Bombardeamentos de Ennedi

Os bombardeamentos de Ennedi ocorreram de 3 a 6 de fevereiro de 2019 e foram realizados pelas forças aéreas francesas contra uma coluna de rebeldes chadianos da União das Forças de Resistência (UFR), no planalto de Ennedi.

Bombardeamentos de Ennedi
Insurgência no norte do Chade
Data 3 - 6 de fevereiro de 2019
Local Planalto de Ennedi
Desfecho Vitória franco-chadiana
Beligerantes
 França
 Chade
União das Forças de Resistência (UFR)
Comandantes
Ousmane Tegeun
Forças
França
7 aviões Mirage 2000[1]
1 drone MQ-9 Reaper[2]

Chade desconhecido
400 homens[3]
50 veículos[2]
Baixas
França nenhuma

Chade nenhuma
10 mortos[4]
267 prisioneiros
20 a 40 veículos destruídos[2][4]

Prelúdio editar

Em janeiro de 2019, o Exército Nacional Líbio (ENL) liderado pelo Marechal Khalifa Haftar lançou uma ofensiva com o objetivo de assumir o controle do sul da Líbia, que se tornou uma base de retaguarda para grupos jihadistas, grupos rebeldes chadianos e grupos rebeldes sudaneses.[5][6][7][8] A operação foi portanto realizada em coordenação com o governo do Chade e com o apoio da França.[6][7][3]

Os rebeldes chadianos da União das Forças de Resistência (UFR), então baseados ao sul de Mourzouq, preferem abandonar o sul da Líbia ao invés de lutar contra as tropas de Haftar e iniciar uma jornada de uma semana para recuperar o território chadiano.[9][10] A UFR, nesse momento, já não possuía o poder que teve outrora durante a guerra civil chadiana de 2005-2010 e seu objetivo parece estabelecer um novo reduto no deserto de Ennedi, ao invés de lançar uma ofensiva contra o governo de Idriss Déby.[9][11] No entanto, a França, ativa na região do Sahel como parte da Operação Barkhane, cujo pessoal está baseado em N'Djamena, não quer que o Chade, um aliado efetivo contra os jihadistas, seja desestabilizado.[9][12][2][13]

Desenvolvimento editar

 
Um Mirage 2000C na base aérea 172 Fort-Lamy em dezembro de 2009.

Durante a noite de 31 de janeiro para 1 de fevereiro de 2019, uma coluna de cerca de cinquenta veículos da UFR cruzou a fronteira entre a Líbia e o Chade.[2][11] Nos dias 1 e 2 de fevereiro, a Força Aérea do Chade realizou ataques aéreos de dissuasão e advertências aos quais os rebeldes não responderam.[2] A coluna chadiana foi em seguida alvo da Força Aérea Francesa no deserto de Ennedi.[9] Em 3 de fevereiro, após sobrevoo de alerta, a aviação francesa bombardeou a coluna duas vezes, a partir das 18h, a fim de impedir seu avanço e dispersá-la.[2][11] Outros ataques aéreos aconteceram nos dias 5 e 6 de fevereiro.[9] Os franceses mobilizaram um total de sete caças Mirage 2000 - cinco assentados na base aérea 172 Fort-Lamy em N'Djaména e dois na base aérea 101 Niamey - reabastecidos por dois C-135s e um drone de observação MQ-9 Reaper15[14] e executaram cerca de vinte ataques aéreos.[1][12]

O Ministério dos Negócios Estrangeiros francês declarou em seguida em um comunicado que "a França interveio a pedido das autoridades do Chade para conter a incursão de elementos armados oriundos da Líbia".[9]

As forças do Exército Nacional do Chade situadas nas bases de Ounianga Kébir e Fada desdobram-se na região de Bao, onde foram realizados os ataques aéreos franceses.[4]

Em 5 de fevereiro, vários rebeldes se renderam às forças governamentais em Amdjarass.[15] O líder da coluna, Tenente Ousmane Tegeun, e seus elementos a bordo de uma dúzia de picapes se refugiaram em uma caverna, perto de Bao Bilia, antes de se renderem.[15] Outros combatentes se esconderam nas montanhas de Hadjer Marfaïn.[4]

Após os ataques aéreos, o porta-voz da UFR, Youssouf Hamid, reage: “Uma batalha está perdida, mas não a guerra. Não sabíamos que a França iria intervir. Normalmente, eles fazem inteligência, nós sabemos disso. Não esperávamos um ataque. Não houve um único combate entre (os combatentes da UFR) e o exército chadiano. Foi a França que combateu, não os chadianos”.[16]

Baixas editar

Em 6 de fevereiro, o exército francês afirmou em um comunicado à imprensa que havia posto fora de combate cerca de vinte picapes.[2] Em 9 de fevereiro, o governo chadiano afirma que 250 rebeldes foram feitos prisioneiros, incluindo o tenente Ousmane Tegeun, que comandava a coluna, e que cerca de quarenta veículos foram destruídos.[15][4] A RFI, por sua vez, indica que, segundo várias fontes, cerca de cem combatentes se renderam.[15] Uma fonte da AFP dentro da UFR também afirma que dez combatentes da UFR foram mortos nos ataques.[4]

