurat e Van Gogh. Eles sentiam-se tão marginalizados como artistas de vanguarda quanto os artistas circenses.[6]

A ênfase anterior nos gestos, característica do maneirismo, e o exagero no comprimento das figuras deu lugar a posições forçadamente contrapostas dos corpos presentes no quadro. [2] Ainda que afastado do azul, que denotava sofrimento, em A Família dos Saltimbancos, Picasso segue representando certo espírito de introspecção e triste contemplação da vida. [3] Ao contrário da interação circense esperada para as figuras[2], elas se mostram psicologicamente isoladas uma da outra, e do próprio espectador[1]. Na falta de um objetivo, uma plateia e um número para apresentar, os artistas encontram-se pesados. As diferentes direções para qual olham promovem uma sensação de perda de sentido até mesmo em quem olha. Na obra, a plasticidade dos corpos é também realçada pelas vestimentas justas, colocadas numa espécie de segunda camada de pele colorida. [2]

A partir do silêncio das bocas, pintadas sem expressão, e do vazio estendido no horizonte do deserto, o artista espanhol constrói uma narrativa do silêncio e faz com que o espectador se pegue indagando o motivo pelo qual a família de saltimbancos encontra-se na situação angustiante do quadro. A classe de brincalhões já havia sido retratada de forma triste por outros pintores franceses, como Antoine Watteau e Paul Cézanne, os saltimbancos eram já reconhecidos por tal aspecto[5]. A obra de Picasso, no entanto, concretiza o retrato dos apátridas, pessoas sem local. Esta questão liga-se ao silêncio estudado na obra de Hannah Arendt, segundo a filósofa alemã, não há situação mais degradante para o homem do que a perda irremediável de um lugar no mundo.[2]

Completando uma metamorfose desde o final da adolescência até a fase adulta, a transformação psicológica de Picasso se deu em paralelo à sua própria mudança artística, desde melancólico período azul de perdas e depressão até o revitalizado "eu" do período rosa. É interessante que o primeiro amor de que se sabe de Picasso, quando era adolescente, foi uma motociclista de circo chamada Rosa. [4]

Exames radiológicos realizados na pintura revelaram que esta foi produzida em cinco estágios, num período de aproximadamente nove meses.[7] Ocupando mais da metade da tela, os personagens do circo aparecem em meio à um cenário sem tempo nem espaço, enquanto uma mulher ocupa a parte restante. Esta encontra-se de frente para o observador, tal como os dois garotos e o bufão. Diferentemente dos saltimbancos, ela está bem vestida e usa um chapéu enfeitado com flores. O arlequim, que está de costas, direciona seu olhar para a jovem. Enquanto a garotinha, também de costas, carrega uma cesta com as mesmas flores do chapéu da mulher, podendo esses serem indicativos da relação da mesma com o grupo. Com o intuito de criar uma visão perturbadora, Picasso deixa conscientemente na obra uma porção de erros. [6] A pintura enigmática continua evocando uma sensação de mistério e várias interpretações a partir de sua contemplação. O artista espanhol costumava datar seus trabalhos, mas raramente os nomeava. Essa pintura originalmente não dispunha de título, este veio derivado do conteúdo.[4]

Referências

  1. a b c d «Pintura: A Família de Saltimbancos (1905)». Consultado em 15 de maio de 2013 
  2. a b c d e f Britto, Denise Fernandes (2013). «A arte como expressão do homem em sociedade: identidade, singularidade e silêncio» (PDF). Revista Fafibe On-Line. Consultado em 23 de setembro de 2017 
  3. a b Noblat, Ricardo. «Pintura: A Família de Saltimbancos (1905)». Ricardo Noblat 
  4. a b c Blum, Harold P.; Blum, Elsa J. (1 de junho de 2007). «The Models of Picasso's Rose Period: The Family of Saltimbanques». The American Journal of Psychoanalysis (em inglês). 67 (2): 181–196. ISSN 0002-9548. doi:10.1057/palgrave.ajp.3350023 
  5. a b «CANAL KIDS - Arte - Teatro - História do Teatro - Teatro Mambembe». www.canalkids.com.br. Consultado em 24 de setembro de 2017 
  6. a b «Picasso – A FAMÍLIA DE SALTIMBANCOS». VÍRUS DA ARTE & CIA. 25 de agosto de 2014 
  7. «The Models of Picasso's Rose Period: The Family of Saltimbanques» (em inglês). Consultado em 15 de maio de 2013