Campeonato Brasileiro de Clubes Campeões de 1920
O Campeonato Brasileiro de Clubes Campeões de 1920,[nota 1][1][2] também conhecido como Torneio dos Campeões, Copa/Torneio dos Campeões Estaduais ou Torneio Nacional de Clubes,[3] foi um dos primeiros campeonatos a nível interestadual no Brasil. Organizado pela Confederação Brasileira de Desportos (CBD) (precursora da atual CBF), em 1920, em plena fase amadora, é tido como um dos antecedentes do Campeonato Brasileiro de Futebol.[4][1]
Campeonato Brasileiro de Clubes Campeões | |
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Torneio dos Campeões (CBD) | |
CA Paulistano - JdB 19200329 p10 "O quadro do C.A. Paulistano, vencedor do Fluminense" Jornal do Brasil, 29 de março de 1920 | |
Dados | |
Participantes | 03 |
Organização | CBD |
Anfitrião | Brasil |
Período | 25 de março – 3 de abril de 1920 |
Gol(o)s | 23 |
Partidas | 03 |
Média | 7,67 gol(o)s por partida |
Campeão | Paulistano (1° título) |
Vice-campeão | Fluminense |
3.º colocado | Brasil de Pelotas |
Melhor marcador | 4 gols:
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Maior goleada (diferença) |
Paulistano 7 – 3 Brasil de Pelotas Estádio das Laranjeiras, Rio de Janeiro 25 de março |
O jornal O Paiz, edição de 25 de março de 1920, anunciava o início do "grande interestadual promovido pela CBD", que convidou altas autoridades do país, incluindo o presidente do Brasil, Epitácio Pessoa, para acompanhar os jogos.[5] O torneio foi vencido pelo Paulistano,[6] que recebeu a "Taça Elixir de Nogueira",[nota 2] na qual continha a inscrição "Campeão Brasileiro de 1920".[7]
Participantes
editarForam chamados os campeões estaduais de São Paulo, Rio de Janeiro (Distrito Federal) e Rio Grande do Sul:
- Fluminense (Rio de Janeiro-DF), campeão carioca de 1919;
- Paulistano (São Paulo-SP), campeão paulista de 1919;
- Brasil de Pelotas (Pelotas-RS), campeão gaúcho de 1919.
Antecedentes
editarA origem da competição relaciona-se com a controvérsia sobre a Taça Ioduran de 1919, em que Fluminense e Paulistano se enfrentariam como campeões estaduais de Rio de Janeiro e São Paulo. Esta acabou não ocorrendo, em razão de desentendimento envolvendo a Associação Paulista de Esportes Atléticos (APEA) e a carioca Liga Metropolitana de Desportos Terrestres (LMTD).[8]
O Paulistano fez críticas ao Botafogo, ao qual o zagueiro Palomone, então Mackenzie, se transferiu logo após o Sul-Americano de 1919. Isto gerou uma crise entre as instituições, conforme explica Fernandez (2016, pp. 240-241) citando Mazzoni (1950): "O clube paulista acusou o clube carioca de aliciar o jogador com ofertas financeiras, a LMDT confirmou a transferência e a APEA rompeu com essa entidade, como a CBD ficou ao lado da LMTD, a APEA também rompeu com a CBD".[8]
A APEA acabaria impedindo o Paulistano de disputar a Taça Ioduran, sob a justificativa de falta de datas, de modo que o Fluminense, não sem o descontentamento paulista, foi declarado campeão por w.o. Já em 1920, o Paulistano aceitou entregar a taça, requisitando, como condição, um novo confronto. Assim, segundo Fernandez (2016, p. 241): "Essa atitude permitiu uma trégua para a realização do primeiro campeonato brasileiro de clubes, a Copa dos Campeões (...)".[8]
Em 1917, o Paulistano também perdeu a Taça Ioduran por w.o, para o America. Em 1918, na única edição realmente jogada, foi campeão sobre o Fluminense, pelo placar de 3 a 2. A Taça Ioduran é contabilizada como Taça dos Campeões Estaduais Rio–São Paulo, a qual já havia sido realizada em 1911 (Taça Salutaris), 1912 (Troféu Interestadual) e 1914, com vitórias de outros três clubes paulistas.
