Rui Galvão de Carvalho

poeta e escritor português (1903-1991)
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Rui Galvão de Carvalho (Rabo de Peixe, 3 de novembro de 1903Ponta Delgada, 29 de abril de 1991) foi um poeta, escritor, ensaísta e professor açoriano que se notabilizou pelo seu estudo da vida e obra de Antero de Quental, sendo considerado um dos bons anterianistas. Deixou uma vasta e diversificada obra literária, em parte publicada sob o pseudónimo de Abd-el Kader.[1]

Rui Galvão de Carvalho
Rui Galvão de Carvalho
Nascimento 3 de novembro de 1903
Rabo de Peixe
Morte 29 de abril de 1991 (87 anos)
Ponta Delgada
Cidadania Portugal
Alma mater
Ocupação poeta, escritor
Casa (em Rabo de Peixe) onde nasceu Rui Galvão de Carvalho e rua com o seu nome.
Placa que certifica o local de nascimento de Rui Galvão de Carvalho.

Biografia editar

Percurso académico editar

Destinado a seguir uma carreira na advocacia, matriculou-se na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, mas em 1922, quando já frequentava o 3.º ano do curso, transferiu-se para a Universidade de Coimbra, matriculando-se então no curso de Ciências Filosóficas, em que se licenciou em 1929.

Durante a sua passagem por Coimbra foi aluno do anterianista Joaquim de Carvalho, professor que o introduziu no estudo da obra de Antero de Quental e com quem manteria uma profícua e longa relação.[1] Também durante esse período aproximou-se das ideias do Integralismo Lusitano e de António Sardinha, cujas conceções e ideais se mostraram de primordial importância na sua formação intelectual e moral. Essas influências são «indispensáveis para compreender a personalidade do pedagogo, do poeta, do anterianista, do açorianista» que depois se revelaria.[2] Outra importante influência deste período foi a amizade que manteve com Bernardo de Vasconcelos, seu condiscípulo em Coimbra.

Iniciou a sua colaboração com a imprensa também ainda enquanto estudante em Coimbra, o mesmo acontecendo com a sua atividade enquanto conferencista. Já em 1927 proferia uma conferência sobre António Sardinha no Centro Académico da Democracia Cristã, em Coimbra, e tinha importante participação nas atividades daquele centro.

Carreira profissional editar

Terminado o curso, declinou um convite para ingressar no corpo docente da Universidade de Coimbra e optou pela docência liceal, tendo lecionado nos liceus de Coimbra, Lisboa e Ponta Delgada. Nesta última cidade, efetivou-se como professor do Liceu Nacional Antero de Quental (atual Escola Secundária Antero de Quental), assumindo um papel de grande relevo na vida escolar e na atividade cultural que se realizava em torno do liceu micaelense. Foi, no dizer de Fernando Aires, «fonte e húmus de iniciativas criadoras»[1] que marcaram várias gerações de estudantes e a vida cultural e cívica da cidade.

Para além da docência liceal dedicou-se ao estudo da poesia açoriana, iniciando logo na década de 1930 uma recolha de poesia de autores de diversas ilhas, cuja análise e contextualização lhe ocupariam quase meio-século. Outra importante linha de estudo, na qual se tornaria um indisputado especialista, foi a vida e obra de Antero de Quental. Em consequência desse labor, foi um dos mais reputados anterianistas de sempre e, simultaneamente, um destacado especialista em literatura açoriana.[carece de fontes?]

