Regina Pacini

cantora de ópera argentina

Regina Pacini Quintero de Alvear (Lisboa, 6 de janeiro de 1871 - Buenos Aires, 18 de setembro de 1965), conhecida como Regina Pacini, foi uma soprano lírica ligeira e benfeitora portuguesa, de mãe espanhola e pai italiano. Para além de se ter notabilizado como cantora é também reconhecida por ter sido primeira dama da Argentina entre 1922 e 1928.[1][2]

Regina Pacini
Regina Pacini
Regina Pacini vestida per una actuació
Nascimento Regina Isabel Luisa Pacini Quintero
6 de janeiro de 1871
Lisboa
Morte 18 de setembro de 1965 (94 anos)
Buenos Aires
Sepultamento Cemitério da Recoleta
Cidadania Portuguesa
Cônjuge Marcelo Torcuato de Alvear
Ocupação cantora de ópera
Prêmios
Instrumento voz

Biografia editar

Filha do barítono, ator e empresário italiano Pietro Andrea Giorgi-Pacini e de Felisa Quintero, natural da Andaluzia, Espanha, Regina Isabel Luisa Pacini Quintero, de Alvear por casamento, nasceu em Lisboa, a 6 de janeiro de 1871, durante a regência do seu pai no Teatro de São Carlos de Lisboa.[3] Descendente de uma família nobre e artística, pelo lado paterno, era neta do basso buffo Luigi Pacini e sobrinha-neta do compositor Giovanni Pacini.[4]

 
Retrato de Regina Pacini

Seguindo o mesmo interesse pelas artes que a sua família, estudou música em Paris com a mezzosoprana alemã Mathilde Marchesi, regressando à capital portuguesa em 1888, onde estreou-se com apenas 17 anos de idade, tendo interpretado o papel de Amina em La sonnambula, no Teatro de São Carlos, com grande sucesso.

 
Regina Pacini e Marcelo Torcuato de Alvear

Apenas um ano depois, e sempre acompanhada pela sua mãe, cantou em Milão, Palermo e Londres, estreando-se no Teatro Real de Madrid em 1890, de novo com La sonnambula.[5] Em 1893 atuou no Grande Teatro do Liceu de Barcelona e entre 1894 e 1895 em Varsóvia e São Petersburgo. Regressando esporadicamente a Lisboa e Madrid durante os últimos anos da década de 1890, em 1899 debutou no Teatro Solís de Montevidéu, no Teatro Politeama e no Teatro Municipal General San Martín de Buenos Aires,[6] onde conheceu Marcelo Torcuato de Alvear, advogado e político argentino liberal, neto de Carlos María de Alvear, que se apaixonou perdidamente por Regina Pacini, tendo lhe enviado um colar ou um anel (segundo vários periódicos de então), que foi rejeitada pela cantora portuguesa, e um ramo de rosas.[7] Com o virar do século apresentou-se em diferentes teatros, passando pelo Covent Garden (Royal Opera House) de Londres, onde contracenou com o tenor Enrico Caruso,[8] ou ainda no Teatro San Carlo de Nápoles e no Teatro alla Scala de Milão, para além de ter atuado em Roma e Florença.[9][10]

A 29 de abril de 1907, no auge da sua carreira, após oito anos de intensa corte de Marcelo Torcuato de Alvear, que, contra os desejos da sua família aristocrática, viajou atrás da atriz por vários países e continentes para a conquistar,[11] e gerando um enorme escândalo na sociedade argentina, Regina Pacini casou-se com o político argentino na Igreja de Nossa Senhora da Encarnação em Lisboa, passando a residir pouco depois com o seu esposo em Louveciennes, França.[12][13] Retirando-se do mundo da música e da representação desde então, apesar de ter tido uma curta carreira, como soprano foi uma importante expoente do bel canto da época, tendo interpretado Lucia di Lammermoor, A bohème, I Puritani, Rigoletto, Manon e o papel de Rosina na ópera O Barbeiro de Sevilha.[14][15][16]

Em 1916, durante a Primeira Guerra Mundial, o seu marido foi nomeado embaixador da Argentina em França por Hipólito Yrigoyen. Apesar das duras dificuldades que enfrentaram durante esse período, a antiga cantora procurou usufruir da sua influência, através da filantropia, tendo auxiliado várias associações e movimentos cívicos de apoio às vítimas de guerra e aos militares destacados na frente do combate ou ainda financiado um hospital de guerra e um banco de sangue, onde exerceu como enfermeira. Por essas ações, após a guerra, o casal foi condecorado com a Ordem Nacional da Legião de Honra pelo governo francês.

