António Ramalho Eanes

Presidente de Portugal entre 1976 e 1986
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António dos Santos Ramalho Eanes GColTEGColIHGColLMSCGCvAMPSD (Castelo Branco, Alcains, 25 de Janeiro de 1935) é um militar e político português, notório por ter sido o o 16.º presidente da República e o primeiro democraticamente eleito após a Revolução de 25 de Abril de 1974.

António Ramalho Eanes
António Ramalho Eanes
António Ramalho Eanes em 2019
16Presidente da República Portuguesa
Período 14 de julho de 1976
a 9 de março de 1986
Primeiro(a)-ministro(a) José Pinheiro de Azevedo
Mário Soares
Alfredo Nobre da Costa
Carlos Mota Pinto
Maria de Lourdes Pintasilgo
Francisco Sá Carneiro
Francisco Pinto Balsemão
Aníbal Cavaco Silva
Antecessor(a) Francisco da Costa Gomes
Sucessor(a) Mário Soares
Presidente do Conselho da Revolução
Período 14 de julho de 1976
a 30 de setembro de 1982
Presidente do Conselho da RTP
Período 28 de outubro de 1974
a 11 de março de 1975
Antecessor(a) Casimiro Gomes
Sucessor(a) João António de Figueiredo
Dados pessoais
Nome completo António dos Santos Ramalho Eanes
Nascimento 25 de janeiro de 1935 (89 anos)
Alcains, Castelo Branco, Portugal
Primeira-dama Manuela Ramalho Eanes
Partido Sem partido (1974–1986, 1990–actualidade)
Partido Renovador Democrático (1986–1990)
Profissão Militar
Assinatura Assinatura de António Ramalho Eanes
Serviço militar
Lealdade Portugal
Serviço/ramo Exército Português
Anos de serviço 1952–1986
Patente General
Conflitos Guerra Colonial Portuguesa
Comissão:
Goa
Macau
Moçambique
Guiné
Angola

Ficou igualmente conhecido pelo seu papel na Crise de 25 de Novembro de 1975, tendo liderado o comando que neutralizou a tentativa de golpe de estado.[1]

Durante a sua carreira militar, participou na Guerra Colonial Portuguesa, tendo posteriormente ascendido ao cargo de General Chefe do Estado Maior do Exército. Em 2000, Ramalho Eanes recusou, por razões ético-políticas, a promoção honorífica a Marechal, à qual teria direito, na qualidade de Presidente da República.

É, atualmente, Conselheiro de Estado e presidente do Conselho de Curadores do ISCTE - Instituto Universitário de Lisboa.[2]

Infância e juventude editar

António Ramalho Eanes nasceu em Alcains, concelho de Castelo Branco, numa família humilde de quatro filhos, sendo o seu pai, Manuel dos Santos Eanes (1900-1970), um pequeno empreiteiro de construção civil, e a mãe, Maria do Rosário Ramalho (1907- 1990), doméstica. A família viveu na aldeia natal até aos 2 anos, altura em que se mudaram para Castelo Branco.[3]

Em 1942 entrou para o Liceu de Castelo Branco. Terminados os estudos secundários, seguiu a carreira das armas entrando para o Exército em 1952, estudando tácticas militares (Escola do Exército, de 1952 a 1956; Estágio CIOE-Curso de Instrução de Operações Especiais, em 1962; instrutor de Acção Psicológica no Instituto de Altos Estudos Militares, em 1962). Frequentou, ainda, o Instituto Superior de Psicologia Aplicada, durante três anos.

Carreira militar editar

No exército, Ramalho Eanes seguiu a Arma de Infantaria. Em 1957, foi promovido a alferes e colocado no Regimento de Infantaria N.º 14, em Viseu. Em 1958, iniciou uma série de comissões de serviço fora de Portugal, nas antigas colónias. A primeira foi em Goa, onde permaneceu entre maio de 1958 e agosto de 1960, seguindo-se Macau (1962-1964). Entretanto, com o deflagrar da Guerra Colonial, seria colocado nos diferentes cenários do conflito: Moçambique (numa primeira comissão, entre 1963-1964, depois retomada entre 1966 e 1968); Guiné (1969-1971) e Angola (entre fevereiro e junho de 1974).

Na Guiné, sob o comando do general António de Spínola, Eanes trabalhou com Otelo Saraiva de Carvalho na Repartição de Assuntos Civis e Ação Psicológica do comando-chefe onde viria a chefiar o Serviço de Radiodifusão e Imprensa.