Os prisioneiros são reunidos em Amdjarass e depois conduzidos para a prisão de Koro Toro. As autoridades chadianas anunciam que os detidos não serão julgados por um tribunal militar, mas por um tribunal civil e que serão processados por "terrorismo".[17]

Reações editar

O ministro francês dos Negócios Estrangeiros Jean-Yves Le Drian, justifica a intervenção francesa em 12 de fevereiro diante do Parlamento: “Houve um ataque de um grupo rebelde vindo do sul da Líbia, que está desestabilizando, para tomar o poder pelas armas em Ndjamena e o presidente Déby pediu-nos por escrito uma intervenção para evitar este golpe de Estado oriundo do sul da Líbia e para proteger o seu próprio país. Isto está em total conformidade com o direito internacional e o primeiro-ministro informou o Presidente do Senado e da Assembleia Nacional".[18]

A intervenção francesa é, no entanto, criticada pela oposição democrática chadiana, pelos movimentos armados de oposição ao regime de Idriss Déby, que denunciam uma ingerência da França nos assuntos internos do Chade, bem como por algumas vozes francesas que criticam o apoio dado uma ditadura.[19] Mahamat Ahmat Alhabo, secretário-geral do Partido para as Liberdades e o Desenvolvimento (PLD) — partido de Ibni Oumar Mahamat Saleh, que faleceu em fevereiro de 2008 e foi um dos principais opositores do Presidente Idriss Déby — declara a este respeito que “a intervenção francesa viola o direito internacional porque é um problema interno que opõe uma rebelião chadiana a um governo chadiano”.[20] Ngarlejy Yorongar, coordenador da Fédération Action pour la République (FAR), afirma que não é “normal que a França apoie Déby”.[21] Para Martin David, da associação Survie: "É esta ditadura que o exército francês sustenta".[20] [22]

Referências

  1. a b «Raids contre l'UFR au Tchad: l'armée française tire un premier bilan». RFI (em francês). 7 de fevereiro de 2019 
  2. a b c d e f g h Le Monde com AFP e Reuters (6 de fevereiro de 2019). «L'armée française bombarde une colonne de rebelles pour éviter la déstabilisation du Tchad» (em francês). Le Monde 
  3. a b Forestier, Patrick (9 de fevereiro de 2019). «Tchad : comment les rebelles sont tombés dans un piège». Le Point (em francês) 
  4. a b c d e f France 24 com AFP (9 de fevereiro de 2019). «Colonne de rebelles au Tchad : 250 "terroristes" capturés, selon l'armée» (em francês) 
  5. Le Figaro com AFP (16 de janeiro de 2019). «Libye: Haftar lance une opération pour» (em francês) 
  6. a b «L'armée libyenne affronte toujours la rébellion tchadienne dans le sud». RFI (em francês). 2 de fevereiro de 2019 
  7. a b Frédéric Bobin (8 de fevereiro de 2019). «En Libye, les avancées du maréchal Haftar rebattent les cartes de la crise» (em francês). Le Monde 
  8. Arianna Poletti (8 de fevereiro de 2019). «Libye : le maréchal Haftar avance dans le sud-ouest et inquiète Tripoli» (em francês). Jeune Afrique 
  9. a b c d e f Macé, Célian (8 de fevereiro de 2019). «Le maréchal Haftar fait des ricochets au Sahara» (em francês). Libération 
  10. Carine Frenk (7 de fevereiro de 2019). «Invité Afrique - Rebelles de l'UFR frappé par la France: «Pourquoi aucune force armée tchadienne ne les a arrêtés?»». RFI (em francês) 
  11. a b c Macé, Célian (4 de fevereiro de 2019). «Au Tchad, les forces françaises frappent aussi les rebelles» (em francês). Libération 
  12. a b Marielle Debos, Que fait l’armée française au Tchad ?, Libération, 8 de fevereiro de 2019.
  13. Christophe Châtelot e Nathalie Guibert, Tchad : la France vole au secours d’Idriss Déby en bombardant des rebelles, Le Monde, 7 de fevereiro de 2019.
  14. Emmanuel Huberdeau (8 de fevereiro de 2019). «Les Mirage 2000 frappent au Tchad en dehors du cadre de Barkhane». Air et cosmos (em francês) 
  15. a b c d «Tchad: nouvelle reddition de rebelles de l'UFR». RFI (em francês). 9 de fevereiro de 2019 
  16. Pierre Magnan (11 de fevereiro de 2019). «"Une bataille est perdue, mais pas la guerre", estime le groupe tchadien attaqué par les Mirage français» (em francês). Franceinfo 
  17. «Tchad: les insurgés de l'UFR devront répondre pour «terrorisme»». RFI (em francês). 12 de fevereiro de 2019 
  18. «Intervention militaire française au Tchad: le Drian devant les parlementaires». RFI (em francês). 13 de fevereiro de 2019 
  19. «Vidéo. Sécurité : L'opposition qualifie l'intervention de la force Barkhane d'ingérence». Tchadinfos.com (em francês). 5 de fevereiro de 2019 
  20. a b «L'intervention militaire française au nord du Tchad pose question». France 24 
  21. «Tchad : L'opposition critique les opérations françaises à la frontière libyenne | TRT Français». www.trt.net.tr (em francês) 
  22. «Présente au Tchad depuis des décennies, l'armée française aide une fois de plus un dictateur ami de la France». Survie (em francês)