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A Retomada Gãh Ré Kaingang é uma retomada indígena localizada no Morro Santana, em Porto Alegre. O território é reivindicado como sagrado pelos povos kaingang e xokleng, além de ter sido ocupado por esses povos indígenas desde tempos anteriores à colonização do local. O espaço – o qual contempla os biomas Pampa e Mata Atlântica, além de nascentes do Arroio Dilúvio – estava abandonado há décadas, quando a retomada se iniciou em 18 de dezembro de 2022. A comunidade ainda está no local, aguardando a demarcação do território como terra indígena.

Antecedentes editar

O território do Morro Santana é um território multiétnico. Os povos kaingang habitavam o morro anteriormente à colonização, e o território foi e é espaço de disputas políticas.[1][2] O morro é o ponto mais alto da cidade, com 311 metros de altura,[3] contendo nascentes do Arroio Dilúvio e espécies do Pampa e da Mata Atlântica.[2]

No século XVIII, a presença portuguesa para criação de gado afastou os povos indígenas do local, que foram relegados para as encostas e as periferias do morro.[2] Um pré-laudo antropológico da UFRGS descreve que o morro é moradia de famílias kaingang e xokleng no último século, sendo um território de memória ancestral e importância espiritual e política.[4]

Na década de 70, o local fazia parte de pedreiras de José Asmuz. Entretanto, as atividades extrativistas foram consideradas danosas ao ambiente e estavam sem licença adequada por grande parte do período de atuação.[5] Em 1981, com a falência da mineradora e a desativação da pedreira, o território foi hipotecado ao Banco Maisonnave.[6] Posteriormente, o grupo Maisonnave hipotecou o terreno como garantia de dívida ao Banco Central. Entretanto, a União não executou a hipoteca.[5]

Anteriormente à retomada, o terreno estava abandonado e sem função social há mais de 40 anos,[3] e em péssimas condições de manutenção.[2] A empresa proprietária planejava construir um condomínio de 11 torres, 714 apartamentos e 865 vagas de estacionamento, o que traria impactos ambientais ao local, sendo uma das últimas áreas de mata preservada da cidade.[4][5] O empreendimento imobiliário foi inicialmente rejeitado pelo Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano Ambiental (CMDUA) de Porto Alegre. Entretanto, a decisão foi repassada para outra Região de Gestão de Planejamento, a RGP 1, em que foi aprovado. Dada essa divergência entre os dois processos, conselheiros do CMDUA, na reunião seguinte à da aprovação, apontaram irregularidades no processo e em licenciamentos ambientais da capital, demonstrando sua preocupação.[5]

Desdobramentos editar

A retomada começou no dia 18 de outubro de 2022, reivindicando o espaço e renomeando-o como Retomada Gãh Ré.[2]

No início do mês de dezembro, a Justiça Federal por meio do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região determinou a reintegração de posse do imóvel para a empresa dona do terreno.[3] Posteriormente ao processo, um dossiê da Federação Anarquista Gaúcha evidenciou irregularidades no processo de reintegração.[4] Em 15 de dezembro, o TRF4 manteve a reintegração de posse, negando recurso do Ministério Público Federal.[2][3]

Em 21 de dezembro, a liderança da comunidade, cacica Gãh Té, também conhecida como Mestra Iracema Nascimento, fez uma greve de fome que durou seis dias, como forma de protesto à reintegração de posse,[2] na tentativa de que seu pedido pela demarcação da terra indígena fosse atendido pela Justiça e pela Funai. Entretanto, a Justiça protelou o caso e determinou a saída voluntária pelos indígenas para 9 de fevereiro de 2023.[3][6]

No início de 2023, Mestra Iracema esteve na Pré-Marcha das Mulheres em Brasília, onde teve a oportunidade de se encontrar com Sônia Guajajara e Joênia Wapichana, as presidentas do Ministério dos Povos Indígenas e da Funai, respectivamente. A cacica Gãh Té entregou uma carta às duas lideranças indígenas, solicitando que a demarcação de terras fosse acelerada.[3][6]

Mesmo com o vencimento do prazo da saída voluntária, os indígenas continuaram recebendo apoio de diversas organizações. No dia 13 de fevereiro de 2023, a comunidade recebeu a visita da Comissão de Direitos Humanos da Câmara de Vereadores de Porto Alegre, representada pelo vereador Pedro Ruas do PSOL.[6] No dia 23 de fevereiro, mais de 30 entidades assinaram um manifesto de apoio, além de levarem alimentos, brinquedos, materiais de limpeza e de construção.[3]

