Vaanes I Mamicônio

 Nota: Para outras pessoas de mesmo nome, veja Vaanes.

Vaanes I Mamicônio[2] (em latim: Vaanes; em grego: Βαάνης; romaniz.: Baánēs; em armênio: Վահան; romaniz.: Vahan; n. ca. 440/5 - m. entre 503-510) foi um armênio dos século V e VI, que ativamente combateu o Império Sassânida. Membro da nobre família Mamicônio, era filho de Maictes, nobre que rebelou-se com seu irmão Vardanes II contra o julgo sassânida. Com o fim da rebelião, Vaanes foi levado à corte iraniana com seus irmãos e por lá ficou durante alguns anos.

Vaanes I Mamicônio
Vaanes I Mamicônio
Ilustração moderna de Vaanes do volume II da História Ilustrada da Armênia
Marzobã da Armênia
Reinado 485-505/510
Antecessor(a) Sapor de Rei
Sucessor(a) Bardas
 
Nascimento ca. 440/5
Morte entre 503-510
Pai Maictes[1]
Mãe Zoique

Então, quando retorna à Armênia, e na posse do título hereditário de asparapetes, rebela-se em 481 contra o Perozes I (r. 459–484) em apoio à revolta iniciada pelo rei ibero Vactangue I (r. 447/9–502/22). Com o sucesso da rebelião, foi nomeado marzobã pelo xá Balas (r. 484–488) em 485 e foi chefe de uma "verdadeira monarquia sem título"[3] até sua morte.

Vaanes (Vaanes) é a forma latina[4] do teofórico armênio Vaã (Վահան, Vahan), que derivou de Vaagne (Վահագն, Vahagn).[5] Vahagn, por sua vez, foi um deus da mitologia armênia que derivou seu nome do parta Varragne (*Warhragn) / Vartagne (*Warθagn), do persa antigo Vertragna (Vṛθragna) e do avéstico Varetragna (vərəθraγna), que era o nome de um dos deuses do panteão iraniano. Como teofórico foi citado em armênio como Verã (Vrām), em persa médio como Vararã (Warahrān) e Varã (Wahrām), em grego como Boanes (Βοάνης, Boánes), Baanes (Βαάνης, Baánēs), Baranes (Βαρανης, Baranēs), Baânio (Βαανιος, Baanios), Uarrames / Varrames (Ουαρράμης, Ouarrámes), Barã (Βαραμ, Baram), Baramo (Βάραμος, Báramos) e Baram(a)anes (Βαραμ(a)άνης, Baram(a)anēs), [6][7] em georgiano como Barã (ბარამ, Baram),[8] em latim como Veramo (Veramus)[9] e Vararanes[10] e em persa novo como Barã (بهرام, Bahrām).[7]

Contexto

editar

Após 387, o Reino da Armênia foi dividido em duas zonas de influência, a bizantina e a persa. Além disso, em 428, o último rei arsácida, Artaxias IV (r. 423-428), foi deposto pelo xainxá Vararanes V (r. 420–438) a pedido dos nacarares, inaugurando o Marzobanato da Armênia.[11] Muito rapidamente, os armênios desiludiram: em 449, Isdigerdes II (r. 438–457) ordenou que eles apostatassem e se convertessem ao zoroastrismo.[12] Sob a liderança de Vardanes II, se revoltaram, mas foram derrotados em junho (ou 26 de maio) de 451 na Batalha de Avarair; a maioria dos nacarares que participaram da revolta foram então deportados à capital persa de Ctesifonte.[13]

Biografia

editar

Juventude

editar
 
Armênia (amarelo) na Antiguidade Tardia

Vaanes nasceu por volta de 440/5[14] e era filho de Maictes e Zoique, a filha de Vararanes ou Vasaces, da família Arzerúnio. Também era sobrinho de Vardanes e irmão de Vasaces, Bardas e Artaxias.[15] Seu pai, depois de Avarair, uniu-se aos insurgentes restantes na guerrilha em suas terras em Taique, mas foi morto pelos persas.[16] Vaanes, porém, foi levado pelo marzobã Vasaces I, entregue aos persas e deportado para Ctesifonte com Vasaces e Artaxias.[17] Condenado a apostasia, segundo seu amigo de infância[12] Lázaro de Farpe, "enfraqueceu em sua fé".[18]

Os três irmãos, condenados à morte, foram libertados através de Achucha II, vitaxa de Gogarena e marido de Anuxurã, a irmã de Zoique.[18][19] Asparapetes da Armênia por direito consuetudinário, Vaanes recuperou seus bens, mas logo foi acusado de desvio da renda das minas de ouro imperiais, acusação à qual respondeu indo para Ctesifonte com grande soma.[20]

