Gavião-asa-de-telha

O gavião-asa-de-telha[2] (Parabuteo unicinctus) é uma ave de rapina de médio-grande porte que se reproduz desde o sudoeste dos Estados Unidos até o Chile, centro da Argentina e Brasil.

Como ler uma infocaixa de taxonomiaGavião-asa-de-telha

Estado de conservação
Espécie pouco preocupante
Pouco preocupante
Classificação científica
Reino: Animalia
Filo: Chordata
Classe: Aves
Ordem: Accipitriformes[1]
Família: Accipitridae
Género: Parabuteo
Espécie: P. unicinctus
Nome binomial
Parabuteo unicinctus
Temminck, 1824
Distribuição geográfica

Há relatos esporádicos de avistamento desta espécie na Europa Ocidental, especialmente na Grã-Bretanha, porém, tendo em conta a sua grande popularidade no âmbito da falcoaria, o mais certo é que esses casos se reportem a fugas de cativeiros.[3]

Nomes comuns editar

Possui ainda os seguintes nomes comuns: gavião-de-asa-castanha[4] e águia-de-harris.[5]

Etimologia editar

O nome do gênero é derivado do grego antigo para, que significa "parecido" e do latim buteo, que se refere a um tipo de ave de rapina. O epíteto específico é do latim uni que significa "um"; e cinctus que significa "faixa", referindo-se à banda branca na ponta da cauda.[6] Logo, o nome científico significa "Ave com uma faixa parecida com um búteo".

Descrição editar

O gavião-asa-de-telha mede de 46 a 59 cm de comprimento e tem uma envergadura entre 103 e 120 cm.[7][8]  A espécie tem um dimorfismo sexual, com as fêmeas sendo maiores em aproximadamente 35%. A média de peso de machos adultos é de 701 g, enquanto as fêmeas têm uma média de 1029 g.[9][10]

Essa espécie tem uma plumagem amarronzada, ombros avermelhados e penas da cauda com base e ponta brancas.[11] As patas são longas e amarelas e a cera do bico é amarela.[12]

 
Juvenil em demonstração de falcoaria

Juvenil editar

O juvenil do gavião-asa-de-telha é majoritariamente listrado em couro, e tem uma aparência bem mais clara do que os adultos. Em voo, a parte de baixo das asas do juvenil é de cor couro com listras marrons. À primeira vista, os juvenis não se parecem com os adultos, mas a coloração avermelhada idêntica é uma ajuda na identificação.[12]

Subespécies editar

São reconhecidas duas subespécies de gavião-asa-de-telha:[13]

Distribuição e habitat editar

O gavião-asa-de-telha vive em bosques esparsos e em clima semiárido, bem como pântanos (com algumas árvores) em algumas partes de sua distribuição (Howell e Webb 1995), incluindo manguezais, como em partes de sua distribuição sul-americana.[15] A espécie não é migratória.[14] Locais para pouso importantes e para suporte de ninhos são fornecidos por árvores maiores espalhadas ou outros elementos (postes de energia, bordas de floresta, árvores mortas em pé, árvores vivas, rochas e saguaros).[16]

A população de gavião-asa-de-telha está diminuindo devido à perda de habitat; no entanto, em algumas circunstâncias, eles são conhecidos por se mudarem para áreas urbanas.[17] No Brasil, a espécie está se tornando cada vez mais comum em centros urbanos, como no Rio de Janeiro, São Paulo e Santos.[4]

Comportamento editar

 
Filhotes com uma semana de vida

Esta espécie ocorre em grupos relativamente estáveis. Há na espécie uma hierarquia de dominância, em que a fêmea madura é a ave dominante, seguida pelo macho adulto e depois pelos filhotes de anos anteriores. Os grupos geralmente incluem de 2 a 7 aves. As aves não apenas cooperam na caça, mas também auxiliam no processo de nidificação.[18] Nenhuma outra ave de rapina é conhecida por caçar em grupos tão rotineiramente quanto esta espécie.[19][20]