Treze anos antes, em 1907, foi disputada a Taça Brasil, tira-teima de ida-e-volta entre as seleções Carioca e a Paulista, organizada pelas respectivas federações estaduais, que usaram a rubrica "Campeonato Brasileiro" na comunicação entre si. São Paulo venceu.[9]
História
editarO jornal O Estado de S. Paulo de 29 de março de 1920, divulgou que o interestadual daquele ano era um campeonato nacional, representado pelas forças máximas da associação, e que, após a vitória sobre o Fluminense, o Paulistano confirmou o seu título de "campeão brasileiro de futebol". Depois de vencer os gaúchos e cariocas, a diretoria do clube paulista voltou para casa festejando os "campeões brasileiros", recebidos com placa, banquete e medalhas.[8][10]
O Correio da Manhã, de 4 de abril de 1920, refere-se ao torneio como "Campeonato Brasileiro".[11] Em 15 de março de 1946, o jornalista Mário Filho, para O Globo Sportivo, artigo "História do Campeonato Brasileiro - 1", escreve: "Em 20, a Confederação Brasileira organizou um torneio a que deu o título de Campeonato Brasileiro"; "E, havia dois anos, a CBD crismara de 'Campeonato Brasileiro' o certame dos campeões do Rio, São Paulo e Rio Grande". Entretanto, só no primeiro campeonato de seleções envolvendo sete estados, em 1922, que a CBD passou a referir uma competição oficialmente de "Campeonato Brasileiro".[9] Segundo reportagem de Mauro Pinheiro (1976), para a Placar, "a CBD organizou o primeiro Campeonato Brasileiro de Clubes Campeões, assim rotulado, mas que acabou sendo um simples triangular (...)".[1] Em 1994, a mesma revista chamou a disputa de "avô do atual campeonato brasileiro".[2] É mais referenciada pela impressa como "Copa dos Campeões" ou "Torneio dos Campeões".[12]
As despesas foram totalmente pagas pela CBD, que precisava montar uma Seleção Brasileira para o Campeonato Sul-Americano de 1920, no Chile, tendo o torneio como uma oportunidade de observar jogadores e para levantar fundos visando a participação do país nos Jogos Olímpicos de Verão de 1920.[13][14]
Todos os jogos foram disputados no estádio do Fluminense, o Estádio das Laranjeiras, que fora construído para o Sul-Americano de 1919, com o apoio da CBD, sendo o maior do Brasil na época. O juiz Henrique Vignal, da Liga Metropolitana e associado do C. R. Flamengo, considerado um dos melhores juízes do futebol brasileiro, conforme O Paiz (1920), apitou a partida inaugural.[5] Arthur Friedenreich, goleador histórico, fez um hat-trick.[15]
No jogo do título contra o anfitrião Fluminense, 25 mil pessoas fizeram presença, então ocupação máxima do Estádio das Laranjeiras.[16] Houve torcida hostil ao time local, seja por torcedores de rivais cariocas ou pela própria torcida (esta última possibilidade levantada pelo O Paiz), o que chegou a ser apontado como razão da derrota e indicava o fim do cavalheirismo no futebol.[8] Em São Paulo, lia-se o confronto do Rio de Janeiro na Praça Antônio Prado, em frente ao Estadão, que a partir de tabuletas informava os lances importantes. Por telefone, um repórter no estádio descrevia a partida para a redação.[16] A vitória foi tida pela impressa paulista como representação da superioridade do futebol de São Paulo sobre o futebol da então capital brasileira.[8] O triunfo foi comemorado pelo poeta Mário de Andrade: "Os cariocas perderam o match / Quatro a um / Urrah, paulistas!".[8] Mário Filho apontou que ter um elenco envelhecido, que vinha de um tricampeonato carioca, foi a causa do insucesso do Fluminense.[9]
O Correio da Manhã (1920) discorreu sobre o último jogo da "série de jogos interestaduais" da CBD, ocorrido entre Fluminense e Brasil de Pelotas. Apesar da diferença de quatro gols em favor do dono da casa, o jornal observa que ambas equipes tiveram um desempenho superior ao que apresentaram contra o Paulistano. O periódico, que narrou cada gol e apresentou as estatísticas da peleja,[nota 3] ao final apresenta a tabela com a "colocação dos concorrentes ao título máximo do Campeonato Brasileiro".[11] Antes da partida houve uma preliminar: Serrano 5 x 1 Carioca.[11] O time gaúcho guarda em suas dependências um troféu pela participação no campeonato.[14][17]
Foi o primeiro torneio nacional do futebol brasileiro,[16] sendo sucedido pelo Campeonato Brasileiro de Seleções Estaduais (1922 a 1987) e pelo Torneio dos Campeões (1937). Este último, organizado pela FBF, também era entre clubes, mas de cunho profissional, tendo sido oficializado como Brasileirão, em 2023, pela CBF.[4][7] São competições distintas. Em 2022, o Club Athletico Paulistano, que abandonou o setor de futebol em 1929 (ainda como time amador), afirmou não ter interesse pelo mesmo reconhecimento.[7] Em 2023, disse em nota que "o tema está em avaliação pelo clube".[15]
Em 3 jogos foram marcados 23 gols, uma média de 7,6 gols por partida.