No verão de 1973, juntamente com os oficiais do exército, Hugo dos Santos e Vasco Lourenço, Eanes foi um dos principais promotores do abaixo-assinado de protesto contra o I Congresso dos Combatentes do Ultramar. Realizado no Porto, o congresso legitimava a política colonial do Estado.[3]

Depois de demorada carreira de combatente, já no posto de major, Eanes encontrava-se ainda em serviço em Angola aquando da revolução de 25 de Abril, e já tinha vindo a demonstrar contestação contra a política colonial do regime em vigor.[4] Aderiu ao Movimento das Forças Armadas e, regressado a Portugal, foi director de programas e nomeado presidente do conselho de administração da RTP, até março de 1975.

No verão de 1975, envolveu-se na conspiração desenvolvida pelo chamado Grupo dos Nove, encabeçado por Ernesto Melo Antunes. Inicialmente subscrito por nove conselheiros da Revolução, o «Documento dos Nove» recolheu um amplo leque de apoios.

Quando começaram os preparativos para responder a um eventual ataque das forças de extrema-esquerda, Ramalho Eanes, então com a patente de Tenente-Coronel, dirigiu as operações militares que neutralizaram a Crise de 25 de Novembro desse mesmo ano,[1] levado a cabo pela facção mais radical da esquerda política do MFA, projectando Eanes, para o primeiro plano da vida nacional.[3][5]

Já como General de quatro estrelas, foi Chefe de Estado-Maior do Exército de Portugal, em consequência imediata da sua ação na neutralização dos sectores mais radicais no 25 de Novembro, de 14 de Julho de 1976 a 16 de Fevereiro de 1981.

Escolhido pelo Conselho da Revolução para candidato às primeiras eleições presidenciais, anunciou a sua candidatura em 14 de maio de 1976. Afirmou, então, que não era o «candidato das Forças Armadas» nem «dos partidos» e que o seu compromisso era «com o povo português».

Presidência da República editar

 
Retrato oficial do Presidente Ramalho Eanes (1991), por Luís Pinto-Coelho. Museu da Presidência da República.

Primeiro mandato presidencial editar

No dia 27 de junho de 1976, António Ramalho Eanes venceu as eleições presidenciais de 1976, com 61,59% dos votos, por sufrágio universal.

Tendo tomado posse no dia 14 de julho de 1976, com 41 anos, tornando-se o Presidente da República mais jovem de sempre e também o primeiro Presidente da República eleito por sufrágio universal, logo a seguir ao 25 de Abril.

O seu primeiro mandato, ficou marcado pela questão militar. Enquanto chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas (CEMGFA) e presidente do Conselho da Revolução, uma das suas principais preocupações recairá sobre a restruturação das Forças Armadas, no sentido do restabelecimento da hierarquia tradicional de comando. Seria, assim, decisivo o seu papel para o regresso pacífico e progressivo dos militares aos quartéis, após o protagonismo que haviam tido na Revolução de 25 de Abril.

Mais tarde, com a revisão constitucional de 1982, o Presidente continuaria a ser o comandante supremo das Forças Armadas, ficando o cargo de CEMGFA para os militares (em fevereiro de 1981, Eanes nomeou o general Nuno de Melo Egídio). O Conselho da Revolução, que presidiu, foi extinto em 1982.[3]

Durante a sua magistratura, num clima de tensão política, Eanes assumiu o protagonismo com três governos de iniciativa presidencial. Conferiu posse ao primeiro Conselho de Estado, em 1982, e presidiu à primeira reunião do Conselho Superior de Defesa Nacional, no ano seguinte. No elenco das suas primeiras ações como Presidente da República fez parte a investidura do I Governo Constitucional, chefiado por Mário Soares, em 23 de julho de 1976.

No plano externo, a Cimeira Luso-Angolana de Bissau constituiu um marco fundamental da atividade presidencial nesse ano de 1978. Eanes encontrou-se com Agostinho Neto, em Bissau, para negociações entre Portugal e Angola, que culminaram na assinatura do primeiro Acordo Geral de Cooperação entre os dois países. Este encontro —em junho de 1978 — foi mediado por Luís Cabral, Presidente da República da Guiné.

Depois de varias experiencias negativas com os três governos de iniciativa presidencial (Nobre da Costa, Mota Pinto e Pintassilgo), dá posse VI Governo Constitucional, chefiado por Francisco Sá Carneiro, os discursos proferidos na cerimónia de tomada de posse deixaram patentes as diferenças entre o Presidente da República e o novo primeiro-ministro. As profundas divergências com o executivo da AD diziam respeito, sobretudo, a uma eventual revisão constitucional pela via referendária.