Obra literária editar

Poesia editar

Também, desde muito cedo, se dedicou à poesia, publicando obra própria de mérito. Para além da obra que publicou sob o seu nome, também publicou importante obra poética sob o pseudónimo de Abd-el Kader, sendo sob este pseudónimo que vieram a público as suas principais obras líricas.[3] Na sua produção poética é clara a influência religiosa e moral de frei Bernardo de Vasconcelos, particularmente na vertente da exaltação da vivência mística do amor de Deus.[2] A sua poesia é, também, a exaltação do sentimento e do amor, como formas de conhecimento superiores à razão e duma permanente inquietude que não cede ao pessimismo.[1]

Monografias e ensaios editar

Na sua atividade como ensaísta, é clara a inseparável ligação ao estudo da filosofia e da poesia de Antero de Quental, mas a sua orientação filosófica reflete também a forte influência do pensamento neoescolástico, essencialmente na orientação que lhe foi dada por Jacques Maritain, Régis Jolivet e Henri Bergson. Outra linha orientadora do seu pensamento, particularmente visível nos seus estudos sobre a poesia e os poetas açorianos, foram os ideais nacionalistas de António Sardinha, com destaque para o culto da identidade e independência de Portugal, em particular na sua oposição às conceções iberistas de alguns grupos monárquicos e dos federalistas republicanos.

Para além da sua obra ensaística e das monografias que publicou sobre a obra de Antero de Quental e sobre literatura açoriana, deixou uma vasta obra dispersa por jornais, revistas literárias, palestras na rádio e conferências, bem como um importante acervo de obras inéditas, depositados na Biblioteca Pública e Arquivo de Ponta Delgada, por disposição testamentária, muitas delas prontos para serem publicados.[1] Entre as obras inéditas inclui-se a intitulada Subsídios para a História da Poesia Açoriana, em 12 volumes, resultado do vasto e longo processo de recolha e estudo da produção poética de todas as ilhas dos Açores, um tarefa que iniciara na década de 1930.

Prémios e condecorações editar

Em 9 de abril de 1981, foi condecorado com o grau de Comendador da Ordem Militar de Sant'Iago da Espada[4], que lhe foi entregue em sessão solene realizada na Universidade dos Açores e presidida pelo general António Ramalho Eanes, então Presidente da República. A distinção foi conferida em reconhecimento do seu relevante contributo na investigação e no ensino.

Em 1986 ofereceu à Universidade dos Açores um importante espólio que incluía várias traduções dos poemas de Antero, ensaios críticos, correspondência literária diversa, obras de autores açorianos, revistas e jornais com artigos de temática anteriana. Este espólio ficou a constituir a Sala Antero de Quental, na qual foi também colocado um busto de Antero de Quental, da autoria de Canto da Maia, um retrato a óleo do poeta pintado por Raposo Marques e um quadro a óleo de inspiração anteriana da autoria de Luísa Athayde. Todo este valioso espólio foi destruído pelo incêndio que deflagrou no edifício da reitoria e que destruiu totalmente o imóvel.

Legado editar

Para além de ser lembrado na toponímia de várias povoações açorianas, é o patrono da principal escola de Rabo de Peixe, a Escola Básica Integrada Rui Galvão de Carvalho.

Notas

  1. a b c d e Enciclopédia Açoriana.
  2. a b Gustavo de Fraga, "Ruy Galvão de Carvalho : O Homem e a Obra", Arquipélago (Ciências Humanas), II.: 91-117.
  3. Desconhece-se a razão da adoção deste pseudónimo, uma aparente alusão ao patriota argelino Abd El-Kader.
  4. «Entidades Nacionais Agraciadas com Ordens Portuguesas». Resultado da busca de "Rui Galvão de Carvalho". Presidência da República Portuguesa. Consultado em 23 de julho de 2020 