A12 de junho de 1922, apesar de ainda residir em Paris, Marcelo Torcuato de Alvear foi eleito presidente da Argentina, obrigando o casal a viajar para Buenos Aires poucos meses depois. Como primeira dama da Argentina, Regina Pacini teve um papel de destaque, tornando-se notória por promover fervorosamente as artes e a cultura no país.[17][18] Segundo vários historiadores, inauguraram-se mais obras públicas durante a gestão presidencial de seu marido que durante a de todos os seus antecessores, tendo sido construídos, inaugurados ou fundados o Museu de Luján, o Conservatório Nacional de Música e Declamação, o Departamento de Artes Musicais e Sonoras da Universidade Nacional de las Artes, o Estadio Alberto J. Armando, o Monumento a La Carta Magna y las Cuatro Regiones Argentinas (conhecido como Monumento de los Españoles), o Palacio de Correos, a primeira Feira do Livro de Buenos Aires ou ainda parte da linha B do metro de Buenos Aires, entre muitos outros.[19]

 
Regina Pacini acompanhada pelo presidente argentino Arturo Frondizi na inauguração da sala dedicada ao seu marido, situada no Museu da Casa de Governo, a 16 de outubro de 1958.

Após o mandato presidencial ter terminado, o casal fixou residência uma vez mais em França, tendo somente regressado a Buenos Aires em abril de 1931, poucos meses antes de se instalar a lei marcial e o auge do regime ditatorial de José Félix Uriburu, que os obrigou a se exilarem na cidade do Rio de Janeiro, Brasil, até outubro desse mesmo ano, partindo depois o casal para Montevidéu e, de seguida, Paris. Após a queda de Uriburu, em 1932, ambos regressaram à Argentina, onde o seu marido continuou a desempenhar um papel de relevo como um dos principais dirigentes do partido Unión Cívica Radical (UCR) até ser uma vez mais perseguido politicamente e preso na ilha Martín García, juntamente com vários opositores do regime de Agustín Pedro Justo e da aliança política Concordancia. Apesar das difíceis condições e persistente vigilância, Regina Pacini permaneceu em Buenos Aires, onde pode visitar Marcelo Torcuato de Alvear na prisão, até este ter aceitado um acordo em que estipulava que passaria a viver no exílio.[20] Em outubro de 1933, partiram uma vez mais de França para a capital argentina, onde Regina acompanhou o seu marido na sua campanha para as eleições dos governadores e deputados nacionais.

 
Marcelo Torcuato de Alvear e Regina Pacini durante a sua visita à Casa del Teatro, fundada com o seu patrocínio. Acompanham-nos os atores Florencio Parravicini e Pierina Dealesi, entre outros.

Apesar dos escândalos e da perseguição política que abalaram a carreira do seu marido, Regina Pacini continuou a desempenhar o seu papel de filantropa e benemérita, tendo fundado em 1938 um projeto que tinha idealizado ainda quando desempenhava o papel de primeira dama - a Casa del Teatro de Buenos Aires, um asilo para atores, semelhante à Casa Verdi de Milão, com 45 habitações, dois pequenos museus e a sede do Teatro Regina, nomeado em sua homenagem, para além do Templo de San Marcelo e o Colégio anexado.[21]

Nos seus últimos anos de vida, viveu em Villa Regina, Mar del Plata, Villa Elvira e, por fim, em Don Torcuato, com uma modesta pensão nacional que repartia por várias obras de beneficência, após ter enviuvado em 1942. Deve-se a ela a construção da capela de San Marcelo, em Don Torcuato.

Faleceu a 18 de setembro de 1965, com 94 anos de idade, sem gerar descendência.[22]

Homenagens e Legado editar

O seu nome foi atribuído em 1925 à então recém criada colónia agrícola e hoje cidade de Villa Regina, na Província de Rio Negro,[23] e a algumas ruas de diversas localidades argentinas, incluindo um bairro em Porto Madero.[24]

Na Casa del Teatro, em Buenos Aires, existem dois museus dedicados à obra e vida de Carlos Gardel e de Regina Pacini.