A 4 de setembro de 1980, Ramalho Eanes anunciou a sua recandidatura às eleições presidenciais. A AD apresentou o seu próprio candidato: o general Soares Carneiro. As eleições legislativas de 5 de outubro de 1980 alargaram a maioria absoluta da AD de 128 para 134 deputados.[3]

Segundo mandato presidencial editar

 
Ramalho Eanes, em visita de Estado aos Estados Unidos, acompanhado de George Shultz (à direita) e Manuela Eanes (à esquerda).

No dia 7 de dezembro de 1980, António Ramalho Eanes venceu as eleições presidenciais de 1980, com 56,44% dos votos, por sufrágio universal.

Três dias, antes, ocorreu o trágico desastre de Camarate que vitimou o primeiro-ministro, Francisco Sá Carneiro, e o ministro da defesa, Adelino Amaro da Costa. A 9 do mesmo mês, o primeiro-ministro interino, Diogo Freitas do Amaral, apresentou a demissão do Governo.

António Ramalho Eanes tomou posse pela segunda vez como Presidente da República no dia 14 de janeiro de 1981. Ainda antes de tomar posse do segundo mandato, empossou, a 5 de janeiro de 1981, o VII Governo Constitucional, chefiado por Francisco Pinto Balsemão.

As relações com o executivo AD de Balsemão pautaram-se por uma enorme tensão. As divergências acentuaram-se em abril e maio de 1981.[3]

O ano de 1982 foi marcado pela Lei da Revisão Constitucional, aprovada pela Assembleia da República em agosto desse ano, e a consequente dissolução do Conselho da Revolução. A revisão constitucional diminuiu o espaço de manobra do Presidente da República nas áreas da política externa e da defesa e reduziu o âmbito de alguns poderes presidenciais.

Em reacção à Revisão Constitucional, Eanes, criticou-a duramente, anunciando a sua intenção de exercer com mais rigor o direito de veto, e responsabilizou os partidos por se terem preocupado com a concentração dos poderes de decisão política, minimizando os aspetos ideológicos e doutrinários do texto de 1976, apontados como obstáculos à política económica e social.

 
Presidente Ramalho Eanes e a esposa Manuela Eanes, recebidos na Casa Branca, pelo Presidente norte americano Ronald Reagan e pela esposa Nancy Reagen em 1983

É no seu mandato que Portugal adere à CEE ( Comunidade Económica Europeia, actual União Europeia), em 12 de junho de 1985.

Em 6 de novembro de 1985, dá posse ao X Governo Constitucional, chefiado por Cavaco Silva.

Ao longo do segundo mandato realizou inúmeras visitas oficiais: em 1981 à República Federal Alemã, a Moçambique, à Zâmbia e à Tanzânia; em 1982, a Angola e Bélgica, Áustria, Guiné-Bissau e Argélia; em 1983, à Grécia e Egipto, aos Estados Unidos da América. Em 1984, visitou o Zaire, o Congo e o Canadá. Deslocou-se a Estrasburgo, discursando na reunião da Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa. No ano seguinte, visitou a China e a Jugoslávia. Ainda em 1985, deslocou-se a Nova Iorque, para discursar na Assembleia Geral da ONU, no dia 23 de outubro de 1985.[3]

Com o fim do segundo mandato, em Fevereiro de 1986, assume pouco depois a presidência do Partido Renovador Democrático, vindo a demitir-se desse cargo em 1987.

Nomeado General em 24 de Maio de 1978, passou à reserva, por sua iniciativa, em Março de 1986.

Com o final do segundo mandato de António Ramalho Eanes, em março de 1986, fechou-se o ciclo dos Presidentes militares.

Pós-Presidência da República editar

Ramalho Eanes é, atualmente, membro do Conselho de Estado e presidente do Conselho de Curadores do ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa.

Em 2000, Ramalho Eanes recusou, por razões de princípio,[6] a promoção a Marechal.

Em 15 de Novembro de 2006, Eanes apresentou na Universidade de Navarra, Espanha, a sua tese de doutoramento. A investigação desenvolvida ao longo de dez anos por Eanes teve como título "Sociedade civil e poder político em Portugal", com duas mil páginas, e foi defendida perante um júri composto por três catedráticos espanhóis e dois portugueses.