Obras publicadas editar

Poesia
  • (1934) — Cântico dos Cânticos: Versos de Amor. Angra do Heroísmo, Livraria Editora Andrade;
  • (1935) — Sol Posto. Angra do Heroísmo, Livraria Editora Andrade;
  • (1957) — Entre o Sonho e a Realidade. Angra do Heroísmo, União Gráfica Angrense;
  • (1990) — Cinzas no Mar: Versos de Abd­-el­-Kader. Ponta Delgada, Instituto Cultural de Ponta Delgada;
Ensaio
  • (1944) — O Génio Poético de Teófilo Braga. Ponta Delgada, Tip. do Diário dos Açores;
  • (1955) — "Contribuição dos Açores para a História da Filosofia Portuguesa". Sep. da Revista Portuguesa de Filosofia, Braga.
  • (1956) — "A volta de António Nobre" in Ocidente : Revista Portuguesa Mensal, Volume L, n.º 217, p. 161-169.
  • (1979, 1984) — Antologia Poética dos Açores. Angra do Heroísmo, Secretaria Regional da Educação e Cultura, 2 vols.;
  • (1985) — Armando Côrtes­-Rodrigues: O Homem e o Poeta. Vila Franca do Campo, Ed. Ilha Nova;
  • (1989) — Poetas dos Açores. Angra do Heroísmo, Secretaria Regional da Educação e Cultura;
  • (1989) — António Franco: Poeta do Sentimento. Nordeste, Câmara Municipal do Nordeste.
Anteriana;
  • (1933) -- Nota breve sobre a timidez de Antero. Porto, Revista Portucale vol. VI, nº 35.
  • (1933) — Três Ensaios sobre Antero de Quental. Coimbra, Imp. da Universidade;
  • (1934) — Meditação Sobre a Vida e a Morte de Antero. Sep. de O Distrito, Ponta Delgada;
  • (1949) — Antero de Quental e a Mulher. Ensaio Breve de Interpretação Psicológico­-Literária. Lisboa, Ed. Álvaro Pinto (dissertação de licenciatura);
  • (1950) — Antero Vivo. Ensaios. Lisboa, Ed. Álvaro Pinto (Ocidente);
  • (1950) — Primazia do Espírito e Agremiações Culturais. Ponta Delgada, Tip. do Correio dos Açores;
  • (1957) — Mulher na Lírica de Antero. Sep. de Insulana;
  • (1961) — Cartas de Antero de Quental a Francisco Machado de Faria e Maia. Lisboa, Delfos;
  • (1962) — Ordenação Cronológica dos «Sonetos Completos» de Antero de Quental. Sep. de Atlântida. Órgão do Instituto Açoriano de Cultura, Angra do Heroísmo;
  • (1965) — O génio poético de Antero. Brotéria, Lisboa, vol. 81, n.º 3 (Setembro de 1965): pp. 175 seg.
  • (1966) --- As raízes bocageanas dos Sonetos de Antero de Quental. Gil Vicente, Lisboa, Vol. XVII 2ª série. nº 11e 12.
  • (1980) — Colectânea de Estudos Anterianos. Angra do Heroísmo, Secretaria Regional da Educação e Cultura;
  • (1983) — Antologia Poética de Antero de Quental. Angra do Heroísmo, Secretaria Regional de Educação e Cultura;
  • (1984) — O Açorianismo de Antero de Quental. Sep. da Biblos, Coimbra;
  • (1985) — Antero de Quental: Novos Ensaios. Vila Franca do Campo, Ed. Ilha Nova;
  • (1989) — Antero de Quental e a Música. Câmara Municipal da Horta.

Referências editar

  • Gustavo de Fraga (1980), "Ruy Galvão de Carvalho: O homem e a obra". Arquipélago (Ciências Humanas), II.: 91-117.
  • Manuel Barbosa (1981), Memórias das Ilhas Desafortunadas. Coimbra, Ed. do autor: 83-91.
  • João Afonso (1985), Bibliografia Geral dos Açores, II: 222-235.
  • Fernando Aires (1990), Em Homenagem a Ruy Galvão de Carvalho. Ponta Delgada, Escola Secundária de Antero de Quental.
  • Carlos Cordeiro (1999), Nacionalismo, Regionalismo e Autoritarismo nos Açores Durante a I República. Lisboa, Edições Salamandra: 119-125.

Ligações externas editar