A identidade badjeca, badieca ou bajeca é referente à população tradicional da Ilha Grande, no Rio de Janeiro, classificada como caiçara.

Cais no Provetá

Embora a denominação "badjeco" seja originalmente exonímica e derrogatória, foi mais recentemente apropriada pela comunidade endonimicamente. Há ao menos três etimologias para o termo: uma popular referente a um suposto morador que teria este nome, uma remontando à gíria ítalo-brasileira, e outra ao termo "bajesto". Outras denominações específicas utilizadas pela comunidade original são "caiçara", "ilhéu" e "nativo", além de termos mais genéricos como "morador", "nascido e criado" e "fluminense".

Denominação editar

Sendo o termo muito ligado à oralidade, há discordância sobre sua grafia como badjeco, badieco ou bajeco. O termo é originalmente exonímico e derrogatório, referindo-se à população nativa e tradicional de Ilha Grande e associado a estereótipos negativos (como preguiça e simploriedade) cultivados por populações que interagiam com as comunidades tradicionais da Ilha, especialmente os "angrenses" (habitantes continentais de Angra dos Reis). No século XX, contudo, o termo foi ressignificada como endônimo, a princípio de forma irônica, mas posteriormente adquirindo conotações mais orgulhosas e generalizadas, podendo inclusive se estender para descendentes dos nascidos na Ilha Grande.[1] A terminologia, contudo, é recebida com resistência por alguns moradores, especialmente os mais idosos.[2][3]

A etimologia do termo é obscura, sendo correlacionada por Janaina de Souza ao termo "bajesto", isto é, "coisa insignificante".[4] A variante badieco, contudo, junto a uma variação local baieco, é utilizada entre ítalo-brasileiros no sul de Santa Catarina como exônimo genérico, especialmente em relação a luso-brasileiros e negros. Desta forma, Luciana Balthazar especula que teria origem no italiano bieco, significando "desonesto" ou "hostil no olhar", vindo do latim obliquus.[5][nota 1] Uma etimologia popular local, contudo, remete o termo a um suposto morador alcoólatra que teria se chamado "Badjeco".[2]

No século XXI, especialmente pela interação com cientistas sociais, alguns setores dos remanescentes tradicionais da Ilha Grande passaram a identificar-se subsidiariamente como caiçaras,[1] terminologia inclusive preferida pelos locais que ainda rejeitam o termo "badjeco" enquanto endônimo,[7] embora ainda secundária em relação a outras identidades,[8] e "importada" de acadêmicos que usam a terminologia genericamente.[9] Além da significação de seus hábitos por padrões científicos extrínsecos, a identificação com população tradicional conhecida assume contornos políticos pela Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais, que lhes garante a manutenção de seu território ancestral apesar de este localizar-se em parque estadual.[10] Ainda, revela-se relevante à medida em que o influxo de pessoas sem raízes na comunidade faz com que esta perceba sua individualidade, identificando-se com populações tradicionais de outras regiões.[9]

Outro termo comum de referência aos nascidos em Ilha Grande é simplesmente "ilhéu", termo genérico para pessoas nascidas em ilhas, aceitado pacificamente entre os locais. Outras autodenominações ainda mais genéricas seriam "morador", "nascido e criado", "fluminense" e "nativo",[8][11] sempre se fazendo polaridade e oposição conceitual entre esta comunidade e os outros indivíduos que se mudam para a Ilha, como empresários do turismo, embora haja convivência. De forma geral, a identidade social e os atributos étnicos são associados a gradações, segundo as quais indivíduos podem ser mais nativos ou menos, o que implica em mais ou menos prestígio em determinadas situações sociais,[12] polaridade intensificada com o aumento do número de habitantes "não nativos", atraídos pelo turismo.[13]

Ver também editar

Notas e referências

Notas

  1. Vale ressaltar que a Ilha Grande era uma parada obrigatória para pessoas vindas de regiões com epidemias para o Rio de Janeiro entre o fim do século XIX e o início do século XX, tratando e retendo os doentes, de forma que recebeu milhares de embarcações, inclusive de colonos italianos.[6]

Referências

  1. a b de Souza 2013, pp. 142-146.
  2. a b de Oliveira 2008, p. 20.
  3. de Souza 2013, p. 146.
  4. de Souza 2013, p. 143.
  5. Balthazar, pp. 231-234.
  6. Rebelo, Maio & Hochman 2011, pp. 70-73.
  7. de Oliveira 2008, p. 89.
  8. a b de Souza 2013, p. 141.
  9. a b Prado 2006, pp. 8-9.
  10. de Souza 2013, pp. 129-150.
  11. de Oliveira 2008, pp. 19-20.
  12. de Oliveira 2008, p. 19.
  13. Prado 2006, p. 9.

Bibliografia editar

  • Balthazar, Luciana Lanhi (2016). Atitudes linguísticas de ítalo-brasileiros em Criciúma (SC) e região (Tese de Doutorado). Curitiba: Universidade Federal do Paraná 
  • de Oliveira, Larissa (2008). Ecoturismo no Parque Estadual da Ilha Grande - RJ: refletindo o contexto atual a partir do olhar dos "badjecos". Universidade Federal do Rio de Janeiro (Tese de Mestrado) 
  • de Souza, Janaina Nascimento Simões (2013). Identidade e representação: os moradores da Praia do Aventureiro - Ilha Grande - RJ (Tese de Doutorado). Niterói: Universidade Federal Fluminense 
  • Prado, Rosane Manhães (2006). Ilha Grande: do sambaqui ao turismo. Rio de Janeiro: Garamound/EDUERJ 
  • Rebelo, Fernanda; Maio, Marcos Chor; Hochman, Gilberto (2011). «O princípio do fim: o "torna-viagem", a imigração e a saúde pública no Porto do Rio de Janeiro em tempos de cólera». Estudos históricos. 24 (47). Rio de Janeiro. pp. 69–87 
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