Dámaso Antonio Larrañaga

Dámaso Antonio Larrañaga (Montevidéu, 10 de dezembro de 1771 – Montevidéu, 6 de fevereiro de 1848), foi um político, naturalista, botânico, escritor, pioneiro da pesquisa científica e sacerdote católico uruguaio, patrono na Academia Nacional de Letras do Uruguai, um dos articuladores da independência de seu país.[1]

Dámaso Antonio Larrañaga
Dámaso Antonio Larrañaga
Retrato de autor desconhecido no Archivo Nacional de la Imagen del Sodre
Nascimento 9 de dezembro de 1771
Montevidéu
Morte 16 de fevereiro de 1848
Montevidéu
Sepultamento Catedral Metropolitana de Montevidéu
Cidadania Uruguai
Alma mater
  • Colégio Nacional de Buenos Aires
Ocupação botânico, bibliotecário, naturalista, diplomata, sacerdote, político
Religião Igreja Católica

Enquanto a Cisplatina era território brasileiro, foi membro da 1ª legislatura da Câmara dos Deputados, sendo substituído por Francisco Llambi porque foi nomeado membro do primeiro Senado Brasileiro.[2][nota 1] Logo depois seria membro do primeiro senado uruguaio. Foi o primeiro diretor da Biblioteca Nacional do Uruguai e contribuiu para a criação da Universidade da República.[1]

Biografia editar

Era filho de Bernardina Pires e de Manuel de la Regaña. Sua mãe era natural da Banda Oriental (chamada, então, "criola"), familiar de José Gervasio Artigas, ao passo que o pai era basco e ocupava cargo político municipal ("cabildante"). Fez os estudos preparatórios no Convento de São Francisco e tencionava estudar medicina, mas decidiu seguir a carreira eclesiástica, vindo a se formar pelo Real Colegio de San Carlos, em Buenos Aires, onde em sua tese demonstrou conhecer os trabalhos dos sábios da época. Dali foi como sub-diácono para a antiga Universidade de Córdoba e veio a sagrar-se padre no Rio de Janeiro em 1798, ocasião em que aprofundou-se nos conhecimentos científicos[1]

De volta a Montevidéu em 1799, ali torna-se capelão das milícias. Em 1804 é vice-pároco da matriz, colaborando para a construção do novo templo onde viria a celebrar o casamento de Artigas com Rafaela Villagrán. Durante as Invasões Britânicas, fez parte das tropas que marcharam a Buenos Aires e, na retomada de Montevidéu cuidou dos feridos. Tão logo vieram as primeiras vacinas contra a varíola de Espanha, pouco tempo após sua invenção, atuou na conservação do vírus e na vacinação.[1]

Larrañaga participou em 21 de setembro de 1808 do Conselho Aberto de Montevidéu que criou um governo local independente do Vice-Reino de Buenos Aires, e núcleo do movimento emancipacionista. Após a Batalha de Las Piedras foi expulso da cidade em 1811, escondendo-se na fazenda de um cunhado, sobrinho de Bernardo Prudencio Berro, que viria a presidir o país. Em 1813 voltaria ao cenário político, sendo enviado a Buenos Aires como delegado junto à Assembleia Constituinte de Buenos Aires durante a Espanha bonapartista mas, ali, foi ignorado: ele então articulou com Artigas a fim de que a Banda Oriental tivesse representação no congresso.[1]

 
Entrevista do general Artigas com o doutor Dámaso Antonio Larrañaga, por Gilberto Bellini

Permaneceu em Buenos Aires, ocupando ali a função de vice-diretor da Biblioteca Pública até 1815, quando voltou à cidade natal levando as primeiras mudas de acácias brancas que pretendia aclimatar. Ali tornou-se pároco da matriz e neste posto foi enviado a Paysandú a fim de resolver as divergências entre o Cabildo de Montevidéu e Artigas - ocasião em que escreveu durante os vinte e seis dias da viagem as obras Diario del Viaje de Montevideo a Paysandú e o Compendio del idioma de la nación chaná. Em agosto daquele ano sugeriu a criação de uma biblioteca, oferecendo-se para dirigi-la: após a aprovação de Artigas, a instituição foi instalada no Forte de Montevidéu e inaugurada em 26 de maio de 1816, vindo mais tarde a se constituir na Biblioteca Nacional.[1]

Ainda sob o comando de Artigas, foi enviado ao Rio de Janeiro a fim de propor a D. João VI de Portugal a anexação da Província Oriental e, em 1821, foi deputado no Congresso Cisplatino que deliberou pela anexação ao Reino de Portugal conservando autonomia local em alguns setores e, quando ocorre a revolução de 1825, que levou à independência do país, não participou dos movimentos. Proclamada a República, em 1830, ele volta à cena política, tornando-se senador. Em seu mandato atuou pela emancipação dos escravos, na criação de um orfanato e na criação de nove novas cátedras que viriam a ser o núcleo da futura Universidade da República.[1]

