Luciano António Pereira da Silva

Luciano António Pereira da Silva (Caminha, 21 de novembro de 1864 — Caminha, 18 de agosto de 1926) foi matemático, professor na Universidade de Coimbra, pedagogo e historiador dos descobrimentos portugueses.[1][2]

Luciano António Pereira da Silva
Luciano António Pereira da Silva
Nascimento 21 de novembro de 1864
Caminha
Morte 18 de agosto de 1926
Caminha
Cidadania Portugal, Reino de Portugal
Alma mater
Ocupação matemático
Empregador(a) Universidade de Coimbra
A astronomia dos Lusíadas / Luciano Pereira da Silva. - Coimbra : Imprensa da Universidade, imp. 2014. - [9], XV, 228 p. : il. ; 24 cm. - Facsímile da edição de Coimbra : Imprensa da Universidade, 1915. - ISBN 978-989-95920-7-0

Biografia editar

 
Lápide comemorativa da casa onde nasceu Luciano Pereira da Silva, na Praça Conselheiro Silva Torres ou Terreiro em Caminha.

Era filho de António Pereira da Silva (1806-1873), farmacêutico na vila de Caminha, e de Isabel Joaquina Coelho da Silva (1820-1892), e irmão de Maria das Dores Pereira da Silva (1848-1896) e cunhado de João Lourenço Marques Torres (1846-1896), que assumiram a farmácia, ainda hoje de nome Torres, no Terreiro, na casa onde nasceu e que exibe uma lápide comemorativa.

Fez o exame de instrução primária e os estudos secundários em Viana do Castelo, concluindo-os no Porto no Colégio de S. Carlos em 1879.

Matriculou-se na Universidade de Coimbra onde se formou em Matemática e Filosofia.

Fez o curso de Engenharia Militar na Escola do Exército.

Regressou à Universidade de Coimbra onde se doutorou em 1889 com uma dissertação sobre Equilíbrio Astático após uma dissertação inaugural sobre Pressões Desenvolvidas no Interior dos Líquidos em Movimento, sendo lente de Cálculo Diferencial e Integral (1902-1904), Mecânica Celeste (1904-1911), e Geometria Descritiva (1910-1911) na Faculdade de Matemática.

Após a reformulação curricular da República foi catedrático de Mecânica e Astronomia (1911-1922), Mecânica Celeste (1916-1922) e Mecânica Racional (1917-1922) na Faculdade de Ciências.[3]

Foi astrónomo do Observatório Astronómico da Universidade de Coimbra.[4]

Foi regente de Metodologia da Matemática e História da Pedagogia na Escola Normal Superior de Coimbra, de que foi diretor entre 1915 e 1925.[5][6][7]

A sua intervenção na área da pedagogia teve relevo numa corrente “heurística”, relacionada com a própria génese do conhecimento científico bem expressa na citação:

“O método de investigação directa, chamado “método laboratorial”, desperta interesse e entusiasmo, difíceis de obter por outros meios. Não é necessário um observatório munido de bons telescópios. Basta um lugar de vistas desobstruídas. Começa-se por observação à vista desarmada, feitas com instrumentos elementares, construídos na localidade, ou nas oficinas dos estabelecimentos de ensino, se as há. O astrolábio está naturalmente indicado. (…)  Por isso explico a construção dos astrolábios de madeira que iam nas nossas naus. Os problemas que preocuparam os nossos navegadores são um bom exercício. Os alunos fazem, a princípio, observações simples. Assim aprendem a ver e colhem, em primeira mão, um bom cabedal de conhecimentos astronómicos, que lhes revela os princípios fundamentais dos movimentos dos astros. E a leitura das passagens astronómicas d’Os Lusíadas constituirá um forte estímulo num ensino assim conduzido.” (Prefácio, Astronomia d’Os Lusíadas, 1915)

defendida por ele e por Joaquim de Carvalho que o sucedeu após a sua morte na regência da História da Pedagogia, em divergência com Eusébio Tamagnini, depois ministro da instrução pública entre 1934 e 1936, e Oliveira Guimarães, professores da mesma Escola que davam mais ênfase ao rigor dos conhecimentos transmitidos.[8][9]

Publicou em 1909 Bases technicas das companhias portuguezas de seguros de vida a Nacional, a Lusitana, e Portugal Previdente, juntamente com António dos Santos Lucas e Fernando Brederode, e em 1913, no Jornal de Seguros nº 156, A Teoria Matemática dos Seguros nas Universidades Alemães (carta ao sr. Fernando Brederode), intervindo dessa forma no debate de matemática actuarial na crise das seguradoras portuguesas então manifestada.[10] Com Sidónio Pais, seu conterrâneo e colega na Faculdade, defendeu sem sucesso a introdução do ensino da Teoria Matemática dos Seguros no currículo da Faculdade de Ciências.[11]

A ele se ficou a dever também a criação do Gabinete de Geometria da Universidade de Coimbra.[12]

É no entanto no estudo dos descobrimentos portugueses que cruzou a sua formação básica em matemática e astronomia com o interesse pela história e pela literatura, publicando uma vasta obra de grande interesse científico, ainda hoje referencial na história da ciência pelo seu rigor e carácter multidisciplinar.

