Batalha de Achém (1569)


A Batalha Naval de Achém foi travada em 1569 ao largo da costa da Sumatra entre uma única nau portuguesa e uma armada do Sultanato de Achém, que estava prestes a atacar a Malaca Portuguesa. Terminou com a vitória portuguesa e a retirada da frota de Achém depois de sofrer perdas pesadas.

Batalha de Achém
Data Maio de 1569
Local Costa noroeste de Sumatra
Desfecho Vitória Portuguesa
Beligerantes
Portugal Sultanato de Achém
Comandantes
Mem Lopes Carrasco Desconhecido
Forças
1 nau 20 galés
20 juncos de guerra
200 embarcações menores
Baixas
Muitos mortos e feridos Vários navios

Contexto

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No início de maio de 1569, uma nau de propriedade privada, escoltada por um galeão fortemente armado, partiu de Goa com destino ao sudeste asiático. O capitão e dono da nau era um homem rico chamado Mem Lopes Carrasco, enquanto que o capitão do galeão era João Gago de Andrade, incumbido de reabastecer e reforçar a guarnição portuguesa na fortaleza de Ternate nas Molucas. Carrasco pretendia navegar com o seu navio pelo Estreito de Sunda, possivelmente para comprar pimenta e sândalo de alta qualidade, entre outros produtos de alto valor produzidos na região. Depois de passar pelo cabo Comorim, no extremo sul da Índia, e a ameaça dos piratas diminuir, a nau deixou a proteção do galeão e navegou a toda velocidade para longe da sua vista. Ao passar a noroeste de Sumatra, onde se situava o Sultanato de Achém, o vento diminuiu repentinamente, ficando a nau a mover-se muito lentamente. Achém era um inimigo ferrenho dos portugueses e frequentemente atacava os navios de Malaca. Nessa altura, tinha preparado uma armada composta por 20 galeras, 20 juncos de guerra e mais de 200 embarcações de menor dimensão para atacar a cidade . [1]

Batalha

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Ao avistar uma nau sozinha, a frota saiu imediatamente do porto de Achém para perseguir a nau. Segundo o historiador português do século XVI Diogo do Couto[2]:

Tanto que Mem Lopes vio a Armada, de que se não podia desviar, preparou-se pera se defender della, porque bem sabia que lhe era assim necessário pera remedio e vida de todos, porque aquelles inimigos não havia poder-se pleitear com elles, porque não dam a vida a Portuguez algum pelo mortalissimo odio que lhe tem: e assim mandou tirar monetas, encher tinas de agua, e preparar sua artilheria, de que levava sete, ou oito peças, camellos, esperas, e falcões; e a gente que levava, que eram quarenta homens, repartio pelos lugares mais arriscados, pondo na proa Martim Lopes Carrasco seu filho com dez homens; e Francisco da Costa, aquelle em que fallei na minha setima Decada no livro nono, capitulo segundo, de espia com hum seu irmão, a quem não soube o nome, poz na popa com outros dez soldados; e a hum Martim Daço primo de Mem Lopes encarregou a artilharia; e elle ficou no convéz com os mais, e com eles o Padre Francisco Cabral da Companhia de Jesus, que depois foi Provencial daquelas partes, e hum Frade de S. Francisco, que ambos com hum Crucifixo nas mãos andavam animando a todos a fe defenderem daquela Armada, que já tinha cercada a náo, e a começou a bater com grande terror, brabosidade, e logo a começaram a destroçar, e desenxarsear, e abrir-lhe muitas arrombadas com os pelouros que varavam a náo; mas tambem os nossos fizeram valerosamente seu officio, destroçando-lhes com sua artilharia muitas das suas embarcações, e matando-lhes muita gente; porque como o mar estava cuberto de embarcações, não tinham as balas da nossa artilheria, por perdidas que fossem, onde dar, senão nellas

Diogo Couto (1673). Da Ásia, Década VIII.

