Carolina Michaëlis
Carolina Wilhelma Michaëlis de Vasconcelos OSE (Berlim, 15 de março de 1851 — Porto, 22 de outubro de 1925) foi uma crítica literária, escritora, lexicógrafa e professora universitária, tendo sido a primeira mulher a leccionar numa universidade portuguesa, na Universidade de Coimbra, e uma das duas primeiras a entrar na Academia das Ciências. Teve igualmente grande importância como mediadora entre a cultura portuguesa e a cultura alemã.
Carolina Michaëlis | |
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Nome completo | Carolina Wilhelma Michaëlis de Vasconcelos |
Nascimento | 15 de março de 1851 Berlim ![]() |
Morte | 22 de outubro de 1925 (74 anos) Porto Portugal |
Nacionalidade | prussiana, portuguesa |
Cônjuge | Joaquim António da Fonseca de Vasconcelos (1876) |
Ocupação | Crítica literária, escritora, lexicógrafa e professora universitária |
BiografiaEditar
Nascida em Berlim, Prússia, na época parte da Confederação Germânica, a 15 de março de 1851, Carolina Wilhelma Michaëlis era filha do professor liceal de matemática e, mais tarde, de fonética e estenografia, na universidade, Gustav Michaëlis e de Henriette Louise Lobeck.[1] Era a mais nova dos cinco filhos do casal e irmã da lexicógrafa e autora dos primeiros dicionários Michaelis, Henriette Michaëlis.[2][1]
Desde muito cedo demonstrou ter uma rara aptidão e gosto pelas línguas e literatura germânica, eslava e latina, tendo ingressado com 7 anos no colégio feminino municipal Luisenschule já a saber ler e escrever. Aos 12 anos de idade tornou-se órfã de mãe. Querendo aprofundar os seus estudos, e apesar do ensino superior ser, à altura, exclusivo ao sexo masculino, dos 16 aos 25 anos, foi educada e instruída pelo seu pai, o filólogo Eduard Matzner e pelo romancista e amigo da família Carl Goldbeck que lhe ensinaram filologia clássica e românica, para além de literatura greco-romana, francesa, espanhola e italiana, entre outras.[3]
Em 1867, com apenas 16 anos, Carolina começou a publicar em revistas alemãs da especialidade e, com 20 anos, já trabalhava como tradutora e intérprete para os assuntos da Península Ibérica, no Ministério do Interior alemão, assim como colaborara nas enciclopédias de Brockhaus e Meyer e em várias revistas e periódicos internacionais, como a Bibliografia Crítica de História e Literatura, dirigida por Francisco Adolfo Coelho.
Em 1876, durante a sua colaboração luso-germânica e após o polémico caso da "Questão do Fausto", na qual foi bastante criticada a versão traduzida da obra Fausto, de Goëthe, feita por António Feliciano de Castilho, Carolina conheceu Joaquim António da Fonseca de Vasconcelos, musicólogo e historiador de arte português. Com ele, iniciou uma longa correspondência de cartas que, em pouco tempo, se transformou num fervoroso namoro à distância. Ficou conhecido o episódio em que Joaquim António de Vasconcelos, arrebatado e decidido em ir ao encontro da sua amada, em plena terceira guerra carlista, à falta de comboios, decidiu atravessar os Pirenéus a cavalo. Nesse mesmo ano, os dois casaram-se em Berlim e foi dada a dupla cidadania a Carolina.
