O Reformismo é uma doutrina política segundo a qual a transformação da sociedade, com vistas a aperfeiçoar todos os seus aspectos, pode efetuar-se no quadro das instituições existentes, por meio de reformas gradativas, sem necessidade de mudanças bruscas, ou de métodos revolucionários. É associado ao conceito de colaboração de classes e socialismo democrático, visando adaptar o capitalismo aos momentos históricos, desconsiderando ideais marxistas como luta de classes, revolução socialista e ditadura do proletariado.[1]

A partir do final da Segunda Guerra Mundial, referiu-se a movimentos de esquerda que tinham em vista a transformação da sociedade e da economia mediante a introdução de reformas graduais e sucessivas na legislação e nas instituições já existentes a fim de torná-las mais justas ou igualitárias, distinguindo-se dos movimentos mais radicais e revolucionários, enquanto reformismo progressista ou social-democrata.

Na atualidade, em países como Portugal ou França, é usual as palavras "reformismo", "reformista" e "reformas" serem utilizadas com a conotação oposta da original, frequentemente à direita para advogar propostas de liberalização da economia do país.

Nos países subdesenvolvidos, em particular na segunda metade do século XX, muitas críticas foram feitas à ideologia neo-malthusiana que via o excesso populacional como o problema destes mesmos países. Com base nessas críticas, teóricos elaboraram a teoria reformista, defendendo que os problemas sociais não eram resultado do crescimento populacional mas sim da desigualdade e da falta de acesso da grande parte dessa população às riquezas produzidas.

Embora, na política do passado, ideias reformistas tenham estado enraizadas em princípios socialistas (especificamente, social-democratas)[2][3] e, na religião, tenham descrito versões mais modernas ou menos dogmáticas de determinada fé ou crença, o reformismo hoje representa apenas alguma alteração ao status quo. De modo geral, descreve mudanças em qualquer direção propostas na política, na economia ou na cultura de uma sociedade, podendo depender de transformações individuais ou invenções com impacto coletivo, tais como a roda de fiar e a economia da aldeia auto-sustentável.[4][5]

Teorias reformistas

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 Ver artigo principal: Reformismo (marxismo)

Teoria populacional reformista

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Na segunda metade do século XX, muitas críticas foram feitas à ideologia defendida pelos teóricos neo-malthusianos. Com bases nessas críticas, teóricos de países subdesenvolvidos elaboraram a teoria reformista que afirma que os problemas sociais não são o resultado do crescimento populacional, mas sim da falta de acesso da grande parte da população às riquezas produzidas.[6]

Essa teoria, ao contrário da neomalthusiana, afirma que a superpopulação é consequência e não causa do subdesenvolvimento.[6]

Em países desenvolvidos, onde há melhor qualidade de vida, ocorre maior controle de natalidade. Em países subdesenvolvidos onde não há grandes investimentos em educação, as pessoas acabam não tendo consciência das determinações econômicas e não se preocupam em gerar menos filhos. Devido a isso, os reformistas propõem reformas nos investimentos,[6] para que haja equilíbrio da educação nesses países.

Movimentos reformistas

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Movimento reformista Radicalista

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 Ver artigo principal: Radicalismo

O movimento radical foi um movimento reformista no Reino Unido no final do século XVIII e início do século XX. Ele fez campanhas para a reforma eleitoral, a reforma das Leis dos Pobres, o livre comércio, a reforma educacional, reforma postal, reforma do sistema prisional, e saneamento básico.[7] Originalmente este movimento deveria substituir o exclusivo poder político da aristocracia com um sistema mais democrático dando mais representatividade as áreas urbanas e as classes média e trabalhadora.

Após as ideias do Iluminismo, os reformadores olharam para o revolução científica e progresso industrial para resolver os problemas sociais que surgiram com a Revolução Industrial.

Finalmente, em 1859, este movimento de reforma levou à formação do Partido Liberal.

O maior sucesso dos reformadores foi na Inglaterra a Lei da Reforma de 1832, o que proporcionou à crescente classes médias mais poder político em áreas urbanas, diminuindo ao mesmo tempo a representação de áreas da Inglaterra não perturbadas pela Revolução Industrial.[8] Apesar da determinada resistência da Câmara dos Lordes a lei foi aprovada dando mais poder parlamentar para os liberais.[9]

Movimento cartista

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 Ver artigo principal: Cartismo

O movimento cartista procurou implementar o sufrágio universal. Um historiador do movimento cartista observou que "O movimento cartista era essencialmente um movimento econômico com um programa puramente político".[10] A ideia do sufrágio universal masculino, uma meta inicial do movimento cartista, era incluir todos os homens como eleitores, independentemente da sua posição social. Isto mais tarde evoluiu para uma campanha pelo sufrágio universal. Este movimento procurou redesenhar os distritos parlamentares dentro de Grã-Bretanha e criar um sistema de salário para os eleitos para que os trabalhadores poderiam ter recursos para representar seus eleitores, sem um fardo para suas famílias.

