Lei divina (ou lei de Deus) é a ideia de que as normas que orientam as ações humanas são estabelecidas no reino divino,[1] um conceito comum ao judaísmo, cristianismo e islamismo.

Origem

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A noção de lei divina, na qual de alguma maneira a divindade aplica a própria lei, aparece pela primeira vez na Grécia Antiga e na Bíblia hebraica. Como as concepções grega e bíblica do divino são radicalmente diferentes, suas noções da lei divina consequentemente divergem das demais também.[2]

Para os gregos, a lei divina não se refere a uma lei dos deuses, porque "porque expressa as estruturas profundas de uma ordem natural permanente",[3] que opera dentro do mundo físico e da natureza humana, jamais imposto por uma divindade.

Antecedentes no cristianismo

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O conceito de ius divinum ("lei divina") é baseado na ideia encontrada em muitas culturas de que a lei ou parte da lei tem origem divina. O cristianismo influenciou significativamente a teoria do ius divinum na Europa. A jurisprudência romana clássica dividia a religião e a lei em duas áreas distintas.[4]

O cristianismo medieval assumiu a existência de três tipos de leis: lei divina, lei natural e lei feita pelo homem.[5] Teólogos debateram substancialmente o escopo da lei natural, com o Iluminismo incentivando um maior uso da razão, expandindo o escopo da lei natural e marginalizando a lei divina em um processo de secularização.[6]

Frequentemente surgem conflitos entre os entendimentos seculares de justiça ou moralidade e a lei divina.[7]

Perspectiva religiosa

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Tomás de Aquino (De lege), definiu a lei de Deus como proveniente unicamente da revelação encontrada nas Escrituras (por exemplo, a lei bíblica, os Dez Mandamentos e outras prescrições que aparecem na Bíblia), sendo acessível ao homem, e sua observância é necessária para a salvação.[8]

Em religiões diversas existem conceitos similares, embora de aplicação muito diferente: a sharia e o conjunto de prescrições do islã (retiradas não apenas do Alcorão, mas também do Hadith e outras fontes), halacha ou mitzvah, e também o conjunto de prescrições do judaísmo (extraídas da Torá e do Talmude).[9]

O pensamento cristão atribui grande importância ao momento histórico da Redenção na medida em que estabelece uma "nova lei", "lei evangélica" ou Lei de Cristo que supera a "antiga lei" ou Lei de Moisés. É também entendida em termos de "aliança" entre o homem e Deus (nova e antiga alianças).[nota 1][10]

Na linguagem medieval, o termo "lei" era utilizado como sinônimo de "religião" (mas com um forte sentido de identidade étnica e consequências jurídicas e políticas nas diferentes comunidades aljamas nos reinos cristãos da Península ibérica) para diferenciar os seguidores da Lei de Cristo, a Lei de Moisés e a Lei Islâmica do profeta Maomé.[11]

Ver também

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Notas

  1. Movimentos de raízes messiânicas, como judeus messiânicos rejeitam este pensamento, atribuindo à lei de Cristo como complementar a lei mosaica.

Referências

  1. Brague, Rémi (2007). The law of God : the philosophical history of an idea (em inglês). Chicago: University of Chicago Press. viii. ISBN 9780226070780 
  2. Christine Hayes. What’s Divine about Divine Law? : Early Perspectives. Princeton University Press (2015), p. 2.
  3. Brague, 2007, p. 18
  4. Link, Christoph. “Ius divinum (divine law)”, in: Encyclopedia of Early Modern History Online. Consultado online em 07de janeiro de 2023.
  5. Anghie, 1996, p. 323
  6. Anghie 1996, p.323
  7. Chaniotis 1996, pp. 65-66.
  8. Summa Theologica, de Tomás de Aquino: (em espanhol) Lei Eterna (em espanhol) Lei Natural
  9. Roberto Bosca, El Derecho y las religiones
  10. Guimarães, Marcelo Miranda. Temas Judaico-messiânicos. AMES: Belo Horizonte (2005), pp. 68-80.
  11. Bocaccio, (em espanhol) Cuento de los tres anillos, Lessing, Natã, o Sábio.