Bruxelas na União Europeia

Bruxelas, na Bélgica, é considerada a capital de facto da União Europeia, tendo um longo e tradicional histórico como sede de várias das principais instituições europeias, mais especificamente na região conhecida como "Bairro Europeu".[1] A União Europeia não possui uma cidade capital e não foram desenvolvidos planos ou acordos para a definição de uma desde a sua fundação, porém, Bruxelas abriga as sedes do Conselho Europeu, Conselho da União Europeia e da Comissão Europeia além de uma sede secundária do Parlamento Europeu.[2]

Localização de Bruxelas e do Reino da Bélgica na União Europeia.

Em dados econômicos de 2013, a presença das instituições europeias gerou uma renda de 250 milhões de euros (8,3% do PIB regional) e 121.000 empregos (16,7% da taxa de emprego regional) à cidade. Segundo analistas políticos, Bruxelas acabou por ser conceituada como sede da organização devido à sua localização estratégica entre França e Alemanha - nações cuja rivalidade desembocou em ambas as Guerras Mundiais no século XX e cuja subsequente reconciliação diplomática possibilitou integração do continente.[3]

História editar

Duas chances editar

 
Vista aérea do "Bairro Europeu" de Bruxelas, sede da maioria das instituições da União Europeia.

Em 1951, líderes de seis países europeus (Bélgica, Luxemburgo, França, Itália, Países Baixos e Alemanha) assinaram o Tratado de Paris, que deu origem à Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (CECA) com suas instituições adjacentes (Conselho de Ministros, Tribunal de Justiça e Assembleia Comum). Várias cidades foram consideradas para sediar a organização e Bruxelas teria sido aceita de comum acordo mesmo com a pressão do governo belga para que a sede fosse escolhida em Liège devido à instabilidade interna do país.

O acordo permaneceu indefinido e foi necessário definir uma sede antes que as instituições pudessem funcionar de fato. Luxemburgo foi escolhida como sede provisória enquanto a Assembleia Comum se reuniria em Estrasburgo, pois era a única cidade com infraestrutura necessária para abrigar as reuniões do grupo.[4] Este acordo era temporário e foram estabelecidos planos para realocar as instituições para Saarbrücken que teria o status de um "Distrito Europeu" dentro da Alemanha, mas isso não ocorreu.

Os Tratados de Roma de 1957 estabeleceram duas novas instituições continentais: a Comunidade Económica Europeia (CEE) e a Comunidade Europeia da Energia Atómica (Euratom). Estas partilharam a Assembleia e o Tribunal da CECA, mas criaram dois novos conjuntos de Conselhos e Comissões (equivalentes à atual Alta Autoridade da CECA). As discussões sobre as sedes das instituições foram proteladas até o último momento antes da entrada em vigor dos tratados para que o debate não interferisse nas negociações sobre a ratificação.

Pouco mais de um mês antes do início formal das negociações, Bruxelas apresentou sua candidatura como sede europeia recebendo apoio não-oficial de diversos Estados-membros. Em contrapartida, os Estados-membros concordaram em princípio em sediar os órgãos e conselhos executivos e a assembleia em uma única cidade ainda indefinida. Entretanto, a Assembleia permaneceria em Estrasburgo e as novas comissões se reuniriam alternadamente na sede da CECA e em Bruxelas.[4] Por outro lado, as sedes dos conselhos seriam escolhidas rotativamente por seus respectivos presidentes.

Expansão inicial editar

 
A Place du Luxembourg no coração do "Bairro Europeu" de Bruxelas. Ao fundo, o complexo de edifícios que sedia o Parlamento Europeu.

Bruxelas perdeu sua candidatura como sede única devido ao esparso interesse do governo belga nas negociações, apesar do amplo apoio de outros países. A Bélgica deu início à sua campanha através de um programa de construções em ampla escala para sediar algumas da instituições. Em 11 de fevereiro de 1958, os seis governos concluíram um acordo não-oficial sobre a criação de sedes comunitárias. Com base no princípio de que levaria dois anos após um acordo final para preparar a sede apropriada, serviços completos foram estabelecidos em Bruxelas na expectativa de um relatório do Comitê de Peritos analisando a questão de uma sede definitiva.