No dia 14 de março, a Justiça Federal emitiu novo pedido de reintegração de posse. A decisão determinava que os membros da comunidade fossem movidos para a terra indígena mais próxima, a terra indígena Cantagalo.[7] Entretanto, a terra do Cantagalo é ocupada por indígenas guarani,[8] enquanto os indígenas da retomada são kaingang e xokleng: não são da mesma cultura e nem falam a mesma língua. A decisão foi considerada racista pela comunidade; além disso, esse tipo de prática integracionista era comum na Ditadura Militar Brasileira.[9] O Conselho Indigenista Missionário afirmou que "a decisão é racista, abusiva e demonstra total desconhecimento acerca das culturas, dos saberes e dos modos de ser e viver dos povos indígenas no Brasil."[7] Em resposta ao novo processo, a comunidade ocupou a sede da Funai de Porto Alegre na manhã da quinta-feira, 16 de março de 2023. Após um contato bem-sucedido com o Ministério dos Povos Indígenas, o órgão se comprometeu a participar do processo na Justiça e se posicionar contra a reintegração de posse.[9]

Em 21 de março de 2023, a Justiça Federal suspendeu a liminar de reintegração de posse. A juíza responsável pela decisão argumenta que não se deve promover uma remoção forçada quando as partes estão dispostas ao diálogo. Também argumenta que devem ser criados os Comitês de Conciliação de Conflitos. A Equipe Sul do Conselho de Missão entre Povos Indígenas e a Equipe de Porto Alegre do Conselho Indigenista Missionário argumentam que a decisão foi uma grande vitória para a comunidade.[10] Em 02 de maio, ocorreu a primeira audiência de Conciliação no Tribunal Regional Federal da 4.ª Região, com os integrantes da comunidade, representantes da família Maisonnave, o Ministério Público Federal, a Defensoria Pública da União, a Procuradoria-Geral de Porto Alegre e a representação estadual e federal da FUNAI.[11]

Ver também editar

Referências

  1. Silva, Luís Gustavo Ruwer da (26 de dezembro de 2023). «Entre o "bem viver" e "viver na caixinha" – Conflitos ontológicos no Morro Santana, em Porto Alegre, RS: Between "living well" and "living in a box" – Ontological Conflicts in Morro Santana, Porto Alegre, RS». Simbiótica. Revista Eletrônica (3): 73–95. ISSN 2316-1620. doi:10.47456/simbitica.v10i3.41111. Consultado em 16 de fevereiro de 2024 
  2. a b c d e f g «Retomada Gãh Ré: indígenas vivem incerteza em meio a disputa judicial». Humanista. 14 de fevereiro de 2023. Consultado em 16 de fevereiro de 2024 
  3. a b c d e f g «Retomada Gãh Ré: mais de 30 entidades registram apoio aos povos Kaingang e Xokleng». Brasil de Fato. 23 de fevereiro de 2023. Consultado em 16 de fevereiro de 2024 
  4. a b c «Em dossiê entidade aponta irregularidades em pedido de reintegração de posse». Brasil de Fato - Rio Grande do Sul. 13 de dezembro de 2022. Consultado em 16 de fevereiro de 2024 
  5. a b c d Brasileira (CAB), Coordenação Anarquista (8 de dezembro de 2022). «Dossiê Maisonnave - a impunidade tem sobrenome». Coordenação Anarquista Brasileira. Consultado em 16 de fevereiro de 2024 
  6. a b c d e «Depois de ir a Brasília, cacica confia em avanço de demarcação de terra indígena no Morro Santana». Sul 21. 13 de fevereiro de 2023. Consultado em 18 de fevereiro de 2024 }
  7. a b Miotto, Tiago (15 de março de 2023). «Justiça Federal concede nova liminar de reintegração de posse contra a Retomada Gãh Ré, no Morro Santana, em Porto Alegre | Cimi». Consultado em 18 de fevereiro de 2024 
  8. «Terra Indígena Cantagalo | Terras Indígenas no Brasil». terrasindigenas.org.br. Consultado em 18 de fevereiro de 2024 
  9. a b «Indígenas da Retomada Gãh Ré do Morro Santana ocuparam Funai em Porto Alegre». Brasil de Fato - Rio Grande do Sul. 16 de março de 2023. Consultado em 18 de fevereiro de 2024 
  10. Nove (22 de março de 2023). «Suspensa a reintegração de posse contra a Retomada Gãh Ré, Morro Santana, Porto Alegre». Desacato. Consultado em 18 de fevereiro de 2024 
  11. «Primeira audiência de Conciliação da Retomada Gãh Ré aconteceu nesta terça-feira (2)». Brasil de Fato - Rio Grande do Sul. 3 de maio de 2023. Consultado em 18 de fevereiro de 2024 

Ligações externas editar

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