Após o casamento, o casal mudou-se para Portugal, dividindo o seu tempo entre a localidade de Vasconcelos, no distrito de Braga, e as cidades de Lisboa e Porto, para além da sua casa de férias em Águas Santas. Apesar de ter dedicado esses primeiros anos à sua vida familiar, Carolina Michaëlis de Vasconcelos nunca deixou os estudos e investigações, e em 1877, durante os primeiros meses de gravidez, era frequente vê-la passar as tardes na biblioteca do Palácio Nacional da Ajuda, em Lisboa, a recolher dados sobre a língua e a literatura do folclore português, especialmente do período arcaico. Em dezembro desse mesmo ano, nasceu o seu primeiro e único filho, Carlos Joaquim Michaëlis de Vasconcelos e tornou-se sócia honorária do Instituto de Línguas Vivas de Berlim.[4]
O seu trabalho de investigação levou-a a corresponder-se com inúmeros nomes grandes da cultura portuguesa e internacional, tais como os portugueses Eugénio de Castro, Antero de Quental, João de Deus de Nogueira Ramos, Henrique Lopes de Mendonça, José Leite de Vasconcelos, o Conde de Sabugosa, Teófilo Braga, Trindade Coelho, Anselmo Braamcamp Freire, Sousa Viterbo, Alexandre Herculano,[5] os médicos e escritores António Egas Moniz e Ricardo Jorge, os espanhóis Menéndez y Pelayo e Menéndez Pidal, para além de diversas personalidades francesas, inglesas e alemãs.[6]
Em 1901, foi-lhe concedida pelo rei D. Carlos a insígnia de oficial da Real Ordem Militar de Santiago da Espada.
Em 1911, foi nomeada, por distinção, docente de Filologia Germânica da Universidade de Lisboa, tornando-se na primeira mulher a lecionar numa universidade portuguesa. Um ano depois, por querer estar mais perto da cidade do Porto, pediu transferência para a Universidade de Coimbra, onde viria a reger cinco cursos distintos: dois de Filologia (românica e portuguesa) e três de Língua e Literatura Alemã.
Nesse mesmo ano de 1912, Carolina foi eleita por mérito, juntamente com Maria Amália Vaz de Carvalho, para a Academia das Ciências de Lisboa, tornando-se assim numa das primeiras mulheres a entrar na prestigiada instituição científica.
Em 1924, dirigiu a revista Lusitânia (1924-1927), uma das publicações de maior projeção cultural em território nacional, e em 1926, o Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas, elegeu-a presidente honorária, prestando-lhe homenagem com um número especial da sua revista Alma Feminina.
Faleceu a 22 de outubro de 1925, com 74 anos de idade, no Porto. No seu enterro, escritores, jornalistas e colegas, assim como o Presidente da República, Teixeira Gomes, e o rei deposto, D. Manuel II, acompanharam o corpo da escritora desde a sua casa, na Rua de Cedofeita, até ao cemitério de Agramonte.
HomenagensEditar
Em 1972, a Câmara Municipal de Lisboa homenageou a professora dando o seu nome a uma rua na zona do Calhariz de Benfica.
O seu nome figura também na toponímia dos concelhos portugueses de Oeiras (Linda-a-Velha), Odivelas (Ramada), Maia (Águas Santas), Porto, Seixal (Corroios), Loures e Coimbra.
Em sua homenagem, o seu nome foi também atribuído à Escola Secundária Carolina Michaëlis, situada na Rua da Infanta Dona Maria, e a uma estação do metropolitano da cidade na cidade do Porto.