Rebelião

editar
 
Vaanes e os armênios voltando para casa. Representação de Julian Zasso (1833-1889)

Após Avarair, os armênios foram constantemente chamados pelos persas para expedições militares distantes e foram obrigados a aceitar o crescente poder dos apóstatas. No contexto, receberam bem o apelo da revolta de Vactangue I (r. 447/9–502/22), que sublevou contra os persas.[20] Vaanes hesitou, mas, em 481 decidiu juntar-se à rebelião,[21] exigindo que os rebeldes jurassem sobre a cruz do Evangelho que se manteriam fiéis à aliança; foi então nomeado asparapetes.[20] O juramento foi, contudo, reportado diretamente por Barsabores Amatúnio ao marzobã Adargusnas, que abandonou Dúbio, a capital armênia, e refugiou-se em Artaxata e finalmente Pérsia.[21]

Vaanes substituiu Adargusnas por Isaque II Bagratúnio, naquela altura o aspetes (mestre da cavalaria).[21] Adargusnas retornou com uma força de sete mil homens contra os insurgentes que foi derrotada por 400 cavaleiros liderados por Vasaces na Batalha de Acori (encosta norte do Ararate[22]); o marzobã foi morto.[20] No verão de 482, Sapor Mirranes ameaçou a Ibéria e Vactangue chamou os armênios ao resgate. Vaanes e Isaque chegaram à frente de um exército ao rio Cura,[23] mas foram derrotados em Aquesga,[24] que, dentre outras consequências, causou a morte de Vasaces e Isaque II.[25] Vaanes levou o resto do exército armênio às montanhas em Taique, onde realizou ações de guerrilha, enquanto Sapor Mirranes assumiu o controle da Armênia. Foi depois chamado à corte de Ctesifonte e Vaanes aproveitou a oportunidade para recuperar o controle de Dúbio.[26]

Vaanes permaneceu em Dúbio para defendê-la[27] até o início de 483, quando foi cercado por reforços de Zarmir, o Azarapates. Para evitar ser preso pelo exército muito maior numericamente, organizou uma saída que pegou os persas de surpresa, derrotando-os na Batalha de Nerseapate, em Artaz (região de Macu),[28] e então achou refúgio nas montanhas. Suas forças fugiram aos distritos próximos da fronteira bizantina,[23] em Taique e Taraunitis.[29] Vaanes esperava que a Pérsia não causaria um incidente na fronteira de modo a evitar guerra com o Império Bizantino, mas Zarmir o seguiu de perto e conseguiu, após uma marcha noturna, chegar ao alvorecer no acampamento armênio. Conseguiu capturar algumas princesas, mas Vaanes e os principais nacarares tiveram tempo de chegar nas montanhas.[30]

Marzobã da Armênia

editar
 
Dinar de ouro de Perozes I (r. 459–484)
 
Dracma de Balas (r. 484–488)

A situação teria uma mudança repentina quando, em 484, morreu o xainxá Perozes I (r. 459–484) na guerra contra o Império Heftalita, o que causou a retirada dos persas da Armênia[23] e a recuperação de Dúbio e Valarsapate. Com dificuldades de suprimir a revolta de Zariadres, o sucessor de Perozes, Balas (r. 484–488), precisou da ajuda armênia: em troca de apoio militar, concordou em firmar um tratado em Nuarsaque (atual Coi[31]); Vaanes também foi reconhecido como asparapetes e as propriedades dos Mamicônios e seus aliados Camsaracanos foram devolvidas.[23]

Na mesma ótica, Vaanes foi nomeado marzobã em 485, "apagando definitivamente as consequências da tragédia de 451", e nomeou seu irmão Bardas como asparapetes. Presidiu uma verdadeira recuperação nacional e, de acordo com os católicos João I Mandacúnio e Apovipcenes de Otmus,[3] reorganizou o país no plano religioso.[32] Nesse sentido, conduziu a reconstrução e ampliação da Igreja de São Gregório de Dúbio[33] e a reparação da Catedral de Valarsapate (484–485).[34]

O país gozou de relativa paz,[32] apesar da tentativa frustrada do sucessor de Balas, Cavades I (r. 488-496; 499-531), de se impor sobre as proposições de Nuarsaque.[35] Em 489, Vaanes se aproximou de Vachagã III, rei da Albânia,[32] e repeliu uma incursão heftalita no início do século VI na Transcaucásia. Morreu entre 503 e 510 e foi sucedido por seu irmão Bardas Mamicônio.[36] De acordo com Cyril Toumanoff, Vaanes teria sido hipoteticamente o pai de Astabasdo (IV), o pai de Samuel I, asparapetes em 555.[37]