Estudou a ciência náutica e os conhecimentos de astronomia dos portugueses dos séculos XV e XVI, pelas obras, entre outros, de Pedro Nunes, sustentando a preparação científica dos navegadores portugueses e estabelecendo a datação cronológica das suas obras,[13] Duarte Pacheco Pereira, encabeçando os defensores do seu protagonismo na real viagem de descoberta do Brasil previamente a Cabral,[14] D. João de Castro e Luís de Camões, revelando os conhecimentos de astronomia na composição dos Lusíadas e da sua outra obra poética .[15]

Na sua bibliografia destaca-se A Astronomia dos Lusíadas (1915), reeditada em fac-simile em 2014 pela Câmara Municipal de Caminha quando do Colóquio Luciano Pereira da Silva - 150 anos do nascimento.[16][17][18] A efeméride foi também assinalada por um colóquio a 24 de Novembro de 2014 no Museu da Ciência da Universidade de Coimbra.[19]

Entre 1943 e 1946 foram publicadas em 3 volumes as suas Obras Completas (ed. Agência Geral das Colónias), organizadas por João Pereira Dias, seu colaborador no Departamento de Matemática e na Escola Normal, onde alternou com ele a regência de Metodologia Geral das Ciências Matemáticas.

Os seus trabalhos principais são: Os Dois Doutores Pedro Nunes (1914), O Libro de Álgebra de Pedro Nunes (1914), As Tábuas Náuticas dos Portugueses e o Almanach Perpetuum de Zacuto (1915), O Astrolábio Náutico dos Portugueses (1917), As Estrelas nas Poesias de Camões (1918), O "Esmeraldo" de Duarte Pacheco - Razão deste Título (1920), A Arte de Navegar dos Portugueses desde o Infante a D. João de Castro (1921, in História da Colonização Portuguesa do Brasil), Duarte Pacheco Pereira, Precursor de Cabral (1921, in História da Colonização Portuguesa do Brasil), A "Regra das Festas Mudáveis" de Gonçalo Trancoso, Autor dos "Contos de Proveito e Exemplo" (1922-1925), A Propósito das Leituras do Infante (1924, Lusitânia, 1, pp 23-27), Kamal, Tábuas da Índia e Tavoletas Náuticas (1924), A Concepção Cosmológica dos "Lusíadas" (1925), O "Roteiro" da Primeira Viagem do Gama e a Suposta Conjuração (1925), e João Dias Solis, Piloto Português (1926, Lusitânia, 9, 3, pp 345-365).[20][21][22]

Escreveu ainda sobre temas caminhenses: De Roca ao Norte (1918, in Águia, 2, XIII, pp 5-12) e A Igreja Matriz de Caminha (1926, in Ilustração, 1, 9, p.23)

Foi deputado pelo Partido Regenerador entre 1901 e 1903, tendo feito um notável discurso sobre a instrução secundária em 13 de Janeiro de 1903,[23][24] que prenunciava já o interesse que haveria de dedicar à pedagogia.

Foi governador civil de Coimbra em 1909-1910.

Foi agredido com uma faca por um alienado a quem costumava dar esmola, em pleno Terreiro de Caminha, em 15 de Agosto de 1926, tendo falecido três dias depois.[25][26]

É personagem com Jaime Cortesão, também investigador da época dos descobrimentos, da peça de teatro Novo Céu (Afrontamento, 2014) que foi apresentada no Teatro Valadares em Caminha em 21 de novembro de 2014 no seu 150º aniversário.[27][28]

Jaime Cortesão cita-o como integrante do “grupo da biblioteca” no "prefácio a modo de memórias" à 4ª edição de 1960 de O Infante de Sagres (1916), em que na nota final lhe agradece ainda “a indicação dos instrumentos náuticos conhecidos ao tempo do Infante”.[29]