Alimentação editar

 
Comendo perna de galinha

A dieta do gavião-asa-de-telha consiste em pequenas criaturas, incluindo aves, lagartos, mamíferos e grandes insetos. Por caçar em grupos, a espécie também pode abater presas maiores.[21] Embora não seja particularmente comum, o gavião-asa-de-telha pode pegar presas pesando mais de 2 kg, como lebres e garças-azuis-grandes (Ardea herodias) adultos e perus-selvagens (Meleagris gallapavo) não totalmente crescidos.[22][23][24] O coelho-do-deserto (Sylvilagus audubonii) é a principal presa no norte da distribuição do gavião-asa-de-telha e geralmente pesa 800 g ou menos.[25] Sem dúvida, por perseguir presas grandes com frequência, a espécie tem pés maiores e mais fortes, com garras longas e um bico em forma de gancho maior e mais proeminente do que a maioria das outras aves de rapina de seu tamanho.[10]

No sudoeste dos Estados Unidos, as presas mais comuns (em ordem decrescente de prevalência) são coelho-do-deserto (Syvilagus auduboni), coelho-da-flórida (Sylvilagus floridanus), lebre-da-califórnia (Lepus californicus), esquilo-terrestre (Ammopsermophilus sp. e Spermophilus sp.), Neotoma sp., Dipodomys sp., Geomys e Thomomys sp, Callipepla gambelii, C. squamata, perdiz-da-vírginia (Colinus virginianus), Campylorhynchus brunneicapillus, cotovia-do-norte (Mimus polyglottos), Sceloporus magister e Eumeces sp..[26][27] Nos trópicos, o gavião-asa-de-telha se adaptou para capturar presas variadas, incluindo galinhas e coelhos-europeus introduzidos pelo homem.[28][29] No Chile, o degu (Octodon degus) representa 67,5% das presas.[30]

Caça editar

 
Gavião-asa-de-telha voando em centro de falcoaria

Enquanto a maioria das aves de rapina é solitária, apenas se reunindo para reprodução e migração, o gavião-asa-de-telha caça em grupos de dois a seis indivíduos. Acredita-se que isso seja uma adaptação à falta de presas no clima desértico em que vive. Em uma técnica de caça, um pequeno grupo voa à frente e observa, então outro membro do grupo voa à frente em perseguição à presa até que esta seja morta e compartilhada.[31] Em outra, todos os indivíduos se espalham ao redor da presa.[32] Grupos de gavião-asa-de-telha tendem a ter mais sucesso na captura de presas do que gaviões solitários, tendo taxas de sucesso aproximadamente 10% maiores por indivíduo extra.[33]

Reprodução editar

Ele nidifica em pequenas árvores, arbustos ou cactos. O ninho é geralmente compacto, feito de gravetos, raízes de plantas e caules, e geralmente é revestido de folhas, musgo, cascas e raízes de plantas. Ele é construído principalmente pela fêmea. Geralmente há de dois a quatro ovos branco-azulados, às vezes com manchas claras marrons ou cinza. Os filhotes nascem amarelo claro, mas em cinco a seis dias tornam-se castanhos.[34]

Muitas vezes, há três indivíduos cuidando de um ninho: dois machos e uma fêmea.[21] Se isso é ou não poliandria é debatido, pois pode ser confundido com uma ave ficando atrás de outra.[35] A fêmea faz a maior parte da incubação. Os ovos eclodem em 31 a 36 dias. Os filhotes começam a explorar fora do ninho aos 38 dias e começam a voar aos 45 a 50 dias. A fêmea às vezes procria duas ou três vezes em um ano.[34] Os juvenis podem ficar com os pais até três anos, ajudando a cuidar de crias posteriores. Os ninhos podem ser predados por coiotes (Canis latrans), águias-reais (Aquila chrysaetos), búteos-de-cauda-vermelha (Buteo jamaicensis), jacurutus (Bubo virginianus) e bandos de corvos-comuns (Corvus corax). Nenhum relato mostra a predação de adultos nos Estados Unidos e o gavião-asa-de-telha pode ser considerado um superpredador, embora possivelmente predadores como águias e corujas sejam capazes de matá-lo.[36] No Chile, a águia-serrana (Geranoaetus melanoleucus) é um provável predador.[37]

Relação com humanos editar

Falcoaria editar

Desde cerca de 1980, o gavião-asa-de-telha tem sido cada vez mais usado na falcoaria e agora é o gavião mais popular do Ocidente (fora da Ásia) para esse fim, pois é um dos mais sociáveis e fáceis de treinar.[38]