 
Monumento a Larrañaga, em Montevidéu

Em 1832 foi promovido a Vigário Apostólico, equivalente a bispo pois que não havia ainda diocese. Em 1837 presidiu a comissão que criou o Museu Nacional de História Natural. Durante a Guerra Grande, com a saúde abalada, vive retirado na sua casa de campo e, dada sua posição religiosa privilegiada, é respeitado pelos dois governos em conflito.[1]

Havia sido nomeado por Manuel Oribe primeiro reitor da Universidade da República, mas morre de acidente vascular cerebral um ano antes de sua inauguração. Como naturalista identificou numerosas espécies animais e vegetais, sendo reconhecido por sábios contemporâneos.[1]

Produção científica editar

Segundo escreveu em 1837, teve "de por, como Adão, nome a todas as criações que se me apresentavam, para dar-me a entender aos sábios" face à terra inexplorada e selvagem de sua época.[nota 2] Foi responsável pela identificação de 646 espécies botânicas, por várias publicações científicas de valor histórico, inclusive com algumas ilustrações que ele mesmo produzia, a maioria publicadas entre 1922 e 1930 em três volumes com textos e ilustrações.[4][nota 3]

Interessou-se por todos os ramos da ciência, incluindo a mineralogia e a paleontologia sendo, neste último, pioneiro com a descoberta de um fóssil de tatu gigante no Uruguai, embora tenha sido a botânica sua área de maior atuação, havendo se correspondido com seus cômpares franceses Aimé Bonpland e Auguste de Saint-Hilaire além de outros naturalistas como Félix de Azara, de quem se acredita tenha conhecido pessoalmente.[4]

Larrañaga também foi o responsável por introduzir a amoreira branca e o bicho-da-seda em seu país, ali fomentando sua produção. Chegou a ter uma boa colheita de casulos que foram suficientes para a confecção de alguns objetos, dentre os quais uma bolsa de dinheiro que veio a ser presenteada a Fructuoso Rivera, quando este ocupou a presidência (1830-1834). Diz-se que, quando de sua morte, foi sepultado usando meias tecidas com a seda produzida no seu criatório particular.[4]

Publicações editar

Além dos já mencionados Compendio del idioma de la nación chaná e Diario del Viaje de Montevideo a Paysandú (obra na qual relacionou suas observações sobre a fauna e flora dos locais pelos quais passou), colecionou em muitos cadernos descrições de árvores e plantas medicinais. Publicou, entre 1820 e 1824, o livro “Botánica”, fruto de anos de estudos. Em 1826 publicou ainda “Fábulas Americanas”.[4]

Boa parte de seus estudos, entretanto, somente viriam a ser editados entre 1922 e 1930, como foi o caso de “Géneros indígenas”, onde relaciona duzentos gêneros. Sua produção seguia, principalmente, o sistema de Lineu.[4]

Homenagens editar

Larrañaga é nome em várias escolas, avenidas e museus no país natal, além de ter monumentos e sua efígie estampada em selos postais e na cédula de dois mil pesos uruguaios, nomeando ainda a Universidade Católica do Uruguai.[1]

Numerosas espécies foram nomeadas em sua homenagem, como Eryngium larranagai, Paspalum larranagae, Euphorbia larranagae, etc.[1]

Notas e referências editar

Notas

  1. Sobre a ambiguidade memorial de Larrañaga acerca da sua adesão ao Império Português (e depois ao Brasileiro), bem como sobre o seu papel na formação da identidade nacional uruguaia, tem-se o estudo de Lauro Manzoni Bidinoto, "Herói ou traidor? Os biógrafos de Dámaso Larrañaga frente à ideia de nação".[3]
  2. Livre tradução para: “de poner como Adán, nombre a todas las producciones que se me presentaban, para darme a entender a los sabios”[4]
  3. Embora as fontes em espanhol sejam omissas sobre esse período de sua biografia, ele coincide com sua estadia no Brasil, quando foi senador.

Referências

  1. a b c d e f g h i j k «Dámaso Antonio Larrañaga» (em espanhol). Academia Nacional de Letras do Uruguai. 2016. Consultado em 22 de fevereiro de 2024. Cópia arquivada em 19 de abril de 2023 
  2. «Deputados à Assembleia Geral - Primeira Legislatura (1826-1829)». Biblioteca Nacional do Brasil. Annaes do Parlamento Brazileiro. Tomo I (1): 7. Consultado em 22 de fevereiro de 2024 
  3. Lauro Manzoni Bidinoto (2012). «Herói ou traidor? Os biógrafos de Dámaso Larrañaga frente à ideia de nação». Revista Aedos n. 10 vol. 4 - Jan/Jul (UFRGS). Consultado em 26 de fevereiro de 2024. Cópia arquivada em 5 de junho de 2020 
  4. a b c d e f «Dámaso Larrañaga» (em espanhol). Jardim Botânico de Buenos Aires. Consultado em 26 de fevereiro de 2024. Cópia arquivada em 24 de junho de 2023 

Abreviatura (zoologia)

A abreviatura Larrañaga emprega-se para indicar a Dámaso Antonio Larrañaga como autoridade na descrição e taxonomia em zoologia.