Referências editar

  1. «Luciano Pereira da Silva». www.mat.uc.pt. Consultado em 1 de junho de 2018 
  2. O Grande Livro dos Portugueses. [S.l.]: Círculo de Leitores. 1990 
  3. Torres Bento, Paulo (2014). «Sinopse Biográfica de Luciano Pereira da Silva» (PDF). CAMINHA 2000 
  4. «Universidade de Coimbra - História da Ciência na UC - SILVA, Luciano António Pereira da». www.uc.pt. Consultado em 2 de junho de 2018 
  5. Nóvoa, António (2003). Dicionário de Educadores Portugueses, Edições Asa, 2003. [S.l.]: ASA 
  6. «Gomes Ferreira, António & Mota, Luís - Uma Questão de Natureza Económica. Métodos e Processos de Transmissão da Verdade Científica na Escola Normal Superior da Universidade de Coimbra, Congresso Luso-Brasileiro de História das Ciências, 1288-1802, 2011» (PDF) 
  7. «Gomes Ferreira, António & Mota, Luís - A Formação de Professores do Ensino Liceal. A Escola Normal Superior da Universidade de Coimbra, Revista Portuguesa de Educação, 26 (2), pp 85-109, 2013» 
  8. Felgueiras, Margarida Louro (16 de agosto de 2012). «A MATRIZ CULTURALISTA DO ENSINO UNIVERSITÁRIO DA HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO EM PORTUGAL. O MAGISTÉRIO DE JOAQUIM DE CARVALHO». Revista Teias. 13 (28). 26 páginas. ISSN 1982-0305 
  9. Carvalho, Paulo Archer de (2016). «Cartas de Joaquim de Carvalho a Alfredo Pimenta: 1922-36: (Seguidas de quatro cartas a António Sardinha, 1923-24)». doi:10.14195/978-989-26-1151-8 
  10. «Carvalho e Silva, Jaime - A Faculdade de Matemática (1722-1911), in História da Ciência na Universidade de Coimbra, 2013» (PDF) 
  11. Martins, Ana Patrícia (2011). «Matemática actuarial: Seu ensino nos Institutos Superiores, dos seus inícios a 1930». Boletim da Sociedade Portuguesa de Matemática. 0 (65-S) 
  12. «Simões, Carlota & Tenreiro, Carlos, O Gabinete de Geometria da Faculdade de Ciências e a sua colecção de modelos para o ensino, in História da Ciência na Universidade de Coimbra (2013)» (PDF) 
  13. «Henrique Leitão - Para uma biografia de Pedro Nunes: o surgimento de um matemático, Cadernos de Estudos Sefarditas, nº 3, 45-82, 2003» (PDF) 
  14. «Edgar Avila Grande & Marcos Borges da Silveira - A Viagem de Duarte Pacheco Pereira, Biblos, 12, 65-73, 2000.» 
  15. «Crato, Nuno - Camões e Copérnico» 
  16. «Astronomia Cantada». sites.google.com. Consultado em 2 de junho de 2018 
  17. «JORNAL DIGITAL REGIONAL CAMINHA 2000». www.caminha2000.com. Consultado em 3 de junho de 2018 
  18. «JORNAL DIGITAL REGIONAL CAMINHA 2000». www.caminha2000.com. Consultado em 4 de junho de 2018 
  19. FBA., Copyright 2013 João Cunha, Ana Soares /. «Museu da Ciência». Museu da Ciência. Consultado em 13 de setembro de 2018 
  20. «Ciência em Portugal - Personagens». cvc.instituto-camoes.pt. Consultado em 3 de junho de 2018 
  21. «Obras de Luciano Pereira da Silva» 
  22. «Obras sobre Luciano Pereira da Silva» 
  23. «Debates Parlamentares - Diário 005, p. 3 (1903-01-13)». debates.parlamento.pt. Consultado em 4 de junho de 2018 
  24. Mónica, Maria Filomena (2006). Gameiro, Fernando L. "Silva, Luciano António Pereira da", Dicionário Biográfico Parlamentar 1834-1910 vol.III (N-Z), 972-671-16: 712 - 716. [S.l.]: Imprensa de Ciências Sociais 
  25. «Uma perda nacional - a figura e a obra do sábio Luciano Pereira da Silva apreciadas por Jaime Cortesão, Diário de Lisboa, 19/8/1926.» 
  26. «In memoriam do Dr. Luciano Pereira da Silva - Joaquim de Carvalho, vida e obra». www.joaquimdecarvalho.org (em inglês). Consultado em 2 de junho de 2018 
  27. «Novo Céu no Teatro Valadares em 21 de novembro de 2014». www.centrodramaticodeviana.com. Consultado em 2 de junho de 2018 
  28. «JORNAL DIGITAL REGIONAL CAMINHA 2000». www.caminha2000.com. Consultado em 3 de junho de 2018 
  29. Cortesão, Jaime; Silva, Oscar da (1916). O Infante de Sagres; drama épico em IV actos. [S.l.]: Porto : "Renascença Portuguesa"