Ver também

editar

Precedido por
Sapor Mirranes
Governo provisório
482-483
Sucedido por
Zarmir, o Azarapates
Precedido por
Sapor de Rei
Marzobã da Armênia
485-505/510
Sucedido por
Bardas Mamicônio

Referências

  1. Jacobus 1993, p. 116.
  2. Yarshater 1983, p. 524.
  3. a b Grousset 1973, p. 230.
  4. Lilie 2013, #710 Baanes.
  5. Ačaṙyan 1942–1962, p. 9.
  6. Justi 1895, p. 363.
  7. a b Vários autores 1988.
  8. Rapp 2014, p. 203.
  9. Moisés de Corene 1736, p. 292.
  10. Martindale 1971, p. 945.
  11. Mutafian 2005, p. 38.
  12. a b Dédéyan 2007, p. 187.
  13. Dédéyan 2007, p. 190.
  14. Settipani 2006, p. 306-310.
  15. Toumanoff 1990, p. 330.
  16. Grousset 1973, p. 207.
  17. Grousset 1973, p. 214.
  18. a b Grousset 1973, p. 215.
  19. Toumanoff 1990, p. 99.
  20. a b c d Dédéyan 2007, p. 192.
  21. a b c Grousset 1973, p. 217.
  22. Grousset 1973, p. 218.
  23. a b c d Dédéyan 2007, p. 193.
  24. Grousset 1973, p. 221.
  25. Grousset 1973, p. 222.
  26. Grousset 1973, p. 221-223.
  27. Grousset 1973, p. 219.
  28. Grousset 1973, p. 220.
  29. Grousset 1973, p. 223.
  30. Grousset 1973, p. 223-224.
  31. Grousset 1973, p. 227.
  32. a b c Dédéyan 2007, p. 194.
  33. Donabédian 1987, p. 514.
  34. Donabédian 1987, p. 516.
  35. Grousset 1973, p. 231.
  36. Dédéyan 2007, p. 195.
  37. Toumanoff 1990, p. 333.

Bibliografia

editar
  • Ačaṙyan, Hračʻya (1942–1962). «Վահան». Hayocʻ anjnanunneri baṙaran [Dictionary of Personal Names of Armenians]. Erevã: Imprensa da Universidade de Erevã 
  • Donabédian, Patrick; Jean-Michel Thierry (1987). Les arts arméniens. Paris: Éditions Mazenod. ISBN 2-85088-017-5 
  • Grousset, René (1973) [1947]. Histoire de l'Arménie: des origines à 1071. Paris: Payot 
  • Jacobus, Donald Lines (1993). The American Genealogist, Volumes 68-69. Universidade de Wisconsin - Madison: D.L. Jacobus 
  • Justi, Ferdinand (1895). «Werepraghna 24». Iranisches Namenbuch. Marburgo: N. G. Elwertsche Verlagsbuchhandlung 
  • Lilie, Ralph-Johannes; Ludwig, Claudia; Zielke, Beate et al. (2013). Prosopographie der mittelbyzantinischen Zeit Online. Berlim-Brandenburgische Akademie der Wissenschaften: Nach Vorarbeiten F. Winkelmanns erstellt 
  • Martindale, J. R.; A. H. M. Jones (1971). «Vararanes». The Prosopography of the Later Roman Empire, Vol. I AD 260-395. Cambridge e Nova Iorque: Cambridge University Press 
  • Moisés de Corene (1736). Historiae Armeniacae libri III. Londres: Caroli Ackers 
  • Mutafian, Claude; Éric Van Lauwe (2005). Atlas historique et culturel de l'Arménie : Proche-Orient et Sud-Caucase du 8e au 20e siècle. Paris: Autrement. ISBN 978-2746701007 
  • Rapp, Stephen H. Jr. (2014). The Sasanian World through Georgian Eyes: Caucasia and the Iranian Commonwealth in Late Antique Georgian Literature. Farnham: Ashgate Publishing, Ltd. ISBN 1472425529 
  • Settipani, Christian (2006). Continuité des élites à Byzance durant les siècles obscurs. Les princes caucasiens et l'Empire du vie au ixe siècle. Paris: de Boccard. ISBN 978-2-7018-0226-8 
  • Toumanoff, Cyril (1990). Les dynasties de la Caucasie chrétienne de l'Antiquité jusqu'au xixe siècle : Tables généalogiques et chronologiques. Roma: Edizioni Aquila 
  • Vários autores (1988). «Bahrām». Enciclopédia Irânica Vol. III, Fasc. 5. Nova Iorque: Universidade de Colúmbia 
  • Yarshater, Ehsan (1983). The Cambridge History of Iran: The Seleucid, Parthian, and Sasanian periods. Cambrígia: Imprensa da Universidade de Cambrígia. ISBN 052120092X