Um Comité de Peritos considerou Bruxelas a única opção por ter todas as características necessárias a uma capital europeia: uma grande metrópole ativa sem um centro urbano congestionado ou moradias em mau estado de conservação; boas relações com as capitais de outros Estados-membros; boa infraestrutura pública; e por ser um importante centro internacional de negócios. Paralelamente a estes fatores, a cidade está localizada exatamente entre França e Alemanha (como outras sedes de instituições europeias) e na fronteira entre a Europa latina (francês valão) e a Europa germânica além de ter abrigado o Benelux, primeira experiência de integração do continente pós-guerra. Acreditava-se também que por ser capital de um dos menores países da região, sua condição como sede não seria usada como pressão sobre outros Estados-membros, sendo basicamente um território neutro entre as Grandes Potências europeias. O relatório da comissão foi aprovado pelo Parlamento e as Comissões enquanto o Conselho não conseguiu uma votação final sobre a questão e adiou a questão por mais três anos, apesar de todas as mover todas as suas instituições para Bruxelas.

Infraestrutura editar

O "Bairro Europeu" editar

A maioria das instituições da União Europeia sediadas em Bruxelas estão localizadas dentro de seu "Bairro Europeu" (francês: Quartier Européen, holandês: Europese Wijk), que é o nome informal da área correspondente ao triângulo entre o Parque de Bruxelas, o Parque do Cinquentenário e o Parque Leopoldo (este último que abrange também o Espace Léopold).[5] A Comissão e o Conselho estão localizados nesta área central, nas proximidades da Estação Schuman do Metropolitano de Bruxelas. O Parlamento Europeu está localizado sobre a Estação Bruxelas-Luxemburgo, próximo à Place Luxemburgo.

Principais edifícios da União Europeia em Bruxelas: O Edifício Berlaymont sedia a Comissão Europeia enquanto o Edifício Europa sedia simultaneamente o Conselho da União Europeia e o Conselho Europeu. O Espace Léopold serve de sede alternativa ao Parlamento Europeu.[4]

A área, conhecida comumente como "Bairro Leopoldo" durante grande parte de sua história, era historicamente residencial, aspecto que se perdeu rapidamente à medida que as instituições se instalavam, embora a mudança de uma área residencial para uma mais orientada para escritórios já tivesse sido em curso há algum tempo antes da chegada das instituições europeias.[6] Os edifícios históricos e residenciais, embora ainda presentes, foram em grande parte substituídos por escritórios modernos. Esses edifícios foram construídos de acordo com a construção especulativa de escritórios do setor privado, sem a qual a maioria dos edifícios das instituições não teria sido construída.[7][8] No entanto, devido às tentativas de Bruxelas de consolidar sua posição, houve um grande investimento do governo em infraestrutura.[9] O arquiteto Benoit Moritz - um dos principais críticos do crescimento urbano da cidade - argumenta que a área tem sido um "enclave de elite" cercado por bairros mais pobres desde meados do século XIX e que o contraste hoje é comparável a uma cidade indiana.[10] No entanto, Moritz também afirma que a cidade avançou economicamente na última década com a ampliação de negócios e residências e que as instituições estão mais abertas a "interagir" com o espaço urbano.[11]

O uso do solo local é muito homogêneo e criticado por especialistas e figuras públicas, incluindo o próprio ex-Presidente da Comissão Romano Prodi que alegou um distanciamento da região do restante da cidade. Por outro lado, o arquiteto Rem Koolhaas alega que a cidade deveria ter um símbolo arquitetônico representativo de toda a Europa (semelhante à Torre Eiffel de Paris ou ao Coliseu de Roma).[12][13] Por sua vez, o filósofo italiano Umberto Eco descreve Bruxelas como "uma capital suave" ao invés de uma "cidade imperial" de um eventual império, mantendo sua missão de "servir" à Europa.[7] Apesar disso, os planos de redesenvolvimento pretendem lidar com uma certa extensão da identidade visual na área.[8]

Comissão Europeia editar

 
O Edifício Berlaymont, sede da Comissão Europeia.