Jogos
editarJogo 1
editar25 de março de 1920 | Paulistano | 7 – 3 | Brasil de Pelotas | Estádio das Laranjeiras, Rio de Janeiro (RJ) |
Arthur Friedenreich 04', 17', 29' Mário Andrade 11', 25' Carlos Araujo 54', 64' |
Ignácio 42' Proença 78' Alberto Côrrea 82' |
Público: ? Árbitro: Henrique Vignal |
- Paulistano: Arnaldo - Orlando (c), Carlito - Clodoaldo, Mariano, Sergio - Zonzo, Mário Andrade, Arthur Friedenreich, Carlos Araujo, Cassiano. Técnico: Angelo Bernardelli.
- Brasil de Pelotas: Frank - Nunes, Zabaleta - Floriano, Rossell, Waldomiro Victoria “Babá” - Faria, Alberto Côrrea, Proença, Ignácio, Alvariza.
Jogo 2
editar28 de março de 1920 | Fluminense | 1 – 4 | Paulistano | Estádio das Laranjeiras, Rio de Janeiro (RJ) |
Zezé 02' | Arthur Friedenreich 40' Mário Andrade 50', 89' Botelho 69' |
Público: 25,000 Árbitro: Eduardo Gibson |
- Fluminense: Marcos Mendonça - Othelo, Chico Netto (c) - Laís, Osvaldo Gomes, Fortes - Mano, Zezé, Harry Welfare, Machado, Bacchi. Técnico: Pode Pedersen.
- Paulistano: Arnaldo - Orlando (c), Carlito - Sergio, Carlos Araujo, Mariano - Zonzo, Mário Andrade, Friedenreich, Botelho, Cassiano. Técnico: Angelo Bernardelli.
Jogo 3
editar3 de abril de 1920 | Fluminense | 6 – 2 | Brasil de Pelotas | Estádio das Laranjeiras, Rio de Janeiro (RJ) |
Machado 16', 77' Zezé 43', 53', 75' Harry Welfare 83' |
Proença 63' Alvariza 86' |
Público: ? Árbitro: Carlos Santos |
- Fluminense: Marcos Mendonça - Othelo, Chico Netto - Laís, Honório, Fortes - Mário, Zezé, Harry Welfare, Machado, Bacchi.[11] Técnico: Pode Pedersen.
- Brasil de Pelotas: Frank - Nunes, Zabaleta - Flóriano, Rossell, Victorino - Faria, Alberto Côrrea, Proença, Ignácio, Alvariza.[11]
Classificação final
editarTriangular final | ||||||||||
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Times | Pts | J | V | E | D | GP | GC | SG | ||
1º | Paulistano | 4 | 2 | 2 | 0 | 0 | 11 | 4 | +7 | |
2º | Fluminense | 2 | 2 | 1 | 0 | 1 | 7 | 6 | +1 | |
3º | Brasil de Pelotas | 0 | 2 | 0 | 0 | 2 | 5 | 13 | -8 |
Premiação
editarCampeonato Brasileiro de Clubes Campeões |
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Paulistano Campeão (1.º título) |
Artilheiros
editar- Arthur Friedenreich (Paulistano), Mário Andrade (Paulistano) e Zezé (Fluminense): 4 gols
- Carlos Araujo (Paulistano), Machado (Fluminense) e Proença (Brasil de Pelotas): 2 gols
Ver também
editar- Campeonato Brasileiro de Seleções Estaduais
- Copa dos Campeões do Brasil de 1978
- Cronologia da história do futebol no Brasil
- Lista de campeões do futebol do Brasil
- Taça dos Campeões Estaduais Rio–São Paulo
- Taça Brasil de Futebol de 1907
- Torneios nacionais que antecederam a Taça Brasil de Futebol
- Torneio dos Campeões da CBD de 1969
- Torneio dos Campeões da CBF de 1982
- Torneio Triangular de Porto Alegre
- Torneio Interestadual Brasileiro de 1954
Notas e referências
Notas
- ↑ A CBD nunca rotulou oficialmente as suas competições de clubes com a nomenclatura "Campeonato Brasileiro". Com a criação da CBF, a nova entidade passou a rotular assim a principal disputa de clubes do país no final da década de 1980.
