Sanatruces (rei nômade)

 Nota: Para outras pessoas de mesmo nome, veja Sanatruces.

Sanatruces (em armênio: Սանատրուկ; romaniz.: Sanatruk; em grego: Σανατρύκης; romaniz.: Sanatrúkes; em latim: Sanatruces), também chamado Sanesano ou Sanesã (em latim: Sanesanus; Սանեսան, Sanesān) foi rei dos mascutes, uma tribo nômade cuja identificação precisa suscita debates, no início do século IV. De acordo com as fontes armênias, aproveitou a sucessão dinástica no Reino da Armênia depois da morte de Tiridates III (r. 285–330) para tentar conquistar o país e tomar o trono de Cosroes III (r. 330–339). Supostamente era membro da dinastia arsácida.

Sanatruces
Rei dos mascutes
Reinado Anos 330
Morte 336
Dinastia arsácida

Sanatruces (Σανατρύκης, Sanatrúkes), também registrado como Sinatruces (Σινατρούκης, Sinatroúkēs), Sanatrúcio (Σανατρούκιος, Sanatroúkios) e Sanatruco (Sanatrucus) são as formas grega e latina do nome parta Sanatruque (Sanatrūk), que seria incorporado no armênio (Սանատրուկ) e aramaico (𐡎𐡍𐡕𐡓𐡅𐡊, sntrwk e snṭrwq (aramaico de Hatra)).[1][2] Em última análise, pode derivar do iraniano antigo *sāna-taru-ka- ("conquistador de inimigos").[3] Sanesano / Sanesã, por outro lado, possui duas origens propostas. Alguns historiadores pensam estar associado ao nome parta Sanesaracã (snysrk(n), Sanēsarakān), lit. "Filho de Sanesar", atestado num fragmento parta do século II/IIII oriundo de Dura-Europos.[4][5] Outros defendem que derive do iraniano antigo Zanasana (Zanaχšāna), "aquele que tem tribo", "de alta linhagem".[6]

Origens

editar

As origens de Sanatruces são disputadas. As fontes, ao citarem seu nome, não informam seu nascimento ou parentesco. Moisés de Corene, em particular, foi a única fonte que lhe atribuiu ancestralidade na dinastia arsácida do Império Arsácida, que desde 224 foi destronada com a derrubada de Artabano IV (r. 213–224) por Artaxes I (r. 224–242) e a fundação do Império Sassânida (224–651).[7][8] À época, na Ibéria e Armênia, reinavam ramos cadetes dos arsácidas, que descendiam de Vologases V (r. 180–208),[9] enquanto na vizinha Albânia, por influência dos romanos, outro ramo cadete, de origens obscuras, ascendeu com o entronização de Vachagã I (r. 300–336).[10] Fausto, o Bizantino, relatando a origem dessa personagem, comenta que ele era "parente" ou "irmão" de Cosroes III (r. 330–339), configurando uma associação implícita à dinastia dos arsácidas.[11]

Sanatruces é referido em diversas fontes históricas armênias. Exceto por Fausto que o chama de Sanesano, as demais referem-se a ele como Sanatruces. Murtazali Gadjiev propôs que trata-se de duas personagens distintas, que por estarem intimamente ligadas entre si, foram confundidas pela historiografia como sendo uma pessoa; o primeiro seria um rei nômade que residia ao norte dos domínios armênios, a quem atribuiu uma hipotética ligação dinástica com a realeza dos alanos como neto de Axídares, cuja filha Asiquena casar-se-ia com Tiridates III (r. 298–330) e dessa união nasceria Cosroes III; o segundo, um arsácida residente na Albânia, que dependeu da assistência de Sanesano no transcorrer dos eventos aos quais esteve relacionado.[12][13] Apesar de assumir a plausibilidade de sua hipótese, essa argumentação não é consenso na historiografia, com outros autores mantendo a posição de que sejam a mesma pessoa.[14][15][16]

A descrição dos acontecimentos possui alguns pontos de divergência entre as fontes. Os dois relatos mais curtos, fornecidos por Ciríaco de Ganzaca e João V de Drascanacerta, alegaram que a Albânia estava submetida à autoridade da Armênia e que Tiridates III nomeou em data incerta Sanatruces como governador dos territórios albaneses. Quando Tiridates III faleceu e foi sucedido por Cosroes III, Sanatruces executou o missionário Gregoris ao arrastá-lo amarrado a um cavalo e dirigiu-se à corte de Ctesifonte, onde recebeu do xainxá do Império Sassânida Sapor II (r. 309–379) as insígnias reais e o direito de governar a Albânia. Cosroes alegadamente teria se contentando com os territórios que ainda possuía, e por iniciativa do católico Vertanes I, o Parto (327/33–341/2), permitiu que Sanatruces continuasse como rei.[17][18]

Moisés de Dascurã, ao mencionar Sanatruces, relata que era rei dos alanos de Paitacarã em oposição a Urnair (r. 350–375), o que configura um erro cronológico, pois esse rei ascenderia apenas em 350, anos depois dos eventos que envolveram Sanatruces.