Em Novembro de 2005, por iniciativa da professora Gabriele Beck-Busse, do Instituto de Línguas Românicas da Universidade de Marburgo, o nome de Carolina Michaëlis foi atribuído a uma das principais artérias da cidade de Berlim, perto de Johanesstrasse, rua onde nasceu. A placa da Caroline-Michaelis-Strasse foi descerrada pelo Embaixador de Portugal na Alemanha, João de Vallera, na presença de várias individualidades alemãs e portuguesas.[7]
Em 2006, os CTT - Correios de Portugal emitiram sete selos postais comemorativos, com sete vultos da cultura portuguesa: o médico e político Miguel Bombarda, o educador e Presidente da Primeira República Bernardino Machado, o cantor de ópera Tomás Alcaide, os escritores José Régio, José Rodrigues Miguéís, Vitorino Nemésio e Bento de Jesus Caraça, e Carolina Michäelis. Três anos depois, foi novamente homenageada pelos CTT - Correios de Portugal, com uma nova emissão comemorativa que evocava as activistas dos direitos femininos dos primeiros tempos da República: Maria Veleda, Adelaide Cabete, Angelina Vidal, Ana de Castro Osório, Carolina Beatriz Ângelo, Carolina Michaëlis de Vasconcelos, Virgínia Quaresma e Emília de Sousa Costa.[8]
ObrasEditar
- Poesias de Francisco de Sá de Miranda: Edição critica feita sobre cinco manuscriptos ineditos e todas as edições impressas: Acompanhada de um estudo sobre o poeta, variantes, notas, glossario, um retrato e cinco facsimiles, Halle, Max Niemeyer, 1880.[9]
- Poesias de Sá de Miranda, 1885
- História da Literatura Portuguesa, 1897
- A Infanta D. Maria de Portugal e as suas Damas (1521-1577), 1902
- Cancioneiro da Ajuda (2 volumes), 1904
- Dicionário Etimológico das Línguas Hispânicas
- Estudos sobre o Romanceiro Peninsular: Romances Velhos em Portugal
- As Cem Melhores Poesias Líricas da Língua Portuguesa, 1914
- A Saudade Portuguesa, 1914
- Loiros, Á Excellentissima Senhora D. Gloria Castanheira, 1919[10]
- Notas Vicentinas: Preliminares de uma Edição Crítica das Obras de Gil Vicente, 1920-1922
- Autos Portugueses de Gil Vicente y dela Escuela Vicentina, 1922
- Estudos camonianos, 1922[11]
- Mil Provérbios Portugueses, 1922
ReferênciasEditar
- ↑ Portugal, Rádio e Televisão de. «Carolina Michaelis de Vasconcellos já tem rua com o seu nome em Berlim». Carolina Michaelis de Vasconcellos já tem rua com o seu nome em Berlim
- ↑ Verdelho, Telmo; Silvestre, João Paulo (1 de maio de 2011). Lexicografia bilingue: A tradição dicionarística português–línguas modernas. [S.l.]: Universidade de Aveiro / CLUL
- ↑ Brandão, Lucas (2017). «Quem foi Carolina Michaelis?». Comunidade Cultura e Arte
- ↑ «A Rua da 1ª professora universitária em Portugal, Carolina Michaelis». Toponímia de Lisboa. 2015
- ↑ Paiva Boléo, Maria Luísa V. de (2006). «Carolina de Michaëlis». O Leme
- ↑ Mühlschlegel, Ulrike (2004). Dona Carolina Michaëlis e os estudos de filologia portuguesa. [S.l.]: TFM
- ↑ «Carolina Michaelis de Vasconcellos já tem rua com o seu nome em Berlim». Carolina Michaelis de Vasconcellos já tem rua com o seu nome em Berlim. Rádio e Televisão de Portugal | RTP. 2005
- ↑ «CTT recorda Mulheres da República com colecção de selos». Imagens de Marca. 2009
- ↑ Miranda, Francisco de Sá de (1885). Poesias de Francisco de Sá de Miranda: edição de Carolina Michaëlis de Vasconcelos. [S.l.]: Imprensa Nacional-Casa da Moeda
- ↑ Vasconcellos, Carolina Michaëlis de (17 de setembro de 2018). Loiros: Á Excellentissima Senhora D. Gloria Castanheira (Classic Reprint). [S.l.]: Fb&c Limited. ISBN 9780366965823
- ↑ Vasconcelos, Carolina Michaëlis de (1922). Estudos camonianos: indices, nótulas e textos inéditos (em inglês). [S.l.]: Imprensa da Universidade
Ver tambémEditar
- Carolina Michaëlis (Metro do Porto), a estação do Metro do Porto em sua homenagem.
- Escola Secundária Carolina Michaëlis, escola situada na Rua da Infanta Dona Maria, no Porto, em sua homenagem.
Ligações externasEditar
- Biografia de Carolina Michaëlisna página do Instituto Camões.
- «Mapeamento de mulheres cientistas - AMONET». AMONET. 2014. Consultado em 5 de Março de 2018