Eanes foi também o primeiro Chefe de Estado que ao deixar a Belém iniciou um trabalho de investigação científica conducente à obtenção do grau de doutor. Uma iniciativa pioneira, a nível nacional, desconhecendo-se inclusive casos idênticos na Europa.

Em 2008 é noticiado que o General Ramalho Eanes não aceita receber os retroactivos de cerca de um milhão de euros.[7][8]

Dia 11 de Outubro de 2010 recebeu o Doutoramento Honoris causa pela Universidade de Lisboa aquando das comemorações do centenário desta, coincidindo com as comemorações do centenário da República Portuguesa (5 de Outubro).

António Ramalho Eanes mantem-se um cidadão ativo e atento à realidade do país, continuando a intervir em assuntos de relevância cívica e social.

Vida pessoal editar

É casado com Manuela Eanes. O casamento teve lugar em Lisboa, no Palácio de Queluz, a 28 de Outubro de 1970 e o casal teve dois filhos: Manuel António Neto de Portugal Ramalho Eanes, nascido a 5 de Maio de 1972, casado e pai de Joana; e Miguel Neto de Portugal Ramalho Eanes, nascido a 20 de Outubro de 1977, casado em Julho de 2006 com Sílvia Romeiro, com dois filhos António e Madalena.

Resultados eleitorais editar

Eleições presidenciais editar

Data Partidos apoiantes 1ª Volta Status
Cl. Votos % +/-
1976 PS, PPD, CDS, PCTP 1.º 2 967 137
61,59 / 100,00
Eleito
1980 PS, PCP, PCTP/MRPP 1.º 3 262 520
56,44 / 100,00
 5,15 Eleito

Eleições legislativas editar

Data Partido Circulo eleitoral Posição Cl. Votos % +/- Status Notas
1987 PRD Lisboa 1º (em 58) 4.º 84 433
6,9 / 100,0
Eleito Presidente do PRD

Condecorações editar

Ordens nacionais:[9] editar

Medalhas Militares:[10] editar

Ordens estrangeiras:[11] editar

Referências

  1. a b «O Golpe do 25 de Novembro». Consultado em 3 de agosto de 2021 
  2. «Curriculum Vitae | General António dos Santos Ramalho Eanes» (PDF). Universidade da Beira Interior. Consultado em 9 de janeiro de 2023. Cópia arquivada (PDF) em 9 de janeiro de 2023 
  3. a b c d e f g «MPR - António Ramalho Eanes». www.museu.presidencia.pt. Consultado em 1 de agosto de 2022 
  4. Digital, Bismuto Labs-Web Design e Marketing (24 de janeiro de 2020). «O caminho imperturbável de Ramalho Eanes». Comunidade Cultura e Arte. Consultado em 3 de agosto de 2021 
  5. Infopédia. «António Ramalho Eanes - Infopédia». Infopédia - Dicionários Porto Editora. Consultado em 3 de agosto de 2021 
  6. «Ramalho Eanes rejeita promoção a marechal». Semanário Expresso. 18 de novembro de 2000. Consultado em 18 de maio de 2014. Cópia arquivada em 10 de agosto de 2004 
  7. Susete Francisco (19 de abril de 2008). «PS 'repõe' pensão de Ramalho Eanes». Diário de Notícias. Consultado em 18 de maio de 2014. Arquivado do original em 18 de maio de 2014 
  8. SPP (13 de setembro de 2008). «Eanes prescinde de um milhão de euros». TVI24. Consultado em 18 de maio de 2014. Arquivado do original em 13 de dezembro de 2013 
  9. «Cidadãos Nacionais Agraciados com Ordens Portuguesas». Resultado da busca de "António Ramalho Eanes". Presidência da República Portuguesa. Consultado em 18 de maio de 2014 
  10. «Listas de condecorações atribuídas pelas forças armadas portuguesas a combatentes em Moçambique e Guiné:» (PDF). e http://ultramar.terraweb.biz/Condecoracoes/Cond_moc.pdf 
  11. «Cidadãos Nacionais Agraciados com Ordens Estrangeiras». Resultado da busca de "António Ramalho Eanes". Presidência da República Portuguesa. Consultado em 18 de maio de 2014 
  • Redacção Quidnovi, com coordenação de José Hermano Saraiva, História de Portugal, Dicionário de Personalidades, Volume XIV, , Ed. QN-Edição e Conteúdos, S. A., 2004

Ligações externas editar

 
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