Corpo das funções racionais
Corpo das funções racionais, em álgebra, se refere ao corpo cujos elementos são a divisão entre dois polinômios, dotado de operações de soma e produto que satisfazem as operações usuais de frações.
Assim como o termo polinômio pode significar uma função polinomial ou pode significar um polinômio no sentido formal,[1][Nota 1] o corpo das funções racionais também pode significar dois objetos matemáticos, um corpo formado por funções, ou um corpo definido de forma abstrata.
Construção como um corpo de funções
editarO corpo da funções racionais com elementos reais pode ser rigorosamente construído a partir das funções racionais. Uma função racional é uma função que pode ser escrita como:
em que bn ≠ 0. Pode-se supor, sem perda de generalidade, que bn = 1.[2]
Um cuidado importante deve ser tomado na definição de igualdade entre duas funções racionais. Pois pode ocorrer que duas funções racionais f e g possam ter domínios diferentes, como no caso em que o numerador e o denominador de f não tenha fatores comuns, mas eles tenham algum fator comum em g, e este fator comum tenha raízes reais. Assim, a igualdade f = g deve ser definida a menos de um número finito de elementos, ou seja, quando para todo x real, exceto um conjunto finito, f(x) = g(x).[2]
Para definir F, o corpo das funções racionais, é preciso definir a soma (+), o produto (.) e os elementos neutros destas operações, respectivamente 0 e 1. Os elementos neutros são as funções constantes, ou seja 0F é a função constante 0F(x) = 0, etc.[2][Nota 2]
Um cuidado adicional é necessário para se definir f + g e f . g, pois as definições usuais através de frações:
tem o problema de que o resultado da operação é uma função racional cujo domínio é pelo menos tão restrito quanto f e g, ou seja, seu domínio é . Então, a definição rigorosa de f + g e f . g consiste em aplicar estas fórmulas e cancelar os fatores comuns no resultado.[2]
Exemplificando, sejam:
que são funções racionais cujo domínio exclui os números 1 e -1. Sua soma f + g é a função:
que é uma função cujo domínio inclui -1 mas não inclui 1.[2]
Com estas definições, temos o seguinte teorema:
- F, com +, ., 0 e 1 definidos acima, é um corpo
a demonstração dá algum trabalho, pois é preciso, a cada etapa, remover as singularidades das operações. O inverso aditivo é trivial, -f é a função (-f)(x) = -f(x), e o inverso multiplicativo, chamado f-1 [Nota 3] é definido naturalmente como:
- f = p/q então f-1 = q/p
e é imediato mostrar que f(x) . f-1(x) = 1 para todo real x, exceto nos pontos que não estão nos domínios de f e f-1, o que completa a demonstração.[2]
Como para todo número real existe uma função racional constante cujo contradomínio é este número, o corpo dos números reais pode ser considerado um subcorpo do corpo das funções racionais.[2]
Construção como o corpo de frações do anel dos polinômios
editarDado um domínio de integridade D, existe um único (a menos de isomorfismo) corpo de frações F de D, que é, formalmente, dado pelas classes de equivalência r/s, com r e s elementos de D.[1]
Dado um corpo K qualquer, K[x], o anel dos polinômios em K, é um domínio de integridade. O corpo das funções racionais em K, definido como K(x), é o corpo de frações deste domínio de integridade.[1]
Quando α é um elemento transcendente sobre K, então o corpo K(α) é isomórfico ao corpo das funções racionais em K.[1]
Como um corpo ordenado
editarNo caso do corpo das funções racionais reais,[Nota 4] é possível construir uma relação de ordem total de forma que este corpo seja um corpo ordenado.[2]
Intuitivamente, esta relação é definida considerando-se a função racional f(x) = x como sendo infinitamente grande, ou seja, 1 < x, 2 < x, 3 < x, etc.[2]
Formalmente, um elemento do corpo das funções racionais
é considerado positivo se, e somente se, am > 0.[2]
Este corpo ordenado é não arquimediano.[2]
Notas e referências
Notas
- ↑ No caso dos números racionais ou números reais, existe uma identidade entre as funções polinomiais e os polinômios, mas isto não é válido para corpos finitos. Por exemplo, em , o corpo GL(2) que possui apenas dois elementos, a função polinomial f(x) = x2 + x + 1 é igual à função polinomial f(x) = 1, porém os polinômios p(x) = x2 + x + 1 e q(x) = 1 são distintos.
- ↑ A notação 0F é usada em outros textos de matemática para deixar claro que o zero do corpo dos polinômios não é a mesma coisa que o zero dos números reais. No texto de Enderton, o mesmo símbolo é usado para os dois zeros.
- ↑ Enderton chama a atenção para o cuidado que se deve tomar com esta notação, pois, normalmente, f-1 é a notação da função inversa.
- ↑ A construção se aplica para qualquer outro corpo ordenado.