Dedução natural é um dos sistemas dedutivos utilizados para construir demonstrações formais na Lógica. Foram introduzidos pela primeira vez, nos anos 30, por Gentzen. Para poder realizar uma derivação formal, é necessário formalizar a expressão que queremos demonstrar. Formalizar significa traduzir da forma linguística usual para uma notação lógica, uma forma que é entendível para qualquer um, independente da língua que fala, e que também reduz o espaço ocupado pela frase escrita, tendo em vista que podemos utilizar uma notação mais económica, a lógica.

Na notação formal utilizamos conectivos lógicos, operadores que realizam a ligação entre os átomos (os menores objetos). São eles:

  • - Negação (não é um conectivo, simplesmente nega a fórmula ou átomo ligado)
  • - Conjunção
  • - Disjunção
  • - Implicação
  • - Bi-implicação

No caso da lógica clássica de primeira ordem, temos ainda os quantificadores:

  • - Universal
  • - Existencial

Também utilizamos alguns símbolos extras para auxiliar:

  • - Derivação
  • - Consequência semântica
  • - Top (Verdade)
  • - Bottom (Absurdo, falsidade)

Motivação editar

O sistema de dedução natural surgiu a partir da insatisfação reinante com relação aos sistemas de demonstração formal existentes anteriormente, que foram criados por Hilbert, Frege, e Russell. Jaśkowski começou, em 1929, a desenvolver um sistema dedutivo mais natural, utilizando-se de uma notação diagramática e, posteriormente atualizando sua proposta em meados dos anos 30. A forma moderna da dedução natural, porém, foi proposta por G. Gentzen, um matemático alemão, em uma dissertação entregue à faculdade de ciências matemáticas da universidade de Göttingen, no ano de 1935. Gentzen foi motivado pelo desejo de estabilizar a consistência da teoria dos números. Ele encontrou, rapidamente, uso para seu cálculo de dedução natural, mas ficou descontente com a complexidade de suas demonstrações, e em 1938 deu uma nova consistência às suas demonstrações.

Prawitz desenvolveu uma monografia em 1965 apresentando o sistema de dedução natural na forma mais conhecida nos dias de hoje, incluindo também aplicações para lógica modal e de segunda ordem. Ele se baseou bastante no trabalho de Gentzen.

Sistema de dedução natural editar

O sistema de dedução natural serve para verificar a derivabilidade de uma expressão. Não serve, porém, para gerar um contra-modelo nem para mostrar um conjunto de derivações possíveis, ou seja, a árvore de derivação nos mostra apenas uma, das várias derivações existentes para a expressão.

Existem dois métodos de se escrever as demonstrações em dedução natural: através de um método linear ou através de árvores de derivação (árvores de dedução). A raiz da árvore é a conclusão, os filhos são as derivações que geram a conclusão. O sistema de dedução natural apresenta regras que unem árvores(finitas), que são geradas a partir de um conjunto finito de premissas e hipóteses até derivar uma certa conclusão.

As folhas da árvore representam hipóteses ou premissas. As folhas abertas representam premissas, enquanto as fechadas representam hipóteses (marcadas com []). Todas as folhas devem possuir marcas e deve-se evitar o conflito de marcas, ou seja, ter duas fórmulas diferentes com uma mesma marca. A marca, geralmente, é um número natural, identificando as folhas.

Cada passo, ou seja, cada derivação realizada, na árvore, deve ser baseada em uma das regras do sistema. É como um jogo, em que devemos seguir todas as regras para podermos concluí-lo de maneira correta e vencer.

Os sistemas que trataremos aqui serão o Sistema intuitivo(Lógica Intuicionista), Sistema Np (Lógica Clássica Proposicional) e o Sistema Nc(Lógica Clássica de Primeira Ordem).

Sistema intuitivo editar

No sistema intuitivo possuímos regras que tratam de conectivos, assim como o sistema Np apresentado abaixo. A grande diferença entre o sistema intuitivo e o sistema Np é que o sistema intuitivo não possui a regra do absurdo clássico e nenhuma derivação baseada nela. Sendo assim, não podemos fazer derivações como:   facilmente derivadas no sistema Np ou Nc da lógica clássica. Com exceção do citado, podemos utilizar as mesmas regras do sistema Np.

Sistema Np editar

No sistema Np possuímos regras que tratam de conectivos. Abaixo está a apresentação do conjunto de regras do Sistema Np:

Regras de eliminação editar

As regras de eliminação mostram como retirar os conectivos para podermos gerar derivações. Elas são melhores utilizadas quando estamos construindo uma derivação a partir das hipóteses em direção a conclusão ("de cima para baixo").

Eliminação da conjunção editar

    Eliminação da conjunção à direita.

    Eliminação da conjunção à esquerda.

As regras de eliminação da conjunção, como foram apresentadas acima, dizem que, se temos uma conjunção, podemos tirar um pedaço dela, a parte mais à direita (Ed) ou a parte mais à esquerda (Ee), e eliminá-lo.

Exemplos:

 

   

 

   

Eliminação da implicação editar

    Eliminação da implicação

A regra de eliminação da implicação diz que se temos uma implicação de   em   e sabemos quem é o   logo saberemos quem é o  

Exemplo:

 

 

Eliminação da disjunção editar

 

 

    Eliminação da disjunção com hipóteses   e  

A regra de eliminação da disjunção diz que, se temos um   derivando um   e um   derivando um   e uma disjunção entre   e   podemos eliminar a disjunção e ficar só com o   como é mostrado acima. Nessa regra podemos também transformar o   e o   em hipóteses, fechando as folhas.