Gaviões-asa-de-telha treinados foram usados para remover uma população indesejada de pombos da Trafalgar Square de Londres e das quadras de tênis em Wimbledon.[39]

Gaviões-asa-de-telha treinados têm sido usados para controle da população de certas espécies de ave por falcoeiros nos Estados Unidos em vários locais, incluindo resorts e instalações industriais.[40]

No Aeroporto de Vitória, no Espírito Santo, Brasil, são usados três indivíduos de gavião-asa-de-telha, junto com dois falcões-sacre e dois falcões-de-coleira, para afugentarem outras aves, evitando assim a colisão destas com as aeronaves.[41]

Referências editar

  1. «Raptors». IOC World Bird List (em inglês). Consultado em 13 de Outubro de 2010 
  2. Infopédia. «gavião-asa-de-telha | Definição ou significado de gavião-asa-de-telha no Dicionário Infopédia da Língua Portuguesa». Infopédia - Dicionários Porto Editora. Consultado em 27 de julho de 2021 
  3. National Audubon Society. «Audubon». Audubon. Consultado em 29 de abril de 2013 
  4. a b «gavião-asa-de-telha (Parabuteo unicinctus) | WikiAves - A Enciclopédia das Aves do Brasil». www.wikiaves.com.br. Consultado em 11 de janeiro de 2021 
  5. Infopédia. «águia-de-harris | Definição ou significado de águia-de-harris no Dicionário Infopédia da Língua Portuguesa». Infopédia - Dicionários Porto Editora. Consultado em 27 de julho de 2021 
  6. Jobling, James A. (1991). A Dictionary of Scientific Bird Names. [S.l.: s.n.] ISBN 978-0-19-854634-4 
  7. Udvardy, Miklos D. F. (2001). National Audubon Society Field Guide to North American Birds 'Western Region'. [S.l.: s.n.] ISBN 978-0-679-42851-0 
  8. Clark, W. S. and B. K. Wheeler. (1987). A Field Guide to Hawks of North America. Houghton Mifflin Co. Boston.
  9. Dunning, John B. Jr. (1993). CRC Handbook of Avian Masses. [S.l.: s.n.] ISBN 978-0-8493-4258-5 
  10. a b Hamerstrom, F. (1978). External sex characters of Harris' Hawks in winter. Raptor Res. 12:1–14.
  11. «Harris's Hawk - Appearance». 2015. Consultado em 22 de Outubro de 2018 
  12. a b Rappole, John H. (2000). Birds of the Southwest. [S.l.: s.n.] ISBN 978-0-89096-958-8 
  13. Clements, JF. «The eBird/Clements checklist of Birds of the World: v2021.». 2021-08. Consultado em 30 de agosto de 2021 
  14. a b c Bednarz, James C. (1995). «Harris's Hawk (Parabuteo unicinctus 
  15. Olmos Fábio & Robson Silva e Silva (2003). Guará-Ambiente, Flora e Fauna dos Manguezais de Santos-Cubatão Empresa das Artes, ISBN 85-89138-06-2
  16. Bednarz, J. C. and J. D. Ligon. (1988). A study of the ecological bases of cooperative breeding in the Harris' hawk. Ecology 69:1176–1187.
  17. Discoll, James T. «Harris' Hawk». Consultado em 19 de novembro de 2007. Cópia arquivada em 23 de novembro de 2007 
  18. Dawson, J. W. and R. W. Mannan. (1991). The role of territoriality in the social organization of Harris' hawks. Auk 108:661–672.
  19. Griffin, C. R. (1976). A preliminary comparison of Texas and Arizona Harris' Hawks (Parabuteo unicinctus) populations. Raptor Res. 10:50–54.
  20. «Gavião-asa-de-telha (Parabuteo unicinctus) | PhotoAves - Fotos e informações sobre a espécie». www.photoaves.com. Consultado em 2 de setembro de 2016 
  21. a b Kaufmann, Kenn (1996). Lives of North American Birds. [S.l.: s.n.] ISBN 978-0-395-77017-7 