A batalha durou o dia todo, até que a armada se retirou ao anoitecer e lançou âncora à vista da nau. Os portugueses aproveitaram para tratar os feridos e fazer reparações no navio durante toda a noite. Na manhã seguinte, a batalha recomeçou, com a armada a navegar para assaltar a nau[2]:

Ao outro dia tanto que amanheceo, tornou a Armada a rodear a náo, e a batella, e destroçalla com nova furia; mas tambem os nossos lhes respodêram, como se estiveram muito descançados, e inteiros, obrando todos altas cavallarias: os inimigos apertaram tanto, que chegaram tres galés muito poderosas a abordar a náo, andando neste conflicto os Padres ambos no meio de todos com Crucifixos levantados, animando os nossos a pelejarem pela Fé de Christo (…) e de tal modo accendeo esta exhortação a furia, e valor aos nossos, que deram com os inimigos ao mar, e com aquele impeto, e furor se lançou apôs elles em huma das galés o Martim Daço com huma espada, e rodella, fazendo grande estragos nos Mouros, sendo de sima ajudado com a espingardaria; e chamando Mem Lopes Carrasco por elle que se recolhesse, lhe respondeo, que o não havia de fazer até render aquella galé, porque a havia de tomar em lugar do batel da náo que os Mouros lhe tinham já tomado; e sendo a galé soccorrida de outras, foi forçado ao Martim Daço recolher-se com alguma feridas bem grandes. O Mem Lopes Capitão, e Senhorio da náo andou todo aquelle tempo como hum alarve encarniçado na briga, e tinto da polvora, e de seu sangue, defeição que o não conheciam pelo rosto, senão pelas armas; e andando soccorrendo pelas partes todas, em que os nossos pelejavam valerosamente, lhe deram huma bombardada por huma perna, e logo correo fama pela náo que elle era morto: chegou ao castello de proa, onde seu filho Martim Lopes Carrasco tinha feito maravilhas em sua defensão; e dizenlhe hum soldado que seu pai era morto: «Se assim he, morreo hum só homem, e aqui ficamos muitos, que defenderemos a náo.». O Mem Lopes, como a ferida não foi mortal, e não lhe impedio o andar, fez seu officio com grande valor, andando sempre a par delle o Padre Francisco Cabral da Companhia muito inteiro, e com grande animo, e prudencia animando, e consolando a todos (...) O Padre de S. Francisco sempre andou com o Crucifixo alentando os soldados, e chamando pelo Bem aventurado Sant-Iago,  animando os homens com palavras muito honradas; (...) basta dizermos que tres dias continuos foram os nossos batidos de toda aquella Armada, até os deixarem arrafados de todos os castellos, e mastros, e a mór parte da gente morta, e os mais feridos,  e no fim dos ditos tres dias os inimigos se afastáram, por apparecer o galeão de João Gago de Andrade; (...)

Diogo Couto (1673). Da Ásia, Década VIII

Rescaldo

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A armada de Achém retirou-se com menos quarenta navios "e os restantes tão gravemente danificados" que os Achéns cancelaram o ataque a Malaca nessa altura.[2]

João Gago forneceu a Mem Lopes Carrasco os materiais para construir mastros improvisados para que conseguissem prosseguir para Malaca. Ele depois deixou a nau para trás, possivelmente indignado por Carrasco o ter deixado depois de passar pelo Cabo Comorim. Ao chegar a Malaca, no entanto, o capitão da fortaleza ordenou a Gago que voltasse imediatamente e os acompanhasse até o destino, onde os passageiros sobreviventes receberam uma recepção triunfante na cidade. A nau ficou tão danificada que Mem Lopes Carrasco desistiu dos planos de seguir para pelo Estreito de Sunda e voltou para a Índia o mais rápido possível. Em Lisboa, ao saber do feito de Carrasco, D. Sebastião de Portugal concedeu-lhe o título de nobre e membro da Ordem de Cristo, juntamente com uma generosa soma anual de dinheiro. [1]

Entretanto, o Sultão de Achém ficou tão ofendido com a derrota humilhante que, segundo Couto, "vingou-se nos seus próprios homens, pois não o pôde fazer nos portugueses".[2]

Referências

  1. a b Armando de Saturnino Monteiro (1992), Portuguese Sea Battles - Volume III - From Brazil to Japan 1539-1579 pp 315-317
  2. a b c d de Couto, Diogo (1673). Da Ásia, Década VIII. [S.l.: s.n.] pp. Capítulo XXX 

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