Referências

  1. Cabrera, Ana María (2013). Regina e Marcelo: um dueto de amor : a soprano portuguesa que foi primeira-dama da Argentina. [S.l.: s.n.] 
  2. Balmaceda, Daniel (1 de maio de 2012). Historias insólitas de la historia argentina (Edición Actualizada) (em espanhol). [S.l.]: Penguin Random House Grupo Editorial Argentina 
  3. Torres, Juan Lucio (2014). El español como soldado argentino: Participación en las campañas militares por la libertad e independencia (em espanhol). [S.l.]: Ediciones de la Torre 
  4. Salgado, Susana (22 de julho de 2003). The Teatro Solís: 150 Years of Opera, Concert and Ballet in Montevideo (em inglês). [S.l.]: Wesleyan University Press 
  5. Chuilon, Jacques (13 de abril de 2009). Mattia Battistini: King of Baritones and Baritone of Kings (em inglês). [S.l.]: Scarecrow Press 
  6. Collier, Simon (15 de dezembro de 1986). The Life, Music, and Times of Carlos Gardel (em inglês). [S.l.]: University of Pittsburgh Pre 
  7. admin (17 de junho de 2018). «Regina Pacini». Fervor x Buenos Aires (em espanhol). Consultado em 16 de dezembro de 2022 
  8. Wearing, J. P. (5 de dezembro de 2013). The London Stage 1900-1909: A Calendar of Productions, Performers, and Personnel (em inglês). [S.l.]: Scarecrow Press 
  9. «Regina Pacini». Operissimo (em alemão). Consultado em 7 de janeiro de 2014. Cópia arquivada em 5 de março de 2016 
  10. Rosselli, John (2 de março de 1995). Singers of Italian Opera: The History of a Profession (em inglês). [S.l.]: Cambridge University Press 
  11. Duggan, Bernardo A.; Lewis, Colin M. (15 de abril de 2019). Historical Dictionary of Argentina (em inglês). [S.l.]: Rowman & Littlefield 
  12. Mato, Omar López (2002). City of Angels: The History of Recoleta Cemetery : a Guide to Its Treasures (em inglês). [S.l.]: OLMO Ediciones 
  13. Bazán, Jorge Osvaldo (11 de maio de 2021). Historias cortas, de poder, de amor y de tragedia (em espanhol). [S.l.]: Ediciones Servicop 
  14. Mallach, Alan (30 de novembro de 2007). The Autumn of Italian Opera: From Verismo to Modernism, 1890-1915 (em inglês). [S.l.]: UPNE 
  15. Opera (em inglês). [S.l.]: Opera Magazine Limited. 1982 
  16. Revista theatral. [S.l.]: Typographia Nacional. 1896 
  17. Portugal, Rádio e Televisão de. «Portuguesa do século XIX foi primeira-dama na Argentina». Portuguesa do século XIX foi primeira-dama na Argentina. Consultado em 16 de dezembro de 2022 
  18. Hanglin, Rolando. Breve historia incorrecta de la Argentina (em espanhol). [S.l.]: Ediciones LEA 
  19. Quaranta, Jorge Alberto (2003). Los museos de Buenos Aires (em inglês). [S.l.]: Secretaría de Turismo y Deporte, Presidencia de la Nación 
  20. Luna, Felix (1 de junho de 2011). Alvear (em espanhol). [S.l.]: Penguin Random House Grupo Editorial Argentina 
  21. Collier, Simon (15 de dezembro de 1986). The Life, Music, and Times of Carlos Gardel (em inglês). [S.l.]: University of Pittsburgh Pre 
  22. «Regina Pacini, la soprano portuguesa que abrazó y protegió a la cultura argentina». www.cultura.gob.ar (em espanhol). Consultado em 16 de dezembro de 2022 
  23. Leitner, Gerry (2000). Argentina Travel Companion (em inglês). [S.l.]: Hunter Publishing, Inc 
  24. «La Mujer En Las Calles De Puerto Madero». Consultado em 4 de janeiro de 2010. Cópia arquivada em 10 de julho de 2011 

Bibliografia Passiva editar

  • Ana Maria Cabrera, Regina e Marcelo: um duetto de amor. Editorial Sudamericana, 2001. 9500720043
  • Ovidio Lagos, A paixão de um aristócrata : Regina Pacini e Marcelo T. de Alvear Emecé Editores, 1993. 9500413043
  • Chirico, Gabriel, As primeiras damas da história argentina. Editorial Dunken, 2005. 9870210600