  22. Bednarz, J. C. (1988). A comparative study of the breeding ecology of Harris's and Swainson's hawks in southeastern New Mexico. Condor 90:311–323.
  23. Woodward, H.D. (2003). Lone Harris' Hawk Kills Great Blue Heron. The Raptor Research Foundation 1:85–86.
  24. Houcke, H.H. (1971). Predation By a White-Tailed Hawk and a Harris' Hawk on a Wild Turkey Poult Condor 4: 475.
  25. Bednarz, J. C., J. W. Dawson, and W. H. Whaley. (1988). Harris' Hawk. Pages 71–82 in Proceedings of the southwest raptor management symposium and workshop. (Glinski, R. L., B. G. Pendleton, M. B. Moss, M. N. LeFranc, Jr., B. A. Millsap, and S. W. Hoffman, Eds.) Natl. Wildl. Fed. Washington, D.C.
  26. Mader, W. J. (1975). Biology of the Harris' hawk in southern Arizona. Living Bird 14:59–85.
  27. Brannon, J. D. (1980). The reproductive ecology of a Texas Harris's hawk (Parabuteo unicinctus harrisi) population. Master's Thesis. Univ. of Texas, Austin.
  28. Nutting, C. C. (1883). On a collection of birds from the Hacienda "La Palma," Gulf of Nicoya, Costa Rica, with critical notes by Robert Ridgway. Proc. U.S. Natl. Mus. 1982(5):382–409.
  29. Johnson, A. W. (1965). The birds of Chile and adjacent regions of Argentina, Bolivia, and Peru. Platt Establecimientos Graficos, Buenos Aires.
  30. Jaksic, F. M., J. L. Yanez, and R. P. Schlatter. (1980). Prey of the Harris' hawk in central Chile. Auk 97:196–198.
  31. Bednarz, J.C. (1988). «Cooperative Hunting in Harris' Hawks (Parabuteo unicinctus)». Science. 239 (4847): 1525–1527. Bibcode:1988Sci...239.1525B. PMID 17772751. doi:10.1126/science.239.4847.1525 
  32. Cook, William E. (1997). Avian Desert Predators. [S.l.: s.n.] ISBN 978-3-540-59262-4 
  33. Dawson, James (1988). «The cooperative breeding system of the Harris' Hawk in Arizona». The University of Arizona. Consultado em 17 de Novembro de 2017 
  34. a b Baicich, Paul J.; Harrison, Colin J. O. (1997). Nests, Eggs, and Nestlings of North American Birds. [S.l.: s.n.] ISBN 978-0-691-12295-3 
  35. Ligon, J. David (1999). The Evolution of Avian Breeding Systems. Col: Oxford Ornithology Series. 10. [S.l.]: Oxford University Press. ISBN 978-0198549130. Consultado em 4 de Agosto de 2013 
  36. Dawson, J. W. and R. W. Mannan. (1991). Dominance hierarchies and helper contributions in Harris' Hawks. Auk 108:649–660.
  37. Jiménez, J. E., & Jaksić, F. M. (1989). Behavioral ecology of grey eagle-buzzards, Geranoaetus melanoleucus, in central Chile. Condor 913–921.
  38. «Raptors page». Users.cybercity.dk. Consultado em 29 de abril de 2013. Cópia arquivada em 5 de março de 2013 
  39. Mount, Harry (3 de julho de 2017). «Introducing Rufus the hawk: the official bird scarer of the Wimbledon Championships». Telegraph. Consultado em 22 de outubro de 2018 
  40. Mraz, Tiffany. «BLOG: Phoenician resort hires hawks to keep pesky birds away from diners». AZFamily (em inglês). Consultado em 19 de agosto de 2020 
  41. «Abu Dhabi e Malala: as aves que garantem a segurança dos voos no Aeroporto de Vitória». www.agazeta.com.br. Consultado em 11 de janeiro de 2021 

Ligações externas editar

 
Commons
O Commons possui imagens e outros ficheiros sobre Gavião-asa-de-telha
 
Wikispecies
O Wikispecies tem informações sobre: Gavião-asa-de-telha

Material histórico editar

  • John James Audubon. "Louisiana Hawk", Ornithological Biography volume 5 (1839). Illustration from Birds of America octavo edition, 1840.