Referências

  1. Justi 1895, p. 282.
  2. Ačaṙyan 1942–1962, p. 392.
  3. Henning 1958, p. 41, nota 1.
  4. Fausto, o Bizantino 1989, p. 406.
  5. Dum-Tragut 2023, p. 62.
  6. Gadjiev 2021, p. 213.
  7. Chaumont 1988, p. 574–580.
  8. Schippmann 1986a, p. 647–650.
  9. Toumanoff 1986, p. 543–546.
  10. Gadjiev 2020a, p. 33.
  11. Gadjiev 2020a, p. 30.
  12. Gadjiev 2020b, p. 108.
  13. Gadjiev 2021, p. 211-212.
  14. Grousset 1973, p. 130.
  15. Nyberg 1975, p. 112, 146.
  16. Dum-Tragut 2023, p. 62-63.
  17. Ciríaco de Ganzaca 2021, p. 40.
  18. João V de Drascanacerta 2004, p. 97-98.

Bibliografia

editar
  • Ačaṙyan, Hračʻya (1942–1962). «Սանատրուկ». Hayocʻ anjnanunneri baṙaran [Dictionary of Personal Names of Armenians] (in Armenian). Erevã: Imprensa da Universidade de Erevã 
  • Chaumont, M. L.; Schippmann, K. (1988). «Balāš VI». Enciclopédia Irânica, Vol. III, Fasc. 6. Nova Iorque: Imprensa da Universidade de Colúmbia. pp. 574–580 
  • Ciríaco de Ganzaca (2021). Kirakos Ganjakec'i (Xiiie Siecle). Histoire d'Armenie: Traduction, Introduction Et Notes par Patricia Boisson. Lovaina: Aedibus Peeters 
  • Dodgeon, Michael H.; Lieu, Samuel N. C. (2002). The Roman Eastern Frontier and the Persian Wars (Part I, 226–363 AD). Londres: Routledge. ISBN 0-415-00342-3 
  • Dum-Tragut, Jasmine; Gippert, Jost (2023). «Caucasian Albania in Medieval Armenian Sources (5th–13th Centuries)». CaucasianAlbania: An international handbook. Berlim: De Gruyter 
  • Fausto, o Bizantino (1989). Garsoïan, Nina, ed. The Epic Histories Attributed to Pʻawstos Buzand: (Buzandaran Patmutʻiwnkʻ). Cambrígia, Massachusetts: Departamento de Línguas e Civilizações Próximo Orientais, Universidade de Harvard 
  • Gadjiev, Murtazali (2020a). «The Chronology of the Arsacid Albanians». In: Hoyland, Robert. From Albania to Arrān: The East Caucasus between the Ancient and Islamic Worlds (ca. 330 BCE–1000 CE). Piscataway, Nova Jérsei: Gorgias Press. pp. 29–35. ISBN 978-1463239886 
  • Gadjiev, Murtazali (2020b). «The mission of bishop Israyel». In: Hoyland, Robert. From Albania to Arrān: The East Caucasus between the Ancient and Islamic Worlds (ca. 330 BCE–1000 CE). Piscataway, Nova Jérsei: Gorgias Press. pp. 29–35. ISBN 978-1463239886 
  • Gadjiev, Murtazali (2021). «Armenia and the Land of the Mazkut' (3rd-5th Centuries AD): Written Sources and Archaeological Data». Electrum. 28: 209-219 
  • Grousset, René (1973) [1947]. Histoire de l'Arménie: des origines à 1071. Paris: Payot 
  • Henning, W. B. (1958). «Mitteliranisch». Iranistik: 1. Abschnitt – Linguistik (Handbuch der Orientalistik; Erste Abteilung; 4). Leida e Colônia: E. J. Brill 
  • João V de Drascanacerta (2004). Boisson, Patricia, ed. Histoire d'Arménie: Introduction, traduction et notes. Lovaina: Aedibus Peeters 
  • Justi, Ferdinand (1895). Iranisches Namenbuch. Marburgo: N. G. Elwertsche Verlagsbuchhandlung 
  • Nyberg, Henrik Samuel (1975). «États vassaux dans l'Empire Sassanide». Lovaina: Brill. Acta Iranica. I (12) 
  • Schippmann, K. (1986a). «Artabanus (Arsacid kings)». Enciclopédia Irânica, Vol. II, Fasc. 6. Nova Iorque: Imprensa da Universidade de Colúmbia. pp. 647–650 
  • Toumanoff, Cyril (1986). «Arsacids vii. The Arsacid dynasty of Armenia». In: Yarshater, Ehsan. Encyclopædia Iranica, Volume II/5: Armenia and Iran IV–Art in Iran I. Londres e Nova Iorque: Routledge & Kegan Paul. pp. 543–546. ISBN 978-0-71009-105-5