Exemplo:

 

 

Regras de absurdo editar

As regras de absurdo partem da premissa que da falsidade podemos derivar qualquer coisa, ou seja, do absurdo podemos derivar qualquer coisa.

Absurdo clássico editar

 

 

    Absurdo clássico com hipótese  

O absurdo clássico gera uma hipótese   Se a partir dessa hipótese chegarmos a um absurdo, então podemos derivar A.

Exemplo:

 

 

Note que, nesse exemplo,   e   são premissas.

Absurdo intuicionista editar

    Absurdo intuicionista

O absurdo intuicionista é menos poderoso que o absurdo clássico. Nele, não ganhamos hipótese alguma para utilizar, ou seja, temos que chegar a um absurdo através das premissas dadas para desse absurdo derivarmos outra coisa qualquer.

Regras de introdução editar

As regras de introdução introduzem conectivos lógicos nas derivações. Elas são melhores utilizadas quando estamos construindo uma derivação a partir da conclusão e em direção as hipóteses(metodologia bottom-up, ou "de baixo para cima").

Introdução da conjunção editar

    Introdução da conjunção

Se temos   e   podemos derivar  

Exemplo:

   

Introdução da implicação editar

 

 

  Introdução da implicação com hipótese  

Se chegamos a   a partir de uma hipótese   derivamos:   e fechamos a hipótese  

Exemplo:

 

Note que nesse exemplo   é uma premissa.

Introdução da disjunção editar

    Introdução da disjunção à direita

    Introdução da disjunção à esquerda

Se temos um   então podemos adicionar à sua direita ou esquerda um disjunto qualquer.

Exemplos:

   

   

Regras derivadas editar

São as regras criadas a partir de outras regras que, quando demonstradas válidas, podem ser utilizadas...

Abaixo temos dois exemplos de regras derivadas, uma de eliminação e outra de introdução, bastante utilizadas:

Eliminação da negação editar

    Eliminação da negação

A regra da eliminação da negação é uma regra feita a partir da eliminação da implicação, pois uma negação   pode ser apresentada como:   e se temos   em conjunto dessa implicação podemos derivar   Ou seja, de   e não   derivamos um absurdo.

Exemplo

 

 

Introdução da negação editar

 

    Introdução da negação com hipótese  

A partir de uma hipótese   se chegarmos a um absurdo podemos derivar   Essa regra se justifica através da regra do absurdo clássico e do fato que   é o mesmo que  

Sobre a bi-implicação editar

A bi-implicação ( ) pode ser introduzida como uma abreviatura para:  

Sistema Nc editar

O sistema Nc inclui todo o sistema Np mas adiciona algumas regras novas para que possamos trabalhar com fórmulas da Lógica Clássica de Primeira Ordem. As regras adicionais são as relativas aos quantificadores, inexistentes na Lógica Proposicional.

Regras de eliminação editar

Seguem as regras que eliminam os quantificadores utilizados em primeira ordem.

Eliminação do universal editar

    Eliminação do Universal

Esta regra diz que se temos um quantificador universal podemos eliminá-lo substituindo-o por um termo   se   for um termo livre para   na fórmula   Recomenda-se a utilização dela o mais próximo das folhas possível.

Exemplo:

   

Eliminação do existencial editar

 

    Eliminação do existencial

Algumas restrições devem ser efeitas sobre a aplicação dessa regra:   não pode ocorrer livre nas hipóteses abertas que derivam   nem em   e a marca n aplica-se apenas às hipóteses com a forma da hipótese fechada.

Regras de introdução editar

Abaixo estão as regras que introduzem os quantificadores utilizados em primeira ordem.

Introdução do universal editar

    Introdução do universal

Se tivermos um i não-livre nas hipóteses abertas que derivam   então podemos introduzir o quantificador universal. Recomenda-se a utilização desta regra o mais próximo da conclusão possível.

Introdução do existencial editar

    Introdução do existencial

Se possuirmos um termo livre   para a variável   na fórmula   podemos então introduzir o quantificador existencial.

Exemplo:

 

Note que nesse exemplo,   e   são premissas.

Validade do sistema editar

Um sistema dedutivo pode ser considerado válido se o que ele deriva pode ser demonstrado, como verdadeiro, através da semântica, sendo assim considerado correto, e se ele conseguir derivar tudo que é demonstrado semanticamente, sendo assim considerado completo. Ou seja, o sistema dedutivo pode ser correto, completo e válido, mas para ser válido ele precisa ser correto e completo ao mesmo tempo.

O sistema dedutivo nomeado dedução natural é válido nos sistemas mostrados acima(intuitivo, Np e Nc).

Bibliografia editar

  • Bedregal, Benjamín René Callejas, e Acióly, Benedito Melo (2002), Lógica para a Ciência da Computação, Versão Preliminar, Natal, RN.
  • F. Miguel Dionísio, Paula Gouveia, João Marcos. Lógica Computacional. Versão preliminar, 2006.
  • Introduction to natural deduction. Acesso em: 11:20 h. 18 de junho, 2007. Disponível em: http://www.danielclemente.com/logica/dn.en.html .

Ver também editar