Movimento pelo sufrágio feminino

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 Ver artigo principal: Sufrágio feminino
 
Mary Wollstonecraft

Muitos consideram o livro "Defesa dos Direitos da Mulher" (1792), de Mary Wollstonecraft, como a origem da longa campanha dos reformadores para inclusão feminista e do movimento do sufrágio feminino. Harriet Taylor foi uma influência significativa nos trabalhos e ideias de John Stuart Mill, reforçando a defesa de Mill dos direitos da mulher. Seu ensaio "Emancipação da Mulher" apareceu no Westminster Review em 1851, em resposta a um discurso de Lucy Stone dado na primeira Convenção Nacional de Direitos da Mulher, em Worcester, em Massachusetts, em 1850. Mill cita a influência de Taylor em sua revisão final da obra On Liberty, de 1859, que foi publicado logo após sua morte.[11]

Movimento Reformista islâmico de Mustafa Kemal

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Os conceitos de reforma social haviam sido desenvolvidos por Mustafa Kemal desde cedo, como fica evidente por seus diários pessoais. Juntamente com seus assessores ele discutia constantemente medidas como a abolição do hijab e outras formas de véus utilizados tradicionalmente pelas mulheres islâmicas, bem como a integração das mulheres na vida social turca.

Mustafa Kemal precisava de um Código civil para dar seu segundo grande passo em direção à liberdade para as mulheres; o primeiro havia sido assegurar a educação para elas, que fora estabelecida como parte da unificação da educação promovida por ele. Em 4 de outubro de 1926, o novo código civil turco foi aprovado, modelado a partir do código civil suíço. Kemal não considerava o sexo um fator na organização social; de acordo com seu ponto de vista, a sociedade marchava rumo a sua meta com todos os seus homens e mulheres juntos, e que seria cientificamente impossível para ele conseguir atingir o progresso e tornar o país civilizado se a separação dos sexos continuasse como nos tempos otomanos.[12]

Em 1927, o Museu Estatal de Arte e Escultura de Ancara (em turco: Ankara Resim ve Heykel Müzesi) abriu suas portas; o museu, como tantas outras instituições que contaram com o incentivo de Kemal, procurou adquirir coleções importantes que servissem como inspiração e fonte de conhecimento para a sociedade. Costumava dizer que a Cultura é a fundação da República Turca.[13]

 
Edição de 1928 do jornal francês L'Illustration, mostrando Atatürk introduzindo o novo alfabeto turco às pessoas de Sinope

Em 24 de maio de 1928, o alfabeto turco, uma variante do alfabeto latino, foi implementado, substituindo o alfabeto árabe, como parte da solução de Mustafa Kemal para o problema da alfabetização. O pedagogo americano John Dewey, contratado por Kemal para assessorar no processo de reforma educacional, relatou que aprender a ler e escrever em turco utilizando-se do alfabeto árabe levava três anos nos níveis mais elementares, frequentemente utilizando-se de métodos bastante cansativos para os alunos.[14] Os cidadãos alfabetizados compunham menos de 10% da população da época, que se utilizavam do turco otomano, no alfabeto árabe e com vocabulário de origem árabe e persa.[14] A criação do alfabeto turco a partir do latino foi realizada pela Comissão da Língua (em turco: Dil Encümeni), sob iniciativa de Atatürk[14] e sob a tutelagem de um calígrafo armênio-otomano.[15]

Em 1931, após participar de trabalhos de pesquisa sobre o idioma turco, Mustafa Kemal determinou o estabelecimento da Associação da Língua Turca (Türk Dil Kurumu); ao avanço institucional da língua turca seguiu-se o da história da Turquia, e no ano seguinte foi fundada a Sociedade Histórica Turca (Türk Tarih Kurumu). Mustafa Kemal ainda apelou publicamente aos setores privados e à sociedade em geral para participarem deste esforço em prol da educação.[16]

Em 1933, Mustafa Kemal Atatürk ordenou a reestruturação da Universidade de Istambul, que a transformou numa instituição moderna, e estabeleceu logo a seguir a Universidade de Ancara, na capital, para se assegurar do zelo e proteção dos princípios que ele via como expressões de uma sociedade moderna, como a Ciência e o Iluminismo.[17]

Kemal se envolveu pessoalmente com a tradução da terminologia científica;[18] ele desejava uma reforma linguística fundamentada numa base metodológica.