A estrutura mais icônica do complexo da União Europeia em Bruxelas é o Edifício Berlaymont, a sede principal da Comissão Europeia. Foi o primeiro edifício a ser construído para a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço na década de 1960. Foi projetado por Lucien De Vestel, Jean Gilson, André Polak e Jean Polak e financiado pelo governo belga na possibilidade de reassumir o complexo mediante a eventual mudança da capital para outra cidade. O projeto arquitetônico teve como inspiração a sede da UNESCO, em Paris, seguindo o mesmo traçado uma estrela de quatro pontas sustentada por pilotis.

Originalmente construído em blocos de amianto, o edifício foi reformado na década de 1990. Após um período realizando suas atividades no Edifício Breydel, a Comissão reocupou e adquiriu definitivamente o Edifício Berlaymont em 2005.

Conselho editar

 
O Edifício Europa, sede do Conselho da União Europeia.

Na direção oposta ao Edifício Berlayont se ergue Edifício Europa, utilizado pelo Conselho da União Europeia e o Conselho Europeu como sede internacional desde o início de 2017. Sua antiga sede no Edifício Justus Lipsius ainda é usada para reuniões secundárias e abriga o secretariado do Conselho. A renovação e construção do novo edifício do Conselho tinha o intuito de renovar a paisagem urbana do bairro, sendo um projeto do arquiteto Philippe Samyn que buscou conceber um edifício "feminino" e "leve" para contrastar com a arquitetura rígida de outros edifícios locais. O edifício apresenta uma estrutura "em forma de lanterna" totalmente cercado por um átrio de vidro produzido com material de janelas recicladas de toda a Europa. A intenção da solução decorativa seria demonstrar estarem "unidas de longe, mas diversas de perto".

Referências

  1. Cybriwsky, Roman Adrian (2013). Capital Cities around the World: An Encyclopedia of Geography, History, and Culture: An Encyclopedia of Geography, History, and Culture. [S.l.]: ABC-CLIO. ISBN 9781610692489 
  2. Demey 2007, p. 528.
  3. Contested Spaces, Common Ground: Space and Power Structures in Contemporary Multireligious Societies. [S.l.: s.n.] 2016. ISBN 9789004325807 
  4. a b c «Why was Strasbourg designated the official seat of the European Parliament?». European Parliament News 
  5. «Europe in Brussels». Comissão Europeia. 2007 
  6. Demey, Thierry (2007). Brussels, Capital of Europe. Bruxelas: [s.n.] p. 72 
  7. a b Zucchini, Giulio (6 de outubro de 2018). «Brussels, a soft capital». Cafebabel 
  8. a b «EU promises 'facelift' for Brussels' European quarter». EurActiv. 6 de setembro de 2007 
  9. «The European Quarter». Wayback Machine. 2008 
  10. Berger, Mathieu; Moritz, Benoît; Carlier, Louise; Ranzato, Marco (2018). «Four challenges of inclusion in Brussels». Metrolab Series. p. 23-39 
  11. Vermeersch, Laurent (30 de janeiro de 2015). «Is the EU's new council building a desperate attempt to change its image?». The Guardian 
  12. Members' Research Service (3 de novembro de 2016). «Places in Brussels of symbolic significance for Europe». Epthinktank 
  13. Crook, Lizzie (25 de fevereiro de 2020). «OMA unveils "cliff-like" headquarters for SNCB in Brussels». Dezeen 

Bibliografia editar

  • Demey, Thierry (2007). Bruxelles, capitale de l'Europe. [S.l.: s.n.] ISBN 9782960041422