- ↑ Elixir de Nogueira era um elixir fabricado em um edifício de mesmo nome demolido em 1970.
- ↑ O jornal errou no subtítulo (linha fina), afirmando que o Fluminense derrotou o G. S. Brasil por 6 a 0. Ao longo da matéria, porém, acerta o placar e até detalha os dois gols pelotenses.
Referências
- ↑ a b c Pinheiro, Mauro (14 de maio de 1976). Primeiro título nacional ficou com o Paulistano. [S.l.]: Revista Placar; Editora Abril.
Ano de 1920, ainda em pleno amadorismo, a CBD organizou o primeiro Campeonato Brasileiro de Clubes Campeões (...)
- ↑ a b Épocas de Ouro. [S.l.]: Placar Magazine; Editora Abril. Outubro de 1994.
(...) inédito título de Campeão dos Campeões, conquistado ao vencer o primeiro campeonato brasileiro de clubes campeões.
- ↑ FAZZOLARI, Felicce Fatarelli. Clube Athlético Paulistano e o primeiro campeonato paulista de futebo. Ludopédio, São Paulo, v. 164, n. 24, 2023. "Na década de 1920, conquistou o Torneio Nacional de Clubes, organizado pela CBD (...)".
- ↑ a b Quais as competições que antecederam o Brasileirão?. [S.l.]: Revista Placar; Editora Abril. Outubro de 2002
- ↑ a b «SPORT: FOOT-BALL - O início dos matches interestaduais - pág 6». O Paiz. 25 de março de 1920. Consultado em 18 de setembro de 2023
- ↑ «Conheça as taças do Paulistano, campeão 11 vezes do Paulistão». Club Athletico Paulistano. Consultado em 19 de setembro de 2023
- ↑ a b c Madureira, Thiago (18 de maio de 2022). «Paulistano descarta seguir Atlético em busca de reconhecimento de título». Superesportes. Consultado em 27 de agosto de 2023
- ↑ a b c d e f g FERNANDEZ, Renato Lanna. O jogo da distinção: C. A. Paulistano e Fluminense F. C. - um estudo das identidades clubísticas durante a fase amadora do futebol em São Paulo e no Rio de Janeiro (1902-1933). 2016. 507 f. Tese (Doutorado em História) - Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil – CPDOC, Fundação Getúlio Vargas, Rio de Janeiro, 2016. Disponível em: https://repositorio.fgv.br/items/0a36e619-ddaf-4d5e-a61c-a2ad0eb2bb2b
- ↑ a b c Mário Filho (15 de março de 1946). História do Campeonato Brasileiro - 1 O Globo Sportivo, p.3.
- ↑ «FOOTBALL». O Estado de S. Paulo. 29 de março de 1920. Consultado em 26 de agosto de 2023
- ↑ a b c d e Correio da Manhã (Correio Sportivo). Football Interestadual, 4 de abril de 1920
- ↑ TNOnline (20 de dezembro de 2010). «Dossiê da unificação: brecha para títulos em 1920 e 1937 | TNOnline». tnonline.uol.com.br. Consultado em 28 de agosto de 2023
- ↑ «Revista Oficial do Club Athletico Paulistano Ano XXXII 382 Dezembro 2020 - pág 52/53» (PDF). Club Athletico Paulistano. Consultado em 1 de julho de 2024
- ↑ a b «História». Grêmio Esportivo Brasil. Consultado em 19 de setembro de 2023
- ↑ a b «Luta pelo título? Veja como clubes lidam com chance de serem reconhecidos campeões nacionais - Lance!». Lance!. 22 de setembro de 2023. Consultado em 1 de maio de 2024
- ↑ a b c Medici, Ademir (27 de março de 2020). «Na praça o povo vê o Paulistano campeão». Jornal Diário do Grande ABC. Consultado em 21 de setembro de 2023
- ↑ «Uma taça para os riograndenses - pág 9». O Paiz. 2 de abril de 1920. Consultado em 19 de setembro de 2023