Em 1932, a primeira tradução para o turco do Corão foi lida publicamente.[19] Mustafa Kemal comissionou uma tradução do Corão para o turco do tafsir Elmalılı Hamdi Yazır. Sua meta mais alta, no campo religioso, era esta tradução do Corão para o idioma nacional;[20] Atatürk queria "ensinar religião em turco para o povo turco, que vinha praticando o Islã sem o compreender por séculos a fio".[20] A intensidade da oposição à tradução na Turquia pode ser constatada com o fato de que, em 1936, o texto sagrado do islamismo já havia sido vertido para outras 102 línguas.[21]

Referências

  1. Breve Diccionário Político - Editorial Progreso - Moscu. «Dicionário Político - Reformismo». www.marxists.org. Consultado em 23 de outubro de 2023 
  2. Sejersted and Adams and Daly, Francis and Madeleine and Richard (2011). The Age of Social Democracy: Norway and Sweden in the Twentieth Century. [S.l.]: Princeton University Press. ISBN 978-0691147741 
  3. Foundations of social democracy, 2004. Friedrich-Ebert-Stiftung, p. 8, November 2009.
  4. Gandhi, Mohandas Karamchand (1990). Desai, Mahadev H., ed. Autobiography: The story of my experiments with truth. Mineola, N.Y: Dover. p. 89. ISBN 0-486-24593-4 
  5. Haferkamp, Hans, and Neil J. Smelser, editors. "Social Change and Modernity."Berkeley: University of California Press, c1992 1991.
  6. a b c Eduardo de Freitas. «Teoria Reformista». R7. Brasil Escola. Consultado em 8 de dezembro de 2012 
  7. Elie Halévy, The Growth of Philosophic Radicalism. Faber (1972) ISBN 0-571-04759-9
  8. G. M. Trevelyan, Lord Grey of the Reform Bill: Being the Life of Charles, Second Earl Grey (London: Longmans, Green, 1913)
  9. G. D. H. Cole, Short History of the British Working Class Movement, 1787-1947. London, George Allen & Unwin (1948), pp. 63-69. "The Reform Movement"
  10. G.D.H. Cole, Short History of the British Working Class Movement, 1787-1947. London, George Allen & Unwin (1948), p. 94 "The Rise of Chartism”
  11. «John Stuart Mill, The Subjection of Women, The Feminism and Women's Studies site (e-text)». Consultado em 6 de dezembro de 2013. Arquivado do original em 27 de julho de 2014 
  12. Tüfekçi, Universality of Atatürk's philosophy
  13. Atillasoy, Atatürk : first president and founder of the Turkish Republic, 15
  14. a b c Wolf-Gazo, Ernest (1996). «John Dewey in Turkey: An Educational Mission». Ancara: American Studies Association of Turkey. Journal of American Studies of Turkey. 3: 15–42. ISSN 1300-6606. Consultado em 6 de dezembro de 2013. Arquivado do original em 27 de março de 2009 
  15. Dundar, Can (25 de abril de 2005). «Türkeş, Atatürk'ün imzasını hatırlattı». Milliyet (em turco). Atatürk'ün imzasını bir Ermeni güzel yazı hocasının çizdiğini duymuş muydun? 
  16. «About Us». Consultado em 1 de fevereiro de 2008. Arquivado do original em 17 de novembro de 2007 
  17. Saikal, Democratization in the Middle East: Experiences, Struggles, Challenges, 95
  18. Lewis, Geoffrey L. (1999), The Turkish Language Reform: A Catastrophic Success, Oxford University Press ISBN 0-19-823856-8 pág. 66
  19. Cleveland, A History of the Modern Middle East, 181
  20. a b Radu, Michael. (2003), Dangerous Neighborhood: Contemporary Issues in Turkey's Foreign Relations, pág. 125, ISBN 978-0-7658-0166-1
  21. Fatani, Afnan (2006). Leaman, Oliver, ed. The Qur'an: an encyclopedia. Translation and the Qur'an. Great Britain: Routeledge. pp. 657–669